Trata-se de texto abordando a específica problemática do recrutamento de Médicos com o fim de suprir sua carência (ou escassez) nos interiores do Brasil (Programa “Mais Médicos”) e nas regiões prioritárias do SUS (Medida Provisória-MP n. 621 de 08/07/2013 e a Exposição de Motivos do Projeto desta MP). Há uma abordagem comparativa sobre o tratamento do Governo conferido à carreira médica nacional e à Defensoria Pública.
Pretendo, superficialmente, abordar o lado político da solução eleita, sem adentrar no mérito jurídico, constitucional e legal dos atos normativos dos quais emanaram a decisão presidencial e a dos respectivos Ministros, deixando a abordagem para os juristas constitucionalistas e humanistas (Direito Constitucional, Direitos Humanos e Internacional).
Acredito que toda medida governamental com espetacularidade numérica e com tratamento simplista de tema complexo atrelado à vida humana, desvinculada de aparato administrativo e organizacional que dê suporte à escolha e sem planejamento público eficiente e duradouro, nada mais é que falácia política, estratégia partidária ou eleitoreira.
A estratégia de alocação de recursos humanos médicos em locais cujo atendimento seja considerado deficitário, insuficiente ou inexistente, pode transparecer a falsa sensação de cobertura sanitária e de efetivação estatal da política pública social de saúde (artigos 196 a 200 da Constituição da República – CRFB).
Para o distante interiorano, o pobre e o desassistido pelo Estado (para muitos dos quais qualquer tentativa de melhora no serviço público, independentemente do meio eleito, é motivo de aplausos, não se enxergando a sombra por trás dos panos), a escolha é solidária, atenciosa e ampara seus reclamos e suas necessidades básicas.
Como intitulei, trata-se de “discurso engana-pobre”, artimanha “politiqueira” (lado negativo da governança política) que atrai popularidade e ganho votos em campanhas eleitorais, em nada pondo um ponto final na discussão de determinada política pública social e dos acessórios da mesma órbita pública (limitação orçamentária e a “reserva do possível”; direito a um mínimo existencial; apropriação e malversação de verba pública; repasse indevido de recursos públicos e programas governamentais; desvio de finalidades administrativas; crimes contra a Administração Pública por agentes públicos do alto escalão; acesso a cargo e emprego público por meio de concurso público, salvante contratação por tempo determinado para atender a necessidade temporária de excepcional de interesse público etc.).
Ora, é mais fácil atender às reivindicações da categoria médica nacional (conferindo-lhe: plano de cargos, carreira e salários; remuneração digna e proporcional às exigências da profissão, do conhecimento científico e da sensibilidade humana, afastado o discurso de que a alta remuneração não contempla a realidade social majoritária; estruturação administrativa, com os equipamentos médicos e farmacêuticos necessários ao exercício íntegro e pleno da função) ou atrair (“recrutar”) profissionais do exterior (“médicos participantes intercambistas” – art. 7.º, § 2.°, inc. I, da MP n. 621), doando-lhes remuneração, impondo as deficitárias condições estruturais e sem permitir, em contrapartida, exigências por melhorias, pena de perda da oportunidade e da vaga de trabalho?
A medida dribla a carreira médica nacional, afastando o foco das discussões acerca das condições de trabalho dos Médicos e da remuneração justa à nobreza da função, dando ares de solução parcial, ainda que com a obviedade do paliativo da estratégia.
É natural que esta não visa solucionar definitivamente a dificuldade de interiorização dos Médicos e da universalização do acesso da população carente à medicina básica (Atenção Básica à Saúde). Trata-se de “instrumento emergencial”. Mas... Esta necessidade urgente surgiu agora? Ela não é histórica e marcante internacionalmente, de acordo com os próprios dados apontados na Exposição de Motivos do Projeto da MP (n. 621/2013)? Por que uma solução emergente, quando a negociação com a carreira médica e o devido emprego dos recursos e repasses públicos poderiam ter atenuado (não disse resolvido) a falta de acesso justo à saúde pública (SUS)?
O ingresso na área pública e o exercício do cargo foram dispensados de concurso público (art. 37, inc. II, da CRFB-Constituição)? Do Revalida (Exame Nacional de Revalidação de Diplomas), para médicos com formação no estrangeiro (art. 48, § 2.°, da Lei n. 9.394/96 – Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB c/c art. 10 da aludida MP)? Serão submetidos a um “Processo de Acolhimento e Avaliação” a ser desenvolvido pelos Ministérios da Saúde e da Educação (exposição de motivos da MP)?
