Introdução.
Fundamentos essenciais a ancorar o contrato do regime de casamento são a exigência da boa-fé e de sua correta operacionalidade, ambos a colidir com Súmula 377/64 do STF, introduzindo, em última análise, uma cláusula contratual ‘oculta’, alterando o regime dos bens já imposto aos cônjuges. Súmula que, ainda, pretende, propõe e acaba, por via indireta, gravando os bens pessoais do cônjuge supérstite, constituindo-se numa sucessão de ardis não visitados pela jurisprudência posterior, a justificar sua revogação, de resto imposta pelo novo Código Civil.
O fato do casamento ser tratado em legislação específica - Livro IV – Direito da Família – Subtítulo I – Do casamento -, não afasta sua dimensão contratual, aspecto que mais e mais acolherá a doutrina, na medida em que divórcios e casamentos posteriores (de divorciados) passem a ocorrer no país em crescente número, substituindo o velho conceito, ainda existente, da sacralidade e derivada indissolubilidade do casamento, um sacramento do ponto de vista religioso, mas um contrato laico do ponto de vista jurídico.
Aliás, o casamento celebrado “mediante procuração, por instrumento público, com poderes especiais” – art. 1.542 do CC – acentua, ainda mais, seu aspecto contratual, palavra lamentavelmente ausente na definição apenas filosófico-religiosa e, por tal razão, a demandar exegese e revisão jurídica do artigo 1.511: “O casamento estabelece comunhão plena de vida, com base na igualdade de direito e deveres dos cônjuges.” Interpole-se ao texto a expressão “contrato” e então teríamos o ingresso desta definição no mundo jurídico, ou “o casamento é um contrato que estabelece comunhão (plena) de vida, com base na igualdade de direito e deveres dos cônjuges”. Expressão esta última, “plena de vida”, um radical pleonasmo.
1. Contrato de casamento: regime insculpido na Certidão. Cláusulas essenciais e boa-fé contratual.
Ao contrair núpcias pelo regime da separação obrigatória de bens, por força do anterior Código Civil, artigo 258, parágrafo único, II, o nubente recebe sua Certidão de Casamento, diploma legal, balizador e contrato solene a reger seu imposto regime matrimonial de seus bens, - fundamental a sua vida econômica - cuja cláusula única esclarece e impõe ter sido seu casamento:
Efetuado pelo Regime: Separação de bens, ex vi, artigo 258, § único. nº II do Código Civil ***.
Ou, explicitando todo este texto, com o texto do artigo:
“artigo 258: Não havendo convenção, ou sendo nula, vigorará, quanto aos bens entre os cônjuges, o regime de comunhão parcial.”
Parágrafo único: “É, porém, obrigatório o da separação de bens do casamento:
...
II – do maior de 60 (sessenta) anos e da maior de 50 (cinqüenta) anos.”
Portanto, seguindo a lei, a própria Certidão de Casamento – e não poderia ser diferente - transcreve aos nubentes o regime adotado ou imposto, este último um “capitis diminutio” da separação obrigatória; regime a gerir doravante suas vidas (plenas ou não): conjugal, econômica e patrimonial com sua aderente gestão.
Inerente e intrínseca ao instrumento da Certidão de Casamento é a boa fé contratual, contrato que é, e solene – o do casamento – axial desde o direito romano, e cuja celebração, diante de um oficial de justiça, exige, como em qualquer singelo contrato, que suas cláusulas fundamentais sejam ampla e exaustivamente conhecidas e transcritas, em benefício dos contraentes ou contratantes - os nubentes -, bem como de sua futura família e da sociedade, contrato matrimonial necessário para assegurar a adequada segurança jurídica. O Capítulo VI do Livro do Direito da Família relaciona as solenidades requeridas para a celebração do casamento, notadamente os art. 1.534, e depois o 1.536, VII, cujo texto diz:
Art. 1.536. “Do casamento, logo depois de celebrado, lavrar-se-á o assento no livro de registro. ... serão exarados:
...
