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A Lei 9.613/98 e a necessidade ou não da condenação pretérita para a sua aplicação

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CAPÍTULO IV - DA NECESSIDADE: MEDIDAS DE COMBATE A LAVAGEM DE CAPITAIS

Nos últimos tempos os crimes têm se fundamentado na questão da transnacionalidade. Assim, em muitos dos casos, o crime acaba por ser planejado em um país pré-determinado, vindo a executar em outro o fruto da atividade criminal, sendo enviado para um terceiro. O presente fato acaba por determinar a necessidade de cooperação jurídica de âmbito internacional.

Torna-se imprescindível considerar a lavagem de capitais como um processo maior que acaba por nascer de um crime prévio, que normalmente se presta a questão do refinanciamento[102].

Nesta esteira, Moro[103] afirma que:

O crime de lavagem pode ter caráter exclusivamente nacional, mas pode ter caráter transnacional. Esse será o caso se o produto do crime for remetido para outro país que não aquele no qual a atividade criminal foi praticada.

Para um melhor entendimento, é possível analisar os fatos sob duas ópticas: Assim, a primeira volta-se para um contexto no qual a lavagem não tem sua conduta criminalizada, e outra no sentido inverso, quando o crime de lavagem passa a ser tipificado.

Deste modo, no primeiro caso, o país onde o fruto do ilícito foi enviado, não dispõe de mecanismos que realmente possam se contrapor em relação ao branqueamento, com a exceção de uma solicitação de cooperação da nação onde o crime fora praticado, e exista uma legislação voltada contra tal prática. Portanto, a investigação não poderá ser iniciada, visto que o crime se originou em um país sem legislação combativa ao delito em evidência.   

Assim, no segundo contexto, quando o branqueamento for criminalizado, o país considerado como de destino do produto ilícito poderá tomar providências reais sob o fato, não dependendo de qualquer pedido de cooperação, pois, aqui ocorre a jurisdição autônoma sobre o crime, conforme retrata Callegari[104]:

Poderíamos enumerar uma série de razões que explicam e justificam aos lavadores utilizarem técnicas que impliquem um movimento de fundos a outros países. Em realidade, todas as razões poderiam ser sintetizadas numa só: a transferência de dinheiro de um a outro país dificulta sua persecução por parte das autoridades e acaba por facilitar sua ocultação.

De um modo geral, o dinheiro alcançado de forma ilícita acaba por ser transferido para países que possuem legislação permissiva, ou mesmo os que apresentam meios repressivos mais escassos, facilitando a ocultação, bem como, consequente execução das operações consideradas como delicadas.

Outra forma relacionada a internacionalização do lucro alcançado por meio de operações ilícitas corresponde a remessa do dinheiro para os chamados paraísos fiscais, locais estes que favorecem a tributação reduzida, bem como, a realização de negócios, que segundo o Ministério Público, os

Paraísos fiscais são locais que oferecem às pessoas jurídicas constituídas em seus territórios tributação reduzida e segurança na realização de negócios, desde que esses últimos não ocorram dentro de suas fronteiras e as empresas pertençam a não residentes. Podem ser países (Líbano, Uruguai, Cingapura), territórios afiliados (Ilhas Virgens, Ilhas Cayman, Groenlândia), principados (Mônaco), ilhas sem qualquer autonomia (Canal da Mancha, Madeira) ou apenas regiões (Campione d’Italia, Hong Kong, Macau)[105]

Assim, as principais características que abrangem os paraísos fiscais são:

- Sigilo tanto financeiro como comercial;

- Controles internos;

- Assessoria jurídico-contábil;

- Flexibilização da legislação voltada para as sociedades;

- Presença de filiais das instituições financeiras espalhadas pelo mundo;

- Incentivos fiscais;

- Maior estabilidade política;

- Infraestrutura tanto na área de comunicação como hotelaria.

