Violência contra mulher e suas repercussões na criação de políticas públicas locais

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Aborda-se a emergência das políticas públicas de proteção à mulher vítima de violência doméstica advindas da Lei 11.340/2006, conhecida como Lei Maria da Penha em nível local.

1. INTRODUÇÃO.

A violência cometida contra mulheres  no âmbito doméstico manifesta-se em especial na relação entre homem e mulher, envolvendo por vezes ciúme, discriminação e preconceito e, ainda, vem cercada pelo silêncio e pela dor.

A eleição do tema deveu-se pela polêmica e relevância que o envolve, sendo a violência doméstica uma cruel realidade na vida de milhares de brasileiras, o aumento crescente desta violência e a lacuna do Estado na assistência aos municípios para efetivar a criação de mecanismos de proteção às mulheres.

A Lei "Maria da Penha", lei n° 11.340/06, foi criada para proteger a população feminina brasileira de qualquer espécie de violência doméstica, entretanto, mesmo com o advento da lei, milhares ainda são agredidas, pois em muitos casos o dispositivo legal não é capaz de impedir o agressor de cometer tais atos, independente de sua natureza, sendo que estes, os atos, em geral resultam de excesso de ciúmes e abuso de álcool (BRASIL, 2013).

Apesar de ser uma lei promulgada há quase uma década, o Brasil parece muito longe, ainda, de criar mecanismos efetivos que garantam a proteção às mulheres vítimas de violência doméstica, principalmente, na missão auxiliar os municípios a efetivarem os direitos das mulheres.

Ao falar do desenvolvimento histórico e social do Brasil, muitas foram as figuras femininas de extrema relevância nessa trajetória e para fins desse trabalho faz-se mister mencionar algumas, quais sejam:

Princesa Isabel de Bragança (1864 – 1921), última princesa imperial brasileira, regente do império, e primeira senadora do Brasil, foi responsável por sancionar a Lei Áurea que garantiu a liberdade a todos os escravos no Brasil (DEURSEN, 2008).

No século XX, período das duas grandes guerras, de imensurável desenvolvimento tecnológico e social e de total turbulência, não seria estranho em meio a tudo isso a existência de várias mulheres que tiveram papéis de extrema relevância e importância, tanto no cenário brasileiro, quanto no cenário mundial. Dentre elas podemos citar: Olga Benário Prestes (1902 – 1942), jovem alemã, militante comunista, recebeu treinamento militar no “Comintern”. Fez parte do grupo de estrangeiros destacados para proteger Luiz Carlos Prestes em seu retorno ao Brasil, chegou a combater no Brasil a fim de, junto com Prestes, estabelecer um governo revolucionário, mesmo grávida, em 1936 foi deportada para a Alemanha nazista onde foi enviada para um campo de concentração, foi executada em 1942 (SALOMÃO, S/D).

Rachel de Queiroz (1910 – 2003) primeira mulher a ocupar uma cadeira na Academia Brasileira de Letras, autora de grandes obras como “As três Marias” e “O quinze”, serviu como delegada do Brasil na Assembléia Geral da ONU, na Comissão dos Direitos do homem (BRASIL, S/D).

O século XXI não podia ser diferente de seu antecessor, o mundo continuou a evoluir, direitos foram conquistados, e as mulheres não podiam ficar fora disso, dentre essa mulheres temos o exemplo Maria da Penha (1945 – até os nossos dias), biofarmacêutica, conhecida por ficar paraplégica ao ser baleada pelo marido enquanto dormia. Mesmo tendo nascido no século XX, as consequências dos atos de sua história só geraram efeitos no século XXI, exemplo disso é que no Brasil há uma lei que carrega o seu nome, a Lei n° 11.340 de 2006, tal lei visa proteger as mulheres da violência doméstica, sendo que esta só veio a ser votada e promulgada após muita pressão popular, e internacional. Muitas mulheres ainda passam por situações parecidas, aquilo que um dia fez parte da sua realidade ainda está presente na de milhares de brasileiras, e essa realidade é o tema principal de discussão deste trabalho (BRASIL, S/D).

2. OBJETIVOS.

Esta pesquisa tem o objetivo primário de: analisar a Lei 11340/06 e seus efeitos na proteção às mulheres vítimas de violência, principalmente no que se refere à infraestrutura dada pelos municípios da Região Metropolitana de São Paulo, mais especificamente na Região do Alto Tietê conforme relata a mídia regional. São objetivos específicos: delinear um breve panorama da violência contra a mulher após a promulgação da “Lei Maria da Penha” e identificar, dentro do que expressa a lei, os tipos de violência cometidos com maior incidência contra mulheres.

