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MTE e MPT: reação diante de infrações trabalhistas praticadas por empresas do setor da construção civil no Amazonas

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15/12/2014 às 12:01
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CONSIDERAÇÕES

Em conclusão, a quantidade de acidentes do trabalho que atingiu o setor da construção civil no Estado do Amazonas, relatada acima, não foi acompanhada de um comportamento repressivo por parte das instituições de vigilância do trabalho.

O comportamento das instituições de vigilância do trabalho – abrangendo o MPT e o MTE - no combate à precarização das relações de trabalho no setor da construção civil no Estado do Amazonas chegou mesmo a incentivar o desrespeito à legislação.

O MPT e o MTE amazonense não sancionaram as empreiteiras diante de infrações formalmente constatadas às normas que tutelam a saúde do trabalhador, ou quando o fizeram, não aplicaram sanções em valor significativo.


Referências:

CARDOSO, Adalberto; LAGE, Telma. As normas e os fatos. Rio de Janeiro: FGV, 2007.

CASAGRANDE, Cassio L.; ARAÚJO, Adriane, PEREIRA, Ricardo José M. de B. Ações Civis Públicas no TST: Atuação do Ministério Público do Trabalho e dos Sindicatos em Perspectiva Comparada. Rio de Janeiro, Escola Superior do Ministério Público da União, 2006

FILGUEIRAS, Vitor. Estado e Direito do Trabalho no Brasil: Regulação do Emprego entre 1988 e 2008. Salvador, UFBa-FFCH, 2012


Notas

[1]Maiores taxas de mortalidade no Amazonas no quinquênio 2007-2011. Os CNAEs assinalados em verde são da construção e os em vermelho da indústria da transformação (em preto são outros). Elaborada pelo auditor-fiscal do Trabalho Josemar Franco, 2013 (SRTE/AM)

2007

2008

2009

2010

2011

1094

4631

4292 (montagem de instalações industriais)

5022

4632

4662

151

4743

810

3702

5239

5231

4110 (incorporação e empreendimentos imobiliários)

4222 (construção de redes de abastecimento de água)

4784

8122

4722

1610 (desdobramento de madeira)

2732 (fabricação de material elétrico)

2320 (fabricação de cimento)

4641

4221 (obras p/ geração de energia elétrica)

4520

4299 (construção de instalações esportivas)

2949

1069

722

1413

1921 (fabricação de derivados do petróleo)

4211 (construção de rodovias e ferrovias)

3512

4322 (instalações hidráulicas)

2599 (confecção de armações metálicas)

4682

5021

2342 (fabricação de azulejos e pisos)

4212 (construção de obras de arte)

4221 (obras para geração de energia elétrica)

4211 (construção de rodovias e ferrovias)

7020

4221 (obras para geração de energia elétrica)

600

3011 (construção de embarcações)

600

4321 (instalação e manutenção elétrica)

4922

2342

4299 (construçao de instalações esportivas)

4321 (instalação e manutenção elétrica)

2511 (fabricação de estruturas metálicas)

[2]Pelo sétimo ofício já passaram ao todo 901 procedimentos em toda a sua existência conforme dados do MPT Digital.

[3]O sistema MPT Digital não permite aferir a totalidade de procedimentos do ramo da construção civil ativos, ou em sua totalidade (ativos e inativos) que já passaram por aquela Procuradoria. Apenas a aferição pelo nome do Investigado permitiu um conhecimento imperfeito acerca da atividade econômica por ele desenvolvida. É isto que foi feito em relação ao sétimo ofício. Nenhum dos procedimentos analisados estava sob sigilo, fator que a lei impediria a divulgação das informações. Considera-se aqui procedimentos ativos aqueles que foram arquivados mas se encontram disponíveis fisicamente para consulta. Estes procedimentos foram arquivados no sistema MPT Digital, mas puderam ser consultados. Há procedimentos que foram arquivados e não se encontram disponíveis porque já estão no que se intitula de “arquivo morto”.

