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Penas alternativas: uma nova alternativa?

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17/04/2014 às 08:23
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As penas alternativas não se situam apenas em nosso ordenamento jurídico como uma alternativa à prisão, mas, sim, como uma medida ressocializadora a ser aplicada sempre que necessária e suficiente na resposta penal.

Quando, através da compaixão, cheguei a reconhecer nos piores dos encarcerados um homem como eu; quando se diluiu aquela fumaça que me fazia crer ser melhor do que ele; quando senti pesar nos meus ombros a responsabilidade do seu delito; quando, anos faz, em uma meditação em uma sexta-feira santa, diante da cruz, senti gritar dentro de mim: ‘Judas é teu irmão’, então compreendi que os homens não se podem dividir em bons e maus, em livres e encarcerados, porque há fora do cárcere prisioneiros mais prisioneiros do que os que estão dentro e há dentro do cárcere mais libertos da prisão dos que estão fora. Encarcerados somos, mais ou menos, todos nós, entre os muros do nosso egoísmo.

Francesco Carnelutti

Resumo:No contexto histórico em que foram concebidas as Penas Alternativas, verifica-se a busca do legislador em apresentar, através destas, um meio legítimo e eficaz no controle da reincidência criminal e como mais uma forma de evitar a pena de prisão. Desse modo, o presente trabalho teve por escopo fazer uma abordagem temática em alguns conceitos ligados à aplicação desta nova modalidade punitiva, no sentido de uma melhor compreensão quanto aos efeitos que ela possa produzir à sociedade. Para tanto, usou-se o método dedutivo, com estudo bibliográfico, bem como com pesquisa documental e de campo. Esta última caracterizou-se por ser um breve estudo sobre estrutura e eficácia processuais, onde se analisou peremptoriamente, entre outros dados, a reincidência frente aos feitos condenatórios em que foram aplicadas as Penas Alternativas junto à Comarca de Lajeado-RS, pertinentes aos processos de execução criminal instaurados nos anos de 1999 e 2000, na matéria.

Palavras-chave: Penas Alternativas; condenado; reincidência; ressocialização; punição.

Sumário: 1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS. 2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA PENA. 2.1 Período das Vinganças Ofensivas. 2.1.1 Fase da Vingança Privada. 2.1.2 Fase da Vingança Divina. 2.1.3 Fase da Vingança Pública. 2.2 Período Humanitário. 2.2.1 Escola Clássica. 2.3 Período Científico. 2.3.1 Escola Positiva. 3 TEORIAS DA PENA. 3.1 Teoria Absoluta (Teoria Retributiva). 3.2 Teoria Relativa (Teoria Preventiva). 3.2.1 Teoria Preventiva Geral. 3.2.2 Teoria Preventiva Especial. 3.3 Teoria Mista e Unificadora. 4 PENAS ALTERNATIVAS: UMA NOVA ALTERNATIVA?1.Breve histórico do Direito Punitivo Brasileiro. 2.Falência da Pena de Prisão. 4.3 O surgimento das Penas Alternativas. 5 ANÁLISE DOS DADOS OBTIDOS – PENAS ALTERNATIVAS: UMA ALTERNATIVA EFICAZ?. 5.1 Análise dos Dados. 5.1.1 Naturalidade. 5.1.2 Sexo. 5.1.3 Idade. 5.1.4 Escolaridade. 5.1.5 Infração. 5.1.6 Penas Alternativas Aplicadas. 5.1.7 Casos de reincidência. 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS. REFERÊNCIAS. ANEXOS


1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS

Neste trabalho, optou-se pelo estudo das Penas Alternativas, uma nova modalidade de punição que vem despertando interesse dos estudiosos do Direito, bem como das autoridades. Trata-se de um tema bastante polêmico, tendo de um lado defensores convictos e, de outro, céticos que questionam a sua suposta eficácia diante do alto índice de reincidência criminal e do próprio aumento da criminalidade vigente em nosso país.

Essa forma alternativa de punição teve seu advento decorrente da Lei n° 9.714/98, que alterou o art. 43 e seguintes do Código Penal, incrementando a aplicação das penas não-privativas de liberdade. Trouxe em seu bojo a busca do legislador em proporcionar aos condenados que estejam amparados pelo art. 44 do CP condições mais favoráveis para a sua reabilitação, permitindo a estes continuarem com suas ocupações lícitas e, ainda, não os distanciando de seu convívio social. Portanto, esta modalidade punitiva afasta a privação da liberdade do condenado, juntamente com os supostos efeitos nefastos provocados pelo sistema prisional.

