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A aplicabilidade do direito fundamental à livre orientação sexual nos tempos atuais: avanços ou retrocessos?

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Resumo:


  • O direito fundamental à livre orientação sexual vem avançando no Brasil, respaldado jurídica e socialmente.

  • Os movimentos sociais, como o movimento LGBT, têm desempenhado um papel importante na garantia dos direitos dos homoafetivos.

  • O princípio da dignidade da pessoa humana tem sido fundamental na proteção dos direitos dos homoafetivos, como o direito à busca pela felicidade.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

O direito à livre orientação sexual vem sendo assegurado ao longo do tempo pelo ordenamento jurídico, sendo dotado de legitimidade jurídica e social.

Resumo: O presente artigo buscou analisar a aplicação do direito fundamental à livre orientação sexual no ordenamento brasileiro, de modo a evidenciar os avanços ou retrocessos na aplicação deste direito. Para isso, utilizou-se a abordagem qualitativa, a partir da análise de direitos e princípios no nosso ordenamento jurídico, através de pesquisa doutrinária, legislativa ejurisprudencial. De modo a ensejar a discussão, abordou-se o tema no contexto do projeto de lei conhecido, popularmente, como “cura gay”. A partir dos tópicos abordados e das discussões ensejadas, concluiu-se que o direito fundamental à livre orientação sexual vem avançando nos tempos atuais, sob amparojurídico e social.

Palavras-chave:Direito Fundamental; Orientação Sexual;Direito.

Sumário: 1. Introdução. 2. Dos direitos fundamentais. 3. Da igualdade. 4. Da liberdade. 5. Da liberdade sexual. 6. Da influência da Igreja. 7. Da cura gay: avanço ou retrocesso?8. Da legitimidade dos movimentos sociais. 9. Do direito à busca pela felicidade.10. Do princípio da dignidade da pessoa humana.11. Considerações finais.


1. Introdução

O direito fundamental à livre escolha do sexo é um tema recorrente nos tempos atuais, nos quais os homoafetivos vêm buscando e garantindo seus direitos. Ao mesmo tempo em que eles vêm obtendo conquistas, ainda enfrentam dificuldades.

De fato, ahomoafetividade não é um fenômeno recente, porém nestas últimas décadas é que o movimento dos homoafetivos vem ganhando mais espaço. Líderes tem se manifestado com maior visibilidade, muitas vezes com apoio social e midiático. Diante de um contexto militante, de reivindicações pelo direito à livre orientação sexual, o nosso ordenamento jurídico vem se adequando a estas novas mudanças. 

O presente artigo analisoucomo ocorre a aplicação do direito fundamental à livre escolha do sexo no Direito brasileiro, abordando, ainda, a influência social no assunto ora tratado. De modo a situar o tema, primeiramente, fez-se uma breve abordagem acerca dos direitos fundamentais, de modo geral, bem como do princípio da liberdade.

Realizada uma análisedo direito fundamental à livre escolha do sexo em co-relação ao princípio da dignidade da pessoa humana e ao direito à busca pela felicidade, aos quais está estritamente relacionado, abordou-sea temática no contexto do projeto da “cura gay”, recentemente arquivado. Seria esse um avanço ou uma limitação aos direitos garantidos aos homoafetivos? 


2. Dos direitos fundamentais

O conceito de direitos fundamentais édecorrente de um desenvolvimento histórico, de modo que não se apresenta como algo definido. Estes direitos se manifestam de modo diverso sob o ponto de vista das suas dimensões. Ou seja, originam-se a partirda realidade social e política do momento.

Bobbio (2004) afirma em seu livro “a era dos direitos”:

“os direitos do homem, por mais fundamentais que sejam, são direitos históricos, ou seja, nascidos em certas circunstâncias, caracterizadas por lutas em defesa de novas liberdades contra velhos poderes, e nascidos de modo gradual, não todos de uma vez e nem de uma vez por todas” (BOBBIO, 2004, pág. 9).

Do ponto de vista histórico, a origem do termo “direitos fundamentais” remonta à Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, 1789. Este período é marcado pelo pensamento liberal-burguês, notadamente individualista, caracterizado pela afirmação de direitos do indivíduo diante do Estado. Um marco deste período histórico é a Revolução Francesa, na qual o ideal burguês foi propagado sob o lema da “liberdade, igualdade e fraternidade”.  Nesta dimensão dos direitos fundamentais foram firmados os direitos à vida, liberdade, igualdade e propriedade.

