6. Conclusões articuladas
1.O direito ao acesso à justiça é um dos direitos mais básicos da cidadania, compondo o mínimo existencial sem o qual não há dignidade da pessoa humana;
2.Cumpre à Defensoria Pública o papel de efetivar o direito fundamental de acesso à justiça daqueles que não dispõem de recursos próprios para fazê-lo por outros meios;
3.Estado de Goiás, sem uma Defensoria Pública real e efetiva, vem privando os cidadãos necessitados de um dos mais básicos direitos de cidadania, pois grande parcela da população no estado não dispõe de um meio que possibilite que se restabeleça o exercício dos direitos fundamentais previstos em nosso ordenamento jurídico.
4.A Lei Complementar estadual nº 51/2005, que criou a Defensoria Pública em Goiás, sofreu alterações que desfiguram o modelo nacional, estabelecido pela Lei Orgânica da Defensoria Pública (LC 80/94). Primeiro, porque a LC nº 61/2008 modificou a estrutura organizacional da Instituição. Segundo, a LC nº84/2011 deu ao Governador do Estado o poder de nomear e exonerar qualquer advogado para o cargo de Defensor Público Geral, quando a Constituição Federal (art.134) estabelece que o cargo de chefe institucional deve ser privativo de integrantes de carreira.
5.Não obstante o Estado de Goiás tenha firmado Termo de Ajustamento de Conduta – TAC com o Ministério Público de Goiás, prevendo a realização de concurso público para provimento de 14 cargos de defensor publico, o quantitativo é insuficiente para atender a demanda no Estado.
6.A arbitrária abstenção do Estado de Goiás em implementar uma Defensoria Pública efetiva caracteriza uma inconstitucionalidade por omissão, pois segundo o artigo 134 da Constituição Federal, cumpre aos Estados a implantação das Defensoria Públicas Estaduais, a fim de viabilizar o acesso à justiça e dar eficácia social aos direitos fundamentais previstos na Constituição.
7.A realidade atual da Defensoria Pública em Goiás demonstra que uma grande parcela da população goiana, formada por pessoas necessitadas, encontra-se à margem do “direito a ter direitos” (ARENDT), isto é, sem um importante instrumento de concretização de direitos, sejam eles individuais, políticos, econômicos, sociais, culturais ou ambientais.
8.No caso dos assassinatos de pessoas em situação de rua em Goiânia, a Defensoria Pública poderia atuar na tutela coletiva dessas pessoas, pleiteando no Poder Judiciário a proteção da vida e a realização de políticas públicas previstas no Plano Nacional para a População em Situação de Rua, regulado pelo Decreto Federal nº 7.053/2009, dentre as quais o acesso amplo simplificado e seguro aos serviços e programas de saúde, assistência social, moradia, segurança, respeitando-se, assim, a dignidade de tais pessoas e valorizando-se o respeito à vida e à cidadania. Destarte, as mais de 40 mortes já ocorridas poderiam ter sido evitadas.
9.A instalação de um centro de internação para adolescentes em um batalhão da Polícia Militar é incompatível com as normas do SINASE. Além disso, tal fato denuncia que o Estado de Goiás não vem cumprindo com o direito à proteção integral a que fazem jus os adolescentes, por força do artigo 227 da Constituição e artigo 3º do Estatuto da Criança e do Adolescente, pois ausente um dos atores do Sistema de Justiça e de proteção às crianças e adolescentes em Goiás, a Defensoria Pública.
10.O caso da menina Julia Gabriele em Anápolis, evidencia a necessidade da implantação de uma Defensoria Pública em Goiás, alinhada com seu mister constitucional de promover o acesso à justiça aos necessitados, bem como com autonomia frente a possíveis desmandos e interferências em sua atuação em prol dos hipossuficientes, uma vez que, nesse caso, o próprio Estado poderia ser condenado a fornecer os medicamentos dos quais Julia necessita, vez que a responsabilidade em dar efetividade ao direito à saúde é solidária entre todos os entes da federação.