3.    MÉTODO

A natureza deste estudo é de revisão bibliográfica, doutrinária e histórica, para tanto optou-se pelos seguintes doutrinadores: Maria Berenice Dias (2010) e Maria Gorete Tavares (s/d), fez-se também uma análise da Lei 11346/2006, bem com buscou-se amparo nos documentos nacionais sobre as políticas públicas para mulheres.

Fez-se finalmente um levantamento de matérias publicadas no jornal diário do Alto Tietê, de janeiro a junho de 2014 que tinha como  palavras chave – violência contra a mulher. Este jornal circula na região do Alto Tietê, que fica no cone leste da região metropolitana de São Paulo, abriga 11 cidades das quais apenas 2 contam com uma delegacia especializada da mulher, são Guarulhos e Mogi das Cruzes. Este levantamento, a fim de se descrever o estado da arte da criação de delegacias da mulher e demais mecanismos de proteção das mulheres contra a violência doméstica.

4.    AS MULHERES E A CONSTRUÇÃO DE INSTRUMENTOS DE PROTEÇÃO LOCAL

Desde os tempos mais antigos as mulheres são vistas como a parte frágil nas relações sociais, em algumas sociedades antigas as mulheres tinham apenas as funções de cuidar do lar, procriar e garantir prazer ao marido. Em geral, muitas das causas pelas quais as mulheres lutaram e ainda lutam para conquistar derivam de toda essa submissão que por anos assombrou essa parcela da sociedade.

No Brasil, as mulheres só conquistaram o direito ao voto no ano de 1932 com o advento do Decreto-lei 21.076 de 24 de Fevereiro de 1932 onde este rezava que: “Art. 2° É eleitor o cidadão maior de 21 anos, sem distinção de sexo, alistado na forma deste código”. Antes disso, por força do Art. 70, “caput”, da Constituição de 1891, somente os “cidadãos maiores de 21 anos que se alistarem na forma da lei” eram considerados eleitores.

4.1 POLÍTICAS PÚBLICAS DESENVOLVIDAS EM OBEDIÊNCIA À “LEI MARIA DA PENHA”

Segundo uma pesquisa feita março de 2013, pela Secretaria da Transparência, do Senado Federal, 18,6% das entrevistadas já sofreu algum tipo de violência doméstica ou familiar, ao passo que, quando perguntadas qual foi a atitude tomada com relação à agressão, somente 40% afirmaram que procuraram algum órgão competente para denunciar o fato. Isso demonstra que esse é um problema ainda muito grave na sociedade e que dificulta o trabalho do poder público uma vez que, para que a “Lei Maria da Penha” seja devidamente aplicada é imprescindível que haja a denúncia, seja da vítima ou de qualquer outra pessoa que tenha conhecimento da agressão, pois ainda existem muitas mulheres que sofrem caladas perante a crueldade de seu agressor, seja por medo (74%), dependência financeira (34%), seguida de um amor cego por ele, e acreditar que o ocorrido seria a última vez (22%), e outro amor incondicional por seus filhos (34%) que em todos os casos estão na mesma relação de dependência que a agredida, obrigando-a a se prender a uma vida de agressões e tristezas para manter a família (BRASIL, 2013).

Segundo Dias (2006), o Estado precisa rever o conceito de família como se tinha até poucas décadas a fim de que muitos não vejam a Justiça parar em frente de casa, pois nem todos os atos de violência deixam marcas físicas, algumas dessas marcas, são muito profundas, pois vêm da violência psicológica.

Tavares (s/d), afirma que a violência contra a mulher é um gravíssimo problema, trazendo inúmeras consequências à sociedade, dentre elas as sequelas físicas e psicológicas nas vítimas; a possibilidade dos filhos delinquirem, apresentarem sequelas psicológicas ou desenvolverem comportamento violento; o declínio drástico da produtividade no trabalho das mulheres vitimadas; as aposentadorias precoces, licenças e internações.