VII – o regime do casamento, com a declaração da data e do cartório em cujas notas foi lavrada a escritura antenupcial, quando o regime não for o da comunhão parcial, ou o obrigatoriamente estabelecido.”
Portanto, “a validade do negócio jurídico requer... III forma prescrita em lei” – art. 104 do CC; e o Código, ao conceituar até mesmo um aparentemente simples contrato preliminar, diz no art. 462: “exceto quanto à forma, deve conter todos os requisitos essenciais ao contrato a ser celebrado.”
Pois eis acima, no artigo 1.536 do CC a forma prescrita em lei para o contrato do casamento.
Princípios comezinhos, ultra conhecidos, a gravitarem em torno do conceito fundamental operacionalizador da lei e viabilizador parcial de sua aplicabilidade: “Ninguém se escusa de cumprir a lei, alegando que não a conhece.” (Art. 3º da Lei de Introdução ao Código Civil)
Aliás, princípio antigo, clássico adágio latino: “Ignorantia juris non excusat” - "A ignorância da lei não é desculpa." Os romanos, espraiando-se por toda a Europa, necessitavam desta ficção jurídica para justificar a imposição de sua lei e a obrigatoriedade de seu cumprimento. Entretanto, ao tempo remoto de Moisés (1.300 AC) com sua menor comunidade, tal ficção ainda não existia: bastou-lhe exibir as tábuas da lei no Monte Sinai para que a comunidade as conhecesse, descabendo então e derivadamente, a excusa da ignorância. A comunidade viu, com seus olhos, as tábuas da lei.
Aos nubentes, os dois sistemas são empregados: exibem-se as tábuas da lei, na forma do instrumento da certidão de casamento que vão assinar, concordando ainda com o texto apresentado, recebendo cada nubente e de pronto sua cópia, conforme dispõe o art. 1.512 do CC.
Assim, o regime da separação obrigatória de bens está insculpido no instrumento contratual desta solenidade matrimonial, na transcrição do art. 258, § único, II, supracitado, acolhido na boa fé desta celebração contratual e valer agora e sempre – “hinc et nunc”.
Além desta solenidade, em que o regime de bens do casamento é trazido ao conhecimento e à concordância escrita dos nubentes, na remota hipótese de que não o tivessem lido, permaneceria ainda a presunção ou a ficção do artigo 3º da LICC, exigência ulterior ao cumprimento contratual da regência de seus bens, na mais absoluta boa-fé contratual.
Boa-fé contratual: em boa hora fundamento introduzido no novo CÓDIGO, princípio ético, segundo Miguel Reale[1]. Em seu Título V – Dos Contratos em Geral – diz o art. 422 do CC: “Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios da probidade e boa-fé.”
Mais adiante o art. 1.536 do CC dispõe o conteúdo do contrato matrimonial, exigindo que sua Certidão (de Casamento), quando da lavratura, discrimine, conforme seu item VII “– o regime do casamento, com a declaração da data e do cartório em cujas notas foi lavrada a escritura antenupcial, quando o regime não for o da comunhão parcial, ou o obrigatoriamente estabelecido.”
2. Ética e Operacionalidade do novo Código, conforme Miguel Reale[2].
A ênfase é sempre no regime que irá comprometer os nubentes, dispondo, diretamente, como será a gestão patrimonial do contrato de casamento que celebram, obedecidos aqueles sagrados princípios da probidade e da boa-fé do art. 422, ou da “ETICIDADE”, princípios éticos do novo Código Civil, a cujo respeito enfatiza MIGUEL REALE:
"Freqüente é no Projeto (do novo Código Civil) a referência à probidade e à boa-fé, assim como à correção ('corretezza') ao contrário do que ocorre no Código vigente (então o de 1916), demasiado parcimonioso nessa matéria, como se tudo pudesse ser regido por determinações de caráter estritamente jurídicas."
