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Contratar um profissional capacitado ou capacitar um bom empregado?

Os tribunais trabalhistas conduzem à resposta

11/01/2015 às 10:03
Leia nesta página:

Há vagas de emprego, mas não há candidatos capacitados para tanto. Será que o Judiciário apoia as empresas que capacitam seus empregados?

Quando o assunto é contratação de empregados é inegável a dificuldade latente das empresas em encontrar um profissional capacitado com as expertises necessárias à vaga que possuem em aberto. A fase atual do país torna realidade uma situação que até então era estranha ao mundo empresarial: há vagas de emprego, mas não há candidatos capacitados para tanto.

A solução encontrada pelos empresários que possuem consciência social e visão de seu negócio como um todo é capacitar aqueles empregados que não tiveram oportunidade de estudo e qualificação profissional, mas que conhecem a empresa e mantêm a mente voltada para os objetivos do grupo. O investimento não só supre uma necessidade do empregador como também aumenta a motivação do empregado, que progride intelectual, hierárquica e financeiramente, qualifica-se e descobre um novo talento.

Além disso, partindo do pressuposto de que se trata de uma opção do empregado, é normal que se elabore um contrato onde o mesmo se compromete a permanecer na empresa durante um determinado período após a conclusão da graduação, a fim de que seja possível desenvolver o trabalho para o qual o empregador investiu. Tal prazo usualmente é de dois anos e, se descumprido, ocasiona a cobrança do valor investido considerando a proporção do tempo em que foi possível usufruí-lo.

Ou seja, a empresa aposta e investe. O empregado aproveita esta vantagem e torna-se o profissional que o mercado de trabalho tem em falta. Em contrapartida, após o término da qualificação, o trabalhador, que agora recebe um salário mais alto pelo novo grau de instrução que possui, precisa desenvolver o seu trabalho dentro do ambiente empresarial pelo período de dois anos.

Parece ótimo. Uma forma clara e justa de o empresário auxiliar o Estado no seu dever de educação e qualificação profissional do povo brasileiro, incentivando e investindo no estudo e melhoria de vida da população. Para o empregado é a chance de tornar-se um profissional, de fazer a faculdade e a especialização com a qual tanto sonha, de aprender um novo idioma ou fazer um curso no exterior. É a oportunidade de fazer tudo o que suas condições financeiras não permitiriam que fizesse e, em razão disso, melhorar sua posição social e a vida de sua família.

Mas a equação de felicidade termina por aí.

Trabalhando no meio jurídico o que temos visto são profissionais que permanecem na empresa até o encerramento de suas dispendiosas especializações e, já qualificados, pedem demissão para trabalhar na concorrência por um salário um pouco mais alto, um horário de trabalho mais flexível ou, ainda, para abrir seu próprio negócio e se tornar, ele mesmo, o concorrente.

Havendo contrato, com a quebra do mesmo e da confiança depositada, cabe à empresa descontar na rescisão contratual, no todo ou em parte, o valor gasto com a qualificação do profissional que hoje produz para a concorrência.

Esse desconto é totalmente válido, já que é impossível que as empresas tenham interesse na qualificação de seus funcionários se não poderão se utilizar deste conhecimento, apenas preparando a mão de obra sem uma perspectiva de retorno.

Porém, os Tribunais Trabalhistas em nosso país entendem ser o desconto totalmente indevido.  Condena-se a empresa à devolução do todo ou da parte que excede a um salário base, acrescida de danos morais em razão do desconto ou cobrança dos valores.

Isso não se verifica somente no Tribunal Regional do Trabalho do Rio Grande do Sul, mas também nos demais Tribunais, inclusive o Superior, onde até o presente momento houve somente uma decisão favorável à empresa, jamais repetida.

Por não haver norma que preconize essa possibilidade, alegam que a Constituição Federal concede a liberdade para o trabalho, razão pela qual o trabalhador poderá sempre escolher onde irá trabalhar.

De fato, o trabalhador possui essa liberdade. Mas é esta mesma liberdade que nos leva ao princípio da boa fé presente nos atos da vida civil, principalmente quando há um ajuste contratual realizado por pessoas capazes e com total conhecimento do que estavam fazendo, tornando o contrato uma fonte voluntária da relação de emprego, livremente ajustada e totalmente válida ante a sua função social (art. 421 do Código Civil).

Recentemente, os empresários gaúchos se depararam ainda com uma cobrança inusitada da nossa Previdência Social onde a mesma, descobrindo o pagamento de cursos aos trabalhadores, definiu tal pagamento como salário in natura, integrando a remuneração e, portanto, o cálculo do valor devido a título de contribuição previdenciária.

Infelizmente, o sistema em que vivemos não admite exceções, não acredita na boa fé, estimula o enriquecimento injusto e corrobora a ilícita quebra de contrato (ilícito penal, pode-se dizer, ante a aplicação analógica do art. 195 da Lei 9.279/96).

O que vemos em reclamatórias trabalhistas que envolvem o assunto é a certeza de que o sucateamento da mão de obra no Brasil advém da ausência de conscientização geral de todos os Poderes e do cidadão. O que vemos é o desestímulo de todo aquele que opta por suprir a escassez profissional no país e a vitória do famoso “jeitinho brasileiro” de tirar vantagem das situações.

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Obviamente, precisamos de uma reforma trabalhista, mas será que ela poderá ter o condão de derrubar alicerces tão profundos da nossa sociedade? Não se sabe.

A jurisprudência dos nossos Tribunais Pátrios leva o empresariado a refutar cada vez mais a concessão do benefício. Contudo, insistimos em repassar a todos que nos consultam a seguinte sugestão: desligue-se da ideia antissocial imposta pelo Judiciário e aposte nas pessoas.

Enquanto houver um cidadão de bem imbuído na missão quase impossível de tornar este País melhor, maior e mais rico (de dinheiro e de educação), manteremos a esperança de que a Justiça, cansada dos mesmos argumentos em casos análogos, retire a venda de seus olhos e analise melhor as situações, admitindo as relações que fogem do legislado e reconhecendo o trabalhador como ser pensante que é, sem mais relega-lo à condição de fraco e incapaz de assumir as obrigações que ele próprio contrata.

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Sobre a autora
Kerlen Caroline Costa

Advogada inscrita na OAB/RS sob o nº 66.121, graduada em direito pela Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões no ano de 2004, pós graduada em direito do trabalho e direito processual do trabalho pela mesma instituição e especialista em direito previdenciário pela Fundação Getúlio Vargas. <br>Advogada integrante da Equipe Trabalhista e Gestão de RH do Scalzilli.FMV Advogados Associados, localizado na cidade de Porto Alegre/RS, mas com atuação em todo o país.<br><br>

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

COSTA, Kerlen Caroline. Contratar um profissional capacitado ou capacitar um bom empregado?: Os tribunais trabalhistas conduzem à resposta. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 20, n. 4211, 11 jan. 2015. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/30114. Acesso em: 22 dez. 2024.

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