Resumo: A abertura do mercado de trabalho à mão-de-obra feminina verificada nas últimas décadas proporcionou um maior contato no ambiente de trabalho entre ambos os sexos. Homens e mulheres permanecem horas exercendo atividades no mesmo espaço e em contínua interação, fazendo surgir conflitos e atrações inerentes aos relacionamentos humanos. É neste cenário que surgem as condutas caracterizadas como assédio sexual, causador de profunda degradação do ambiente de trabalho, ferindo o direito do trabalhador a ter um local de trabalho saudável. O presente estudo tem por fim analisar os aspectos que caracterizam o assédio sexual, bem como sua repercussão na responsabilidade civil e, sobretudo, no contrato de trabalho.
Palavras-chave: Direito do Trabalho. Meio ambiente do trabalho. Direito á intimidade. Assédio sexual. Contrato de trabalho. Dano Moral.
INTRODUÇÃO
O presente trabalho tem por finalidade analisar a conduta denominada de assédio sexual, decorrente da evolução social verificada nas últimas décadas, que proporcionou a abertura intensa do mercado de trabalho às mulheres, e as conseqüências, especialmente as justrabalhistas, dando destaque à sua caracterização, à responsabilidade civil do empregador e às repercussões no contrato de trabalho.
Realizaremos, inicialmente, uma análise dos conceitos de meio ambiente do trabalho e do direito constitucional à intimidade, sendo premissas necessárias à leitura do capítulo seguinte, onde dissertaremos acerca do objeto do presente estudo, enfocando a atuação do Poder Judiciário na resolução dos conflitos submetidos à sua apreciação.
Em seguida, abordaremos a responsabilidade civil dos empregadores por seus próprios atos e por atos de seus empregados que impliquem em assédio sexual.
No último capítulo, analisaremos a configuração de dano moral por conta de atos desta natureza, ressaltando, sobretudo, a necessidade de fixação de indenização que compense o sofrimento da vítima bem como desencoraje práticas futuras.
1 Meio ambiente do trabalho
O ambiente de trabalho deve ser sadio, seguro e salubre para proteger a vida e a dignidade dos trabalhadores, conforme garante a Constituição Federal in verbis:
Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:
XXII - redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança;
XXIII - adicional de remuneração para as atividades penosas, insalubres ou perigosas, na forma da lei;
Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:
VI - defesa do meio ambiente.
O mais fundamental direito do homem, consagrado em todas as declarações internacionais, é o direito à vida, base à existência e gozo dos demais direitos humanos. Entretanto, esse direito, conforme assegura a nossa Constituição Federal no art. 225, exige vida com qualidade e, para que o trabalhador tenha vida com qualidade, é necessário que se assegurem os seus pilares básicos: trabalho decente e em condições seguras e salubres (adequadas à saúde física e psíquica do obreiro).
Na lição de Celso Antonio Pacheco Fiorillo[1], meio ambiente do trabalho é o:
“local onde as pessoas desempenham suas atividades laborais, sejam remuneradas ou não, cujo equilíbrio está baseado na salubridade do meio e na ausência de agentes que comprometem a incolumidade físico-psíquica dos trabalhadores, independente da condição que ostentam (Homens ou mulheres, maiores ou menores de idade, celetistas, servidores públicos, autônomos etc.)”.
Acerca da natureza jurídica do meio ambiente de trabalho, ensina brilhantemente Raimundo Simão de Melo[2]:
“O meio ambiente do trabalho adequado e seguro é um direito fundamental do cidadão trabalhador (lato sensu). Não é um mero direito trabalhista vinculado ao contrato de trabalho, pois a proteção daquele é distinta da assegurada ao meio ambiente do trabalho, porquanto esta ultima busca salvaguardar a saúde e a segurança do trabalhador no ambiente em que desenvolve as suas atividades.
De conformidade com as normas constitucionais atuais, a proteção do meio ambiente do trabalho esta vinculada diretamente à saúde do trabalhador enquanto cidadão, razão por que se trata de um direito de todos, a ser instrumentalizado pelas normas gerais que aludem à proteção dos interesses difusos e coletivos. O Direito do Trabalho, por sua vez, regula as relações diretas entre empregado e empregador, aquele considerado estritamente.”
Portanto, pode-se conceituar meio ambiente de trabalho como o local onde os trabalhadores devem permanecer exercendo suas atividades profissionais, sob o controle de um superior hierárquico.
Com a expansão do mercado de trabalho e a consequente inserção da mulher, os relacionamentos entre homens e mulheres se intensificaram, favorecendo o surgimento de uma conduta denominada de assédio sexual, que pode ser tanto por parte da mulher, como por parte do homem.
