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Função estética da paisagem urbana:

o direito fundamental à beleza paisagística

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20/05/2014 às 16:25
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CONSIDERAÇÕES FINAIS

De tempos em tempos, o Direito se sensibiliza ante os anseios mais urgentes que pulsam do eterno dinamismo social e os positiva sob o manto dos direitos fundamentais, reconhecendo esses valores como pressupostos da proteção da dignidade da pessoa humana e, com efeito, norteadores da ordem jurídica.

Enquanto conjunto de normas que, orientado por valores, tem por objetivo maior reger a vida em sociedade, o Direito tem se deparado com um valor indispensável à persecução da qualidade de vida humana, qual seja, o valor estético da paisagem, capaz de resgatar o indivíduo das agruras citadinas e proporcionar-lhe um alívio revigorante, mesmo que momentâneo.

Por essa razão, é impositivo que a paisagem urbana, microbem ambiental, seja reconhecida com a peculiar proteção e robustez jurídica própria dos direitos fundamentais, dotados de posição de supremacia entre as normas constitucionais, vetores da convivência social e blindados contra qualquer tentativa do legislador de aboli-los.

Gradativamente, o ordenamento jurídico brasileiro começa a atribuir maior relevância ao combate à poluição visual, enxergando-a como um dos algozes da qualidade de vida almejada pelo texto constitucional. Contudo, ainda é necessária a conscientização mais sólida de toda a coletividade acerca da premência de se conter a degradação estética da paisagem, a partir do conhecimento dos efeitos significativos que a percepção visual tem sobre o ser humano.

Assim, é dever de todos, coletividade e Poder Público, lutar pela contenção do modelo de cidades orientadas essencialmente pelo urbanismo funcionalista que negligencia o valor estético e as suas implicações na saúde psíquica e espiritual do ser humano, razão pela qual o incremento legislativo deve vir associado também a uma mudança de paradigma social, de maneira que os interesses econômicos não mais prevaleçam absolutos sobre a tutela ambiental.

Para tanto, não é preciso propugnar uma cisão entre o desenvolvimento econômico e a proteção ambiental, sob pena de se incorrer numa percepção romantizada que por vezes retira a credibilidade do discurso ambientalista, mas sim tentar buscar a conjugação simbiótica e pragmática dos dois elementos, a fim de alcançar o imprescindível entrosamento entre crescimento econômico e valorização da paisagem urbana.

A paisagem urbana, com sua função estética, já se provou verdadeira exigência da dignidade humana, corolário do direito à vida e pilar da noção de sustentabilidade, uma vez que não se pode viver em plenitude sem a interação que só o belo é capaz de promover entre o indivíduo e os aspectos mais sutis da existência, num tempo em que a modernidade verticalizou o cenário urbano e afastou o homem da sua primordial conexão com a natureza.

Sendo a estética um valor intrínseco à paisagem, resta evidente a influência da beleza paisagística no sentir de cada ser humano, que cotidianamente é impactado pelas paisagens urbanas, sofrendo as influências diretas dessa percepção. Assim, o belo revela sua essencialidade na medida em que é capaz de atenuar o desgaste psicológico e devolver a paz e a serenidade perdidas para as frustrações cotidianas.

A importância cada vez mais evidente de se proteger a paisagem urbana e seu valor estético se coaduna com o dinamismo e o caráter social que perpassam todo o fenômeno jurídico, porquanto estamos diante de um bem já revelado indispensável e essencial à ampla proteção do meio ambiente e, consequentemente, à proteção da vida em todas as suas formas.

As cidades atreladas à harmonia estética viabilizam o equilíbrio psíquico e são, desta forma, essenciais para a qualidade de vida dos seus cidadãos, que podem, a partir daquilo que seus olhos contemplam, usufruir da sua familiaridade com a natureza e das belezas que só a Terra foi capaz de construir.

A presença é necessária para tomarmos consciência da beleza, da majestade, do aspecto sagrado da natureza. Você alguma vez contemplou o espaço infinito em uma noite clara, estarrecido por sua calma absoluta e incrível vastidão? Já escutou, de verdade, o som de um riacho numa montanha na floresta? Ou o som de um melro ao cair de tarde em uma tranquila tarde de verão? Para perceber tudo isso a mente tem que estar serena. Você tem que se despojar por um momento da sua bagagem pessoal de problemas, do passado e do futuro e também do seu conhecimento. Do contrário, você olhará mas não verá, ouvirá mas não escutará. Estar totalmente presente é fundamental. (TOLLE, p.97)


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Sobre o autor
Felipe Augusto Rocha Santos

Bacharel em Direito pela FDV - Vitória

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SANTOS, Felipe Augusto Rocha. Função estética da paisagem urbana:: o direito fundamental à beleza paisagística. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 3975, 20 mai. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/28658. Acesso em: 25 abr. 2024.

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