Destarte, o presente trabalho visa analisar, conceituar e compreender as modalidades alternativas previstas na Lei n° 9.714/98, assim como seus reflexos no ordenamento jurídico pátrio, na real perspectiva de verificar se a aplicação dessa nova forma punitiva caracteriza-se ou não como um instrumento tendente a trazer resultados significativos à sociedade e ao ordenamento juridico, principalmente no que tange à ressocialização do condenado e a redução da reincidência criminal.

Vale destacar que a terminologia “Penas Alternativas”, utilizada neste trabalho, é uma denominação oriunda da forma pela qual foi criada esta nova maneira de punir, encontrando-se no atual Código Penal Brasileiro através do termo Penas Restritivas de Direitos.

Entretanto, antes de adentrarmos na conceituação desta nova modalidade de punição e nos dados estatísticos do estudo de processos, torna-se necessário nos reportarmos à visão histórica da pena, demonstrando a sua transformação no tempo, desde o surgimento desta na antiguidade até os períodos humanísticos, abordando as Escolas Penais e sua fundamental contribuição do direito de punir, assuntos apresentados no capítulo 2.

É também relevante a compreensão das Teorias da Pena, através das diversas explicações que a Doutrina dedicou ao tema, assim como a abordagem da crise do sistema penitenciário e o surgimento das Medidas Alternativas de Punição e sua suposta eficácia, razão pela qual esses tópicos também foram inseridos neste estudo.

Por fim, serão analisados, de forma sumária, os dados colhidos na pesquisa realizada, através dos processos de execução criminal, que foram instaurados nos anos de 1999 e 2000, perante a Vara de Execução Criminal da Comarca de Lajeado-RS, especificadamente frente às infrações em que foram aplicadas Penas Alternativas, decorrentes de sentenças criminais.

O trabalho foi realizado através do método dedutivo, com pesquisa bibliográfica, documental e de campo, no objetivo de melhor compreender se as Penas Alternativas caracterizam-se, ou não, como um instrumento capaz de trazer resultados significativos à sociedade e ao ordenamento jurídico pátrio, principalmente no que tange à tão sonhada redução do elevado índice da reincidência criminal brasileira.


2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA PENA

O caráter punitivo de aplicar uma sanção ao indivíduo que infringir determinada norma ou costume está inserido em nosso contexto histórico desde os primórdios da humanidade, traduzindo-se nas mais variadas formas de punição, que se manifestam através de reflexos das condições sociais e culturais de uma época. Desse modo, pelo fato da origem da pena ser tão antiga quanto à própria humanidade, torna-se importante analisar a sua evolução histórica frente ao objetivo do presente trabalho, buscando, assim, melhor compreender a sua função e a sua finalidade para a sociedade.

A seguir, de forma breve, abordaremos os períodos históricos da Pena, analisando a sua transformação no decorrer dos tempos.

2.1 Período das Vinganças Ofensivas

O período das vinganças ofensivas nasceu praticamente junto com a humanidade, ou seja, nos tempos primitivos, e se prolongou até o século XVIII. Ele se caracterizou como o marco do surgimento da aplicação de sanções para determinadas condutas incongruentes com normas ou costumes de uma época. Vigia a lei do mais forte, pois naquela época inexistia um sistema orgânico de princípios gerais. Os grupos sociais deste período estavam abrangidos por uma cultura mágica ou religiosa, que acreditava que fenômenos naturais, como as pragas, erupções vulcânicas e até mesmo a seca, eram castigos divinos para a prática de atos que exigiam reparações.

Esse período subdividiu-se em três fases: Fase da Vingança Privada, Fase da Vingança Divina e a Fase da Vingança Pública.

Essas fases não possuíram um limite cronológico que as dividiu, tendo em vista que a cronologia era algo secundário, já que a separação era feita por idéias.

2.1.1 Fase da Vingança Privada

A vingança privada caracterizou-se pela relação natural e instintiva, pautando-se como uma realidade sociológica e não como uma instituição jurídica.