Deste modo, a adoção de políticas internacionais e nacionais como meio de prevenção, assim como, a consequente repressão ao crime de branqueamento se faz necessária para que ocorra a colaboração transnacional. Assim, em reunião do grupo dos sete países considerados como os mais ricos do mundo (G-7) no ano de 1989, criou uma organização intergovernamental procurando o desenvolvimento e, consequente, promoção de projetos para o combate à lavagem de capitais. Alguns anos depois, mais precisamente em 2001, o presente órgão acabou por receber mais uma função, ou seja, o combate do financiamento ao terrorismo.

4.1 Medidas Assecuratórias

Por meio do Artigo 4º, da Lei 12.683/2012 ocorre a materialização das medidas assecuratórias voltadas à arrecadação cautelar. Uma das principais é a apreensão de direitos, valores e bens do investigado. Deste modo, a legislação anterior retratava que o juiz poderia, sempre que fosse necessário, realizar a decretação da apreensão ou mesmo o sequestro de bens, valores ou direitos.

A presente menção era restrita a questão apenas da apreensão como o sequestro, sendo considerado como alvo de grande divergência doutrinária. Portanto, segundo entendimento de Cavalcanti:

A nova Lei deixa claro que podem ser objeto das medidas assecuratórias os bens, direitos ou valores que estejam em nome do investigado (antes da ação penal), do acusado (após a ação penal) ou de interpostas pessoas. A nova Lei deixa expresso que somente podem ser objeto de medidas assecuratórias os bens, direitos ou valores que sejam instrumento,produto ou proveito do crime de lavagem ou das infrações penais antecedentes[106]

Assim, a alteração deixa claro que o magistrado poderá decretar medidas assecuratórias, ou seja, englobando todas as espécies de medidas consideradas como cautelares.

4.2 As Pessoas Físicas e a Questão das Atividades Contra o Combate à Lavagem de Dinheiro

As consequentes mudanças ocorridas em razão da publicação da nova Lei de Lavagem de Capitais acabaram por implicar também as atividades imobiliárias, industriais e também as comerciais. Assim, o assunto se direciona também para a classe empresarial, administradores e os proprietários que se envolvem nas variadas operações.

Em razão da nova lei de Lavagem de Capitais acabou-se por impor a, praticamente, todos os profissionais na área de compra e venda de imóveis, bem como, dos estabelecimentos comerciais e industriais, sociedades de qualquer natureza, exploração ou mesmo gestão de sociedades, entre outras, o dever de prestar informações às autoridades, principalmente nos casos considerados como suspeito de envolvimento com o crime de branqueamento.[107]

4.3 A quebra de sigilo

De um modo geral o sigilo é protegido por leis ordinárias, principalmente o dos profissionais. Assim, na ordem hierárquica, uma lei nova poderá tanto revogar como alterar outras leis, desde que de mesmo grau hierárquico. Portanto, o sigilo de profissionais como advogados passa a ser tutelado de forma constitucional, sendo interpretado como uma exceção a regra a manutenção sigilosa dos dados do cliente, sem que ocorra a caracterização da cumplicidade ou mesmo co-autoria da prática de atos ilícitos em razão dos advogados ou associações destes[108].

Nesta esteira, Teixeira[109] retrata que:

É de clareza solar que o advogado mereceu tratamento diferenciado na Constituição Federal, que expressamente o considerou indispensável à justiça. Assim, não parece razoável supor que uma lei genérica, que trata de serviços de assessoria, consultoria, auditoria, aconselhamento ou assistência de qualquer natureza possa alterar a lei específica dos advogados para criar obrigações não previstas no estatuto, que contrariam frontalmente a essência da profissão, revogando artigos e princípios de forma implícita.

Portanto, os princípios constitucionais tendem a proteger, tutelar e salvaguardar o sigilo profissional do jurista em razão a imprescindibilidade do profissional advogado para à administração e manutenção da justiça.