A iminente doutrinadora Alice Monteiro de Barros[3], com base em pesquisa realizada em doze capitais no início de 1995, constatou que, no Brasil, 52% das mulheres que trabalham já sofreram assédio sexual devido a sua vulnerabilidade, sendo que 90% dos assédios têm como assediador o homem, 9% de mulheres e 1% de indivíduos do mesmo sexo. Entretanto, são raros os casos que chegam ao conhecimento da Justiça.
As razões da não efetivação das denúncias são várias, por exemplo, o medo de perder o emprego ou de sofrer retaliações por parte do empregador acusado.
As trabalhadoras mais assediadas são as secretárias e as empregadas domésticas, por estarem em posição de subordinação marcante frente ao sexo masculino.
É de suma importância evitar o desgaste nas relações interpessoais, já que estas se constituem em instrumento de deterioração dos relacionamentos no âmbito interno das empresas, trazendo, via de regra, a insatisfação e, como consequência, a redução da capacidade laborativa.
A prática de assédio sexual gera nas relações de trabalho um clima inseguro e psicologicamente insalubre, tornando o ambiente onde as pessoas exercem o seu labor em um local hostil e intimidativo, capaz de causar à vítima danos psicológicos, humilhações e, até mesmo, ofensas ultrajantes, principalmente nas mulheres, autorizando a Consolidação das Leis Trabalhistas a rescisão indireta do contrato de trabalho pelo descumprimento, pelo empregador, das obrigações contratuais.
2 Princípio da Dignidade da Pessoa Humana
No Brasil, a Constituição Federal de 1988 acolhe expressamente no art. 1º o modelo do Estado Democrático de Direito, prevendo longo catálogo de direitos humanos, acobertados de eficácia imediata, o que leva à constitucionalização do direito privado com a conseqüente necessidade de seus institutos serem relidos à luz dos princípios consagrados na Magna Carta.
O Estado Democrático de Direito se caracteriza pela busca do equilíbrio entre as necessidades de intervenção estatal e as exigências de respeito ao regime democrático, procurando-se garantir e promover a dignidade da pessoa humana, postulado vaticinado pelo art. 1º, III da Constituição Federal de 1988.
Os textos constitucionais encerram uma relação de direitos fundamentais, resultante de longa evolução política, econômica e social, constituída por direitos individuais, sociais e difusos, detentores de eficácia plena. Os códigos de direito privado não são mais o centro regulador das relações jurídicas, devendo ser compreendidos a partir da força normativa dos estatutos supremos.
As normas constitucionais são possuidoras do mais elevado poder normativo dentro do ordenamento jurídico, revelando uma eficácia vinculante que se estende por todo o sistema legal, já que a Constituição localiza-se no cume do sistema hierárquico de normas. A força normativa da Constituição sustenta-se no reconhecimento de sua juridicidade, principalmente no que diz respeito aos direitos fundamentais. Canotilho[4] assevera que “os direitos, liberdades e garantias são regras e princípios jurídicos, imediatamente eficazes e atuais, por via direta da Constituição e não através da auctoritas interpositio do legislador”.
Neste sentido, as normas jurídicas devem ter por sustentáculo os princípios estabelecidos no estatuto fundamental. Ocorre o que se denomina de constitucionalização do direito. Paulo Luiz Netto Lôbo[5] salienta que “a restauração da primazia da pessoa humana, nas relações civis, é a condição primeira de adequação do direito à realidade e aos fundamentos constitucionais”.
Com a Constituição de 1988, o Direito do Trabalho sofreu profundas transformações, recebendo um caráter publicista ainda maior, pois, além de interesses meramente particulares, existe forte presença de princípios de ordem pública, minimizando a autonomia privada, tão afirmada nos ramos do Direito Privado. Porém, esse sinal publicista do Direito do Trabalho não o retira do Direito Privado, já que os sujeitos das relações trabalhistas são particulares e os correspondentes direitos de caráter individual, apesar da forte presença do Estado na proteção e na organização do trabalho.
O princípio da dignidade da pessoa humana, previsto no art. 1º, III da Constituição Federal, apregoa que o homem deve ser considerado como fim, não como meio, e como sujeito, não como objeto. O preceito caracteriza a fundamentalidade material dos direitos humanos positivados na Constituição. Trata-se da base sobre a qual se constroem todos os direitos fundamentais.