Até mesmo os Gestores Municipais quando forem admitir agentes comunitários de saúde e agentes de combate às endemias terão de elaborar um Processo Seletivo Público (art. 198, § 4.°, CRFB c/c art. 9.° da Lei n. 11.350/06), mais simplificado que um Concurso Público, mas não dispensando uma exigência mínima que supera a formação médica acadêmica e a mera presunção de conhecimento científico e humano necessários ao exercício da divina arte de curar e tratar vidas humanas.
A saúde tem previsão constitucional expressa (art. 196, CRFB), como mandamento, como direito fundamental de cumprimento obrigatório e forçoso pelo Administrador Público.
Segundo o STJ (Superior Tribunal de Justiça), Tribunal Superior responsável pela uniformização de entendimento acerca da interpretação da lei federal comum, no julgamento do RMS n. 24.197/PR, T1, DJe 24/08/2010, “a Constituição não é ornamental, não se resume a um museu de princípios, não é meramente um ideário; reclama efetividade real de suas normas” (p. ex., educação, saúde, transporte, segurança pública, acesso às Instituições Públicas do Sistema de Justiça – Judiciário, Defensoria Pública, Ministério Público –, cidadania, previdência e assistência social, meio ambiente do trabalho etc.). E o direito à saúde está sendo efetivado?
A efetivação (na sua completude) deste direito, para que ele possa alcançar, sobretudo, pessoas em situação de hipervulnerabilidade social e econômica e vivendo em extrema pobreza nos mais distantes locais do país, perpassa tanto pela valorização da carreira médica, quanto pela estruturação adequada ao exercício da medicina, disponibilizando equipamentos científicos e tecnológicos avançados.
No concernente à valorização, refiro-me à remuneração devidamente legislada e regulamentada, seja em forma de vencimentos, seja em forma de subsídio (como indicação legislativa), já que a valorização do Médico é ontológica, está arraigada na essência da nobre função do profissional, não precisando de reconhecimento social e descoberta de sua utilidade pública.
Nas condições remuneratórias públicas ofertadas atualmente, Médicos acumulam ilegalmente funções públicas remuneradas, com incompatibilidade de horários (art. 37, incs. XVI, “c”, e XVII, da CRFB), recusam-se a trabalhar nos interiores do Estado, onde a remuneração seria relativamente a mesma da metrópole e sem as condições de trabalho suficientes e com boa qualidade de vida, lazer e perspectiva de promoção para centros urbanos mais desenvolvidos. A supremacia do interesse público fica afastada pelo interesse privado do profissional.
Naturalmente que não significa justificativa jurídica, moral e social, mas a situação de alguma maneira é compreendida como forma de contornar o menoscabo do Estado/Governo em conferir o tratamento adequado, com carreira apropriada, na qual um Médico ingresse no cargo com alto salário, oportunizando-lhe remoção/promoção com o passar dos anos até chegar ao local desejado, permitindo que todos os interiores sempre estejam acobertados pelos agentes da saúde.
O que mais preocupa o serviço público de saúde é a estruturação administrativa digna, eficiente e completa, instrumentalizando os meios para seu exercício. O maior défice estatal encontra-se no aparelhamento de hospitais e demais unidades de saúde, pois a maior preocupação de nosso Estado Democrático e Social de Direito não é com a invasão estatal na esfera privada dos indivíduos, mas com a permanência da inércia, da omissão e da desídia na efetivação dos direitos sociais, mormente os mais básicos e ululantes (art. 6.° da CRFB).
O Governo finge que o aparelhamento é suficiente, tomando medidas paliativas, de curta durabilidade. O Médico é obrigado a trabalhar com as condições lhe entregues, correndo o risco de cometer falhas irreversíveis, cuja causa naturalmente vem do Estado, mas para a vítima e seus familiares o primeiro causador da lesão é o agente, irrelevando as condições estruturais com as quais teve ele de trabalhar. A população continua à mercê da boa gestão política, da boa governança que bem aplique as verbas públicas e saiba negociar com os reais instrumentos de promoção e efetivação da saúde pública: os Médicos e demais carreiras da saúde (dentistas, psicólogos, enfermeiros etc.).
Quanto à estruturação administrativa como um todo, basta observar os atendimentos na Defensoria Pública dos Estados e da União (DPEs e DPU): assistidos reclamando por medicamentos de fornecimento obrigatório, tratamentos fora do domicílio (TFD), ausência de vagas em leitos de UTI, falta de instrumentos para tratamentos específicos e de alta complexidade etc.