Com o avanço industrial e o crescimento demográfico decorrente da implementaçãodeste ideal liberal-burguês, houve o surgimento de graves problemas sociais e econômicos, os quais suscitaram em movimentos nos quais a sociedade buscou garantir o seu direito em face do Estado. Os direitos fundamentais, sob esta nova dimensão, caracterizam-se por garantirem aos indivíduos o direito a prestações sociais, como saúde, educação e trabalho. E ainda, agregam algumas liberdades sociais, como o direito de greve. O Estado migrou da sua abstenção característica da primeira dimensão e passou para certo ativismo, ou seja, nesta nova dimensão o Estado tinha o dever de prestar certas garantias (MENDES, COELHO, BRANCO; 2009).

A posteriori, com as mudanças subsequentes do segundo pós-guerra, houve o aparecimento de novas necessidades, as quais suscitaramnos direitos de terceira dimensão. Estes se caracterizam pela proteção a grupos humanos (titularidade difusa), como é o caso do direito à paz, ao desenvolvimento, à proteção do meio ambiente, por exemplo.

Bonavides(2006) enuncia, ainda, a existência de uma quarta dimensão, corolário da globalização dos direitos fundamentais. Seria o caso do direito à democracia e ao pluralismo. Não obstante, a maior parte da doutrina é contra o posicionamento a respeito da existência desta dimensão.

Quando se enuncia acercadas dimensões dos direitos fundamentais, é preciso sobrelevar que o surgimento de uma não suplantou a pré-existente, pelo contrário, os direitos das diversas dimensões existem e interagem uns com os outros.

Bobbio(2004)evidencia a importância da concretização destes direitos ao mencionarque a função prática desses é fortalecer movimentos reivindicatórios que buscam a satisfação de interesses materiais e morais, porém pode, também, obscurecer a diferença entre o direito reivindicado e o direito reconhecido e protegido.A partir desta constatação, pôde-se abordar o direito à livre escolha do sexo.

De fato, o direito à liberdade, de modo geral, é um direito de primeira dimensão. Logo, pode-se afirmar que o direito à livre escolha do sexo é um direito “garantido”desde a primeira geração, com reforços sob a segunda e terceira dimensões. Mas, até que ponto se deu essa garantia histórica? Como se dá essa proteção, reconhecimento e proteção do direito à livre escolha do sexo no ordenamento brasileiro? De modo a responder tais questionamentos, apreciou-se, primeiramente, o princípio da igualdade.


3. Da igualdade

O princípio da igualdade garante que o Estado trate a todos com o mesmo respeito e consideração, de modo que todos têm direito de organizar a sua vida de acordo com os seus interesses, desde que não violem os direitos de terceiros. Está garantido constitucionalmente através do artigo 5º caput da Constituição de 1988, no qual afirma que todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza. E ainda, sob o artigo 3º, inciso IV, através do qual a promoção do bem todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação se constitui como um objetivo fundamental da República Federativa do Brasil.Porém, qual a real dimensão desta igualdade?

Baseando-se apenas neste princípio,poderíamos afirmar que os homoafetivos possuem os mesmos direitos que os heteroafetivos. Afinal, eles são iguais, sem distinções “de qualquer natureza”. Porém, na prática não é tão simples assim. A sociedade que tem a igualdade como princípio basilar é a mesma que ainda se apresenta sob algumas posições discriminatórias em questões referentes aos homoafetivos.

Há quem afirme que o natural é ser “normal”, heterossexual. Estas afirmações estãoarraigadaspelo preconceito, decorrente da moral social e da influência religiosa, as quais legitimam, muitas vezes, posturasque desigualam os indivíduos de acordo com a sua orientação sexual. Mas, também, não podemos deixar de mencionar a precedência de argumentos jurídicos que poderiam afastar o tratamento igualitário, se vistos de modo pontual.

O artigo 226, §3º, da Constituição Federal de 1988, por exemplo, reconhece a união estável entre homem e mulher. A partir deste artigo, alguns juristas alegaram a impossibilidade da admissão da união estável entre pessoas do mesmo sexo, visto que a previsão legal é apenas entre pessoas de sexos opostos. Porém, este argumento foi alvo de questionamentos, visto que houve uma omissão por parte do legislador. Ou seja, é perceptívelo reconhecimentoda união estável entre homem e mulher no artigo supracitado, porém não há vedaçãoà união estável entre pessoas do mesmo sexo.

Diante disso, percebe-se a necessidade de analisar o ordenamento como um todo, sobo “romance em cadeia” dworkiano. Em outros termos, não se pode afastar um direito dos homoafetivos com base em uma omissão legislativa. Faz-semisteranalisar o ordenamento como um todo, no qual estão inseridos o principio da igualdade, da liberdade, da dignidade humana e o direito fundamental à busca pela felicidade, bem como observar as pretensões sociais do presente momento.

