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A disposição dos sujeitos processuais em audiências criminais.

Para além da mera (mu)dança das cadeiras

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29/01/2013 às 11:54
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5. Considerações Finais.

Vimos que, no Brasil, o modelo de sistema processual adotado a partir da Constituição de 1988 foi o acusatório, que pressupõe, entre outros princípios, o da nítida separação entre as funções de acusar, defender e julgar. Ainda que a práxis processual indique uma forte influência do sistema inquisitivo, esse modelo não pode subsistir a partir de uma leitura constitucional do Direito Processual Penal.

No sistema acusatório proposto (ou imposto) pela Constituição, o processo penal desempenha a função de garantia dos indivíduos contra o (ab)uso do poder punitivo. Asseguram-se o contraditório, a ampla defesa, a imparcialidade do juiz, a paridade de armas e, como já dito, a separação das funções processuais, conferindo-se a um órgão estatal autônomo a titularidade da ação penal. A criação do Ministério Público é, como vimos, resultado da superação do modelo inquisitivo.   

De tudo o que foi exposto, parece claro que, assim como, no plano abstrato, propala-se a (tri) angularização do processo, nas salas de audiência, a disposição mais democrática e consentânea com o princípio da imparcialidade do juiz e com o seu corolário princípio da eqüidistância entre as partes seria garantir a Defensores e Advogados dos acusados assento no mesmo plano e imediatamente ao lado esquerdo do juiz, próximo ao acusado, formando-se, destarte, um triângulo, entre os principais sujeitos processuais.

Como adotamos ou queremos ver adotado no país um sistema processual consonante com os princípios democráticos, quem quer que assuma a função acusatória deve estar, no mínimo, razoavelmente separado do Juiz, de forma a que se possa identificar perfeitamente quem é quem na sala de audiência[28].


Referências.

·  CÁCERES, Claudio Palavecinos. Sistemas procesales e ideologias. Derecho y Humanidades, N 17, 2011, p. 21. Disponível em : http://www.derechoyhumanidades.uchile.cl/index.php/RDH/article/viewFile/16973/17699 Acesso em: 27 jan. 2013.

·  CHOUKR, Fauzi Hassan. As reformas pontuais do código de processo penal. In: Estudos do processo penal: o mundo à revelia. Campinas: Agá Juris, 2000.

· COUTINHO, Jacinto Nelson de Miranda. Prefácio. In: LOPES JR., Aury. Direito processual penal e sua conformidade constitucional. 3ª Ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008, p. xxi.

·  FERNANDES, Antônio Scarance. Processo penal constitucional. 4ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005.

· FERRAJOLI, Luigi. Direito e razão: teoria do garantismo penal. 3ª Ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010.

·  LOPES JR., Aury. Direito processual penal e sua conformidade constitucional. 3ª Ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008.

·  MARQUES, José Frederico. Elementos de direito processual penal. Vol 1. Campinas: Bookseller, 1997.

· NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de Processo Penal e execução penal. 2ª Ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006.

· PACELLI, Eugênio. Curso de processo penal. 16 ed. São Paulo: Atlas, 2012.

·  TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo penal. Vol. 1. 26ª ed.  São Paulo: Saraiva, 2004.


Notas

[1] A esse fenômeno de ressurgimento do modelo inquisitivo sob a roupagem do sistema misto, com base na obra de Benabentos, Claudio Palavecinos Cáceres chama de reverdecer neoinquisitivo. Cf.: CÁCERES, Claudio Plavecinos. Sistemas procesuales e ideologias. Derecho y Humanidades, N 17, 2011, p. 21. Disponível em : http://www.derechoyhumanidades.uchile.cl/index.php/RDH/article/viewFile/16973/17699 Acesso em: 27 jan. 2013.

[2] FERRAJOLI, Luigi. Direito e razão: teoria do garantismo penal. 3ª Ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010, p. 96.

[3] FERRAJOLI, Luigi. Op. Cit. p. 96-97.

[4] LOPES JR., Aury. Direito processual penal e sua conformidade constitucional. 3ª Ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008, p. 56.

[5] LOPES JR., Aury. Op. Cit.. p. 57.

[6] CHOUKR, Fauzi Hassan. As reformas pontuais do código de processo penal. In: Estudos do processo penal: o mundo à revelia. Campinas: Agá Juris, 2000, p. 102.

[7] Ao comentar o livro de Aury Lopes Junior, Jacinto de Miranda Coutinho afirma que ele tenta o “quase impossível”, isto é: “compatibilizar a Constituição da República, que impõe um Sistema Acusatório, com o Direito Processual Penal brasileiro atual e sua maior referência legislativa, o CPP de 41, cópia malfeita do Codice Rocco de 30, da Itália (cópia ruim do Code d’Instruction Criminelle,dito Code Napoléon, de 17.11.1808 e em vigor desde 01.01.1811), marcado – como já demonstrei tantas vezes e sofri muito pela incompreensão disto – pelo princípio inquisitivo nas duas fases da persecutio criminis (preliminar e processual), logo, um processo penal regido pelo Sistema Inquisitório”. COUTINHO, Jacinto Nelson de Miranda. Prefácio. In: LOPES JR., Aury. Direito processual penal e sua conformidade constitucional. 3ª Ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008, p. xxi.