A dignidade da pessoa humana completa o conteúdo mínimo dos direitos humanos fundamentais. Aduz Glauco Barreira[6] que “a dignidade da pessoa humana é o núcleo essencial de todos os direitos fundamentais, o que significa que o sacrifício total de algum deles importaria uma violação ao valor da pessoa humana”.
De acordo com Sarlet[7], a dignidade constitui “qualidade intrínseca e indissociável de todo e qualquer ser humano”, sendo uma “meta permanente da humanidade, do Estado e do Direito”. Portanto, a dignidade da pessoa humana, como valor moral e também espiritual, é qualidade intrínseca e indissociável de todo ser humano, por ser este titular de direitos e deveres fundamentais, que, sendo respeitados e assegurados pelo Estado, proporcionam condições mínimas para uma vida digna em harmonia com os demais seres humanos.
O ideal de Justiça deve ser transportado para o nosso dia-a-dia, sobretudo para os que vivem à margem da sociedade e para as minorias discriminadas, pois sentem, como nenhum outro grupo, a falta efetiva de um real e alcançável Estado Democrático de Direito.
Ensina Rizzato Nunes[8] que “a dignidade é um conceito que foi elaborado no decorrer da história e chega ao início do século XXI repleta de si mesma como valor supremo, construído pela razão jurídica.”
O princípio da dignidade da pessoa humana, como princípio superior e aglutinador dos demais, como a liberdade, a igualdade e a autonomia, deve mostrar para a sociedade a segurança e a realização de condições de igualação dos indivíduos em sociedade sem discriminação de qualquer ordem.
Neste jaez, valer-se da qualidade de superior hierárquico no âmbito das relações de trabalho para auferir vantagens sexuais contra a vontade do trabalhador subordinado, malferindo-lhe a liberdade, é conduta que afronta diretamente o princípio da dignidade da pessoa humana, não se compatibilizando com o Estado Democrático de Direito consagrado pelo texto constitucional de 1988.
2.1 Direito à intimidade
Os direitos fundamentais nascem com a pessoa e, por isso, não podem ser considerados como uma concessão do Estado. O art. 1º, III estabelece como fundamento da República Federativa do Brasil a dignidade da pessoa humana, devendo este valor ser entendido como absoluto respeito aos direitos fundamentais, devendo ser asseguradas condições dignas de existência para todos.
Em 1890, com a publicação do artigo The Right of Privacy, buscou-se demonstrar a necessidade de se frear as intromissões da imprensa na vida e na honra das pessoas, discutindo-se a proteção de certos direitos fundamentais, antes olvidados, tais como: a intimidade, a vida privada e a honra.
Dispõe o art. 12 da Declaração dos Direitos do Homem:
Art. 12. Ninguém será sujeito à interferência na sua vida privada, na sua família, no seu lar ou na sua correspondência, nem ataques à sua honra e reputação. Toda pessoa tem direito à proteção da lei contra tais interferências ou ataques.
René Ariel Dutt caracteriza a intimidade como sendo “a esfera da vida do individuo na qual este tem o poder legal de evitar os demais.”[9]
A Constituição Federal de 1988 assegura tais direitos:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;
Vale ressaltar que o direito ao trabalho é parte do que se convencionou denominar de Direitos Sociais, que surgiram em virtude das lutas no séc. XIX e foram consolidados no séc. XX de uma nova classe social: os trabalhadores. São considerados normas de ordem pública, invioláveis, portanto, pela vontade das partes contraentes da relação trabalhista.
É incontestável que o trabalhador tem direito a ter sua privacidade resguardada. O art. 483, e da CLT dispõe que: “o empregado poderá considerar rescindido o contrato e pleitear a devida indenização quando praticar o empregador ou seus prepostos, contra ele ou pessoas de sua família, ato lesivo da honra e boa fama.” Neste sentido, a jurisprudência:
DANO MORAL. VIOLAÇÃO DA INTIMIDADE – Responde por danos morais a empresa cujo sócio viola a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem de ex-empregada e frusta-lhe o acesso ao mercado de trabalho. (TRT 8ª Reg. RO 7143/95; Ac. 3ª Turma, Rel. Juiz José Maria Quadros de Alencar).