E REALE cita ainda como exemplos desta busca de correção os artigos 113, 187[3] e o 422[4], este último já citado ao início deste texto. E acrescenta, enfatizando o princípio da ETICIDADE:
... "Não menos relevante é a resolução de lançar mão, sempre que necessário, de cláusulas gerais, como acontece nos casos em que se exige probidade, boa-fé ou correção (corretezza) por parte do titular do direito, ou quando é impossível determinar com precisão o alcance da regra jurídica."
Se, como sublinhado anteriormente, o art. 3º da LICC é dirigido ao comum dos cidadãos, os arts. 4º e 5º dirigem-se aos meritíssimos juízes, educados e treinados, ao longo de anos, para a aplicação e interpretação da lei, em cada “caso” concreto: “omissa” a “lei... o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito.”
Aqui se está diante de outro princípio que buscou nortear a elaboração do novo Código Civil, a OPERABILIDADE, assim explicada por REALE em seu artigo mencionado:
Busca "...estabelecer soluções normativas de modo a facilitar sua interpretação e aplicação pelo operador do Direito. Nessa ordem de idéias, o primeiro cuidado foi eliminar as dúvidas que haviam persistido durante a aplicação do Código anterior."
Pois bem, em sua Introdução, o Código Civil se dirige tanto ao cidadão comum, quanto aos juízes, buscando mostrar-lhes o caminho da utópica, mas sempre perseguida justiça, contratada ou aplicada.
3. A invasão da Súmula 377 de 1964. Cláusula oculta no contrato matrimonial.
A grande mudança intentada pela Súmula 377/64[5] no regime da separação obrigatória – em duas sintéticas linhas - não foi recepcionada pelos legisladores da Lei do Divórcio de 1977 – Lei nº 6.515, que já a conheciam.
Esta Lei, em suas Disposições Transitórias e através do artigo 50 altera o antigo regime do caput do artigo 258 do CC de 1916, transformando a anterior regência da separação em comunhão parcial, em casos em que não tenha havido convenção, ou de nulidade.
Ora, quisesse, poderia o legislador de 1977 ter recepcionado a Súmula 377, - tão próxima de seu tempo histórico - alterando o então regime legal da separação obrigatória de bens para este novo e inusitado regime jurisprudencial e sumular, - o da comunicação dos aqüestos ‘pos-mortem’ -, regime que, aliás, somente hoje é admitido como regime matrimonial específico no novo Código Civil, art. 1.672, mas mediante prévia escolha:
“Art. 1.672. No regime de participação final nos aqüestos, cada cônjuge possui patrimônio próprio, consoante disposto no artigo seguinte, e lhe cabe, à época da dissolução da sociedade conjugal, direito à metade dos bens adquiridos pelo casal, a título oneroso, na constância do casamento.”
Então, como poderia o nubente suspeitar que, além da lei – transcrita em seu contrato matrimonial e a não ser ignorada, força do artigo 3º da LICC -, deveria ainda, naquele ato contratual, preocupar-se com disciplina eventualmente imposta por remota jurisprudência, aliás, área restrita do poder judicante, força dos artigos subseqüentes - 4º e 5º - da referido LICC e supratranscritos?
Aquela nova Lei do Divórcio poderia - mas não o fez – tanto abrigar o regime matrimonial proposto pela Súmula editada 7 anos antes, alterando o artigo correspondente como alterou o art. 258, quanto instruir a que o texto da Súmula fosse incluído no corpo do próprio contrato matrimonial, de modo a facilitar sua operacionalização. Poderia, por exemplo, nas mesmas Disposições Transitórias, alterar a redação da Certidão do Casamento – contrato típico – exigindo-lhe, doravante que, em suas Observações fosse melhor tipificado o regime do casamento adotado, quer para os anos de vida do casal, quer para os do cônjuge sobrevivente, abrigando assim a ruptura contratual introduzida pela Súmula. O instrumento da Certidão possui em seu verso, no campo das Observações, mais de 20 linhas que poderiam abrigar, por exemplo, a transcrição desta controversa e sintética Súmula, cuja existência – oculta - não é trazida aos nubentes quando de seu arriscado e temerário enlace sob o regime da separação obrigatória dos bens.