Como consequência existem Núcleos de Defesa da Saúde nas Defensorias Públicas e Promotorias Especializadas nos Ministérios Públicos. A proposta atual é que se criem Varas Especializadas da Saúde no Poder Judiciário ou mesmo uma Vara da Fazenda Pública com este enfoque, dado o número elevado de pedidos judiciários contra a Administração Pública para atendimento da saúde de maneira integral (judicialização da saúde pública). Notícia relativa ao CNJ (Conselho Nacional de Justiça) criar um resolução ou recomendação aos Tribunais para criarem Varas Especializadas em: http://www.conjur.com.br/2013-mai-29/cnj-suspende-votacao-criacao-varas-especializadas-saude.
Não assevero que a solução presidencial eleita é, de todo, errônea. Há busca da finalidade social e de atendimento emergencial? Sim. Há necessidade de mais Médicos no país, principalmente nos locais de difícil acesso aos serviços públicos regulares, com índice de desenvolvimento humano (IDH) baixo e situação de vulnerabilidade socioeconômica? Sim!
Por que o foco nos Médicos e não nos demais segmentos da saúde? Na própria EMI n. 00024/2013 – MS/MEC/MP (exposição de motivos da MP n. 621: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2013/Mpv/mpv621.htm - Link: “Exposição de Motivos”) ficou pontuado que “em estudo do Sistema de Indicadores de Percepção Social, realizado pelo Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (IPEA), em 2011, 58,1% dos 2.773 entrevistados disseram que a falta de médicos é o principal problema do SUS. No mesmo estudo, a resposta mais frequente como sugestão de melhoria para o sistema de saúde foi de aumentar o número de médicos.”
O Médico é a porta de entrada e de saída na saúde. Não é único instrumento de promoção desta e de prevenção de enfermidades e de outros agravos, claro, mas sua essencialidade básica é indiscutível. O Ministério da Saúde (MS) entende que a Atenção Básica à Saúde é a porta de entrada prioritária do SUS, por isso sustenta na mesma EMI n. 00024/2013 que “a atenção básica bem estruturada possibilita a resolução de até 85% dos problemas de saúde, contribuindo assim para ordenar as Redes de Atenção à Saúde – RAS e organizar a demanda para outros serviços, tais como os de urgência e emergência.”
Qual o fundamento inicial do recrutamento de Médicos do estrangeiro para os interiores do Brasil? Foi apontada uma proporção ideal Médico/Habitante e o lento crescimento do número de Médicos no país, na forma como se espera regularmente (graduação com internato, residência/especialização, 2.° ciclo da MP n. 621/13 a partir de 1.°/01/2015 e inserção no mercado de trabalho ou investidura no cargo ou função pública).
De acordo com dados do CFM/2012 (Conselho Federal de Medicina) e do IBGE/2012 (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), o MS apontou que, para se atingir um número ideal de médicos por habitantes, seriam necessários mais de 169 (cento e sessenta e nove) mil deles. Mas com a taxa de crescimento atual dos profissionais, a meta só seria alcançada em 2035.
Não estou contrariando os argumentos até então apresentados, de que fundamentalmente há tom falacioso na medida, com estratégias meramente paliativas. O maior perigo é reafirmarmos que no Brasil toda exceção se torna regra e que todo paliativo pode se perenizar, consolidando-se no tempo, com o risco de a “Teoria do Fato Consumado” acabar por abarcá-la, dando segurança jurídica a uma situação inicialmente temporária e/ou ilegal.
Acontece que do ponto de vista do Governo há lucidez nos argumentos de carência dos Médicos e da necessidade temporária de uma medida emergencial para cobertura sanitária da população marginalizada e desamparada pelos serviços do SUS.
Acredito que, para a legalidade e a constitucionalidade da medida, as soluções de longo prazo sejam prontamente apresentadas com transparência, eficiência e economicidade. Que solução? Negociação com a carreira médica nacional e oferta dos instrumentos e equipamentos necessários ao exercício legítimo da profissão e da função pública, evitando evasão nos interiores do Estado, acumulação ilícita de cargos e empregos públicos e outras irregularidades prejudiciais ao interesse público e social. Se esta solução não for propalada, evidente estará a tentativa simbólica de resolver o problema da escassez dos Médicos nos recantos do país.