DANO MORAL - COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO. É possível que o dano moral decorra da relação de trabalho, quando o empregador lesar o empregado em sua intimidade, honra e imagem(CF, art. 5º, V e X; CLT, art. 483, "a", "b" e "e"). Punição disciplinar ou pecuniária injusta, que denigra a imagem do empregado, é passível de indenização na esfera trabalhista, uma vez comprovado o caráter danoso do ato patronal. A fonte da obrigação de reparar o dano moral sofrido pelo empregado reside no ato ilícito do empregador de lhe imputar inverídica conduta desairosa e, como tal, guarda íntima relação com o pacto laboral, de forma que se encontra inserida na regra de competência preconizada pelo art. 114 da Carta da República. (TRIBUNAL: TST. DECISÃO: 24 11 1999. PROC: RR NUM: 348045 ANO: 1997 REGIÃO: 10 RECURSO DE REVISTA TURMA: 04 ÓRGÃO JULGADOR - QUARTA TURMA)
RESPONSABILIDADE DO EMPREGADOR - ATIVIDADE COMO CONCAUSA DE DOENÇA - RESPONSABILIDADE - INDENIZAÇÃO - DANOS MORAL E MATERIAL - I- Cabe ao empregador inúmeras obrigações, dentre elas, e a mais importante (cláusula implícita no contrato) é a preservação da integridade física e psíquica do trabalhador, dimensão do direito de personalidade vinculado à dignidade humana e ao valor social do trabalho princípios elevados a direitos fundamentais pela Constituição Federal de 1988. II. Se o laudo pericial reconhece que a doença tem cunho degenerativo mas afirma que a doença foi agravada pelas condições de trabalho verifica-se a concausa e a presença do acidente de trabalho, máxime e se o Órgão Previdenciário atesta o afastamento e a percepção auxilio acidente em função das tarefas desenvolvidas (varreção e recolhimento de resíduos, como também pela necessidade de empurrar e puxar carrinho contendo resíduos). III. Provado o acidente o nexo causal acham-se presentes os requisitos da responsabilidade civil do empregador (dano, omissão a dever legal e nexo de causalidade) é devida a indenização por danos morais, nos termos do art. 186 do Código Civil. IV. Indenização. Dano Moral. Desnecessária é a prova do dano moral, basta a prova do fato gerador do dano, pois a esfera atingida é a subjetividade da vítima, tal seja, seu psiquismo, sua intimidade, sua vida privada, gerando dor, angústia, entre outros sentimentos de indignidade.. V- Valor da indenização por dano moral. Os critérios para a fixação do valor da indenização por dano moral deve levar em conta o grau de culpa da reclamada (art. 944, parágrafo único do Código Civil), a extensão do dano, o caráter pedagógico da condenação, a fim de que a empresa reveja seus procedimentos, a razoabilidade e, o intuito de amenizar o sofrimento ocasionado. VI- Dano Material. Os art. 1.539 e 950 do CC, estabelecem duas possibilidades: 1 - defeito que impede o exercício do mesmo ofício ou profissão; 2 - defeito que não impede o exercício do mesmo ofício ou profissão, mas traz dificuldades para o mesmo trabalho, daí a diminuição da capacidade para o trabalho. Para cada um das possibilidades, a medida da pensão ou indenização será diversa: se há impedimento para o mesmo labor (possibilidade 1), a pensão corresponderá à importância deste mesmo trabalho, ou seja, ao valor do salário que recebia, até o advento do acidente do trabalho ou doença equiparada; agora, se não há impedimento para o trabalho (possibilidade 2), mas mera redução da capacidade laboral, a pensão abrangerá apenas o valor da depreciação, apurável pela aplicação de um percentual representativo da incapacidade sobre o valor do salário. É que o Código Civil, no instituto da responsabilidade civil, inclusive por acidente do trabalho é regido pelo princípio da restitutio in integrum. Diante da incapacidade total do exercício de mesma função,hipótese 01, descabido pensar em qualquer percentual ou tabela: a pensão deve abranger o valor total do salário. Mantenho o valor arbitrado na sentença. (TRIBUNAL: 2ª Região ACÓRDÃO NUM: 20090647828 DECISÃO: 18 08 2009 TIPO: RO01 NUM: 02364 ANO: 2007 NÚMERO ÚNICO PROC: RO01 - 02364-2005-030-02-00-8 RECURSO ORDINÁRIO TURMA: 4ª ÓRGÃO JULGADOR - QUARTA TURMA)
O dano moral irradia-se da calúnia, da difamação, da injúria, ou da prática de ato atentatório à honra, boa fama, imagem, intimidade, à vida, ao patrimônio moral do trabalhador e de sua família.
É cediço que o dano moral ocasiona lesão na esfera personalíssima do titular, implicando numa indenização compensatória ao ofendido (art. 5º, incisos V e X, CF). Sua reparação exige a fixação do valor da indenização pautada pelo princípio da razoabilidade e proporcionalidade (art. 944, CC), ou seja, capaz de satisfazer o interesse de compensação do lesado e a repressão à conduta do lesador.