Coibir a prática da violência de gênero é dever do Estado, mas o Brasil só avançou neste sentido quando foi condenado pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos no caso n.12.051, de Maria da Penha Maia Fernandes. Desde então, o país intensificou as medidas para erradicar a violência de gênero, tendo como marco a criação da Lei n.11.340/06. Tal Lei trouxe avanços no combate a violência contra a mulher no aspecto formal.

Para Dias (s/d),

A sociedade protege a agressividade masculina, constrói a imagem da superioridade do homem. Afetividade e sensibilidade não são expressões da masculinidade. O homem é retratado pela virilidade. Desde pequeno é encorajado a ser forte, não chorar, não levar desaforo para casa, não ser “maricas”.

A Constituição Federal, de 1988, preconiza em seu preâmbulo de forma poética a promulgação da Constituição da República Federativa do Brasil e a instituição de um Estado Democrático

destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias.

Para reforçar a ideia proposta pelo preâmbulo, podem ser citados os artigos 1°, III, 3°, IV, 4° II, 5°, caput e inciso I e 226, §8°. Entretanto, mesmo com o dispositivo constitucional, foi necessário que uma mulher perdesse a capacidade de andar e chegar a beirar o abismo da morte mais de uma vez, recorrer à Comissão Internacional de Direitos Humanos e que tal instituição condenasse o Estado brasileiro para que este começasse a tomar providencias e buscar uma solução para a questão da violência contra a mulher.

Como já fora mencionado na parte histórica deste trabalho, muitas mulheres tiveram papéis de imensurável e inestimável valor no desenvolvimento da sociedade, a biofarmacêutica Maria da Penha Maia Fernandes foi o reagente que desencadeou toda essa situação.

A Lei 11.340 de 2006, mais conhecida como “Lei Maria da Penha”, em observância ao art. 226, §8°, CF, foi promulgada com o objetivo de criar mecanismos para coibir e prevenir a violência doméstica e familiar contra a mulher.  Trata-se de uma nova “lei para um velho problema” (DIAS, S/D).

Em uma breve síntese, entre os mecanismos desenvolvidos pela lei, estão alterações legislativas, desenvolvimento de políticas públicas de assistência, proteção, resguardo e acolhimento à mulheres vítimas de violência doméstica e familiar e de prevenção à violência.

A “Lei Maria da Penha”, em seu Art. 7°, e incisos, elenca alguns tipos de violência que podem ser infringidas contra mulheres, sendo elas, física, psicológica, moral, sexual e patrimonial. Além de elencar os tipos de violência, em cada inciso há uma explicação de cada requisito que deve ser adotado para a interpretação de cada tipo. Ex: “A violência física, entendida como qualquer conduta que ofenda sua integridade ou saúde corporal”.

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Para fins deste trabalho, em virtude da identificação generalizada já expressa no dispositivo legal, faremos uma identificação dos tipos de violência que mais são utilizados pelos agressores, seguindo como parâmetro a ilustração já feita pela lei.

Como já mencionado, a violência física foi o tipo que serviu de combustível para a promulgação da Lei 11.304/06, sendo esta a mais comum, e uma das mais bárbaras a serem praticadas contra as mulheres. Conforme uma já mencionada pesquisa feita pelo DATASENADO, a violência física detém o topo do pódio (62% dos relatos das entrevistadas) com relação às demais, seguida da violência moral (39%), da psicológica (38%), e da sexual (12%), conforme apurado pela pesquisa, não houve relatos de violência patrimonial.

Não só leis e programas, mas pesquisas vêm confirmando que programas são necessários para a efetivação das garantias previstas pela Lei 11340/06. Conforme uma pesquisa feita em 2013 pela Secretaria de Transparência do Senado Federal, a proteção contra a mulher está melhor, a da promulgação desta lei, segundo 66% das entrevistadas. (DATASENADO, 2013)

Segundo o último senso realizado no país, em 2010, o Brasil possuía uma população de 97.362.142 de mulheres (BRASIL, 2010), e conforme a pesquisa supramencionada apesar de 99% das mulheres do Brasil já terem ouvido falar da “Lei Maria da Penha”, cerca de 700.000 mulheres (em tese 0,71% da população feminina) ainda são vítimas de agressão no país.