A sociedade muda com o tempo, de modo que surgem novas necessidades, decorrentes do surgimento de novos problemas, os quais resultaram do aumento da complexidade social. É neste contexto, de aumento da complexidade social, que se percebe a imprescindibilidade de reconhecer o direito dos homoafetivos. Por ser o Direito uma conquista evolutiva, como retrata Luhmann (1985), a inovação judicial é possível até mesmo diante da lei, enquanto a inovação não é introduzida legalmente, visto que está firmada sob os novos anseios sociais. Em outros termos, o direito precisa condizer com essas mudanças.

Pelo exposto, percebe-se que era fundamental reconhecer a união estável entre casais homoafetivos. Afinal, apesar dos preconceitosincrustadosna sociedade, não se pode desconsiderar a existência da homoafetividade, bem como a necessidade de consubstanciar os direitos dos homoafetivos. Este assunto foi discutido com mais detalhes no tópico liberdade sexual, no qual foi analisado os avanços na obtenção de direitos por parte de casais do mesmo sexo.

Em suma,não podemos discriminar alguém pelo seu modo de vida. Se o fizéssemos estaríamos indo em sentido contrário ao princípio da igualdade, bem como o princípio da não discriminação. O princípio da igualdade é um dos princípios basilares para a garantia dos direitos por parte dos homoafetivos ao longo desses últimos anos no ordenamento jurídico brasileiro. Nos termos de Cármen Lúcia apud José Afonso da Silva (2007), a igualdade constitucional é mais do que uma expressão do Direito, é um modo justo de se viver socialmente.


4. Da liberdade

A liberdade está estritamente relacionada à igualdade, pois, assim como o direito à igualdade, o direito à liberdade também está garantido constitucionalmente no caput do artigo 5º da Constituição Federal de 1988.

Este direito é, também, decorrentede uma conquista histórica que se deu na conjuntura da Revolução Francesa, no século XVIII. Os protagonistas foram os burgueses, os quais buscaram assegurar seus interesses se libertando das amarras do Estado absolutista, no qual o poder estava nas mãos do Rei e da Igreja.O movimento, de caráter individualista, foi precursor da garantia dos direitos de primeira dimensão, no qual a liberdade se apresentou como um dos principais.

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Diante disso, é possível reconhecer o caráter histórico da liberdade, oriundo da relação entre o homem e a sociedade em um dado momento histórico, no qual esse busca a satisfação de interesses pessoais. Porém, a satisfação pessoal não deve implicar em prejuízos a terceiros, pois, segundo Mill (2006), caso isto ocorra, a moralidade ou a lei prevalecerão em detrimento da liberdade. A partir destas premissas, analisou-se a liberdade sexual.


5. Da liberdade sexual

A liberdade, de modo geral, está estritamente relacionada à autonomia, ao direito de escolha. Em se tratando de liberdade sexual, refere-se à liberdade de escolher com quem se relacionar afetivamente. É um direito que deve ser tutelado e reconhecido pelo Estado.

Quando o Estado nega ao indivíduo o reconhecimento e tutela deste direito, inibe-o de viver plenamente de acordo com a sua orientação sexual, com os seus anseios. Impossibilita o indivíduo de constituir uma família nos moldes aos quais lhe é pertinente, limitando a sua realização pessoal.

A liberdade sexual, apesar de ser um direito garantido na primeira geração, visto que é uma espécie do gênero liberdade, vem sendo garantida e aplicada no ordenamento jurídico brasileiro, ao longo destes últimos anos.

Devido à omissão do legislador, o qual não previu a relação entre pessoas do mesmo sexo, a garantia do direito à liberdade se deu ao longo de decisões, fruto de reivindicações por parte dos homoafetivos, que vem buscando obter os seus direitos. Dworkin (2003) deu legitimidade às reivindicações sociais nas decisões jurídicas, visto que, segundo o autor, os juízes devem tomar decisões presentificadas e aceitas socialmente.

Inicialmente, as decisões equiparavam a união entre pessoas homoafetivas à sociedade de fato, de modo que não reconheciam a natureza de entidade familiar. Segundo Dias:

“a aversão da doutrina dominante e da jurisprudência majoritária a se socorrerem das regras legais que regem a união estável ou o casamento leva singelamente ao reconhecimento de uma sociedade de fato. Sob o fundamento de se evitar enriquecimento injustificado, invoca-se o Direito das Obrigações, o que acaba subtraindo a possibilidade da concessão de um leque de direitos que só existem na esfera do Direito das Famílias” (DIAS; pag.07).

