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Alternativa ou impunidade?

07/02/2014 às 09:24
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Deixar de prender simplesmente porque não há mais onde não é alternativa, é impunidade.

A crise no presídio de Pedrinhas, no Maranhão, reacendeu o debate sobre a caótica situação do sistema carcerário brasileiro. A discussão tem como base, invariável e acertadamente, a superpopulação das unidades prisionais, problema crônico do qual decorre, para o Estado, verdadeira impossibilidade de controlar seus presos. Mas o que fazer para começar a resolver esta grave questão?

Buscando responder a esse dilema, muitos estudiosos, dentre os quais renomados juristas, veem na adoção de penas alternativas um caminho promissor. É o caso, por exemplo, do Ministro do Supremo Tribunal Federal Ricardo Lewandowski, que acaba de encaminhar ao Ministério da Justiça uma proposta de alteração no Código de Processo Penal, para impor aos magistrados, ao decretarem prisões, que justifiquem expressamente as razões de não optarem por penas alternativas, isto é, aquelas em que não há recolhimento a presídios.

A discussão é rica e, do ponto de vista teórico, muito válida. Porém, jamais deveria ser travada num momento de crise institucional de todo o sistema carcerário nacional, com reflexos diretos nos índices gerais de criminalidade.

Momentos de crise exigem soluções emergenciais, de resultados práticos imediatos, sem possibilitar, sequer minimamente, que se ponha em dúvida a eficácia e a presença do poder público. Essas soluções, por mais que contrariem a teoria das causas determinantes do meio social, passam, invariavelmente, pela repressão rígida.

Os exemplos disponíveis confirmam a eficácia repressiva para a redução célere de crises de insegurança. Na década de noventa do século passado, quando Nova Iorque enfrentou seu ápice nos índices de criminalidade, a solução engendrada sob o comando do então prefeito Rudolph Giuliani não foi abrandar penas. Ao contrário, ali se instaurou uma política repressiva extremamente rígida, com ações enérgicas diante do menor sinal delitivo, o mundialmente famoso programa de "Tolerância Zero".

Com a intervenção repressiva, Nova Iorque reduziu significativamente seus índices de criminalidade. Em pouco tempo, ao final da gestão Giuliani, os homicídios na cidade haviam caído em 65% e os crimes em geral em mais de 57%. A então enérgica polícia nova-iorquina virou sinônimo de sucesso, merecendo reconhecimento elogioso até pelo FBI.

Mesmo em períodos mais longos, as penas privativas de liberdade têm se revelado eficazes na contenção criminal. Os números do Mapa da Violência no Brasil, parâmetro mais utilizado oficialmente pelo Ministério da Justiça, demonstram que a criminalidade homicida vem aumentando significativamente no país nos últimos anos, à exceção do estado de São Paulo, onde apresentaram redução, justamente o que fez a realidade nacional não ser absolutamente desastrosa.

O que levou o estado a destoar positivamente do resto do país não foram penas alternativas. Desde 1999, a segurança pública em São Paulo passou a se pautar no fortalecimento da ação policial, conduzindo a mais prisões. Pouco mais de uma década depois, o estado, que conta com aproximadamente 11% da população brasileira, respondia por 40% da população carcerária.

Números assim, indicando aumento de prisões e queda nos homicídios, não fortalecem a corrente da alternatividade das penas.

O desafio brasileiro atual não é definir quais punições são mais adequadas a quais tipos de delito, mas assegurar que as penas que para estes já são previstas sejam cumpridas. O maior problema que enfrentamos na segurança pública é objetivo: a impunidade. É isso que se precisa resolver urgentemente, para que possamos retomar a situação de normalidade, já quase esquecida, e, a partir daí - e somente então - podermos discutir alterações legais na previsão das penas.

Vivenciamos uma realidade em que mais de 50 mil homicídios são cometidos todos os anos e nem 10% deles são esclarecidos, em que mais da metade dos presos são reincidentes e boa parte dos que obtêm direito a saídas provisórias não retorna. Um quadro no qual o regime semiaberto tem como regra o significado de delinquir de dia e só voltar para dormir presídio, lugar onde o Estado não consegue nem mesmo controlar o que entra, a ponto de precisar instalar bloqueadores para que os inúmeros celulares que ali estão ilegalmente não funcionem.

Em circunstâncias assim, como assegurar, sequer minimamente, que condenados a penas alternativas efetivamente as cumprirão? Como ter a certeza ou transmitir a sensação de que serão punidos?

O roteiro está errado. O caminho deveria ser criar novas vagas no sistema carcerário, fazer com que a lotação máxima dos presídios seja respeitada e que os presos sejam separados de acordo com suas condenações e grau de periculosidade. Quando estivermos assim, testar penas diferentes das restritivas de liberdade certamente não será temerário.

Contudo, adotar penas alternativas num momento em que a sociedade tem incutida uma enorme sensação de insegurança não há de ser visto como algo adequado. Se for sob o pretexto de esvaziar presídios, então, é a receita da catástrofe. Deixar de prender simplesmente porque não há mais onde não é alternativa, é impunidade.

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Sobre o autor
Fabricio Rebelo

Pesquisador nas áreas Jurídica e de Segurança Pública, Coordenador do Centro de Pesquisa em Direito e Segurança (CEPEDES), Professor (cursos livres), Autor de "Articulando em Segurança: contrapontos ao desarmamento civil", Assessor Jurídico.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

REBELO, Fabricio. Alternativa ou impunidade?. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 3873, 7 fev. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/26617. Acesso em: 22 dez. 2024.

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