Resumo: Este trabalho propõe o enfrentamento de uma questão polêmica no sistema jurídico brasileiro, a prescrição intercorrente no Processo de execução. A finalidade proposta é analisar a possível aplicação desse instituto nos processos de execução civis e fiscais, sendo naqueles focados na hipótese da não localização de bens penhoráveis do devedor e nestes na redação do artigo 40 da Lei n. 6.830/1980. Os estudos também estão voltados à análise do artigo 791, inciso III do Código de Processo Civil, no que tange a suspensão do processo de execução, percebendo que sua redação se apresenta com divergentes interpretações doutrinárias, encontrando a pacificação no entendimento jurisprudencial majoritário. Por fim, por meio da pesquisa desenvolvida acerca do tema proposto por esse trabalho, chega-se a conclusão de que o sistema jurídico brasileiro, em especial o Direito Civil, necessita de reformulação, pois o entendimento acerca desse assunto tem sido amparado em doutrinas e jurisprudências, todavia, há divergências que devem ser resolvidas pelo amparo legal como é feito na execução fiscal, portanto, pela reforma da fonte formal imediata do Direito, a lei.
Palavras-chave: Processo civil. Prescrição. Prescrição Intercorrente. Processo de execução. Suspensão da execução. Execução Fiscal.
INTRODUÇÃO
No limiar deste trabalho, saliente-se o método de estruturação utilizado para melhor compreensão acerca do tema que propõe abordar, a prescrição intercorrente no processo de execução. Desta sorte, a abordagem compreenderá em ordem lógica de explicação do que a doutrina e a jurisprudência entende conceitualmente como prescrição, prescrição intercorrente, execução e, enfim, a aplicação da prescrição intercorrente no processo de execução. Nesta seara de conceitos, serão abordadas divergências conceituais da doutrina frente ao instituto de prescrição, principalmente no que tange a doutrina clássica e a contemporânea.
Importante se faz salientar a evolução do instituto da prescrição na abordagem doutrinária do Direito Civil brasileiro, uma vez que entendem alguns doutrinadores que a partir das ideias do civilista Agnelo Amorim Filho, grande estudioso do Direito Alemão, o tratamento da prescrição – em termos técnico-conceituais – foi significativamente discutido e modificado.
Há no ordenamento jurídico brasileiro algumas divergências acerca da aplicação da prescrição intercorrente no processo de execução e, portanto, o objetivo primordial deste trabalho é demonstrar tais divergências, bem como as pacificações doutrinárias e jurisprudenciais, ainda que não seja de forma exaustiva, mas buscando o entendimento teórico-prático desse instituto de suma importância para o direito adjetivo ou processual.
1. DA PRESCRIÇÃO
1.1. CONCEITO
Antes de adentrar na exposição do conceito de prescrição, cabe ressaltar a natureza jurídica desse instituto. A prescrição é um fato jurídico stricto sensu, sendo um acontecimento independente da vontade humana que produz efeitos jurídicos, criando, modificando ou extinguindo direitos.Numa classificação mais estrita, trata-se de fato jurídico stricto sensu ordinário, uma vez que o decurso do tempo entre intervalos (dies a quo e dies ad quem) é um fato normal, de ocorrência diuturna e comum [1].Quanto ao conceito desse instituto, há na doutrina certa diversificação na maneira de visualizá-lo, principalmente em relação aos doutrinadores clássicos tradicionais como CâmaraLeal, Clóvis Beviláqua e Orlando Gomes. Desta sorte, Câmara Leal entende que prescrição é a “extinção de uma ação ajuizável, em virtude da inércia de seu titular durante um certo lapso de tempo, na ausência de causas preclusivas de seu curso”. Enquanto isso, Clóvis Beviláqua conceitua prescrição como “perda da ação atribuída a um direito, e de toda a sua capacidade defensiva, em consequência do não uso dela, durante determinado espaço de tempo”. Para Caio Mário da Silva Pereira “a prescrição é o modo pelo qual se extingue um direito (não apenas a ação) pela inércia do titular durante certo lapso de tempo”[2].
