Artigo Destaque dos editores

A prescrição no procedimento administrativo ambiental

Exibindo página 2 de 2
11/07/2013 às 15:25
Leia nesta página:

5.A IMPRESCRITIBILIDADE DO DEVER DE REPARAR O DANO AMBIENTAL.

A obrigação de reparar o dano ambiental, ao contrário do que ocorre com as sanções pecuniárias, não é alcançada pela incidência da prescrição no procedimento administrativo ambiental. É a regra disposta no § 4º do artigo 21 do Decreto nº 6.514/2008:

Art. 21.

§ 4º  A prescrição da pretensão punitiva da administração não elide a obrigação de reparar o dano ambiental.

A independência das obrigações nascidas de conduta contrária à legislação ambiental encontra fundamento no texto constitucional, que assim dispõe:

Art. 225.

§ 3º. As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar danos ambientais.

O Superior Tribunal de Justiça, ao julgar o REsp1.120.117-AC, manifestou-se no sentido de reconhecer a imprescritibilidade do direito à reparação do dano ambiental, posto que se trata de direito inerente à vida, fundamental e essencial à afirmação dos povos:

ADMINISTRATIVO E PROCESSO CIVIL - DIREITO AMBIENTAL - AÇÃO CIVIL PÚBLICA – COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL – IMPRESCRITIBILIDADE DA REPARAÇÃO DO DANO AMBIENTAL – PEDIDO GENÉRICO – ARBITRAMENTO DO QUANTUM DEBEATUR NA SENTENÇA: REVISÃO, POSSIBILIDADE - SÚMULAS 284/STF E 7/STJ.

1.É da competência da Justiça Federal o processo e julgamento de Ação Civil Pública visando indenizar a comunidade indígena Ashaninka-Kampa do rio Amônia.

2. Segundo a jurisprudência do STJ e STF trata-se de competência territorial e funcional, eis que o dano ambiental não integra apenas o foro estadual da Comarca local, sendo bem mais abrangente espraiando-se por todo o território do Estado, dentro da esfera de competência do Juiz Federal.

3. Reparação pelos danos materiais e morais, consubstanciados na extração ilegal de madeira da área indígena.

4. O dano ambiental além de atingir de imediato o bem jurídico que lhe está próximo, a comunidade indígena, também atinge a todos os integrantes do Estado, espraiando-se para toda a comunidade local, não indígena e para futuras gerações pela irreversibilidade do mal ocasionado.

5. Tratando-se de direito difuso, a reparação civil assume grande amplitude, com profundas implicações na espécie de responsabilidade do degradador que é objetiva, fundada no simples risco ou no simples fato da atividade danosa, independentemente da culpa do agente causador do dano.

6. O direito ao pedido de reparação de danos ambientais, dentro da logicidade hermenêutica, está protegido pelo manto da imprescritibilidade, por se tratar de direito inerente à vida, fundamental e essencial à afirmação dos povos, independentemente de não estar expresso em texto legal.

7. Em matéria de prescrição cumpre distinguir qual o bem jurídico tutelado: se eminentemente privado seguem-se os prazos normais das ações indenizatórias; se o bem jurídico é indisponível, fundamental, antecedendo a todos os demais direitos, pois sem ele não há vida, nem saúde, nem trabalho, nem lazer, considera-se imprescritível o direito à reparação.

8. O dano ambiental inclui-se dentre os direitos indisponíveis e como tal está dentre os poucos acobertados pelo manto da imprescritibilidade a ação que visa reparar o dano ambiental.

9. Quando o pedido é genérico, pode o magistrado determinar, desde já, o montante da reparação, havendo elementos suficientes nos autos. Precedentes do STJ.

10. Inviável, no presente recurso especial modificar o entendimento adotado pela instância ordinária, no que tange aos valores arbitrados a título de indenização, por incidência das Súmulas 284/STF e 7/STJ.

11. Recurso especial parcialmente conhecido e não provido[11]. (grifo nosso).


CONCLUSÕES.

O procedimento administrativo ambiental é composto por duas fases distintas: a primeira, que podemos denominar de fase constitutiva, na qual haverá a lavratura do auto de infração e a consequente abertura do procedimento administrativo ambiental, finalizando-se com o julgamento no sentido da homologação ou não do auto de infração e seu transito em julgado (coisa julgada administrativa). E uma segunda fase, que podemos denominar de fase executória.

Na primeira fase, teremos a possibilidade da incidência da prescrição da pretensão punitiva e da prescrição intercorrente. A prescrição da pretensão punitiva decorre do escoamento do prazo de cinco anos, este contado da data da prática do fato ou da cessação da conduta ilícita, o que acaba por retirar da Administração Pública o poder de impor sanções às condutas indesejadas.