Do número total de entrevistadas, somente 40% afirmaram que procuraram auxílio após a primeira agressão, outras 32% e 21% afirmam, respectivamente, que só procuraram ajuda após a terceira vez que foram agredidas, ou que não procuram por ajuda. Tais dados deixam claro que há uma tendência relativamente alta em “deixar para lá” por parte das agredidas, sendo que o medo é um dos principais fatores (74%) que as impede tomar alguma atitude com relação ao agressor. Dependência financeira (34%), “segundas chances” (22%), medo pelos filhos (34%), não existir punição (23%), desconhecimento de Direitos (19%) e vergonha da agressão (26%) também fazem parte do rol de causas que impedem a efetivação da busca por soluções para o problema. Conforme apontado pela ilustre doutrinadora Maria Berenice Dias, o motivo que faz com que as vítimas não denunciem a primeira agressão é o fato de não quererem se separar do agressor, nem que ele seja preso, apenas desejam parar de apanhar, havendo a denuncia apenas depois que ficarem saturadas de tais situações, as agressões (DIAS, S/D).

Conforme noticiado pela BBC BRASIL, em 2013, o número de denúncias de violência contra mulheres aumentou em 600% (88.685 relatos em 2012, contra 12.664 em 2006) nos 6 anos subsequentes à promulgação da Lei 11.340/06, o autor da notícia enfatiza que, “a elevação no número de relatos não significa necessariamente um crescimento real dos casos de violência, mas um aumento das notificações – na medida em que mais mulheres estariam se sentindo seguras para procurar ajuda”, na mesma exposição há também a afirmação da Ministra da Secretaria de Política para as Mulheres de que o crescimento de denúncias significa um aumento da confiança das mulheres nos mecanismos de proteção oferecidos pelo Estado (KAWAGUTI, 2013)

Segundo um levantamento feito pelo Instituto de Pesquisa Econômica Avançada (IPEA), entre 2001 e 2011, ficou constatado que não houve significativa redução na mortalidade de mulheres por agressão, mesmo após a promulgação da lei em 2006, sendo que a estimativa de mulheres mortas por causas violentas foi de 5.664 por ano (BRASIL, s/d).

Outro dado levantado foi o de que a maioria das vítimas possuía baixo grau de escolaridade, 48% delas possuíam até 8 anos de estudo, neste mesmo ponto concorda o estudo feito pelo DataSenado quanto a afirmação de que a maioria dos casos de violência ocorreram contra mulheres com baixos graus de escolaridade.

Segundo o Centro de Valorização da Mulher Consuelo Nasser (CEVAM), em 2014, cerca de 106.030 mulheres foram atendidas pelo Sistema Único de Saúde (SUS), no ano de 2012, porém não há números exatos para quais desses casos sejam de violência doméstica (CARVALHO, 2014).

Seguindo essa mesma linha, conforme outra matéria publicada pela Agência Brasil, em 2012, cerca de R$ 5,3 milhões foram gastos somente com internações de mulheres vítimas violência (LEITÃO, 2012).

Há ainda insuficiência de dados que relacionam os casos de internação com os casos de violência contra mulher, não se observa o diálogo entre os diferentes entes governamentais que apontem para índices mais transparentes sobre os diferentes dados que possam dar um retrato mais fiel do problema no Brasil.

No Brasil, em 2012, o número delegacias deste gênero era de 374, representando apenas 7% dos mais de 5,5 mil municípios brasileiros. (BRASIL, S/D) Esse número é realmente pequeno se levado em consideração o número de denúncias recebidas pelo Ligue 180 naquele ano, mais de 1,8 mil ligações por dia.

Nessa mesma linha, nas palavras da Senadora Ana Rita (PT-ES) “já sabemos de antemão que a estrutura é insuficiente para dar conta do combate à violência contra a mulher. É preciso fortalecer toda a rede de atendimento...” (BRASIL, S/D).

Muitas são as políticas públicas criadas em prol das mulheres vítimas de violência, muitas delas expressas na própria lei 11.340/06, entretanto, para os fins deste trabalho, listaremos apenas algumas, que dizem respeito, tanto a itens expressos, quanto a outros indiretamente ligados ao dispositivo legal.

Dentre essas várias políticas, a primeira que podemos citar é a criação de delegacias especializadas no atendimento à mulheres vítimas de violência, sendo que a primeira foi criada em 1985, onde São Paulo foi o primeiro Estado-membro a possuir uma (BRASIL, s/d).