[8] NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de Processo Penal e execução penal. 2ª Ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 104-105.

[9] Em que pese nos filiemos àqueles que defendem uma leitura constitucional do processo penal e a aplicabilidade imediata de seus dispositivos garantistas, não podemos olvidar que a práxis processual no Brasil atualmente se fundamenta no Código de Processo Penal de 1940. Assim, estamos com Jacinto de Miranda Coutinho quando ele afirma que o processo penal brasileiro é inquisitivo, tanto na sua primeira fase quanto na segunda. A gestão das provas pelo juiz mesmo na fase judicial revela que, de fato, não adotamos sequer o sistema misto. Assim, embora seja inquisitivo, entendemos que o processo penal no Brasil deve ser acusatório, nos termos da Constituição de 1988.

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[10] Cf.: MARQUES, José Frederico. Elementos de direito processual penal. Vol 1. Campinas: Bookseller, 1997, p. 68.  No mesmo sentido: TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo penal. Vol. 1. 26ª ed.  São Paulo: Saraiva, 2004, p. 29.

[11] Nas palavras do autor: “[O processo penal] É a forma que o Estado impõe para compor os litígios, inclusive de caráter penal, através dos órgãos próprios da administração da Justiça. Como na infração penal há sempre uma lesão ao Estado, este, como Estado-Administração, toma a iniciativa de garantir a observância da lei recorrendo ao Estado-juiz para, no processo penal, fazer valer sua pretensão punitiva”. MIRABETE, Júlio Fabbrini. Processo Penal. 18 ed. São Paulo: Atlas, 2007, p. 6-7.

[12] PACELLI, Eugênio. Curso de processo penal. 16 ed. São Paulo: Atlas, 2012, p. 8.

[13] PACELLI, Eugênio. Curso de processo penal. 16 ed. São Paulo: Atlas, 2012, p. 9

[14] NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de Processo Penal e execução penal. 2ª Ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 512-513.

[15] NUCCI, Guilherme de Souza. Op. cit.,p. 513.

[16] LOPES JR., Aury. Direito processual penal e sua conformidade constitucional. 3ª Ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008, p. 66.

[17] Nas palavras do autor: “O Ministério Público é uma parte fabricada. Surge da necessidade do sistema acusatório e garante a imparcialidade do juiz”. LOPES JR. Aury. Op.cit. p. 66.

[18] Ibidem.

[19] MARQUES, José Frederico. Elementos de direito processual penal. Vol 1. Campinas: Bookseller, 1997, p. 358-360.

[20] O art. 102, I, l, da Constituição de 1988 prevê que compete ao STF processar e julga originariamente a “reclamação para a preservação de sua competência e garantia da autoridade de suas decisões”. Por seu turno a alínea “n” do mesmo inciso I do art. 102 da Constituição prevê que compete ao STF processar e julgar causa que a ação em que todos os membros da magistratura sejam direta ou indiretamente interessados, e aquela em que mais da metade dos membros do tribunal de origem estejam impedidos ou sejam direta ou indiretamente interessados.

[21] STF. Reclamação nº 12.011. Relatora Ministra Carmen Lúcia. Disponível em: http://www.stf.jus.br/portal/processo/verProcessoAndamento.asp?incidente=4111765. Acesso em 24 jan. 2013.

[22] Idem.

[23] CNJ. Consulta nº 0000422-19.2011.2.00.0000. Disponível em: http://s.conjur.com.br/dl/inicial-tj-df-consulta-locais-assentos.pdf Acesso em: 24 jan. 2013.

[24] Idem.

[25] CNJ. Procedimento de Controle Administrativo nº 0001023-25.2011.2.00.0000. Relator Ministro Marcelo Nobre. Disponível em: http://s.conjur.com.br/dl/liminar-conselheiro-marcelo-nobre.pdf Acesso em: 24 jan. 2013.

[26] FERNANDES, Antônio Scarance. Processo penal constitucional. 4ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005, p. 52.

[27] FERNANDES, Antônio Scarance. Op. cit. p. 52-53.

[28] Permitir-se-á, inclusive, distinguir o membro do Ministério Público dos servidores auxiliares e escreventes da audiência.

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Sobre o autor
André Carneiro Leão

É Mestre em Direito Penal pela Universidade Federal de Pernambuco-UFPE. Especialista em Direito Penal e Direito Processual Penal. É Professor da Faculdade Damas de Instrução Cristã. Professor convidado do Instituto de Magistrados de Pernambuco-IMP. É Defensor Público Federal. Titular do 9ª Ofício Criminal da DPU/PE. Ex-chefe da Defensoria Pública da União em Pernambuco. Vice-Diretor da Escola Superior da Defensoria Pública da União (ESDPU). Coordenador Estadual do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais-IBCCRIM. Foi professor universitário de Direito Penal e Processual Penal da Faculdade de Direito de Olinda (AESO/BARROS MELO). Foi professor de cursos para concursos. Foi Professor e Coordenador da disciplina Direito Previdenciário da Escola Superior da Advocacia de Pernambuco (ESA/PE). Bacharel em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco-UFPE.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LEÃO, André Carneiro. A disposição dos sujeitos processuais em audiências criminais.: Para além da mera (mu)dança das cadeiras. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3499, 29 jan. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/23572. Acesso em: 25 abr. 2024.

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