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Condomínio urbanístico:

constitucionalidade da legislação municipal

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23/03/2016 às 11:08

Resumo:


  • A competência municipal para legislar sobre urbanismo é reforçada pela Constituição Federal e pelo Estatuto da Cidade, com ênfase no planejamento via plano diretor e possibilidade de adaptação das normas gerais às realidades locais.

  • A existência de normas gerais sobre parcelamento do solo e condomínio edilício não impede a atuação municipal em adequar tais normas à realidade local, sendo a autonomia municipal um exercício de sua competência urbanística.

  • Argumentos contra o fechamento de loteamentos, como violação do direito de ir e vir, não se sustentam diante da competência municipal para gerenciar o espaço urbano e possibilidade de uso privativo de bens públicos, desde que haja legislação municipal específica e observância dos princípios constitucionais.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

5-Não resta dúvida quanto à competência municipal para ordenar o espaço urbano, que tem sua base constitucional nos arts. 5º, XXII e XXIII, 30, I e VIII, 182 §§ 1º e 2º da Constituição Federal. É possível afirmar, também, quanto ao fato de ser a utilização do solo uma atividade econômica, uma forma de aproveitamento do solo.

O STF já se manifestou no sentido da competência municipal, como está na ADIn 478-6-SP. O mesmo foi realizado pelo TJSP na ADIn68.759-0/SP, tratando especificamente do loteamento fechado.

O Estatuto da Cidade, que regulamentou os arts. 182 e 183 da Lei Maior, estabelecendo as diretrizes gerais em matéria de urbanização, como é de sua competência, por força do art. 24, I e § 1º da CF, enfatiza a competência municipal para planejamento municipal. No art. 4º, caput, lê-se:

“Art. 4º. Para fins desta Lei, serão utilizados, entre outros instrumentos:”

A utilização dos instrumentos, que são referidos nos incisos, visa realizar a política urbana prevista nos arts. 182 e 183 da CF. Entre eles o inciso III, destaca o planejamento municipal, de forma ampla. Ao enumerar medidas nas alíneas do inciso III, ele diz que são medidas que merecem maior atenção, o que se deduz da expressão em especial, presente no final do inciso III.

Dúvida não fica que o planejamento municipal é amplo, com ênfase para as hipóteses das alíneas, que seriam dispensáveis, quando se diz que o planejamento municipal é instrumento de realização da política urbana. Ao alinhar várias hipóteses, no art. 4º, o Estatuto da Cidade nada mais faz do que destacar ou evidenciar pontos importantes do planejamento municipal para efetivar a política urbana prevista no texto constitucional, o que é compreensível em matéria de diretrizes gerais.

O art. 39 do Estatuto da Cidade destaca a importância do plano diretor, seus objetivos, que se contêm nos limites do planejamento municipal, como força de equilibrar o interesse particular e o interesse público, ou seja, o conteúdo econômico e o conteúdo social da propriedade.

Havendo normas gerais, ou diretrizes gerais, na Lei n. 4.591/1964, bem como no Decreto-lei n. 271/1967, na Lei n. 6.766/1979, no Estatuto da Cidade, e sendo o Município competente constitucionalmente para editar regras a respeito do tema, como já demonstrado, não fica qualquer dúvida quanto à constitucionalidade de Lei municipal que regulamente o condomínio urbanístico, nem fere a Lei Maior, permitir o fechamento de loteamento.

E mesmo que se pretenda pela perda de eficácia do art. 3º do Decreto-lei n. 271/1967 – e isso a título de argumentação, porque como demonstrado, isso não se deu -, tanto se pode adotar as diretrizes da lei n. 4.591, art. 8º, como da Lei 6.766/1979, como foi demonstrado, também. As duas leis trazem normas gerais em matéria de aproveitamento do solo, e essas regras podem ser adequadas às realidades locais e à política urbana, como previsto no art. 4º, III do Estatuto da Cidade.

E mesmo se admitir-se a perda de eficácia do dispositivo da Lei n. 4.591/64 citado, o diploma civil não proíbe esse tipo de empreendimento.

Não fosse o bastante, a existência de base constitucional e lei ordinária, que assegura legalidade, merece atenção a teoria dos direitos implícitos.

A teoria dos direitos implícitos parte do seguinte raciocínio: em princípio os poderes do Estado alcançam tudo o que não lhe é proibido por norma constitucional federal, ou não haja sido atribuído privativamente à União, seja por preceito explícito, que por estar implicitamente contido nos poderes expressos.

Se a Constituição Federal concede os fins, dá os meios. (HAC 91.661/PE, o3/04/2009, STF)

Essa teoria permite relação pacífica entre o direito criado e o direito implícito, porque há uma complementação entre eles. Aquilo que é perdido em precisão no processo legislativo é suprido pelo direito implícito.

Nessa linha, se por absurdo não se aceitar o entendimento que defendo, ainda assim, a teoria do direito implícito socorre o exegeta.

 Não há qualquer sentido atribuir o planejamento urbano ao Município e lhe negar o direito de adequar os institutos jurídicos existentes, segundo o interesse local, ou suplementar a legislação federal e estadual visando adequá-las à realidade local, bem como promover o ordenamento territorial, que se contém no planejamento municipal. Teria sido dado o fim, mas negado o meio, o que o STF entendeu não ter cabimento.

Seriam letra morta as regras constitucionais citadas, bem como a Lei n. 10.257/2001.