O problema encontrado nos conceitos mais clássicos é a polêmica que se tem quando afirmam que a prescrição ataca diretamente a ação, que a ação está prescrita ou que a ação extingue-se por prescrição. Por isso, o novo Código Civil de 2002, coordenado pelo ilustríssimo jurista Miguel Reale, adotou o vocábulo “pretensão” (do alemão anspruch), já estudado por Agnelo Amorim Filho, para indicar claramente que a prescrição não ataca o direito subjetivo público abstrato da ação, tutelado constitucionalmente como direito fundamental no artigo 5º, inciso XXXV, da Constituição da República Federativa do Brasil que assim dispõe: “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”, bem como o exposto nesse mesmo artigo, no inciso XXXIV, alínea a, que “assegura a todos, independente do pagamento de taxas o direito de petição aos Poderes Públicos em defesa de direitos ou contra ilegalidade ou abuso de poder”.
Destarte, a pretensão, segundo Francisco Amaralé “um poder de exigir de outrem uma ação ou omissão” [3]. Enquanto isso, de forma mais abrangente, Maria Helena Dinizconceituapretensão como “direito de exigir em juízo a obrigação do inadimplente, do dever legal ou contratual” [4].A adoção deste conceito para a definição de prescrição possibilita o entendimento de que o credor, ainda que tenha perdido o direito à pretensão, poderá exercer seu direito de ação que é imprescritível e ajuizar a petição inicial ao Poder Judiciário, pois este não poderá deixar de apreciá-la sobpena de violação de direitos fundamentais já supracitados. O que não importará que ao titular desta ação seja provida a pretensão desejada decorrente da violação de um direito seu, pois o direito a esta pretensãojá foi prescrito se decorrido o decurso do tempo estipulado em lei respeitando a ausência de causas impeditivas, suspensivas ou interruptivas da contagem desse prazo.
Sabendo que a prescrição atinge a ação em sentido material enão o direito subjetivo à ação, prescrevendo a pretensão nasce a exceção, técnica de defesa quealguém tem contra quem não exerceu, dentro do prazo estabelecido em lei, a pretensão [5]. Segundo o artigo 190 do Código Civil Brasileiro de 2002 e pelo princípio da actio nata, a prescrição faz extinguir a pretensão, tolhendo tanto o direito de ação (em sentido material) como o de exceção, visto que o meio de defesa do direito material deve ser exercido no prazo em que prescreve a pretensão, prazos estes que serão abordados em tópicos posteriores.
Feitas as devidas considerações, o Código Civil de 2002 segue a linha de adoção do vocábulo pretensão e assim dispõe: “Violado o direito, nasce para o titular a pretensão, a qual se extinguirá pela prescrição, nos prazos a que aludem os arts. 205 e 206”(Grifo meu).
1.2. FUNÇÃO JURÍDICA DA PRESCRIÇÃO
Fugindo do senso comum para o qual a prescrição é apenas um instituto que protege os inadimplentes, principalmente aqueles de má-fé, a verdadeira função jurídica e que reflete no âmbito social é de um instituto criado como medida de ordem pública para proporcionar segurança às relações jurídicas, que seriam comprometidas diante da instabilidade oriunda do fato de se possibilitar o exercício da ação por prazo indeterminado [6]. Maria Helena Diniz afirma que a prescrição se trata de pena ao titular da prestação que por negligência deixa escoar por sua inércia o lapso temporal de forma prolongada e contínua, dando origem a uma sanção adveniente que seria a própria prescrição [7]. Para Clóvis Beviláqua, havendo aprescrição, há desoneração do devedor ante a negligência do credor em não propor ação de cobrança de dívida dentro do prazo estabelecido em lei, reclamando seu direito; porém tal fato não anula a obrigação do devedor, já que será válido o pagamento voluntário de dívida prescrita, cuja restituição não poderá ser reclamada [8].