As relações homoafetivas não eram tuteladas de modo igualitário em relação às uniõesheteroafetivas. Em se tratando destas últimas citadas, o caráter patrimonial decorrente do tratamento no campo do Direito das Obrigações prevalecia sobre o caráter afetivo, familiar. Dias (2011) anuncia que o fato propulsor da inserção das uniões homoafetivas no Direito das Famílias foi uma decisão da Justiça do Rio Grande Sul que definiu a competência dos juizados especiais da família para analisar as uniões homoafetivas. Esta decisão abriu precedentes para uma das maiores conquistas dos homoafetivos: o reconhecimento da união estável de casais do mesmo sexo, pelo Supremo Tribunal Federal.

Este reconhecimento, pelo STF, deu-se no julgamento da ADPF 132/RJ e da ADI 4.277/DF, pelo STF.Tais decisões foram reiteradas tomando por base os princípios tratados neste artigo, bem como o reconhecimento ao pluralismo, o do direito à busca pela felicidade, em uma análise adequada aos novos anseios sociais. Eis um trecho da ADI 4.277/DF:

“reconhecimento do direito à preferência sexual como direta emanação do princípio da ‘dignidade da pessoa humana’: direito a auto-estima no mais elevado ponto de consciência do indivíduo. Direito à busca pela felicidade. Salto normativo da proibição do preconceito para a proclamação do direito à liberdade sexual. O concreto uso da sexualidade faz parte da autonomia da vontade das pessoas naturais”

Estas decisões impulsionaram outra conquista neste ano: o reconhecimento do casamento civil entre pessoas do mesmo sexo, pois com o reconhecimento da união estável, através da ADPF 132/RJ e da ADI 4.277/DF, muitos casais homoafetivos solicitaram a conversão das suas uniões estáveis em casamento.

O STJ, no julgamento RESP 1.183.378 – RS reconheceu a possibilidade de um casal homoafetivo requerer a conversão para o casamento. A partir deste precedente, alguns estados autorizaram, em consonância com o STF, o casamento entre pessoas do mesmo sexo, enquanto outros se abstiveram desta autorização.

Castro (2013) traz que de modo a solucionar discrepância entre os estados, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) editou a Resolução nº 175, de 14 de maio de 2013, publicada em 15 de maio de 2013, autorizando o casamento entre casais homoafetivos, de forma direta ou através da conversão de união estável.

Outra grande conquista diz respeito ao reconhecimento da adoção por parte destes casais. A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) garantiu, recentemente, a adoção unilateral de filha gerada a partir de uma inseminação artificial, de modo que ambas as mulheres pudessem ser consideradas como mãe (STJ; 2013).


6. Da influência da Igreja

As uniões homoafetivas sempre existiram. Remontam ao período antigo. Na Grécia antiga, por exemplo, o relacionamento entre homens era considerado mais nobre do que o entre seres do sexo oposto(CAVALCANTE, 2011). Porém, com o advento do Cristianismo, a partir do momento em que a Igreja sacralizou o direito de família, tomando por base o critério procriativo, as relações homossexuais foram vistas como nefastas dignas de repúdio e preconceito. Eram “pecaminosas”.

O exercício da sexualidade foi, então, associado à procriação, bem como à “instituição” do casamento nos moldes religiosos. Deu-se, assim, a sacralização do direito de família. A partir de tais fatos, a Igreja repudia, desde então, “comportamento sexuais desviantes” ao conceito de família por ela pregado, baseado na procriação e no casamento. Esta seria a ordem “natural” das coisas.Porém, vive-se em um Estado laico, caracterizado pela liberdade religiosa, de modo que o indivíduo não precisa viver de acordo com os ditames de determinada religião.As pessoas são livres para seguirem qualquer religião, logo o Estado não deve tutelar decisões ensejadas por fatores religiosos.

Apesar desta garantia constitucional, muitos religiosos ainda se manifestam, socialmente, contra a garantia dos direitos por partes dos homoafetivos. Merece destaque a participação dos evangélicos. A maior parte desses repudiou a decisão na qual foi reconhecido o direito à união estável por parte de casais homoafetivos. Recentemente, defenderam arduamente um projeto conhecido, popularmente, como “cura gay”.


7. Da “cura gay”: avanço ou retrocesso?

A “cura gay” é a expressão popularmente atribuída ao Projeto de Decreto Legislativo 234/11. Este projeto, de autoria do deputado João Campos (PSDB-GO), pretendeu tornar sem efeitoo artigo 3º, parágrafo único, e o artigo 4º da Resolução do Conselho Federal de Psicologia nº 1/99 de 23 de março de 1999, os quais regulamentam sobre a orientação sexual.