[4]Em verdade, esse percentual pode ser muito maior, uma vez que durante aproximadamente 3 anos, somente o sétimo ofício recebeu procedimentos envolvendo meio ambiente do trabalho, de forma que a amostra coletada se mostraria ainda mais representativa de um padrão de atuação. Pela procuradoria regional da 11a Região, em todo o seu histórico de existência, já passaram mais de 14.014 procedimentos genéricos, envolvendo todo e qualquer tipo de atividade econômica. Dados do MPT Digital. Durante o período pesquisado, mais de 8 (oito) procuradores estiveram à frente do 7o ofício da Procuradoria Regional do Trabalho, o que afasta a possibilidade de comportamentos individuais heterodoxos terem influenciado esta conclusão. Além disso, outros procedimentos pertencentes a ofícios diversos foram redistribuídos para o sétimo ofício, o que implica na análise do comportamento de um número ainda maior de procuradores do trabalho.

[5]Banco de dados informatizado, constituído pelo Ministério do Trabalho em 1995 para compilação das informações sobre a fiscalização do trabalho, e, desde o ano de sua formatação, contempla dados sobre todas as fiscalizações realizadas pelo MTE. (Filgueiras, 2012)

[6]Pela quantidade de empregados informada no SFIT.

[7]Não se deve esquecer que os valores das multas administrativas do MTE, além do seu valor intrinsecamente baixo, estão há 15 anos sem reajuste. De acordo com o anexo II, da Portaria 290 de 1997, o valor máximo das multas relativas a segurança e medicina do trabalho não chega a R$ 6.304,47. Deve ser levado em conta, ainda, que é possível o pagamento destas multas com desconto de 50%, de forma que o valor máximo de uma multa chega a R$ 3.152,24. Toda multa administrativa do Ministério do Trabalho e Emprego tem início com a lavratura do auto de infração pelo auditor-fiscal. Esse auto de infração passa por um procedimento interno de revisão, em que o autuado tem direito a apresentar defesa e provar as suas alegações. Confirmada a legalidade do auto de infração, o Superintendente Regional do Trabalho impõe a penalidade. A quase totalidade dos autos de infração lavrados são convertidos em multas administrativas. Para esta pesquisa, a fim de facilitar o entendimento, as expressões autos de infração (documento formal que inicia o procedimento de imposição de multas administrativas) e multas administrativas (sanção pecuniária decorrente da lavratura de um auto de infração) foram utilizadas de forma sinônima.

[8]No entanto, deve ser dito que não houve fiscalizações com frequência igual ou superior a 1 em todas as empresas; por outro lado, algums empresas foram fiscalizadas com maior frequência durante o espaço de tempo de um ano.

[9]É mesmo natural que assim seja, porquanto são os itens legais que mais tem relação com essa atividade empresarial. Neste ponto, o objeto das fiscalizações mostrou-se coerente com o perfil da atividade econômica desempenhada pelas empresas de construção civil.

[10]Dentre as 29 empresas analisadas, em 27 delas houve fiscalização por parte dos auditores fiscais do trabalho. Logo, esse foi o número total de ações fiscais que permitiram aferir a proporção de orientações com concessão de prazos.

[11]E isso não se relaciona com o dispositivo legal que veda a autuação na primeira visita a um estabelecimento (Art. 627 - A fim de promover a instrução dos responsáveis no cumprimento das leis de proteção do trabalho, a fiscalização deverá observar o critério de dupla visita nos seguintes casos: a) omissis b) em se realizando a primeira inspeção dos estabelecimentos ou dos locais de trabalho, recentemente inaugurados ou empreendidos) Conforme Nota Técnica de n. 62 da Secretaria de Inspeção do Trabalho, o critério orientador, sem aplicação de multas, somente se dá em situações que permitam a correção da irregularidade de forma retroativa no tempo, o que não é o caso das irregularidades encontradas em canteiros de obras. Da mesma forma, as situações encontradas estão relacionadas a itens legais tidos como graves, como ausência de proteções coletivas, andaimes irregulares, situações que ensejam risco de vida aos trabalhadores. Essas situações também não permitem a mera orientação sem lavratura de autos. Por fim, como veremos, mesmo na segunda inspeção aos canteiros de obras, o procedimento meramente orientador também é hegemonico. Logo, não houve qualquer vinculação entre a conduta da Fiscalização e o dispositivo da CLT.