Carlos Roberto Gonçalves também defende que a prescrição é uma forma de proporcionar a tranquilidade nas relações jurídicas e consolidação dos direitos, evitando que o devedor de uma prestação necessite de guardar documentos que comprovem a quitação da prestação por um longo período, bastando guarda-los até o momento da quitação [9].
1.3. REQUISITOS E FORMAS DA PRESCRIÇÃO
Para que a prescrição se configure, faz-se necessário o preenchimento de alguns requisitos. Câmara Leal identifica quatro elementos essenciais à configuração da prescrição, sendo eles: a) existência de uma ação exercitável (actio nata); b) inércia do titular da ação pelo seu não exercício; c) continuidade dessa inércia durante um certo lapso de tempo; e d) ausência de algum fato ou ato a que a lei atribua eficácia impeditiva, suspensiva ou interruptiva do curso prescricional. Em posicionamento diferente de Câmara Leal, Carlos Roberto Gonçalves os resume quanto à indispensabilidade desses requisitos à apenas três: a) a violação do direito, com o nascimento da pretensão; b) a inércia do titular; e c) o decurso do tempo fixado em lei [10].
Maria Helena Diniz, na mesma linha, elenca quatro requisitos para a configuração da prescrição. São eles: 1) Existência de uma pretensão, que possa ser em juízo alegada por meio de uma ação exercitável, portanto, deve haver a violação de um direito que possibilitará o nascimento da pretensão que dentro do prazo estabelecido em lei poderá ser ajuizada; 2) Inércia do titular da ação (em sentido material) pelo seu não exercício, que é a passividade por inércia do titular em não ajuizar sua pretensão, permitindo que a violação permaneça; 3) Continuidade dessa inércia durante um certo lapso de tempo, que é justamente o ato que a lei busca punir, uma inércia prolongada e ininterrupta do titular lesado dentro dos prazos legais; e 4) Ausência de algum fato ou ato a que a lei confere eficácia impeditiva, suspensiva ou interruptiva de curso prescricional, que é o fator que neutraliza a prescrição, impedindo queinicie o prazo, suspendendo o prazo já em andamento ou interrompendo o prazo, que inicia-se a correr do ato interruptivo, sem levar em consideração o tempo já corrido [11].
Há duas formas de prescrição, sendo elas a aquisitiva e a extintiva. As duas formas de prescrição surgem no direito romano sob o mesmo vocábulo, partindo de dois elementos nucleares que as caracterizam, a ação prolongada do tempo e a inércia do titular do direito violado. A prescrição extintiva atinge qualquer ação (no sentido material), fundamentada na inércia do titular em exercer seu direito à pretensão e no tempo prolongado e ininterrupto. A prescrição aquisitiva, tratada com a denominação de usucapião, por sua vez, visa à propriedade ou a outro direito real, fundando-se na posse e no tempo. A prescrição extintiva étratada na parte geral do Código Civil de 2002, enquanto a prescrição aquisitiva (usucapião) é tratada na parte especial, na disciplina do direito das coisas [12].
1.4. DOS PRAZOS DA PRESCRIÇÃO
Os prazos prescricionais estão sempre previstos na lei (uma das diferenças frente à decadência) e, no Código Civil, em dois únicos artigos, sendo no artigo 205 (que estabelece o prazo prescricional geral máximo de 10 anos) e no artigo 206 (que estabelece prazos prescricionais especiais).
O artigo 205 do Código Civil dispõe que “a prescrição ocorre em dez anos, quando a lei não lhe haja fixado prazo menor”. Esse prazo decenal é chamado de prazo ordinário ou comum, também denominado de subsidiário por possuir a função de ser aplicado quando a lei não estabelecer prazo menor para a pretensão ou exceção [13].
