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Autorização ambiental de funcionamento

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25/06/2013 às 08:45
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7. AAF EM ATIVIDADES MINERÁRIAS: LAVRA ILEGAL POR NULIDADE

Dito isso, conclui-se que a AAF não pode ser entendida como instrumento, legítimo, a autorizar ambientalmente o funcionamento de atividades minerarias.

Ao definir as classes de aplicação do instituto da AAF, o estado de Minas Gerais parte da premissa, equivocada, de que todas as atividades minerarias definidas nas classes 1 e 2, não se enquadrariam na expressão “efetiva e potencialmente poluidores”, bem como não seriam capazes, sob qualquer forma, de causar “degradação ambiental”.

Ora, somente para se ter uma ideia, em Minas Gerais, é possível obter AAFs para autorizar extração de granito ornamental. A jazida é constituída de blocos e blocos retirados das mais variadas camadas da terra, gerando um grande buraco e rejeito no entorno. Como pode este empreendimento ser considerado de impacto ambiental não significativo?

Acrescente-se, a isso, o fato de que a classificação do empreendimento se baseia nas informações prestadas pelo minerador, ou seja, é o empreendedor que classifica o porte de sua atividade. O minerador preenche o Formulário de Caracterização do Empreendimento (FCE) e, a partir dele, o órgão ambiental gera o Formulário de Orientação Básica (FOB), no qual são listados os documentos necessários ao empreendedor para formalização do processo simplificado de emissão da AAF.

Ademais, se não houve vistoria prévia, como pode o Estado garantir que o local do empreendimento não se encontra em Área de Preservação Permanente, por exemplo? Por que o minerador assim o garantiu?

Corroborando os motivos para não aceitarmos a AAF para atividades minerarias, mais uma vez, citamos informações colhidas no trabalho de Viana (2007):

Outra prática corriqueiramente observada nos últimos anos, embora não admitida oficialmente, é o falseamento da declaração, por parte do empreendedor, das corretas dimensões do empreendimento, com o objetivo de que ele seja enquadrado em classe inferior à real, portanto com menores exigências, se possível encaixando-se no âmbito da AAF e livrando-se do processo de licenciamento ambiental. Virou motivo de zombaria, por exemplo, o fato de uma conhecida mineradora ter procurado ampliar uma das maiores minas do estado mediante o requerimento de 19 AAFs em áreas contíguas, com o deliberado objetivo de burlar as normas vigentes, o que foi denegado pelo órgão ambiental.

(...)

Outro exemplo de tentativa de burla à legislação, à qual o órgão ambiental também deve estar atento, é a declaração por parte da empresa de que “só haverá lavra”, ou seja, de que não será implantada unidade de beneficiamento, o que levaria o empreendimento ao enquadramento numa classe inferior. Acontece que o beneficiamento por vezes é efetuado em outro local, o que, é evidente, também deve ser considerado para a classificação do empreendimento.

Álvaro Luiz Valery Mirra (2008) ensina:

Assim, o que se conclui é que as normas federais que disciplinam o estudo de impacto ambiental – Lei 6938/1981, Decreto n. 99.274/1990 e Resolução CONAMA 001/1986 do CONAMA – são, efetivamente, em sua integralidade e em todos os seus aspectos, normas gerais e, por se mostrarem compatíveis com a previsão constitucional do art. 24, § 1º. da Constituição de 1988, não podem ser contrariadas pelas normas dos Estados e Municípios para o fim de reduzir o grau de proteção do meio ambiente.

Desta feita, tendo as Resoluções CONAMA 01/86, 09/90 10/90 e 237/97 exigido, expressamente o licenciamento ambiental clássico, não pode Estado de Minas Gerais se afastar do comando.

Afinal, o Princípio da Legalidade[45] se impõe aos atos administrativos. Se a norma federal impõe a realização de Avaliação e/ou Estudo Prévio de Impactos Ambientais, não é lícito ao Poder Público Estadual ou Municipal, direta ou indiretamente, dispensá-los.

Exigir ou não a Licença Ambiental às atividades minerárias, longe de ser mera faculdade do administrador, constitui dever inafastável[46] para regularização ambiental das atividades modificadoras do meio ambiente.

Assim, a DN COPAM 74 não deve ser entendida como válida. Afinal, considerando que a Administração Pública deverá ficar restrita aos limites da lei, rigorosamente atrelada ao princípio da legalidade, um ato administrativo normativo contrário à lei não terá validade[47].   