O artigo 3º, parágrafo único, proíbe que os psicólogos colaborem com eventos e serviços que proponham tratamento e cura das homossexualidades. Já o artigo 4º proíbe que os psicólogos se pronunciem ou participem de pronunciamentos públicos, nos meios de comunicação de massa, de modo a reforçar os preconceitos sociais existentes em relação aos homossexuais como portadores de qualquer desordem psíquica. De acordo com o projeto de lei, tais artigos (no caso do 3

º apenas o parágrafo único), deveriam ser sustados, ou seja, tornados sem efeitos.

É impróprio falar em cura das homossexualidades, visto que a Organização Mundial de Saúde (OMS) retirou o homossexualismo da lista internacional de doenças há 20 anos, no dia 17 de maio de 1990.Não há, então, o que tratar, o que curar.

A maioria das pesquisas sobre orientação sexual mostraque esta é de origem genética, ou seja, as pessoas nascem homoafetivas ou heteroafetivas. Elas não escolhem a sua orientação sexual. Esta está pré-determinada. Porém, existem outras pesquisas as quais acreditam que a orientação sexual é resultado de vivências, do ambiente social no qual o indivíduo está inserido. Independentementedo critério utilizado, é fato que a homossexualidade está atrelada às características mais particulares dos indivíduos, as suas necessidades de realização pessoal, aos seus anseios, à sua personalidade. Está atrelada ao que indivíduo é e não aquilo que ele gostaria de ser. Não é uma questão de opção. (VARELLA; 2013).

Se a orientação sexual fosse uma escolha por que os homoafetivos escolheriam o caminho “tortuoso”? Por que eles escolheriam o caminho cheio de dificuldades, nos quais lidam com o preconceito e falta de reconhecimento social? Por que muitos ficariam “presos ao armário”? Por que outros cometeriam suicídio pela falta de aceitação social e familiar?

A sociedade precisa reconhecer que a orientação sexual não é opcional. Ela é fruto dos desejos e necessidades mais íntimas do indivíduo, de modo que não deve ser reprimida por meros convencionalismos. De fato, os homoafetivos vêm garantindo o seu espaço. A jurisprudência tem avançado cada vez mais no sentido de concretização dos direitos destes indivíduos, os quais merecem as mesmas garantias dos heteroafetivos.

É lastimável que em um contexto de conquista afirmativa e reconhecimento seja apresentado um Projeto de Lei como este, popularmente conhecido como “cura gay”. Tal projeto trata a orientação sexual como uma escolha, a qual pode ser alterada, ou, nos termos do artigo que será sustado, curada, tratada.

A sociedade é que deveria ser “curada”. Ela é que deveria reconhecer a possibilidade de uma escolha sexual que vai contra os ditames do convencionalismo. De fato, os homoafetivos, assim como os heteroafetivos, devem receber orientação dos psicólogos, de modo a lidar com seus anseios, assim como já é feito. Mas não, no sentido de alterar asexualidade de modo a estar de acordo com os convencionalismos sociais. É uma afronta direta ao princípio da dignidade da pessoa humana.

Este Projeto de Lei ainda nos leva a outro questionamento: e como seriam nos casos das crianças e adolescentes que manifestam comportamentos homoafetivos? A escolha quanto ao comportamento seria por parte dos pais?  Ou seja, os pais teriam direito de reprimir a orientação sexual da criança por opção própria? A partir disso, pode-se perceber que o projeto nos suscita problemas espantosos, que vão contra o princípio da dignidade da pessoa humana, da liberdade sexual e do direito à busca pela felicidade.

Em pleno século XXI, no qual a liberdade sexual vem ganhando cada vez mais espaço, um retrocesso como este, protagonizado pelo projeto da “cura gay”, é inaceitável. A sociedade, englobada pelos homoafetivos e os heteroafetivos, avançou mais uma vez na garantia do direito à liberdade sexual com o arquivamento deste projeto, carente de legitimidade social.

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Sobre os autores
Filipi Alencar Soares de Souza

Graduando do curso de Direito pela UFPI

Thamires Oliveira de Holanda Monteiro

Graduanda do curso de Direito pela UFPI.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SOUZA, Filipi Alencar Soares ; MONTEIRO, Thamires Oliveira Holanda. A aplicabilidade do direito fundamental à livre orientação sexual nos tempos atuais: avanços ou retrocessos?. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3772, 29 out. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/25621. Acesso em: 23 dez. 2024.

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