CONCLUSÃO

A lavagem de capitais por meio da Lei nº 12.683/12 que reformou a Lei nº 9.613/98 é considerada como um tema recente e merecedor de grande atenção, principalmente pela doutrina pátria.

Em outro viés, a lavagem de dinheiro não trata de diploma penal recente, a mesma está abarcada nos clássicos crimes de conexão, em especial pelo delito de favorecimento real, que tem como objetivo manter o uso do produto do crime.

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A tipificação do crime alvejante obteve força no cenário mundial por meio da sensação de fraqueza na persecução dos crimes vinculados ao tráfico de drogas. Todavia, a sua verdadeira origem é eternizada pela lei seca Norte Americana, que proibiu a comercialização do álcool como bebida.   

Portanto, o estudo sobre a aplicação legislativa acaba por assumir um caráter contínuo, fazendo com que o sistema legal venha a evoluir de forma concomitante com o crescimento da sociedade em que o mesmo se aplique.

A alteração da lei de lavagem de capitais acabou por se dar como meio eficiente para a persecução penal. Assim, a Lei nº 12.683/12 veio representar uma grande reação no que diz respeito ao cumprimento das pressões internacionais em relação a batalha contra o crime organizado, sendo a mesma, liderada principalmente pelos Estados Unidos e a ONU.

Não restam dúvidas que punir a presente conduta delitiva é de suma importância, porém, a sua comprovação é considerada algo difícil, em razão do crime se apresentar complexo. Por tanto, diante desta situação, deverá existir um empenho de todos os participantes sociais para a repressão da prática do crime de branqueamento.

Consequentemente, com a mudança que eliminou o rol fechado de crimes antecedentes, a legislação de nosso país passou para a terceira geração de normas, que já fora adotada por outros Estados desenvolvidos.

Importante salientar que outro avanço se deve a possibilidade do Poder Judiciário acolher a denúncia do crime de lavagem de capitais sem a necessidade da condenação pelo crime antecedente. Medida esta, que traz uma maior celeridade na persecução penal. Gerando como consequência, a diminuição da sensação de impunidade gozada por agentes branqueadores.   

Destarte, é possível compreender que a nova lei elucidou a existência de qualquer controvérsia vivenciada anteriormente, deixando assim, de forma clara e precisa a autonomia do processo que abarca o crime de lavagem de capitais.

Do mesmo modo, aperfeiçoou a possibilidade da condenação do agente do crime de lavagem de capitais sem a ocorrência da punibilidade pelo delito antecedente, mesmo que este já tenha sido extinto ou prescrito.

Depreende-se pelo verdadeiro sentido e alcance dados pelo legislador brasileiro, que o desígnio da lei 9.613/98, com suas alterações concedidas pela lei 12.683/12, é coagir o delinquente a deitar-se sobre o seu lucro espúrio, ancorando-o ao mesmo e impedindo-o de gozar sob qualquer pretexto ou forma, do alvo de sua atividade deletéria.

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Sobre o autor
André Luiz Rapozo de Souza Teixeira

Doutorando em Ciências Jurídico-Criminais pela Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra - FDUC (2020-2025); Mestre em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade Federal da Bahia - UFBA com investigação realizada sobre a tutela penal da ordem econômica (2018); Especialista lato sensu em Direito Público pela Universidade Cândido Mendes - UCAM (2016); Especialista lato sensu em Ciências Criminais pela Faculdade Baiana de Direito - FBD (2015); Bacharel em Direito pela Universidade Católica do Salvador - UCSAL (2012); Associado ao Instituto Brasileiro de Ciências Criminais - IBCCRIM e ao Conselho Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Direito - CONPEDI; Advogado (2012); Tem experiência na área de Direito, com ênfase em Direito Penal.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

TEIXEIRA, André Luiz Rapozo Souza. A Lei 9.613/98 e a necessidade ou não da condenação pretérita para a sua aplicação. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 21, n. 4648, 23 mar. 2016. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/47368. Acesso em: 23 nov. 2024.

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