Ademais disso, em verdade, a inconstitucionalidade de tal diploma transparece evidente, sendo de se destacar que sobre matéria símile já decidiu o Supremo Tribunal Federal:

CONSTITUCIONAL. MEIO AMBIENTE. ESTUDO DE IMPACTO AMBIENTAL. EIA. CF art. 225, § 1º, IV. Cabe ao Poder Público exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo de impacto ambiental, a que se dará publicidade. Considerando-se a importância do EIA como poderoso instrumento preventivo ao dano ecológico e a consagração, pelo constituinte, da preservação do meio ambiente como valor e princípio, conclui-se que a competência conferida ao Município para legislar em relação a esse valor só será legítima se, no exercício dessa prerrogativa,esse ente estabelecer normas capazes de aperfeiçoar a proteção à ecologia,nunca, de flexibilizá-la ou abrandá-la. (STF AgRg no RE 396.541-7 – RS – Rel. Min. Carlos Veloso. J. 14.06.2005.

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. ARTIGO 182, § 3º, DA CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DE SANTA CATARINA. ESTUDO DE IMPACTO AMBIENTAL. CONTRAIEDADE AO ARTIGO 225, § 1º, IV, DA CARTA DAREPÚBLICA. A norma impugnada, ao dispensar a elaboraçã de estudoprévio de impacto ambiental no caso de áreas de florestamento oureflorestamento para fins empresariais, cria exceção incompatível com odisposto no mencionado inciso IV do § 1º do artigo 225 da ConstituiçãoFederal. Ação julgada procedente, para declarar a inconstitucionalidade dodispositivo constitucional catarinense sob enfoque. (STF - ADI 1086 / SC -SANTA CATARINA - Rel. Min. ILMAR GALVÃO. J. 10/08/2001).

Com efeito, urge a propositura de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade, em face do art. 2º da DN COPAM 74, com pedido de exclusão do anexo, não somente da extração de ferro[48], mas de todas às atividades minerarias.

Destarte, não se entende como legítima a exigência de, somente, AAF para regularização de atividades minerarias, pelo que o Ato Administrativo que concedeu o título de lavra, seja a Guia Utilização ou a Portaria de Lavra, deve, via de consequência, ser entendido como nulo.

É que, na exata determinação dos artigos 3º e 16 da Lei nº 7.805/89, o Licenciamento Ambiental prévio é elemento essencial do ato administrativo de concessão de lavra. Com efeito, não há no ato, deferimento do título de lavra, o pressuposto de validade, qual seja, a licença ambiental prévia. Assim, nulo deve ser entendido o ato que expediu a Guia de Utilização e/ou a Portaria de lavra.

É que, de acordo com a melhor doutrina administrativista, o ato administrativo deve ser compreendido, a partir de toda emanação unilateral de vontade, juízo ou conhecimento, predisposta à produção de efeitos jurídicos, expedida pelo Estado, no exercício de suas prerrogativas e como parte interessada numa relação, estabelecida na conformidade ou na compatibilidade da lei, sob o fundamento de cumprir as finalidades assinaladas no sistema normativo (GASPARINI, 2004).

Presentes os elementos indispensáveis à formação dos atos administrativos e estando plenamente ajustados às exigências legais, temos o ato perfeito e válido. O ato administrativo perfeito e válido é aquele que reúne elementos essenciais para a sua formação, tem que possuir todos os elementos que a lei exige, e desta maneira se aperfeiçoa e passa a existir no mundo jurídico.

CARVALHO FILHO, 2009, afirma que para o ato administrativo ser considerado válido ele deve ser legal, deve observar os requisitos de validade para que possa produzir normalmente seus efeitos. E que sem eles o ato não poderia ter a eficácia desejada pela administração, sendo, portanto, um ato nulo[49].

Com efeito, não sendo a Autorização Ambiental de Funcionamento um Licenciamento Ambiental e, ainda, devido á inexistência de estudos de impactos, não sendo, inclusive, um instrumento constitucional para os fins de regularizar atividades ambientais, entendemos que não foi cumprido pressuposto de validade do ato administrativo de expedição do título de lavra.