Basta observar a figura do shopping center. Qual sua natureza jurídica? Qual a legislação que o regula a nível federal? Inexiste previsão legal, mas ele se estrutura seja como condomínio edilício, seja como condomínio voluntário, ou sociedade de propósito específico. São adotadas regras de institutos jurídicos existentes para dar vida legal ao empreendimento.

Merece atenção a lição sempre citada de HELY LOPES MEIRELLES:

“Os loteamentos especiais estão surgindo principalmente nos arredores das grandes cidades, visando descongestionar as metrópoles. Para esses loteamentos não há, ainda, legislação superior específica que oriente a sua formação, mas nada impede que os Municípios editem normas urbanísticas adequadas a essas urbanizações. E, tais são os denominados “loteamentos fechados”, “loteamentos integrados”, “loteamentos em condomínios”, com ingresso só permitido aos moradores e pessoas por eles autorizadas e com equipamentos e serviços urbanos próprios, para auto-suficiência da comunidade. Essas modalidades merecem prosperar. Todavia, impõe-se um regramento legal prévio para disciplinar o sistema de vias internas (que em tais casos não são bens públicos de uso comum do povo) e os encargos de segurança, higiene e conservação das áreas comuns e dos equipamentos para uso coletivo dos moradores, que tanto podem ficar com a Prefeitura como com os dirigentes do núcleo, mediante convenção contratual e remuneração dos serviços por preço ou taxa, conforme o caso”. (MEIRELLES, Hely Lopes. Direito de Construir. 3ª. ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, p. 124, 1981).(grifei)

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Se Município regulamenta o condomínio urbano e o loteamento fechado, está exercendo sua competência nessa matéria, como reconhecido na lição citada.

 A legislação urbanística municipal, ao disciplinar o condomínio urbano e regulamentar o loteamento fechado deve obedecer a Lei Federal, o Plano Diretor do Município, as disposições da Lei de Uso e Ocupação do Solo do Município e o Código de Obras. Deverá observar a continuidade do sistema viário público, o acesso público a bens de domínio da União, do Estado e do Município, o acesso à área de uso comum, destinada à implantação de equipamentos comunitários, e estabelecer que os ônus decorrentes da manutenção e conservação de áreas comuns compreendidas no perímetro interno do condomínio urbanístico ou do loteamento fechado, incluindo as vias de circulação e da coleta e armazenamento seletivo temporário dos resíduos sólidos, sejam de inteira responsabilidade da entidade representativa dos proprietários, afastando a responsabilidade  municipal

Por derradeiro, não se vislumbra competência da Agência Metropolitana para participar do processo de aprovação de condomínio urbanístico. O que a Lei n. 6.766/1979 edita é a audiência prévia do Estado-membro em projetos de parcelamento para fins urbanos, em casos específicos. (art. 13)

O condomínio urbanístico não se confunde com parcelamento, em nenhuma de suas espécies.


Referências bibliográficas:

ÁVILA, Humberto de.Teoria dos Princípios. 5ª. ed., São Paulo: Malheiros Editores.

COSTA, José Eduardo da. Dos Bens, In Teoria Geral do Direito Civil. São Paulo: Atlas, pág. 282, 2008, coord. Renan Lotufo e Giovanni Ettore Nanni.

COUTO, Sérgio A. Frazão do. Manual Teórico e Prático do Parcelamento Urbano. Rio: Forense,  1981.

FILHO, Elvino Silva. Loteamento Fechado e Condomínio Deitado. Revista de Direito Imobiliário. São Paulo, Revista dos Tribunais, n.14, jul./dez., 1984.

MEIRELLES, Hely Lopes. Direito de Construir. 3ª. ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 1981.

NADER, Paulo. Curso de Direito CivilDireito das Coisas. Rio, Forense, 2006.

OLIVEIRA, Gustavo Burgos de, Loteamento, Desmembramento, Desdobro, Loteamento Fechado. Jus Navegandi. Teresina, ano 13, n. 1688, 14 fev. 2008.

RIZZARDO, Arnaldo, Direito das Coisas. 2ª. ed., Rio,: Forense.

VIANA, Marco Aurelio S., Comentários ao Novo Código Civil – Direitos Reais.4ª. ed, Rio: Forense, v. XVI, 2013. Coordenação: Sálvio de Figueiredo Teixeira.

VIANA, Marco Aurelio S. Loteamento Fechado e Loteamento Horizontal. Rio: Aide, 1991.

VIANA, Marco Aurelio S., Comentários à Lei Sobre Parcelamento do Solo Urbano. São Paulo: Saraiva, 1980.

VIANA, Marco Aurélio S. Viana, Manual do Condomínio Edilício. Rio: Forense,  2009.

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Sobre o autor
Marco Aurelio S. Viana

Doutor em Direito Civil pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Jurista com mais de 40 livros publicados sobre todos os temas do Direito Civil. Realiza palestras e conferências em todo o Brasil. Como advogado, atua no contencioso, bem como elaborando pareceres, consultas presenciais e virtuais, prestando assessoria e consultoria em todas as áreas do Direito Civil, com mais de quatro décadas de experiência.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

VIANA, Marco Aurelio S.. Condomínio urbanístico: : constitucionalidade da legislação municipal. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 21, n. 4648, 23 mar. 2016. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/47321. Acesso em: 22 dez. 2024.

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