Para melhor compreendermos este período, oportunas são as palavras de Aníbal Bruno¹:

“A história da pena pode ser observada desde a antiguidade, no momento em que o indivíduo passa a viver em coletividade, criando desde logo normas de comportamento no sentido de manter-se a paz social do grupo, resultavam estas normas através do hábito, e a obrigatoriedade se assentava no temor religioso ou mágico. A punição para o infrator das normas de comportamento era a humilhação ou o desprezo dos demais do grupo frente a este, chegando a pena em determinados casos ser até mesmo a expulsão do infrator da comunidade e a punição extrema caracterizava-se através da expulsão do infrator e tornava-o inimigo do clã e de seus deuses e das forças da natureza. Sendo ainda que a vingança privada começa a tomar forma na pré-história, através de grupos, com reações contra agressões sofridas, não tendo ainda estas um cunho individual, mesmo porque a vingança era dirigida a qualquer um membro do grupo contrário e não ao verdadeiro agressor, caracterizando-se assim a vingança como forma de guerra entre as tribos e não punição para um delito”.

Com o passar do tempo, estes grupos se transformaram em sociedades; portanto, a vingança transferiu-se dos agrupamentos secundários para a coletividade geral, devido ao aumento da solidariedade e a íntima integração daqueles grupos na comunidade total. A pena, por sua vez, começou a definir sua característica como vingança social, e se tornou mais definitiva à proporção em que o órgão central do poder mostrou-se mais organizado e forte. A partir desse marco na história, essas comunidades começaram a resolver os dissídios através do chamado “preço do sangue” onde o agressor era punido pelo delito que cometera através de lesões a sua integridade física².

No momento em que as sociedades começaram a evoluir, as relações internas tornaram-se mais complexas, surgindo, dessa forma, a necessidade de regulamentação por intermédio de normas expressas. Destacou-se no Oriente o primeiro, mais extenso e conhecido corpo de lei da Antigüidade: a Lei de Talião (Código de Hamurabi 1.680 a.C.). Tratava-se de um texto legal de 282 (duzentos e oitenta e dois) artigos. Neste, a pena era medida pela intensidade da agressão segundo a fórmula “olho por olho, dente por dente” na qual punia-se o agressor pela mesma intensidade em que cometera o delito, com o intuito de reduzir a ira do ofendido e a revolta social, visando o respeito à figura do soberano.

Surgiu também neste período a Composição, através da qual o ofensor comprava a sua liberdade com dinheiro, gado, armas, etc. Esse instituto foi adotado pelo Código de Hamurábi (Babilônia), pelo Pentateuco (hebreus) e pelo Código de Manu, sendo largamente aceita pelo Direito Germânico, caracterizado como a origem remota das indenizações cíveis e das multas penais.

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2.1.2 Fase da Vingança Divina

Nesta fase, destacou-se a influência das religiões e do politeísmo, pois as crenças eram decisivas na vida dos povos antigos. A administração da sanção penal ficava a cargo dos sacerdotes que, como mandatários dos deuses, encarregavam-se da justiça a ser feita.

Nesse sentido, torna-se importante destacar o ensinamento de Noronha³:

“Na fase da Vingança Divina o princípio que domina a repressão é a satisfação da divindade, ofendida pelo crime. Pune-se com rigor, antes com notória crueldade, pois o castigo deve estar em relação com a grandeza do deus ofendido”.

A legislação típica desta fase encontrava-se nos códigos da Índia (Manava, Dharma, Sastra), bem como no Egito (Cinco Livros), na China (Livro das Cinco Penas), na Pérsia (Avesta) e também no povo do Israel. Teve relevo nessa época o surgimento, na Índia, do Código de Manu, que também visou o rigor da pena. O Código de Manu (séc. XI a.C.) regia-se sob o fundamento de que a pena purificava o infrator, determinava o corte de dedos dos ladrões, evoluindo para os pés e mãos no caso de reincidência. Era previsto o corte da língua para quem insultasse um homem de bem; a queima do adúltero em cama ardente; a entrega da adúltera para a cachorrada4.

2.1.3 Fase da Vingança Pública

No período das grandes civilizações, a sociedade passou a ter uma maior organização, principalmente no poder político, surgindo a figura do chefe social ou da assembléia. Nesse contexto, a pena começou a perder a sua característica sacra, transformando-se em uma sanção imposta em nome de uma autoridade da sociedade. Portanto, os agentes que aplicavam as penas não eram mais os sacerdotes, mas, sim, o soberano (rei, príncipe, regente ou chefe local), que exercia sua autoridade em nome de Deus.

Nesta fase a aplicabilidade da pena se deteve no escopo de assegurar o poder do Estado, evitando seu enfraquecimento, ou que fosse contrariada a sua política.

As formas das sanções visavam a intimidação do infrator, através de penas severas e cruéis, que demonstravam à sociedade a força do governante.