Desta feita, devido à nulidade latente do Título de Lavra deferido mediante apresentação de AAFs, existe doutrina[50], suficiente, a respaldar como ilegais as lavras decorrentes do ato nulo. Há quem diga, inclusive, que são inexistentes estes atos administrativos, quais sejam, os títulos de lavra.

Entretanto, a bem da razoabilidade, como em Minas Gerais foram expedidos centenas ou milhares de AAFs, para os fins de não causar um caos econômico no setor, a nulidade deverá ser declarada. Para tanto, urge ao DNPM publicar ato com este fim, chamando os feitos a ordem, e exigindo a regularização ambiental legítima.

Pode-se, também, ser declarada a nulidade do título de lavra mediante procedimentos judiciais, propostos por, por exemplo, Ministério Público Federal, Ibama, União ou qualquer pessoa prejudicada pela lavra ilegal.

Nesta linha, as lavras amparadas com títulos precedidos de AAFs, podem e devem ser entendidas[51], judicialmente ou mediante declaração de nulidade da autarquia, como lavras ilegais, por nulidade do título de lavra expedido.


8. CONCLUSÃO

Finalizando este trabalhão, é clarividente que os recursos naturais são extremamente utilizados pelos atores do modelo industrial capitalista, que depende, sobremaneira, da utilização de produtos oriundos da mineração.

Entretanto, sob o viés de uma cidadania ativista, concluímos pela necessidade de se exigir o bom desenvolvimento das atividades minerarias. A significar que se faz mister o crescimento do setor aliado à justiça ambiental.

É que, em verdade, praticamente toda atividade minerária é potencialmente poluidora, sendo frequente a ocorrência de modificações significativas na qualidade do solo e na topografia da superfície local, bem como a deposição de rejeitos sobre a vegetação. Logo impactos ambientais são inerentes a sua existência, o que exige, do Poder Público, uma legislação eficiente e uma fiscalização rigorosa, objetivando fazer cumprir os regramentos balizadores da proteção do meio ambiente.

Nesta linha, existe amplo normativo federal, com fundamento constitucional, que define como necessários os estudos de impacto ambiental para atividades potencialmente poluidoras. Entretanto, a DN COPAM 74/2004 possibilita o funcionamento, com base em mera AAF, de uma série de atividades para as quais a normatização federal exige, expressamente, a elaboração de EIA/RIMA e a sujeição ao processo de licenciamento ambiental clássico.

A AAF objetivaria, assim, regularizar, ambientalmente, empreendimentos cujos portes impliquem em impactos não significativos, ao ponto de exigirem a condução, pelo Estado, do já citado processo de tripartição das licenças.

A filosofia, equivocada, de atuação em Minas Gerais é conceder uma autorização, com base em análise de documentos administrativos e declaração de compromisso do empreendedor e do responsável técnico quanto à adequação ambiental da sua atividade. Não são realizadas, previamente, vistoria e, muito menos, uma avaliação ambiental, tampouco são estabelecidas condicionantes, efetuando-se, em tese, somente fiscalizações a posteriori, para a verificação da conformidade legal da atividade.

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A normatização estadual deve ser revista. Urge a adequação da DN 74/2004 ao princípio da prevenção e sua compatibilização com as normativas federais sobre a matéria são, sem dúvida, medidas essenciais e impostergáveis para a correção e reparação desses sérios equívocos.

Entrementes, devem, também, serem declarados nulos os títulos de lavra expedidos mediante apresentação de AAFs, uma vez que não foi cumprindo requisito essencial do ato, qual seja, a apresentação da Licença Ambiental.

Afinal, a realidade de produção sem sustentabilidade das mineradoras não deve balizar a atuação dos órgãos competentes. Somente a fiscalização eficiente e o incremento de ações judiciais impulsionarão a busca pelo cumprimento da legislação e escolha por tecnologias desenvolvidas, que respeitem o meio ambiente e o patrimônio público.


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Sobre a autora
Valkiria Silva Santos Martins

Advogada da União. Integrante do Grupo Permanente de Combate a Corrupção. Pós Graduanda em Advocacia Pública pelo IDDE em parceria com o Centro de Direitos Humanos da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra. Especializada em Direito Civil e Processual Civil pela UNICOC e em Direito Público pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Graduada em Direito pela Fundação Educacional Monsenhor Messias.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MARTINS, Valkiria Silva Santos. Autorização ambiental de funcionamento. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3646, 25 jun. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/24774. Acesso em: 22 nov. 2024.

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