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A vedação ao discurso do ódio na Constituição Federal de 1988

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26/03/2013 às 15:39
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5. CONCLUSÃO

O papel desempenhado pela livre manifestação de pensamento, reconhecida como um direito fundamental na Constituição Federal de 1988, se apresenta como de inegável contribuição ao fortalecimento do regime democrático, ao pluralismo político e cultural, possibilitando que mediante um debate o mais amplo possível circule o conhecimento humano em suas mais diversas formas e modalidades, com a máxima amplitude.

Conforme se expôs, embora o direito à livre manifestação de pensamento seja reconhecido tanto na Constituição dos Estados Unidos quanto na Constituição Federal de 1988, vê-se que situações fáticas semelhantes obtém respostas distintas pelo Poder Judiciário, posto que, no primeiro caso, em razão de inspiração fortemente liberal e individualista, prevalece como direito hierarquicamente superior aos demais com que venha a entrar em confronto.

No caso brasileiro, ao contrário, embora se assegure a liberdade na manifestação do pensamento, estebeleceu o constituinte uma série de balizas que devem ser observadas para que se possa falar no exercício lícito do direito em tela, norteados pelo princípio da dignidade da pessoa humana,as quais, caso não sejam observadas, implicarão em abuso da livre manifestação de pensamento, podendo também ensejar a responsabilidade criminal dos autores.

O caminho trilhado pela jurisprudência pátria, seguido pelo entendimento jurisprudencial também adotado em outros países com menor inclinação liberal, se apresenta como mais adequado à vida em sociedade, a qual pressupõe uma compartição de liberdades, em que se exige à licitude do exercício de qualquer direito o respeito aos direitos dos demais, notadamente em se tratando de minorias étnicas, raciais, religiosas e grupos socialmente discriminados.

Por essa razão, o discurso do ódio, longe de contribuir para a formação de de um debate plural, por apresentar a pretensão de destruir um determinado segmento social, não pode ser tolerado. A mera divulgação de ideias e discursos odiosos já se apresenta suficientemente danosa ao princípio da dignidade da pessoa humana, elemento de unidade axiológica e ao qual podem ser remetidas as liberdades conferidas pela Carta Magna de 1988, inclusive a liberdade de expressão.

A divulgação de ideias odiosas também se apresenta suficientemente danosa e perigosa na medida em que faz com que encontrem eco estereótipos fortemente ofensivos às vítimas do discurso, contribuindo para que seja alimentado um ciclo de diminuição de auto-estima dos grupos estigmatizados, ao mesmo tempo em que pode criar nos destinatários do discurso ânimo irracional de seguimento a ideias deturpadas.


8. BIBLIOGRAFIA

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Notas

[1] MACHADO Segundo, Hugo de Brito. Fundamentos do Direito. São Paulo: Atlas, 2010, p. 131.

[2] TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional. 6. ed. São Paulo, Saraiva, 2008, p. 577.

[3]BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 26 ed. São Paulo: Malheiros, 2011, p. 31.

[4] MIRANDA, JORGE. Manual de Direito Constitucional, Tomo IVDireitos Fundamentais. 2ª edição. Lisboa: Coimbra Editora, 1993, p. 8.

[5] SARLET, Ingo. A eficácia dos direitos fundamentais. 8ª edição. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2007, p. 49.

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[6] BOBBIO, Norberto. A Era dos Direitos. 10ª. edição. Rio de Janeiro: Elsevier, 2004, p. 1.

[7] COULANGES, Fustel de. A Cidade Antiga. Rio de Janeiro: EDIOURO, 2004, p. 419.

[8] SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 18a. edição. São Paulo: Malheiros, 2000, p. 147.

[9] CASTRO, Carlos Roberto Siqueira. A Constituição aberta e os direitos fundamentais – ensaios sobre o constitucionalismo pós-moderno e comunitário. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 19/20.

[10] MIRANDA, JORGE. Manual de Direito Constitucional, Tomo IV – Direitos Fundamentais. 2ª edição. Lisboa: Coimbra Editora, 1993, p. 166.

[11] COMPARATO, Fábio Konder. Ética: direito, moral e religião no mundo moderno. São Paulo, Companhia das Letras, 2006, p. 483/4.

[12] MORAES, Germana de Oliveira. Controle Jurisridicional da Administração Pública. São Paulo: Dialética, 1999, p. 56.

[13]FARIAS, Edilsom Pereira de. Colisão de Direitos. A honra, a intimidade, a vida privada e a imagem versus a liberdade de expressão e informação. 3ª edição. Porto Alegre: Sérgio Antonio Fabris Editor, 2008, p. 59.

[14]MORENO JACINTHO, Jussara Maria. Dignidade humana – princípio constitucional. Curitiba: Juruá, 2006, p. 25.

[15] CARVALHO, Luís Gustavo Grandinetti Castanho de. Liberdade de informação e o direito difuso à informação verdadeira. Rio de Janeiro: RENOVAR, 1994, p. 87.

[16] DIMOULIS, Dimitri e MARTINS, Leonardo. Teoria Geral dos Direitos Fundamentais. 3ª. edição. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2011, p. 17.

[17]VASCONCELOS, Arnaldo. Teoria da Norma Jurídica. 3ª edição. São Paulo: Malheiros, 1993, p. 12.

[18]Op. cit., p. 196/197.

[19]Registros do julgamento podem ser encontrados no site http://supreme.justia.com/cases/federal/us/395/444/case.html

[20]DWORKIN, Ronald.  O direito da liberdade: a leitura moral da Constituição norte-americana. São Paulo: Martins Fontes, 2006, p. 327.

[21]SARMENTO, Daniel.  Livres e Iguais: estudos de Direito Constitucional. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006, p. 236/237.


Abstract

The constitutional protection of freedom of speech is one of the most important instruments guaranteed by the Constitution of 1988, in that it allows the construction of environment characterized by political pluralism, religious and cultural, enabling the formation of a society in which the various points of views are heard.

Due to the protection of other rigths equally relevant, and protecting the Constitution the principle of human dignity, it is necessary to consider whether it is protected by freedom of expression the so called hate speech, taking as parameter, for analysis, understanding jurisprudential from the United States, whose constitution has like the basic principle of protecting freedom.                                                         Given this fundamental difference, we should analyze the reasons why the so-called hate speech is not hosted by freedom of expression in Brazil, allowing potential liability, including criminal, under Brazilian law, contrary to what occurs in the United States of America, where this mode of expression is tolerated by the Supreme Court.

Keywords: Hate Speech. Constitutional Protection.

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Sobre o autor
Rômulo Moreira Conrado

Procurador da República. Mestrando em Direito. Especialista em Direito Constitucional e em Direito e Processo Tributários.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CONRADO, Rômulo Moreira. A vedação ao discurso do ódio na Constituição Federal de 1988. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3555, 26 mar. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/24047. Acesso em: 16 abr. 2024.

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