Outra política desenvolvida para auxiliar no combate a violência contra a mulher foi a criação da Central de Atendimento à Mulher, mais conhecido como Ligue 180, criado em 2005 pela Secretaria de Políticas para as Mulheres, como já foi mencionado, somente no ano de 2012 a central recebeu mais de 88.685 ligações, sendo constatado um aumento de 600% no número de denúncias quando comparado ao ano de 2006 (12.664 denúncias), e no ano de 2013 o número de ligações bateu a marca de 532.711, e desde que o serviço foi criado já foram computadas mais de 3,6 milhões de ligações (BRASIL, 2014).

Conforme estabelecido pela lei, dentro do rol de políticas a serem desenvolvidas para combater a violência contra a mulher, está a criação de varas especializadas no processamento e julgamento de litígios que envolvam violência contra a mulher. Segundo um levantamento feito pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), há cerca de 66 unidades judiciárias com competência exclusiva para julgar tais casos, conforme indicado por esse mesmo levantamento, há um desequilíbrio na distribuição destas unidades no Brasil, sendo que este foi feito para estudar a possibilidade de criação de outras 54 unidades. Outro dado levantado é o de que no final de dezembro de 2011 haviam sido processados mais de 600 mil procedimentos pelas varas e juizados especializados na matéria (BRASIL, 2013).

Em 2012, os Ministros Garibaldi Alves Filho, e Eleonora Menicucci, respectivamente, da Previdência Social e da Secretaria de Políticas para as Mulheres, fizeram uma série de acordos de colaboração na implantação de políticas publicas contra violência (GUERLENDA, 2012). Uma delas, apesar de parecer simplória, visando a publicidade educativa, trata-se de uma gravação feita por Maria da Penha, a ser tocada em todas as ligações feitas à Central 135, da Previdência Social. Somente em 2012, a central recebeu mais de 71 milhões de ligações (ANDRADE, 2013).

Por último, também seguindo as diretrizes legais, em alguns Estados-membros e no Distrito Federal foram criadas as casas-abrigo, que tem como objetivo acolher mulheres vítimas de violência extrema, onde estas podem, em geral, permanecer por até 90 dias, sendo que nestes centros, contam com apoio de profissionais das áreas de psicologia, pedagogia, assistência social e jurídica, sendo o objetivo principal desta política, garantir que cada mulher acolhida possa viver de forma autônoma sem precisar voltar ao antigo lar.

Muito poucos são os dados referentes às casas-abrigo, entretanto, dentro do que foi possível localizar, no Distrito Federal, foram acolhidas 138 mulheres, 159 crianças e 13 adolescentes no ano de 2013 (SECRETARIA DA MULHER, 2014).

4.2 POLÍTICAS LOCAIS PARA COIBIR A VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER NA REGIÃO DO ALTO TIETÊ

A nova geografia regional é tratada a partir de processos de produção  que se firmam em construções sociais, políticas, econômicas e culturais que interferem no processo de governança.

No cenário nacional atual, a regionalidade é um conjunto de características dadas pelo sistema federalista, e, neste sentido, deve haver um esforço conjunto dos poderes locais e regionais de manter/construir a identidade local por meio de políticas focadas no desenvolvimento local e regional. Não há mais que se falar em lugares, mas, sim em territórios – que envolve identidade regional, forças sociais que se integram, se contrapõem e se complementam para o planejamento das ações de desenvolvimento estratégico, principalmente para as políticas  de saúde. A região do Alto Tietê congrega os municípios de Guarulhos, Mogi das Cruzes, Itaquaquecetuba, Poá, Ferraz de Vasconcelos, Suzano, Arujá, Santa Isabel, Salesópolis, Guararema e Biritiba Mirim, o que representa uma população de 2 milhões e 200 mil habitantes aproximadamente. Ela é um polo industrial, comercial e logístico do estado, que tem o aeroporto internacional de Guarulhos, é servido por duas rodovias federais: a Rodovia Presidente Dutra que liga duas das mais importantes metrópoles do país e a Rodovia Fernão Dias que dá acesso ao estado de Minas Gerais. Há ainda o complexo Airton Senna-Carvalho Pinto que passa pelos municípios de Itaquaquecetuba, Mogi das Cruzes e Guararema e conduz o escoamento de produtos para o Vale do Paraíba e liga-se em São José dos Campos com a Rodovia dos Tamoios que dá acesso ao Porto de São Sebastião. A rodovia Dom Paulo Rolim Loureiro, liga a região à ao litoral norte e a Rodovia Rio-Santos, bem como a Rodovia Piaçaguera-Guarujá  que dá acesso ao Porto de Santos. Além das rodovias há ainda as ferrovias das linhas Coral e Safira que se conectam ao Metrô de São Paulo, além das companhias de ônibus que fazem as ligações municipais, este complexo viário transporta mais de 3 milhões de trabalhadores por dia.