11.O caso da Sra. Maria do Socorro Lopes, que desistiu dos serviços oferecidos pela Defensoria Pública de Goiás para conseguir que o pai de seu filho voltasse a pagar a pensão alimentícia de seu filho de 14 (quatorze) anos de idade, ante a ausência de uma Instituição composta por defensores públicos vocacionados e preparados para lidar com os destinatários dos seus serviços, caracateriza verdadeira negativa de acesso à justiça pela própria Defensoria Pública de Goiás.
12.Sem uma Defensoria Pública efetivamente implantada, independente, autônoma, com cargos de Defensores Públicos providos por profissionais aprovados em concurso próprio da Instituição, cientes e vocacionados para sua relevantíssima missão constitucional, o Estado de Goiás continuará deixando pessoas como os cidadãos em situação de rua em Goiânia, os adolescentes em cumprimento de medidas socioeducativas, a menina Julia Gabriele, a Sra. Maria do Socorro Lopes e muitos outros à margem da cidadania e da própria dignidade da pessoa humana.
Referências Bibliográficas
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FENSTERSEIFER, Tiago. O controle judicial de políticas públicas destinadas à efetivação do direito fundamental das pessoas necessitadas à assistência jurídica integral e gratuita. Em: SOUSA, José Augusto Garcia. Coordenador. Uma Nova Defensoria Pública Pede Passagem: Reflexões sobre a Lei Complementar 132/09. Obra coletiva. Editora Lumen Juris. 2012.
MENDES, Gilmar Ferreira. Curso de direito constitucional / Gilmar Ferreira Mendes, Inocêncio Mártires Coelho, Paulo Gustavo Gonet Branco. – 4a ed. São Paulo: Saraiva, 2009.
RASCOVSKI, Luiz. Medicamentos: uma abordagem prática do tratamento dado pelo Poder Judiciário. Em: RÉ, Aluisio Iunes Monti Ruggeri. Coordenador. Temas Aprofundados: Defensoria Pública. Obra coletiva. Ed. JusPodivm. 2013.
SADEK, Maria Tereza Aina. Defensoria Pública: A Conquista da Cidadania. Em: RÉ, Aluisio Iunes Monti Ruggeri. Coordenador. Temas Aprofundados: Defensoria Pública. Obra coletiva. Ed. JusPodivm. 2013.
SOUSA, José Augusto Garcia. Uma Nova Defensoria Pública Pede Passagem: Reflexões sobre a Lei Complementar 132/09. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2012.
RÉ, Aluisio Iunes Monti Ruggeri. Temas Aprofundados: Defensoria Pública.. Editora jusPodivm. 2013.
Notas
[2] Disponível em http://www.ipea.gov.br/sites/mapadefensoria - acessado em 06/11/2013.
[3] Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/957877-fraude-em-concurso-para-defensor-leva-a-prisao-no-am.shtml - acessado em 06/11/2013.
[4] Fonte: http://www.anadep.org.br/wtk/pagina/materia?id=15615 - acessado em 06/11/2013.
[5] Fonte: http://g1.globo.com/goias/noticia/2013/08/governo-de-goias-vai-realizar-novo-concurso-para-defensor-publico.html - acessado em 06/06/2013.
[6]Fonte: http://www.opopular.com.br/cmlink/o-popular/busca?q=morador+de+rua+assassinado - acesso em 06/11/2013
[7] Disponível em http://www.opopular.com.br/editorias/cidades/morador-de-rua-e-criança-morrem-a-pauladas-1.303500?localLinksEnabled=false - acessado em 06/11/2013.
[8] Fonte: http://www.defensoria.sp.gov.br/dpesp/Repositorio/31/Documentos/Projeto_Básico_-_População_em_Situação_de_Rua.pdf - acessado em 06/11/2013.
[9] SOUSA, José Augusto Garcia de. I Relatório Nacional de Atuações Coletivas da Defensoria Pública: Um estudo empírico sob a ótica dos “consumidores”do sistema de justiça. Brasília: ANADEP, 2013, p. 22.
[10] Fonte: http://g1.globo.com/goias/noticia/2013/11/mae-de-menina-de-9-anos-e-que-pesa-14-kg-pede-que-prefeitura-doe-remedios.html - acessado em 08/11/2013.
[11] Disponível em http://www.opopular.com.br/editorias/cidades/demanda-bem-acima-da-oferta-1.123562 - acessado em 08/11/2013.