Foucalt5 salienta o caráter da pena que era aplicada nesta fase, que se estendeu até o final da Idade Média, na seguinte descrição:

“A partir desta época até o final do século XVIII a pena é vista como um instrumento do terror nas mais variadas formas de suplício tanto físico como espiritual dos delinqüentes, incorporando a estes as mais variadas sanções físicas, até mesmo a de morte através de rituais de expiação e de castigo. Uns eram condenados à forca; outros a ter a mão ou a língua cortada ou furada e ser enforcado em seguida; outros por crime mais graves a serem arrebentados vivos e expirar na roda depois de ter os membros arrebentados; outros a serem arrebentados até a morte natural; outros a serem estrangulados e em seguidas arrebentados, outros a serem queimados vivos ou até mesmo a serem puxados por quatro cavalos”.

Nessa fase, diversas formas de punição surgiram, assim como a fiança. Rusche6 cita o surgimento da fiança na Idade Média, considerando-a uma medida que beneficiava os senhores feudais:

“Se no calor do momento ou num estado alterado alguém cometesse uma ofensa à decência, a moral vigente ou a religião, ou injuriasse ou matasse, uma reunião solene de homens livres era formada para proceder ao julgamento e fazer o julgado pagar, de modo que a vingança das partes injuriadas não evoluísse para o sangue ou anarquia. Mas a questão da fiança residia na maioria dos malfeitores, pois os mesmos não tinham bens suficientes para pagar a fiança, então estes eram submetidos aos castigos corporais, esta modalidade de pena apenas beneficiava uma determinada classe”.

Com o passar do tempo, a população começou a repudiar a forma pela qual o Estado executava as penas através do suplício. Mas foi somente na segunda metade do séc. XVII que começaram a nascer correntes de pensamento que lutaram contra a crueldade e os abusos que eram aplicados na pena pela figura do Estado.

Aníbal Bruno7 salienta a importância do direito canônico na evolução da pena:

O direito canônico teve uma importância muito acentuada na história da pena, a igreja na idade média crescia em domínio e poder, estabelecendo-se assim até na disciplina de fatos considerados como crime, tendo desta forma influência na prática da justiça punitiva, contribuindo para a disciplina da repressão anticriminal e o fortalecimento da autoridade pública, pelo combate da prática da vingança privada com a instituição de tréguas e dos asilos religiosos.

2.2 Período Humanitário

Cabe ressaltar que o Direito Canônico muito contribuiu para a humanização da pena, pois, além de se opor às formas banais da aplicabilidade das sanções pelo suplício, ele deu início ao uso da prisão como pena-fim, através do confinamento aos monges que ficavam presos em mosteiros, rezando como forma de se redimirem de seus pecados. Portanto, por influência da Igreja é que se acolheu a pena de prisão. Mas, por mais que a Igreja Católica contribui para o nascimento de um sistema punitivo mais digno, essa também utilizou-se da pena como instrumento de terror. Tal faceta foi apresentada na época da Inquisição, onde julgou, perseguiu e puniu acusados de heresia; as sanções aplicadas variavam desde a obrigação de fazer uma retratação pública ou uma peregrinação a um santuário, ou até mesmo o confisco de bens. A pena mais severa era a prisão perpétua, podendo ser convertida pelas autoridades civis em execução na fogueira ou na forca em praça pública.

Destarte, com a influência do Direito Canônico, a prisão deixou de ser apenas uma maneira de segurar o condenado antes de cumprir a sua pena corporal, constituindo-se como instituição. Métodos de punição começaram a sofrer mudanças no século XVIII e princípios do século XIX, acarretando a passagem à modalidade da penalidade de detenção, que se tornou um marco importante para a história da pena, momento em que começou a haver um maior acesso à humanidade da pena8.

Foucalt9 descreve a chegada da prisão como uma medida capaz de extinguir, de certa forma, os suplícios, buscando corrigir os indivíduos:

“A prisão foi desde o inicio uma (detenção legal) encarregada de um suplemento corretivo, ou ainda uma empresa de modificação dos indivíduos que

a privação de liberdade permite fazer funcionar no sistema legal. Em suma, o encarceramento penal desde o início do século XIX, recobriu ao mesmo tempo a privação de liberdade e a transformação técnicas dos indivíduos”.