Enquanto isso, o artigo 206 elenca os prazos especiais que a lei apresenta de forma determinada por conveniência de reduzir os prazos de exercício de determinados direitos. Apresentam na medida de um, dois, três, quatro ou cinco anos. Como exemplos de prazos prescricionaispode-se citar: no prazo ânuo tem-se a pretensão dos hospedeiros ou fornecedores de víveres destinados ao consumo no próprio estabelecimento, para o pagamento da hospedagem ou dos alimentos fornecidos (§1º, I); de prazo bienal há a pretensão para haver prestações alimentares, a partir da data que vencerem (§ 2º); no prazo trienal prescreve a pretensão de reparação civil (§ 3º, V); após prazo quatrienal prescreve a pretensão relativa à tutela (§ 4º); e após prazo quinquenal prescreve a pretensão de cobrança de dívidas líquidasconstantes de instrumentos público e particular (§ 5º, I). Ressalta-se que os exemplos supramencionados não compreendem todas as situações elencadas no artigo 206, tendo sido apresentado dessa forma a fim de compreensão pedagógica.
1.5. DO TRATAMENTO NORMATIVO E DAS PRETENSÕES IMPRESCRITÍVEIS
Ao tratar das características da prescrição, serão abordadas as normas gerais desse instituto que estão dispostas do artigo 189 ao 206 do Código Civil Brasileiro de 2002. A primeira característica faz referência ao artigo 191, dispondo sobre a renúncia da prescrição que poderáser realizada pelo interessado (devedor) apenas quando o prazo prescricional já estiver corrido, portanto, a prescrição estiver consumada, desde que não haja prejuízo de terceiro. Essa renúncia pode ser expressa ou tácita, sendo expressa quando feita de modo explícito, declarando que não quer mais utilizá-la e, portanto, tácita quando o devedor pratica atos contrários ou incompatíveis com a prescrição, como a renegociação da dívida, o seu pagamento mesmo depois de prescrita. Enfim, o devedor nesse caso abre mão de sua defesa oriunda da prescrição, a exceção [14].
Segundo o artigo 192, as partes não poderão, por autonomia da vontade, modificarem os prazos da prescrição, nem aumentando e nem restringindo, pois o prazo estará sempre prescrito em lei, ainda que trate de direitos patrimoniais.
O artigo 193 versa sobre o momento da sua alegação no processo, que pode ser realizada em qualquer grau de jurisdição pela parte a quem aproveita. A interpretação desse artigo é que a alegação pode ser feita na primeira ou segunda instância, em qualquer momento do processo a não ser na execução, salvo quando posterior à sentença transitada em julgado. No que tange a alegação da prescrição em recurso extraordinário e especial, importante se faz ressaltar que ela só poderá ser realizada quando pré-questionada em instância ordinária, fato fundamentado nos artigos 102, III e 105, III da Constituição da República Federativa do Brasil. A parte a quem aproveita será o herdeiro, o fiador, o credor do prescribente, o codevedor em obrigação solidária, a coobrigado em obrigação indivisível, quando se beneficiem com a decretação da prescrição [15].
O artigo 194 deve ser analisado com maior atenção, pois antes da Lei nº. 11.280/2006 possuía a seguinte redação: “O juiz deve suprir de ofício a alegação de prescrição em favor de absolutamente incapaz”. Com a vigência da lei supracitada, esse artigo foi revogado e, mais ainda, a lei alterou a redação do § 5º do artigo 219 do Código de Processo Civil que assim dispõe: “O juiz pronunciará, de ofício, a prescrição”. Por isso, não só quando em favor de absolutamente incapaz que o juiz poderá pronunciar de ofício a prescrição, pois sendo a prescrição matéria de ordem pública e de interesse social (para corrente majoritária), o órgão judicante poderá de ofício alegar a prescrição, ainda que não tenha requerimento do interessado. Uma curiosidade em relação a essa competência do juiz é tratada por Pablo Stolze ensinando que em respeito ao princípio da cooperatividade, para os processos em curso, é importante que o juiz, antes de pronunciar de ofício a prescrição conceda prazo para que as duas partes se manifestem. Neste prazo, o devedor pode renunciar a alegação de prescrição, que é uma defesa sua como visto no artigo 191. Caso permaneça o devedor silente, poderá o juiz então pronunciar de ofício a prescrição, tratando-se de conduta que se enquadra ao princípio do devido processo legal [16].