Interessante que o Governo sempre se manifesta preocupado com a massa populacional humilde, desprovida de recursos financeiros e de acesso à Justiça Social (os famigerados pobres e em situação de vulnerabilidade socioeconômica).
Conhece o Agente Público responsável por proteger e buscar soluções para todos os problemas sociais e jurídicos relativos a esses grupos sociais vulneráveis, incluindo a saúde e demais políticas públicas sociais? O Defensor Público. Ele está presente em todas as Comarcas do Brasil, auxiliando quem mais precisa de acesso à Justiça e de uma Instituição (Defensoria Pública) que solucione ou busque soluções para as omissões estatais na prestação dos serviços públicos? Digo abaixo.
Trago um comparativo da carreira médica com uma carreira jurídica pública, a dos membros da Defensoria Pública (Defensores Públicos: estaduais, federais ou distritais). Não falei Advogados, muito menos Advogados Públicos, para os que imaginam que todo aquele formado em Direito é Advogado, e não Bacharel em Direito, e para outros que discursam que exercer Advocacia é exclusividade de Advogados. Esclarecimentos pormenorizados e técnico-jurídicos no meu Artigo publicado no JusNavigandi: http://jus.com.br/revista/texto/23468/defensor-publico-nao-exerce-advocacia-publica.
Para quem não conhece bem, a Defensoria Pública (dos Estados, do Distrito Federal ou da União – DPEs, DPDF e DPU) é uma Instituição Pública, Autônoma (desvinculada do conceito de “Poderes”, principalmente do Executivo), Democrática, integrante do Sistema de Justiça, composto este pelo Ministério Público, pela Defensoria (Pública), pelo Poder Judiciário, pela Advocacia e pela Advocacia Pública, nos termos expressos da Constituição do Brasil (arts. 127-135, da CRFB c/c PECs n. 247/2013 e 487/2005).
Sua missão constitucional é atuar na defesa e na proteção, individual e coletivamente, judicial e extrajudicialmente, dos vulneráveis socioeconômicos (sobretudo dos pobres cuja renda mensal não supere três salários-mínimos, como balizamento inicial, sem análise concreta das circunstâncias fáticas trazidas pelo Assistido, isto é, pelo usuário dos serviços da Defensoria), prestando-lhe orientação e assistência jurídica integral e gratuita em nome do Estado (arts. 134 e 5.°, inc. LXXIV, da CRFB c/c 1.° e 4.°, § 5.°, da LC n. 80/94 – LONDP – Lei Orgânica Nacional da Defensoria Pública).
Suas atribuições perpassam por todos os setores da vida em sociedade, indo da saúde, educação, moradia, cidadania, transporte, família, seguridade social, chegando até o sistema prisional e penitenciário e os fatores criminológicos ligados à criminalidade moderna (uso de drogas e substâncias entorpecentes, violência doméstica e familiar, hiperpobreza, marginalização, falta de educação e acesso aos direitos fundamentais sociais básicos desde a infância até o início da vida adulta etc.).
Para esclarecimentos sobre a Instituição e suas atribuições, indico meu Artigo publicado em http://jus.com.br/revista/texto/22066/defensoria-publica-na-concretizacao-de-politicas-publicas.
Qual o comparativo que pretendo fazer depois desta abordagem conceitual?
Não há atualmente Defensor Público em todas as Comarcas e Seções Judiciárias do país para amparar as diversas demandas da população, mormente daquela em situação de vulnerabilidade social e econômica, por isso a criação da PEC n. 247/2013 para impor aos Governos a obrigação de suprir todas as Comarcas com membros da Defensoria.
O IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) em parceria com a ANADEP (Associação Nacional dos Defensores Públicos) lançou o “Mapa da Defensoria Pública no Brasil” e afirmou que só existem 28% (vinte e oito por cento) das Comarcas brasileiras atendidas pelos serviços da Defensoria. Informações em: http://www.ipea.gov.br/sites/mapadefensoria.
Resultado: há cargos criados de Defensor, mas não providos por falta de orçamento da Instituição (prejudicando a abertura de concurso público); há carência na criação de outros cargos, do quadro de apoio (servidores: psicólogos, médicos, assistentes sociais, assessores, técnicos e analistas de informática, oficiais etc.; e estagiários) e na estruturação administrativa que permita um trabalho efetivo, eficiente e resolutivo; há demanda social e jurídica das mais caras às pessoas, mas não há Defensoria e Núcleo Regional no interior para amparar e solucionar os problemas.