O período humanitário da punibilidade fortaleceu-se e tomou forma quando correntes iluministas e humanitárias, das quais faziam parte Voltaire, Montesquieu e Rousseau, comandaram um movimento que propôs a reforma do sistema punitivo. Estes, através de suas ideologias, lutaram contra um cenário em que reinava a preocupação com a defesa do soberano e dos seus protegidos, o arbítrio judicial, a desigualdade das classes frente à punição e a excessiva crueldade das penas. Esse movimento de reforma teve seu apogeu na Revolução Francesa, em 1789, que influenciou outros filósofos, como Beccaria.

Em meados do século XVIII, o descontentamento e o protesto frente à forma de como as penas eram aplicadas, encontrava-se em todas as classes sociais, originando-se através deste clamor social a necessidade do nascimento de novas modalidades de punição, que substituíssem o suplício, conforme observa Foucalt10:

“O protesto contra os suplícios é encontrado em toda parte na segunda metade do século XVIII: entre os filósofos e teóricos do direito; entre juristas, magistrados e a parlamentares; no chaires de deléonces e entre os legisladores das assembléias. É preciso punir de outro modo: eliminar essa confrontação física do príncipe e a cólera contida do povo, por intermédio do supliciado e do carrasco. O suplicio tornou-se rapidamente intolerável. Revoltante, visto da perspectiva do povo, onde ele revela a tirania, o excesso, a sede de vingança e o cruel prazer de punir. Vergonhoso, considerado da perspectiva da vítima, reduzida as desespero e da qual ainda se espera que bendiga “o céu e seus Juizes por quem parece abandonada”. Perigoso de qualquer modo, pelo apoio que nele encontram, uma contra a outra, a violência do povo e do rei. Como se o poder soberano não visse, nessa emulação de atrocidades, um desafio que ele mesmo lança e que poderá ser aceito um dia: acostumado a ver correr sangue, o povo aprende rápido que só pode se vingar com sangue. Nessas cerimônias que são objeto de tantas investidas adversas, percebem-se o choque e a desproporção entre a Justiça armada e a cólera do povo ameaçado”.

Este período ficou marcado pelos movimentos revolucionários conduzidos por filósofos, que pretendiam a reforma do sistema punitivo. Martins11 assim o descreve:

“Um dos pilares dessa filosofia, foi Cesare Bonesana, Marquês de Beccaria, que editou obra que consistiu no símbolo da reação liberal ao desumano panorama penal então vigente, elaborando princípios que se firmaram como a base do direito penal moderno, alguns adotados pela Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, na Revolução Francesa. Com relação às penas, disse da impossibilidade da implementação de punição que atinjam direitos não cedidos pelos cidadãos à sociedade, repudiando as penas de morte e cruéis; disse da necessidade das leis estipularem as penas, evitando-se o arbítrio judicial; repudiou as penas de confisco, as quais transcendem à pessoa do condenado, assim como as infantes, propugnando que as penas não fossem utilizadas somente para a intimidação, mas para recuperar o delinqüente”.

Becaria foi um dos ilustres pensadores que este período teve a seu lado. A sua ideologia consistia na concepção de que “as penas que ultrapassam a necessidade de conservar o depósito da salvação pública, são, por sua própria natureza, injustas; e tanto mais justas são as penas, quanto mais sagrada e inviolável é a segurança e maior a liberdade que o soberano conserva para os seus súditos12”. Também entendia que não era a dureza da pena que impedia a reincidência, mas a certeza da punição.

Mas quem muito contribuiu e desempenhou um papel fundamental à humanização da pena, foi a Escola Clássica. Ela era formada através de um sistema de idéias e teorias políticas e filosóficas sobre as principais questões penais, conforme, a seguir, será abordado.

2.2.1 Escola Clássica

A obra “Dos delitos e das Penas” de César Beccaria abriu caminho ao movimento da Escola Clássica. Tal Escola deve ser considerada como um dos marcos do surgimento da luta pelos direitos da humanização da pena, visando-se o fim dos suplícios. Para ela o crime não era um ente de fato, e, sim, uma entidade jurídica; não se tratava de uma ação, mas de uma infração.

A Escola Clássica tinha como ideologia os fundamentos políticos-filosóficos que contrariavam o absolutismo (liberalismo); defendiam os direitos individuais, bem como o princípio da reserva legal, a oposição a tratamentos degradantes na aplicação da pena e ao processo inquisitório. Esta ideologia era defendida por doutrinadores como César Beccaria, Filangieri, Rossi, Carmigini, Francesco Carrara.