O artigo 195 permite que os relativamente incapazes e as pessoas jurídicas tenham ação contra os seus assistentes ou seus representantes legais, quando estes derem causa à prescrição ou não a alegarem oportunamente. Essa norma possui o fim de preservar a incolumidade patrimonial dos incapazes. Todavia, Maria Helena Diniz muito bem ressalta que o representante legal do relativamente incapaz que, ao assisti-lo, por falta de experiência negocial ou por desconhecimento jurídico, deixar de alegar a prescrição que tanta vantagem traria ao representado, não poderia ser responsabilizado civilmente, por não ter agido culposamente, fato que não ocorre com o representante legal da pessoa jurídica por possuir o dever de experiência negocial [17].
No artigo 196 está disposto de forma clara que “a prescrição iniciada contra uma pessoa contínua a correr contra o seu sucessor”. Portanto, se o credor falecer após o início do prazo prescricional, ela continuará correndo contra seus herdeiros a título universal ou singular, exceto quando forem absolutamente incapazes por força do artigo 198 [18].
Por fim, uma característica de suma importância é que no decurso da prescrição não há a geração de direito adquirido, pois o prazo poderá ser alterado por norma posterior.Existem pretensões que são imprescritíveis, todavia, vale ressaltar que a prescritibilidade é regra, enquanto imprescritibilidade é a exceção. Destarte, não prescrevem as pretensões que protegem os direitos da personalidade (direito à vida, à intimidade, à honra); as que prendem ao estado das pessoas (a condição conjugal, estado de filiação, a qualidade de cidadania); as de exercício facultativo (ação de divisão ou de venda da coisa comum, a de pedir meação no muro); as referentes a bens públicos de qualquer natureza, as que protegem o direito de propriedade, que é perpétuo; as pretensões de reaver bens confiados à guarda de outrem, a título de depósito, penhor ou mandato; e as destinadas a anular inscrição do nome empresarial feita com violação de lei ou do contrato. Vale lembrar que a pretensão que protegem os direitos da personalidade não é prescritiva, todavia, a indenização, ou melhor, as vantagens econômicas decorrentes desta pretensão são prescritíveis [19].
1.6. DAS CAUSAS IMPEDITIVAS, SUSPENSIVAS E INTERRUPTIVAS DA PRESCRIÇÃO
O Código Civil Brasileiro de 2002 não faz distinção entre causas que impedem ou suspendem a prescrição, sendo arroladas em seus artigos 197, 198 e 199. Não sendo objeto direto deste trabalho, não serão abordadas taxativamente todas as causas as que referem esse tópico. A diferença entre causas impeditivas e suspensivas se encontra no momento em que essas acontecem, portanto, se ocorrer antes de iniciar-se o prazo prescricional possuirá natureza impeditiva, pois obsta o início do prazo que não começa a correr enquanto a causa estiver em vigor; se ocorrer após iniciado o prazo prescricional possuirá natureza suspensiva, pois paralisa o prazo que está em curso.
O artigo 197 dispõe sobre causas taxativas (não admitindo interpretação extensiva) que impedem ou suspendem a prescrição por motivos de confiança, amizade e laços de afeição existentes entre as partes [20]. Nesse caso, não correrá a prescrição “entre os cônjuges, na constância da sociedade conjugal; entre ascendentes e descendentes, durante o poder familiar; entre tutelados ou curatelados e seus tutores ou curadores, durante a tutela ou curatela”.