O IDH da região é declarado alto pela ONU, porém, ela enfrenta dilemas do atual ciclo de desenvolvimento social, econômico e político que desperta a atenção do pesquisadores, que iniciaram a estruturar um olhar interdisciplinar para os efeitos das políticas públicas sobre os cidadãos.

Embora conte com mais de uma centena de Unidades Básicas de Saúde distribuídas somente entre os municípios do Alto Tietê, e com o apoio de Hospitais de Referência - como o Hospital Santa Marcelina, na Zona Leste da capital, e o Hospital das Clínicas Luzia de Pinho Melo, em Mogi das Cruzes, Hospital Nipo-Brasileiro em Guarulhos entre outros, a região ainda apresenta dificuldades para garantir atendimento e acompanhamento médico adequados à população local. Há carências em várias áreas: de programas de medicina preventivo-coletiva bem como na disponibilização de leitos hospitalares em quantidade e com a qualidade necessárias para maximizar a qualidade de vida da população e de programas de proteção às mulheres, pois só existem duas Delegacias da Mulher em toda a região, uma no município de Guarulhos e outra em Mogi das Cruzes, nos demais municípios existem algumas outras iniciativas, em Itaquaquecetuba, existe um Centro de Referência à Vítima (CRAVI), que atende também as mulheres, vítimas de violência doméstica.

Estas lacunas podem ser detectadas nas publicações veiculadas pela mídia. No jornal DAT – Diário do Alto Tietê que circula na região só aparecem 3 matérias relacionadas às políticas públicas para proteção e prevenção de violência contra a mulher  como se descreve a seguir:

DATA

TÍTULO

SEÇÃO

08.03.2014

Data comemora avanços femininos

Região

25.03.2014

Atendimento terá maior divulgação

Suzano

06.06.2014

Prefeitura faz convênio para instalar futura DDM

Suzano

            O jornal divide suas seções por cidades, observa-se que no período pesquisado a data comemorativa do Dia Internacional da Mulher,  o editorial aponta que a Região do Alto Tietê concentra 772.580 mulheres. O texto ainda ressalta que ainda há poucas iniciativas nas políticas públicas para as mulheres e conclui afirmando que o ponto mais importante é a luta contra a violência física, sexual ou psicológica, afirma completando: esta reivindicação deve ser da sociedade como um todo que deve repudiar e punir mais.

No texto publicado em 25 de março, a matéria jornalística faz a cobertura sobre a iniciativa da Comissão da Mulher Advogada de Suzano, 55a. Subseção da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) de divulgar o Plantão de Atendimento de Vítimas da Violência, para o combate à violência contra à mulher naquela cidade, que já tem, na 2a. Delegacia de Polícia 40% dos boletins de ocorrência registrados de violência contra a mulher.

Em entrevista ao jornal, a representante da OAB afirma que em Suzano, registram-se 20 casos, e esse  número de mulheres que buscam ajuda é pouco, justamente porque ainda há o medo e a vergonha de denunciar os companheiros. O terceiro artigo, também na seção Suzano, há o relato sobre o convênio firmado entre o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo para a instalação e funcionamento do Anexo de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher.

Como se vê no que se refere ao cuidado de proteção às vítimas de violência, o aspecto criminal, a ajuda ainda é pequena na região, o que consolida a hipótese de que há grandes lacunas na garantia dos direitos fundamentais das mulheres.

A presença de equipes multidisciplinares ainda está distante de mulheres que precisam de atendimento, há em Guarulhos, Mogi das Cruzes e Itaquaquecetuba o que, embora seja um esboço dos reflexos da Lei 11340/2006 e da Política Nacional da Mulher, ainda é pouco se se considera uma população de quase 800 mil mulheres.