Esta Escola via a questão da pena como a retribuição para a restauração da ordem abalada pelo crime; portanto, a Escola Clássica adotou as sanções com sentido utilitário. Ela observava o crime como um ente jurídico, porque este constituía a violação da norma legal, atingindo um direito qualquer, resultando da vontade livre do homem. Há de ser destacado que a Escola Clássica caracterizou a medida da pena através da gravidade dos elementos materiais e morais, ou seja, a pena tem que ser proporcional ao crime13.

Também merecem citação nesta Escola as idéias do filósofo inglês Jeremy Bentham, que escreveu a obra “Teoria das Penas e Recompensas” em 1818. Para este filósofo, a pena aplicada através do suplício seria tanto um mal individual como coletivo. Propugnava pela pena de prisão como castigo suficiente para o agressor, buscando afastar, então, a aplicabilidade da pena corporal.

Por volta da metade do século XIX, deu-se a passagem do Período Humanitário para o Período Científico, começando a ser trilhado outro caminho para o estudo do Direito Penal, tendo como característica principal a busca pelos motivos que levam o ser humano a delinqüir. Neste período, destacou-se a Escola Positiva.

2.3 Período Científico

Martins14 comenta o nascimento do Período Científico, pela seguinte ótica:

“Mais recente, no crepúsculo do séc. XIX, estabeleceu-se o que foi chamado de movimento científico, de que a maior expressão foi CESARE LOMBROSO, com a sua obra “O Homem Delinqüente”, buscando-se compreender cientificamente os fenômenos criminais e o próprio infrator. Assentava-se que as normas penais deveriam ser utilizadas como forma de defesa da sociedade constituída contra aqueles que, por força de seu comportamento, personalidade denotassem tendência para práticas criminosas, abandonando-se a idéia da utilização das reprimendas como forma retributiva, para emprestar-lhes o caráter de meios de tratamento individualizado do criminoso, como também de defesa social, acautelando-se contra ele”.

Dentro deste período está inserida a Escola Positiva, conforme, a seguir, será abordada.

2.3.1 Escola Positiva

Esta Escola fixou seus fundamentos político-filosóficos na oposição ao liberalismo, no desenvolvimento das ciências positivas do século XIX e no predomínio do conhecimento racional (dogmática, a fonte principal do conhecimento é a razão, o pensamento). A corrente positivista pretendeu aplicar uma nova orientação aos estudos biológicos e sociológicos sobre o delinqüente, chegando, assim, ao suposto verdadeiro nascimento da Criminologia.

César Lombroso, médico italiano, foi um dos fundadores desta Escola, assim como Ferri e Garofolo.

A idéia inicial de Lombroso foi a do criminoso nato. Para ele, o delinqüente verdadeiro é uma variedade particular da espécie humana, um tipo definido pela presença constante de anomalias anatômicas e fisiopsicológicas. Essa concepção caracterizou-se como o ponto de partida e o núcleo do movimento da Escola Positiva. Lombroso reconheceu que os estigmas arrolados, não que determinantemente indicassem que qualquer pessoa que tivesse algum destes caracteres fosse um criminoso, pois existem indivíduos honestos e normais que apresentam alguns desses. O fato é que, porém, os estigmas são encontrados em proporção muito maior entre os criminosos.

Esta Escola considerava a pena de forma genérica, todas elas sob a forma de defesa social. Já frente ao crime, a concepção é de que este é a conseqüência da conjugação dos fatores antropológicos, físicos e sociais, sendo, portanto, um ato humano15.

Prado e Bitencourt16 salientam algumas das contribuições que a Escola Positiva trouxe ao Direito:

“a) a descoberta de novos fatos e a realização de experiências ampliaram o conteúdo do direito; b) o nascimento de uma ciência causal-explicativa: a criminologia; c) a preocupação com o delinqüente e com a vítima; d) uma melhor individualização das penas (legal, judicial e executiva); e) o conceito de periculosidade; f) o desenvolvimentos de institutos como a medida de segurança, a suspensão condicional da pena e o livramento condicional; e g) o tratamento tutelar ou assistencial do menor’.

A partir dessa Escola, nascem a Terceira Escola, a Escola Moderna Alemã, bem como outras, que vão se moldando na busca de constituírem paradigmas penais, condizentes com a realidade da época e de seu avanço cultural, para que, assim, a pena possa reger as atividades humanas, de acordo com os interesses sociais.

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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

BRANDINI, Rafael Santin. Penas alternativas: uma nova alternativa?. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 3942, 17 abr. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/27757. Acesso em: 21 nov. 2024.

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