O artigo 198 dispõe sobre causas motivadas pela preocupação de proteger pessoas que se encontram em situações especiais que as impedem de serem diligentes na defesa de seus interesses [21]. Nesse caso, não correrá a prescrição, por exemplo, contra os incapazes de que trata o artigo 3º, que são absolutamente incapazes (inciso I), contra os ausentes do País em serviço público da União, dos Estados ou dos Municípios (inciso II).
O artigo 199 dispõe que não correrá a prescrição “pendendo condição suspensiva; não estando vencido o prazo; pendendo ação de evicção”. Nas duas primeiras causas não se tem direito adquirido que pode ser exigido, pois ou a condição a qual submetia a aquisição do direito não se implementou ou o prazo estipulado para realização da prestação ainda não venceu. A terceira causa é que se terceiro propor ação de evicção, será suspensa a prescrição até o desfecho final dessa ação [22].
Existe outra causa de suspensão encontrada no artigo 200, pois como a pretensão de reparação civil prescreve em três anos, importante se faz que “quando a ação se originar de fatoque deva ser apurado no juízo criminal, não correrá a prescrição antes da respectiva sentença definitiva”, sentença esta entendida como título executivo judicial [23].
O artigo 201 trata da suspensão da prescrição em relação aos credores solidários. Desta sorte, dispõe que “suspensa a prescrição em favor de um dos credores solidários, só aproveitam os outros se a obrigação for indivisível”. Isso acontece por ser a prescrição benefício pessoal e que se a obrigação for divisível, poderá ser realizada a distinção entre os credores, não necessitando de estender a incidência deste instituto aos outros credores sobre os quais não recaírem a suspensão [24].
As causa interruptivas podem ser conceituadas de forma simples como aquelas que quando sobrevém ao início do prazo prescricional faz recomeçar do zero sua contagem (artigo 202, parágrafo único). Segundo Gonçalves, qualquer ato de exercício ou proteção ao direito (a pretensão) interrompe a prescrição, extinguindo o tempo já decorrido, que volta a correr por inteiro, portanto, não se computa o tempo já decorrido anteriormente ao ato interruptivo [25]. Essas causas são tratadas no artigo 202 do Código Civil de 2002, sendo, por exemplo, protesto judicial ou cambial, notificação judicial, habilitação do crédito em juízo, despacho do juiz que ordenar a citação, entre outras. O artigo 219 do Código de Processo Civil, em seu §1º dispõe que: “A interrupção da prescrição retroagirá à data da propositura da ação”. Segundo Gonçalves, pelo sistema do Código de Processo Civil, a prescrição considera-se interrompidana data da distribuição, onde houver mais de uma vara, ou do despacho. Todavia, o que interrompe a prescrição é a citação, operando, portanto, retroativamente, à referida data. Há causas de interrupção dispostas em leis especiais, portanto, esse rol não é taxativo em relação a todo o ordenamento jurídico.
O artigo 203 dispõe que “a prescrição pode ser interrompida por qualquer interessado”, portanto, não só o titular da pretensão possui o condão de interrompê-la, mas também seus representantes, os interessados como seus credores, o fiador do devedor e os herdeiros do prescribente.
No artigo 204 se encontra mais uma vez a pessoalidade dos efeitos da prescrição. Destarte, “a interrupção da prescrição por um credor não aproveita aos outros; semelhantemente, a interrupção operada contra o codevedor, ou seu herdeiro, não prejudica aos demais coobrigados”. No § 1º deste artigo, o código dispõe sobre uma exceção a essaregra, quando diz que “a prescrição por um dos credores solidários aproveita aos outros; assim como a interrupção efetuada contra o devedor solidário envolve os demais e seus herdeiros”. O § 2º dispõe que salvo quando houver obrigações e direitos indivisíveis, a interrupção realizada contra um dos herdeiros do devedor solidário não prejudica os outros herdeiros ou devedores. Nesse sentido, o Superior Tribunal de Justiça decidiu que “se o direito em discussão é indivisível, a interrupção da prescrição por um dos credores a todos aproveita” [26].