Temerário e arriscado: pois ambos se casam com uma cláusula oculta e não sabida: a Súmula 377 de 1964, um absoluto escândalo em legislação e prática contratuais. A este respeito, considerando-se que o regime obrigatório do casamento se assemelha a um contrato de adesão por força de lei, poder-se-ia igualmente invocar o apoio corretivo do art. 423 do atual CC, que diz:
"Art. 423 do CC: Quando houver no contrato de adesão cláusulas ambíguas ou contraditórias, dever-se-á adotar a interpretação mais favorável ao aderente.”
4. O ardil da Súmula 377/64: alteração de fundamentos contratuais introduzindo os polêmicos aqüestos.
Certamente os Ministros do Supremo Tribunal Federal que editaram aquela Súmula, não imaginaram que estavam a adulterar e a rasgar o regime matrimonial da separação obrigatória de bens na doutrina e na aplicação da lei; e mais, rasgavam o significado legal de um contrato solene. Ou, então, se a tal alteração pretendessem, deveriam complementar seu ato, remetendo-lhe ao conhecimento dos nubentes via cartorial, de modo a não lhes esconder tal dispositivo fraudulento, ardil inesperado e inadmissível na jurisprudência.
Ardil sempre invocado por advogados junto aos tribunais no arrolamento de bens do cônjuge sobrevivente no regime de separação obrigatória; ardil que retira a plena disponibilidade de seus bens, tão logo desfeita a união. Descobre o cônjuge sobrevivente que a Certidão de Casamento – seu contrato - lhe enganara e que não poderia dispor de seus bens - como ali lhe assegurara a lei - após o falecimento de seu parceiro. Dupla dor: perde seu parceiro de vida e depois perde seus bens pessoais. Se na véspera do falecimento de um deles, o sobrevivente dispunha plenamente de seus bens – ao limite de poder fazê-los desaparecer -, tal poder cessa com o simples falecimento do outro cônjuge, convocando a Súmula seus bens pessoais ao monte, sob a singela e sutil, mas não menos impactante, denominação de aqüestos, intervenção de um terceiro contratualmente interessado, o Estado, na busca de impostos.
Desgrudada a Súmula de um julgado específico de 1964, ganhou vida própria, sendo, deste então, e com o apoio da Justiça, invocada por herdeiros de olho esticado no bem alheio, à busca de um enriquecimento, sempre sem causa.
Bens mobiliários financeiros, por exemplo, se constituem em impasse para serem traduzidos em aqüestos. Aplicação financeira iniciada nos anos 70 e enfrentando hiperinflação nos 30 anos subseqüentes na casa do quatrilhão, conheceu exuberante correção monetária apenas para manter seu valor inicial. Mas agora, na interpretação da Súmula, eis aí todo um aqüesto, o da correção monetária, chamada ao monte para a partilha junto com a aplicação financeira inicial, desconsiderando-se a hiperinflação da história brasileira. Esforço comum aqui? Nem pensar.
Divorcia-se a justiça das regras econômicas, ignorando as regras do capitalismo, consubstanciadas no Constituição de 1988, e que ultrapassam conceitos anteriores provenientes de economias agrária ou urbana, quando os aqüestos eram manifestamente rendas de aluguel, da lavoura e do campo, época em que a renda mobiliária era inexpressiva, cingida quase que apenas, e para muito poucos, aos dividendos de ações. Em artigo intitulado “Capital X Trabalho na Constituição e as Opções por Mercado” publicado neste ‘site’ sublinho a opção dos constituintes pelo capitalismo. (Outra impropriedade proveniente do desconhecimento dos fatores econômicos pelos juristas, mas igualmente expressiva, - cuja revisão bate à porta - foi a absorção do Código Comercial pelo Código Civil, que analisei em artigo publicado neste ‘site’: “Novo Código Civil e o Direito da Empresa: Fascismo tardio?”)
O fato econômico da hiperinflação na casa do quatrilhão dos anos 70 a 90, altera objetivamente a concepção de aqüesto financeiro e mobiliário, a exigir contabilização exaustiva para sua atualização e adequada resposta, domínio da contabilidade e não do direito. E aquela Súmula de 1964 ainda não conhecera a explosão inflacionária das décadas seguintes.