A prescrição intercorrente, por sua vez, poderá se dar no curso do procedimento administrativo e decorre unicamente da inércia da Administração Pública em promover atos necessários ao deslinde da causa. A paralisação injustificada do processo por mais de três anos ensejará o reconhecimento de ofício da prescrição intercorrente e demandará a apuração da responsabilidade funcional.

A fase executória do procedimento administrativo diz respeito aos atos necessários à tomada de medidas administrativas tendentes à satisfação do débito imposto na decisão final administrativa, já transitada em julgado, e não satisfeita voluntariamente pelo interessado. A Administração Pública deverá no prazo de cinco anos, a contar da data da constituição definitiva do crédito não tributário, promover as medidas necessárias à satisfação do débito, estando inclusive autorizado a promover a inscrição do nome do infrator no CADINe na dívida ativa.

Por fim, o dever de reparar o dano ambiental não será prejudicado pelo reconhecimento da ocorrência da prescrição no âmbito administrativo, pois, segundo entendimento do Superior Tribunal de Justiça, o direito constitucionalmente assegurado a um meio ambiente ecologicamente equilibrado (art. 225) é imanente ao direito à vida, e, portanto, indisponível e protegido sob o manto da imprescritibilidade.


REFERÊNCIAS.

CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo/José dos Santos Carvalho Filho. São Paulo:Atlas, 2013.

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. São Paulo: Atlas, 2010.

FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de Direito Ambiental Brasileiro. São Paulo: Ed. Saraiva, 2012.

MACHADO, Paulo Affonso Leme Machado.Direito Ambiental Brasileiro. São Paulo: Ed. Malheiros, 2009.

Assine a nossa newsletter! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos

MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. São Paulo: Editora Malheiros, 2005.

MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente: A gestão ambiental em foco. Doutrina. Jurisprudência.Glossário.São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011.

SIRVINSKAS, Luís Paulo. Manual de Direito Ambiental. São Paulo: Editora Saraiva, 2011.

TRENNEPOHL, Curt. Infrações contra o meio ambiente: multas, sanções e processo administrativo: comentários ao Decreto nº 6.514, de 22 de julho de 2008. Belo Horizonte: Fórum, 2009.

VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: parte geral/Sílvio de Salvo Venosa. Coleção de direito civil; v.1. São Paulo: Atlas, 2003.


Notas

[1]MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. p.662.

[2]VENOSA, Direito Civil: parte geral.p. 642.

[3] CUNHA, Leonardo José Carneiro. A Fazenda Pública em juízo. p.71.

[4] MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente: A gestão ambiental em foco. Doutrina. Jurisprudência. Glossário. p. 1233.

[5]TRENNEPOHL, Curt. Infrações contra o meio ambiente: multas, sanções e processo administrativo: comentários ao Decreto nº 6.514, de 22 de julho de 2008, p.139.

[6]CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo, p.977.

[7] CARVALHO FILHO, José dos Santos. Op. cit.

[8]MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. p.664.

[9]REsp 623023/RJ, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 03/11/2005, DJ 14/11/2005, p. 251

[10]REsp 1115078/RS, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 24/03/2010, DJe 06/04/2010

[11]REsp 1120117/AC, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 10/11/2009, DJe 19/11/2009.


Abstract:This work studies the incidence of prescribing in environmental administrative procedure.

Keywords:Prescription. Types. Environmental administrative procedure.

Assuntos relacionados
Sobre a autora
Helena Marie Fish Galiano

Procuradora Federal. Chefe da Procuradoria Federal especializada junto ao IBAMA no estado de Roraima. Bacharel em Direito pela Universidade Federal do Amazonas

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

GALIANO, Helena Marie Fish. A prescrição no procedimento administrativo ambiental. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3662, 11 jul. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/24929. Acesso em: 22 dez. 2024.

Leia seus artigos favoritos sem distrações, em qualquer lugar e como quiser

Assine o JusPlus e tenha recursos exclusivos

  • Baixe arquivos PDF: imprima ou leia depois
  • Navegue sem anúncios: concentre-se mais
  • Esteja na frente: descubra novas ferramentas
Economize 17%
Logo JusPlus
JusPlus
de R$
29,50
por

R$ 2,95

No primeiro mês

Cobrança mensal, cancele quando quiser
Assinar
Já é assinante? Faça login
Publique seus artigos Compartilhe conhecimento e ganhe reconhecimento. É fácil e rápido!
Colabore
Publique seus artigos
Fique sempre informado! Seja o primeiro a receber nossas novidades exclusivas e recentes diretamente em sua caixa de entrada.
Publique seus artigos