Segundo a melhor doutrina, desnecessária a prova do dano moral, pois, a esfera atingida da vítima é a subjetiva, tal seja, seu psiquismo, sua intimidade, sua vida privada, gerando dor, angústia, entre outros sentimentos de indignidade. Basta a prova do fato ilícito, potencialmente gerador do dano moral. Sendo assim, comprovado o ato, cabe indenização pelo dano moral causado. É o que se denomina de dano in re ipsa, ou seja, aquele que prescinde de comprovação para efeitos de indenização. Assim reconhece a jurisprudência:
EMENTA: FRENTISTA - VÍTIMA DE ASSALTO - NEGLIGÊNCIA DA EMPREGADORA NA ADOÇÃO DE MEDIDAS DE SEGURANÇA - DANO MORAL CONFIGURADO. É notório que postos de gasolina são alvos frequentes de assaltos, pela vulnerabilidade e facilidade de abordagem aos frentistas, que normalmente carregam razoável quantidade de numerário para viabilizar o desempenho de suas atividades, sendo que ações criminosas deste porte ocorrem em maior número no período noturno, devido à pouca movimentação e o número reduzido de empregados. Portanto, compete ao empregador, sabendo dos riscos que envolvem o seu empreendimento, adotar a diligência necessária e razoável para evitar ou reduzir os riscos inerentes ao trabalho, nos termos do art. 7o., inciso XXI, da Constituição Federal de 1988, sendo insuficiente a tese de que a Segurança Pública compete ao Estado. Conforme essas premissas, a inobservância da reclamada no que tange ao seu poder geral de cautela, submetendo seu empregado a trabalhar sozinho como frentista durante jornada noturna em posto de gasolina sem a iluminação necessária, caracteriza a ilicitude de sua conduta, ensejando a indenização por dano moral, mormente quando constatado nos autos que o reclamante foi baleado na cabeça em decorrência de assalto ocorrido durante a sua jornada de trabalho, sendo sequer necessária a prova da repercussão do dano na órbita subjetiva do autor, que está implícito na própria gravidade da ofensa (dano 'in re ipsa"). Inteligência dos arts. 186 e 927 do Código Civil em conjunto com o art. 7o., inciso XXII, da CF/88. (TRIBUNAL: 3ª Região DECISÃO: 12 05 2009 TIPO: RO NUM: 00013 ANO:2009 NÚMERO ÚNICO PROC: RO - 00013-2009-045-03-00-0 TURMA: Segunda Turma).
EMENTA: DANO MORAL - CONDIÇÕES DEGRADANTES DE TRABALHO - CULPA CONTRA A LEGALIDADE - O descumprimento do dever legalmente previsto é o bastante para confirmar a negligência dos empregadores, caracterizando a culpa contra a legalidade. O dever de indenizar decorre da própria conduta ilegal dos réus, pois não se pode exigir que a ofendida demonstre a existência de um dano que é imaterial, deixando-se em confortável situação processual os autores do ato ilícito. A concepção atual da doutrina e da jurisprudência orienta-se no sentido de que a responsabilização do agente causador do dano moral opera-se por força do simples fato da violação - danum in re ipsa. (TRIBUNAL: 3ª Região DECISÃO: 05 02 2009 TIPO: RO NUM: 00250 ANO: 2008 NÚMERO ÚNICO PROC: RO - 00250-2008-043-03-00-7 TURMA: Setima Turma).
O assédio sexual atenta contra a intimidade, a dignidade pessoal e, principalmente, contra a liberdade sexual, caracterizando-se como uma conduta discriminatória, que provoca grave perturbação no ambiente de trabalho, a qual é vedada pela lei (inciso X do art. 5° da CF). O representante da empresa que pratica ato libidinoso comete assédio sexual para fins justrabalhista, pois esse ato corresponde a uma insinuação sexual ofensiva, rude e grosseira capaz de atacar a dignidade e a liberdade sexual da trabalhadora. A gravidade do ato e a dor moral experimentada pela trabalhadora justificam a indenização imposta à empresa pelo ato faltoso do seu representante ou preposto.
Portanto, a empresa que falha em seu dever de zelar pelo direito constitucional à intimidade de seus empregados, corolário do princípio da dignidade da pessoa humana, merece censura, pois denota negligência no exercício do poder empregatício, o que impõe sua responsabilização no tocante ao assédio sexual.
Neste sentido, coibir o assédio sexual é uma das maneiras de proteção à liberdade sexual e à intimidade dos obreiros, conquistas da evolução social e libertação dos costumes, duramente auferidas ao longo dos tempos.