[12]Apesar da legislação prever o procedimento da dupla visita por parte do fiscal do trabalho, continua sendo uma reivindicação constante dos empresários das MPE a fiscalização pedagógica, como verificou-se pela sistematização das propostas do Seminário realizado pelo Sebrae com empresários em MPE de todo o país5. Essa persistência da demanda pode ser um indicador de que esteja ocorrendo uma falha de comunicação dos órgãos responsáveis pela implementação e cumprimento das normas do trabalho, o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) e as Delegacias Regionais do Trabalho (DRTs) junto ao setor empresarial, mais precisamente, junto ao segmento das MPE (Krein, Biavaschi e outros, disponível em < http://www.eco.unicamp.br/cesit/images/stories/TextoParaDiscusso19.pdf> acesso em 08.07.2013)

[13]Art. 628. Salvo o disposto nos arts. 627 e 627-A, a toda verificação em que o Auditor-Fiscal do Trabalho concluir pela existência de violação de preceito legal deve corresponder, sob pena de responsabilidade administrativa, a lavratura de auto de infração

[14]Superintendência Regional do Trabalho e Emprego no Amazonas

[15]Para quatro empresas, não houve fiscalização posterior, de forma que somente se pode considerar para a análise estas 25 possíveis.

[16]O salutar critério da dupla visita corporifica uma das finalidades institucionais da fiscalização do trabalho, qual seja, a orientação dos empregadores no cumprimento das normas trabalhistas, especialmente as normas de segurança e medicina do trabalho, que é campo dos mais tormentosos na rotina da empresa. (disponível em< http://www.trt3.jus.br/escola/download/revista/rev_70_II/Vander_Vale.pdf> acesso em 08.07.2013).

[17]Esse dado deve ser relativizado porquanto, como dito acima, esse percentual envolve ainda fiscalizações em empresas em que não houve formalização da aferição do item fiscalizado (o auditor-fiscal não apôs no sistema SFIT do MTE a informação de que o item fiscalizado estava regular; ele apenas não disse que estava irregular), não se permitindo averiguar se houve ou não posterior cumprimento efetivo da legislação de segurança e saúde no trabalho com certeza.

[18]I.Por óbvio, não se pode desconsiderar que a maior constatação de infrações pode ter decorrido de inúmeros motivos, tais como auditores fiscais mais preparados, por conta de cursos de qualificação, ou lançamentos de dados mais detalhados no SFIT. No entanto, ainda que considerados estes fatores, é de extrema relevância o fato de que, com o passar do tempo, e com a adoção da postura não-punitiva, tenha havido um aumento na quantidade de itens irregulares.

II. Em pelo menos um item da legislação houve reincidência nas ações fiscais, além da ampliação das infrações.

III.O incremento leva em conta a ampliação do número de infrações constatadas pelo critério cronológico. Assim, é possível que na primeira fiscalização tenham sido encontradas um número determinado de irregularidades (x), na segunda esse número dobra, e na terceira ação fiscal esse número é reduzido. Ainda assim consideramos que houve incremento em face da relação existente entre a quantidade de infração relativas à primeira e segunda ação fiscal.

[19]Isto não significa, por óbvio, que o meio ambiente de trabalho das demais empresas (22) encontra-se saudável e seguro.

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[20]São exemplos disso, as infrações relacionadas por Filgueiras (2012). Estas infrações, historicamente, são aquelas que mais ensejaram embargos por parte da Fiscalização do Trabalho. A nível nacional, como também no Estado do Amazonas, deveriam ensejar, em tese, a suspensão de atividades.

Tabela 8.2 - Itens de risco grave e iminente irregulares, percentual de interdição ou embargo, Brasil, anos selecionados:

Item 1996 2000 2004 2008
Proteção coletiva, queda 18.13.4 8,7% 26% 22,3% 27%
Abertura no piso, 18.13.2 7,1% 22,0% 14,9% 19,2%
Andaime sem guarda-corpo 11,1% 32% 32,2% 32,2%
Abertura nr 8       2,7%

Fonte: SFIT, elaboração própria (os itens com * são considerados expressamente de grave e iminente risco pela respectiva Norma Regulamentadora)

[21]Não estamos falando de itens individuais de SST que foram notificados sem autuação. Estamos falando de ações fiscais que costumam envolver mais de uma dezena de itens fiscalizados.

[22]Mas poderia ter sido, uma vez que o auditor-fiscal, quando inspeciona um canteiro de obras, tem a praxe de verificar o livro de inspeção do trabalho aferindo se aquela empresa já foi previamente orientada quanto a itens legais descumpridos.

[23]Houve uma média de 7,28 ações fiscais meramente orientadoras para cada uma das empresas fiscalizadas.

[24]Mesmo procuradores do trabalho têm consciência de que o que está no cerne do descumprimento das leis trabalhistas é o aspecto pecuniário. Não fosse assim, os TACs não teriam previsão de multas pecuniárias.

