Antecedentes criminais e decisão penal não transitada em julgado

19/12/2014 às 16:40
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Decisões penais não transitadas em julgado podem ser consideradas como antecedentes criminais, componentes das circunstâncias judiciais, diante do princípio da presunção de inocência?

O  artigo 59 do Código Penal dispõe sobre a fixação da pena. São as chamadas circunstâncias judiciais.

O artigo referenciado, como explicou Paulo José da Costa Jr.(Comentários ao Código Penal, 2ª edição, pág. 309), reconheceu  ao juiz, na aplicação da pena, larga margem de discricionariedade. Mas essa discricionariedade não poderá ser livre, mas haverá de ser vinculada. Essa discricionariedade não é arbitrariedade.

Por certo, há limitações impostas ao juiz, na fixação da pena, pois deverá fazê-lo, primeiramente, dentro das balizadas estabelecidas pelas margens do tipo penal. Ainda deverá  levar em consideração os fatos elencados de maneira taxativa pelo artigo 59 do Código Penal referenciado.

Mas deverá o juiz motivar a sentença.

A pena, sabe-se, deve ser necessária e suficiente para a reprovação e prevenção do crime de forma que ela deverá desencorajar ou intimidar aqueles que pretendem iniciar-se na prática delituosa. Para tanto, deve ser estabelecida com base na intensidade e nos graus de culpabilidade, não podendo igualmente excedê-la. De forma que é a culpabilidade que deverá estabelecer os limites da pena que não poderá ser transposto.

Levam-se em conta na fixação da pena: culpabilidade, antecedentes, conduta social, personalidade, motivos do crime, circunstâncias e consequências do crime; comportamento da vítima.

Os antecedentes criminais são fatos anteriores da vida do agente. Serve este componente, de forma específica, para se verificar se o delito foi um episódio esporádico na vida do sujeito ou se ele, com frequência, ou mesmo de forma habitual, infringe à  lei.  

Prescreve o artigo 5º, LVII, da Constituição Federal, que “toda pessoa se presume inocente até que tenha sido declarada culpada por sentença transitada em julgado”.

Aplica-se o princípio da presunção da inocência, segundo o qual toda pessoa se presume inocente até que tenha sido declarada culpada por sentença transitada em julgado.

Nessa matéria, o Superior Tribunal de Justiça editou a Súmula 444 segundo a qual “é vedada a utilização de inquéritos policiais e ações penais em curso para agravar a pena-base”.

Por sua vez, o artigo 33, § 4º, da Lei nº 11.343/2006, prevê que “nos delitos definidos no artigo caput e no § 1º deste artigo, as penas poderão ser reduzidas de um sexto a dois terços, vedada a conversão em penas restritivas de direitos, desde que o agente seja primário, de bons antecedentes, não se dedique às atividades criminosas nem integre organizações criminosas”.

Observe-se, de toda sorte, que o Supremo Tribunal Federal, no julgamento da ADPF 444/DF, Relator Ministro Celso de Mello, entendeu que “a mera sujeição de alguém a simples investigações policiais(arquivadas ou não) ou a persecuções criminais ainda em curso não basta, só por si- ante a inexistência, em tais situações, de condenação penal com trânsito em julgado  - para justificar a exacerbação da pena, pois com o trânsito em julgado, descaracteriza-se a presunção “juris tantum” de inocência do réu, que passa, então, a ostentar o “status’ jurídico-penal de condenado com todas as consequências legais daí decorrentes”.

No passado, o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do HC 73.297 – SP, Relator Ministro Maurício Corrêa, em 6 de fevereiro de 1996, entendeu que “`É elemento caracterizador de maus antecedentes o fato de o réu responder a diversos inquéritos policiais e ações penais sem trânsito em julgado, justificando-se, assim, a exacerbação de pena-base”.

O Supremo Tribunal Federal, no julgamento do HC 97.665 Relator Ministro Celso de Mello, em 4 de maio de 2010, já havia entendido que “processos penais em curso, ou inquéritos em andamento, ou, até mesmo, condenações criminais ainda sujeitas a recurso não podem ser considerados, enquanto episódios processuais, suscetíveis de pronunciamento absolutório, como elementos evidenciadores de maus antecedentes do réu”.

Caso os inquéritos ou processos criminais considerados como antecedentes tenham desfecho favorável ao acusado, ainda assim ele sofrerá prejuízo, pois os procedimentos terão sido utilizados para aumentar sua pena em processo no qual foi efetivamente condenado. “O lançamento no mundo jurídico de enfoque ainda não definitivo e portanto sujeito à condição resolutiva potencializa a não mais poder a atuação da polícia judiciária e a precariedade de certos pronunciamentos judiciais”, como advertiu o Ministro Marco Aurélio, em voto no julgamento do RE 591.054, com repercussão geral.

A divergência foi aberta pelo ministro Ricardo Lewandowski. Segundo ele, o artigo 59 do Código Penal compreende diversos aspectos que devem ser considerados pelos juízes para dosar a pena, entre os quais a culpabilidade, os antecedentes, a conduta pessoal e a personalidade do sentenciado. “Esse artigo entrega ao prudente arbítrio do juiz a possibilidade de dosar a pena de maneira a fazê-la suficiente para a reprovação e prevenção do crime”, argumentou.

No entendimento do ministro, os antecedentes mencionados no artigo 59 do Código Penal, que trata da fixação da pena, não podem ser confundidos com o artigo 61, que fala das circunstâncias agravantes. Em seu voto, destacou que não é incomum que os juízes criminais se deparem com extensa ficha criminal de um determinado réu, muitas vezes por fatos semelhantes ao que são objeto do julgamento, e que essas circunstâncias devem ser levadas em consideração na dosimetria da pena.

Nesse mesmo sentido votaram as ministras Rosa Weber e Cármen Lúcia e o ministro Luiz Fux.

A matéria é objeto de divergência no Supremo Tribunal Federal.

No julgamento do HC 122.940, Segunda Turma,  o Ministro Gilmar Mendes, concedeu a ordem com base no princípio constitucional da não culpabilidade ou da presunção de inocência, uma vez que considerou inviável o reconhecimento de maus antecedentes referentes a inquéritos  e ações penais em fase que ainda seja permitida a apresentação de novos recursos.  Por sua vez, a Ministra Cármen Lúcia apresentou pedido de vista.

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A matéria, portanto, continua em discussão perante o Supremo Tribunal Federal merecendo a devida atenção dos estudiosos.

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Sobre o autor
Rogério Tadeu Romano

Procurador Regional da República aposentado. Professor de Processo Penal e Direito Penal. Advogado.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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