Pergunto: a solução do Governo (Federal) foi efetivar legalmente esta autonomia financeiro-orçamentária da Defensoria, já prevista na Constituição (ao lado da autonomia administrativa e funcional), colocando-a na Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) e impondo um percentual da receita corrente líquida do Estado para gastos com pessoal (até 2%), permitindo a nomeação de novos Defensores, a criação do quadro de apoio, a adequada estruturação administrativa da Instituição, a interiorização e universalização dos seus serviços?
Não! A solução presidencial recentemente foi vetar o PLP (Projeto de Lei Complementar) n. 114/2011 aprovado unanimemente no Congresso Nacional, o qual regulamentava a autonomia orçamentária da Defensoria, desvinculando seu orçamento do Poder Executivo, o que pela Constituição já é óbvio.
Qual a situação de aproximação entre a Medicina nacional e a Defensoria Pública? Em vez de o Governo Federal desprender completamente o orçamento da Defensoria Pública para que esta preencha seus quadros com os Defensores Públicos em número suficiente, regulamente seu quadro de apoio e interiorize seus Núcleos, universalizando seus serviços, decidiu vetar integralmente o Projeto, deixando os grupos sociais vulneráveis, mais uma vez, distantes do acesso à Justiça Social.
Consequência disso, vários Municípios criam “Defensorias Públicas Municipais” ilegalmente (o que é inconstitucional: só Estados, DF e União podem criar, nos termos do art. 24, inc. XIII, da CRFB) e proveem “cargos” de “Defensor Público Municipal” (inexistente na Constituição e na Lei Orgânica Nacional da Defensoria Pública – LONDP), desrespeitando as Defensorias Públicas, seu público-alvo e sociedade.
Mais grave: estão dando provimento a cargos de Procuradores Municipais (Advogados Públicos do Município) e permitindo-lhes exercer as atribuições do Defensor Público, que geralmente litiga contra os próprios Municípios em benefício da Sociedade, máxime a carente (art. 4.°, § 2.°, da LC n. 80/94 – LONDP).
Como um Advogado do Município, que representa e atua na defesa, assessoria e orientação jurídica do Ente Público Municipal (equivalentes dos arts. 131 e 132 da CRFB), atuará na defesa da população contra o próprio Município? Patrocínio simultâneo ou tergiversação (crime do art. 355, parágrafo único, do CP)? O cargo de Defensor Público é indelegável e privativo de membro da Carreira (art. 4.°, § 2.°, da LONDP).
A estratégia é eleitoreira, cujo discurso é subliminar, intencional à captação ilícita de popularidade e votos. O Chefe do Executivo Municipal preenche os cargos e diz que está dando assistência jurídica e social à população, ainda que burlando vários princípios e normas constitucionais. Para muitos Munícipes a solução pode até amparar vários de seus interesses, aparentando dispensar uma Instituição Defensorial forte e atuante na localidade, já que nem a conhecem.
Em relação aos Médicos, o mesmo. Para que o Governo vai atender às “várias exigências” da categoria médica nacional se pode recrutar Médicos do estrangeiro, oferecendo atenção básica de saúde e ganhar popularidade?
Quanto aos Defensores Públicos, basta autonomia financeira (derrubada do veto presidencial ao PLP n. 114/2011 pelo Congresso Nacional, na forma do art. 66, §§ 4.° e 5.° da CRFB) e abertura de concurso público com o orçamento autônomo, porque existem inúmeros bacharéis em Direito interessados na Carreira Defensorial. O preenchimento será feito com rigorosíssimo certame público de provas e títulos, com provas objetiva, subjetiva (prático-profissional e discursiva), oral, de sanidade mental e da vida pregressa e análise dos títulos.
No que se refere aos Médicos, podem-se apresentar os dados das pesquisas confirmando a escassez dos profissionais por alguns vários anos. Mas de 2035 em diante, o problema estará solucionado com a prestação do serviço público pelos médicos (participantes e intercambistas) na atenção básica à saúde, ordenando-se a rede de atenção à saúde? Será criado um plano de cargos, carreira e salários ou teremos que continuar importando médicos estrangeiros sempre com a alegação de evasão dos médicos nacionais?
Espero que a temporariedade da solução não seja consumada jurídica e politicamente e que de 2035 em diante a medida seja a mesma, perenizando-se o problema, driblando-se a carreira médica e jamais entregando saúde pública eficiente, de qualidade e integral à população, máxime à carente socioeconomicamente.