[25]Somente no ano de 2011, foram arquivados 23.061 procedimentos no MPT. Desses, 19.939 foram arquivados sem termo de ajustamento de conduta. Apenas 2657 ações foram ajuizadas em contrapartida. Disponível em <http://www.cnmp.gov.br/portal/images/stories/RetratoMP.pdf > acesso em 08.06.2013). O arquivamento do procedimento também é considerado uma conduta válida, por conta do que se intitula independência funcional.

[26]Neste sentido temos a Lei n. 7.347/85 e a Resolução n. 69 do CSMPT

[27]Isto quando se chegava a formalizar esse instrumento com o infrator. Como veremos, foram encontradas inúmeras situações em que o procedimento foi arquivado sem qualquer instrumento.

[28]Os demais foram sumariamente arquivados ou a empresa não foi localizada.

[29]É no mínimo curioso notar a boa vontade do infrator em adequar a sua conduta com a autoridade que tem por atribuição a própria responsabilização do agente do ato ilícito, quando a adequação dessa conduta não implica em qualquer prejuízo financeiro.

[30]Busca-se aqui, também, tentar explicar a razão para a facilidade com que o MPT logrou êxito em firmar compromissos com os infratores. A razão disso nos parece óbvia: a firmatura de um termo de compromisso não envolveu nos procedimentos analisados qualquer custo para a construtora que descumpriu a lei.

[31]As empreiteiras e seus advogados, ao longo de anos lidando com o MPT, adquirem de antemão o conhecimento de que o descumprimento dos TACs não enseja o pagamento de multas dele decorrentes (quando muito, multas cobradas administrativamente são sensivelmente reduzidas). Essa informação é crucial para a decisão empresarial de firmar ou não um termo de ajustamento de conduta.

[32]Dentre 20 hipóteses possíveis, foi constatado novo descumprimento à legislação em 18 delas.

[33]Convencionamos chamar de reincidência genérica o descumprimento de normas trabalhistas após a instauração de procedimento junto ao MPT visando apurar a irregularidade, mesmo que não tenham sido as mesmas normas trabalhistas violadas.

[34]Aqui abre-se um dilema. Poder-se-á argumentar que não houve indenização por danos morais coletivos pelo fato de que a lesão não maculou direitos difusos, coletivos ou individuais homogêneos. No entanto, se não houve qualquer lesão a direitos fundamentais da coletividade, mesmo a legitimidade do MPT para agir nestas hipóteses deveria ter sido questionada. Uma coisa ou é, ou não é.

[35]Convencionamos chamar de reincidência específica aquela que ocorre após o descumprimento do termo de ajuste de conduta, diferenciando-se daquela reincidência constatada (pelo MTE ou pelo MPT) antes ou depois da assinatura do termo de ajuste de conduta.

[36]A premissa largamente utilizada por membros do MPT é no sentido de que os TACs representam uma vantagem em relação às ACPs porquanto contém, como diferencial, o cumprimento espontâneo da legislação por parte do infrator, significando melhorias imediatas e futuras para os trabalhadores por ele atingidos. A ACP, alegam, não teria esse caráter resolutista já que ela implicaria numa demanda judicial longa e com poucas chances de êxito, sem qualquer benefício direto à coletividade de trabalhadores. Mesmo esse último argumento – sem qualquer demonstração empírica - é completamente equivocado porque desconsidera, mesmo abstratamente, a possibilidade de concessão de tutela antecipada nas ações civis públicas, o que também permitiria benefícios imediatos aos obreiros – além da indenização por danos morais coletivos que os termos de ajuste de conduta não costumam ter.

[37]Não se observou nenhum pagamento de multas decorrente de TACs realizado na esfera administrativa no período.

[38]  Deve-se levar em conta que há uma distribuição de processos entre todos os 40 magistrados locais.

[39]IMPÉRIO, HOSS, PLATINUM e NV ENGENHARIA.

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Sobre o autor
Ilan Fonseca de Souza

Procurador do Trabalho na 5ª Região (Bahia), Especialista em Processo Civil, Mestre em Direito pela Universidade Católica de Brasília. Doutor em Estado e Sociedade pela Universidade Federal do Sul da Bahia.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SOUZA, Ilan Fonseca. MTE e MPT: reação diante de infrações trabalhistas praticadas por empresas do setor da construção civil no Amazonas. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 4184, 15 dez. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/32536. Acesso em: 24 nov. 2024.

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