Mesmo numa região economicamente de destaque no cenário estadual e nacional, há ainda uma longa estrada a percorrer.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diante do exposto, pôde-se concluir que a violência contra a mulher no Brasil ainda é um problema que precisa ser encarado com maior seriedade, apesar da constatação de um aumento mais do que significativo no número de denúncias, que boa parte da população feminina tem conhecimento de seus direitos como mulheres, que o poder público tem feito o possível para tentar combater a violência contra mulheres no país, e todas as políticas públicas desenvolvidas, o número de mulheres mortas por ano em razão da violência de gênero ainda é o mesmo, se considerar o antes e o depois da Lei, o número de delegacias criadas para atender mulheres vítimas de violência, e varas criadas para processar e julgar casos que envolvam violência contra mulher ainda é ínfimo, levando em consideração a demanda de denúncias e processos apurada.

Em virtude disso, fica clara a necessidade de um empenho ainda maior do poder público brasileiro para combater a violência contra a mulher, sendo que para isso se faz necessária a criação novas delegacias de atendimento especial à mulher, novas unidades judiciárias para “desafogar” o poder judiciário e garantir um andamento mais rápido a todos os processos que envolvam violência contra a mulher, intensificar as políticas de proteção às mulheres com o objetivo de tentar reduzir o número de feminicídios, intensificar as políticas educacionais existentes no país a fim de garantir às mulheres um melhor conhecimento de seus direitos e assim tentar acabar com o silêncio e a dor que envolve a violência contra mulher.

Com muito custo e sangue a sociedade brasileira conseguiu dar um salto no combate a violência contra as mulheres, quando foi promulgada a “Lei Maria da Penha”, porém apenas o dispositivo legal não é suficiente para dar conta de combater a violência

 

REFERÊNCIAS 

ANDRADE, Camila. Central 135 recebeu quase 72 milhões de ligações em 2012. Blog da Previdência Social. 2013. In http://blog.previdencia.gov.br/?p=5768 Acesso em 01.08.2014

BRASIL, Apenas 7% das cidades brasileiras têm delegacias especializadas no enfrentamento à violência contra a mulher. Observatório Brasil da Igualdade de Gênero, Brasília, 2012, In http://www.observatoriodegenero.gov.br/menu/noticias/apenas-7-das-cidades-brasileiras-tem-delegacias-especializadas-no-enfrentamento-a-violencia-contra-a-mulher/ Acesso em 01.08.2014

BRASIL. Aplicativo para celular amplia canais para denúncia de violência contra mulher. Blog do Planalto, Brasília, 2014. In http://blog.planalto.gov.br/assunto/disque-180/ Acesso em 04.08.2014

BRASIL, Censo 2010: população do Brasil é de 190.732.694 pessoas. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE. Brasília, 2010

BRASIL, Distribuição das varas de violência doméstica é desproporcional, revela estudo inédito do CNJ. Conselho Nacional de Justiça – CNJ, Brasília, 2013. In http://www.cnj.jus.br/noticias/cnj/23999-distribuicao-de-varas-da-violencia-domestica-e-desproporcional-revela-estudo-inedito-do-cnj-2 Acesso em 07.04.2014

BRASIL, Institucional – Delegacia de Defesa da Mulher. Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo, São Paulo, S/D. In http://www.ssp.sp.gov.br/fale/institucional/answers.aspx?t=7 Acesso em 01.08.2014

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BRASIL. Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher. Senado Federal. Brasília. 2013.

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CARVALHO, Cleide. Agressão física encabeça violência contra a mulher. O GLOBO, Rio de Janeiro, 2014. In http://oglobo.globo.com/brasil/agressao-fisica-encabeca-violencia-contra-mulher-12866926 Acesso em 18.06.2014

DEURSEN, Felipe van. Isabel, a princesa do Brasil. Guia do Estudante. São Paulo: Abril. 2008. In http://guiadoestudante.abril.com.br/aventuras-historia/isabel-princesa-brasil-436000.shtml. Acesso em 21.01.2014

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Sobre os autores
Luci Mendes de Melo Bonini

Doutora em Comunicação e Semiótica pela PUC-SP, Professora de Filosofia e Pesquisadora no Mestrado em Políticas Públicas da Universidade de Mogi das Cruzes. Área de interesse: Direitos Humanos e Políticas Públicas.

Felipe de Oliveira Silva

Estudante de Direito da Universidade de Mogi das Cruzes e estagiário na Procuradoria Municipal em Mogi das Cruzes

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

Mais informações

Este texto originou-se de uma orientação de pesquisa do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica (PIBIC) da Universidade de Mogi das Cruzes e concorreu ao prêmio Diversidade de Gênero.

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