5. Outro ardil da Súmula 377/64: um inesperado gravame sobre os bens pessoais do cônjuge supérstite no regime da separação legal dos bens.
No domínio do direito, o que se pretende ao invocar a Súmula 377/64 é dizer que o bem patrimonial de um cônjuge em contrato matrimonial regido pela separação, de livre disposição, perde esta qualidade intrínseca pela simples morte do outro cônjuge. Esta perda da disponibilidade é ônus assemelhado ao de um gravame, tornando-o bem indisponível sob a denominação de aqüesto, a ser trazido ao monte da herança, ardil da Súmula ao legítimo contrato do casamento, ato de má fé contratual de terceiro interessado, o Estado cobrador de impostos, ato radical de insegurança jurídica na esfera contratual.
A rationália jurídica que suporta à Súmula 377 avança, em última análise, sobre o bem disponível, gravando-o e transformando herdeiros do cônjuge falecido em co-proprietários deste mesmo bem, cuja plena disponibilidade pelo cônjuge sobrevivente era a regra, até a véspera do falecimento do ‘de cujus’, evento que a abole subitamente, num ato de má fé contratual deste terceiro interveniente e interessado: o Estado.
Em artigo[6] próprio sobre gravame (eis que a Súmula altera a livre disponibilidade do bem), assim se manifesta Leonardo Gomes de Aquino[7] em seu resumo:
“Resumo: Há várias situações que deixam os estudiosos perplexos diante da aparente interpretação conceitual de direito real e direito obrigacional, pois algumas situações jurídicas dispostas na lei ou imposto por contrato possuem características tanto de direito real com de direito obrigacional. Estas situações são denominadas de figuras intermediárias.”
Sublinha o Autor: “situações jurídicas dispostas na lei ou imposto por contrato”, fundamentos essenciais para gravar bens, diferente da hipótese da emergência de um gravame de origem jurisprudencial. Pois que não se perca o foco do problema: chamar bens livres ao monte sucessório, retirando-lhes a intrínseca liberdade que gozavam até o momento do falecimento de um cônjuge no regime em comento, é o estabelecimento de um gravame, ao arrepio da lei.
Ainda buscando conceituar o gravame, para pontuar como a referida Súmula também invade este campo, eis como o Autor supracitado invoca em seu artigo, definições de juristas de nomeada:
“Silvio Sálvio Venosa conceitua ônus reais “como o gravame que recai sobre uma coisa, restringindo o direito do titular de direito real” Já Carlos Roberto Gonçalves afirma que “são obrigações que limitam o uso e gozo da propriedade constituindo gravames ou direitos oponíveis erga omnes” Maria Helena Diniz afirma que os ônus reais “são obrigações que limitam a fruição e a disposição da propriedade. Representam direitos sobre coisa alheia e prevalecem erga omnes” e exemplifica como ônus reais: a servidão predial, a enfiteuse, o usufruto, o uso, a habitação, a superfície, a hipoteca, o penhor e a anticrese. ”
Não nos enganemos: a Súmula grava o bem patrimonial plenamente disponível no contrato matrimonial da separação legal de bens, retirando-lhe sua plena disponibilidade ao cônjuge sobrevivente, após o falecimento do primeiro. O contrato matrimonial perde sua característica contratual para acolher dispositivos extracontratuais, gravando-se o bem patrimonial até então disponível, com uma “cláusula de indisponibilidade”, fruto desta nefasta interpretação de um Tribunal supremo, há quase 50 anos.
Os aspectos contratuais acima assinalados devem ser acrescidos à análise do tema, além dos estudos jurídicos que gravitam em torno da “mutabilidade do regime dos bens” sob o efeito da Súmula, seminal texto[8] do jurista Francisco Cahali, ou ainda do texto do Procurador Jorge Kuranaka[9]. Ou mergulhamos mais uma vez na insegurança contratual face aos tribunais.