Distrato/Rescisão de compra de imóvel novo: Justiça manda refazer distrato de devolução de 70%, determinando aumento para 80% de restituição dos valores pagos

24/03/2016 às 22:26
Leia nesta página:

O Tribunal de Justiça de São Paulo, apesar de já ter ocorrido o distrato/rescisão do contrato de compra e venda de imóvel, com devolução de 70% dos valores, mandou aumentar para 80% a devolução.

No caso em tela:

O Requerente, interessado na compra de um imóvel, para uso próprio, realizou diversas pesquisas no mercado imobiliário e em 21/04/2010, imaginando ter encontrado o imóvel que atendia suas expectativas e necessidades, movido principalmente pelos diversos atrativos do empreendimento comercializado pela ora Requerida SAGITÁRIO TORRES EMPREENDIMENTOS IMOBILIARIOS LTDA., e ODEBRECHT REALIZAÇÕES IMOBILIARIAS S/A, adquiriu um apartamento. Pelo compromisso de compra e venda, o Requerente pagaria a importância de R$ 474.411.42 (quatrocentos e setenta e quatro mil, quatrocentos e onze reais e quarenta e dois centavos) pelo “sonho” que estava adquirindo, sendo que pagou a importância de R$ 141.424,42 (cento e quarenta e um mil e quatrocentos e vinte e quatro reais e quarenta e dois centavos), parceladamente na forma estabelecida e o restante seriam financiados por instituição financeira. Com efeito, o Requerente pagou as parcelas religiosamente, ou seja, pagou rigorosamente as parcelas em dia.

Entretanto, o Requerente no momento em que houve a chamada para assinar o financiamento, pela instituição bancária indicada pelas Rés, não teve seu crédito aprovado por esta, mesmo após meses de análises, que sem qualquer explicação não pode sequer ter prazo suficiente para conseguir financiar em outra instituição financeira de sua preferência e diversa da indicada pelas Requeridas, gerando assim a rescisão contratual.

Consta no INSTRUMENTO DE ADESÃO que no caso de rescisão contratual em Cláusula 6.3, o Requerente teria apenas 70% com as deduções de: verbas de corretagem e aos gastos de publicidade, despendidos pela VENDEDORA na ocasião da venda, desde já fixados em 10% (dez por cento) do valor até então pago pelo comprador.

A 1ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferiu a seguinte decisão em sede da apelação nº 1013300-xx.xxxx.8.26.0068: "Deram provimento em parte ao recurso. V. U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão. O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores CLAUDIO GODOY (Presidente sem voto), RUI CASCALDI E FRANCISCO LOUREIRO e o Relator AUGUSTO REZENDE em 22/03/2016.

Ementa (resumo da Decisão)

  •  Compromisso de compra e venda Rescisão contratual através de instrumento de distrato Previsão de restituição de 70% das quantias pagas Abusividade Aplicação do Código de Defesa do Consumidor - Retenção de 20% para compensar os prejuízos da resolução do pacto Correção monetária incidente a partir dos respectivos desembolsos e juros de mora a contar da citação Recurso das rés provido em parte.

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Trata-se de ação de restituição de quantias pagas e indenização de danos morais julgada parcialmente procedente pela sentença de fls. 358/363, para reconhecer a nulidade da cláusula 6.3, caput, do contrato celebrado entre as partes e condenar as rés a restituir ao autor 90% das quantias pagas (R$ 121.523,04, conforme extrato de fls. 228/229), com correção monetária a partir de cada parcela adimplida e juros de mora de 1% ao mês, a contar da citação, repartidos entre os litigantes, em face da sucumbência recíproca, os correspondentes ônus.

Sustentam as rés, em seu recurso, a validade do distrato no qual o autor aceitou a restituição das quantias pagas com as deduções previstas contratualmente. Alegam que a resolução do negócio se deu por culpa do autor, que não obteve o financiamento para pagamento da parte final do preço e, por isso, a restituição deve observar o que foi expressamente pactuado.

Pedem, em caráter alternativo, que a retenção das parcelas pagas seja em percentual não inferior a 25%. Afirmam, por fim, que a correção monetária dos valores a serem devolvidos deve incidir apenas a partir da distribuição da ação e os juros de mora a contar da prolação da sentença. Houve contrarrazões, sustentando o autor o acerto do deslinde dado à causa.

É o relatório

Por primeiro, tendo em vista que a sentença afastou o pleito de restituição da comissão da corretagem e com isso se conformou o autor, não havendo, portanto, discussão a respeito a ser conhecida por esta Câmara, torno sem efeito o despacho de fls. 404, passando ao julgamento do recurso interposto pelas rés.

O autor celebrou com as rés compromisso de compra e venda envolvendo uma unidade do Condomínio Alpha Square, mas não tendo obtido financiamento imobiliário para pagamento da parte final do preço, o contrato foi rescindido mediante distrato (fls. 65/70), no qual avençou-se a restituição de R$ 85.901,41, correspondente a 70% das quantias pagas, conforme cláusula 6.3 do pacto imposto pelas rés, ajuizou a presente ação, que foi julgada parcialmente procedente, determinada a restituição ao autor de 90% das quantias pagas.

Por isso, foi interposto o presente recurso, que em que pese o respeito devido ao entendimento esposado na sentença, merece parcial acolhida.

Com efeito, embora o autor tenha subscrito o distrato, o certo é que, como já decidiu esta Câmara,

  • “(...) o distrato ou quitação nele contida não impedia o acolhimento da pretensão do autor. Como se vem entendendo, dada a natureza da relação em tela, a quitação apenas se há de tomar em relação ao que devolvido. Mas não pode coonestar evidente abusividade, revelada pela devolução de parcela ínfima de tudo que o promissário pagou, de resto na esteira da abusividade da cláusula de retenção contida no próprio compromisso, ou com que se lhe repassaram despesas que são próprias da alienante, e em real venda casada (...)” (TJSP - Apelação Cível nº 1004867-10.2014.8.26.0008, relator Des. Claudio Godoy, j. 10/02/2015).

 Trata-se, aqui, de relação de consumo, e ainda que se alegue dever ser feita a restituição de valores nos termos pactuados em instrumento de distrato, este não pode ocorrer à margem do que estabelece o Código de Defesa do Consumidor.

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Mostra-se abusiva, e, portanto, nula a cláusula que autoriza a retenção de percentual abusivo, colocando em desvantagem exagerada o consumidor, o que é vedado pelo Código de Defesa do Consumidor (inciso IV, artigo 51).

E, efetivamente, embora a ré não possa ser responsabilizada pela rescisão do contrato, que se deveu mesmo à falta de pagamento do parte final do preço, que seria objeto de financiamento bancário, não obtido pelo autor, as quantias pagas por conta do preço devem ser restituídas, autorizada a retenção pelas rés do percentual de 20% (e não de 10%, como determinado na sentença) para compensar prejuízos de ordem administrativa que porventura tenha tido com a resolução do negócio, percentual este costumeiramente adotado por esta Câmara em casos análogos em que a rescisão se dá sem culpa da vendedora.

As rés devem, portanto, restituir ao autor 80% das quantias pagas (observando-se que 70% já foram devolvidos por ocasião do distrato). A correção monetária (que não acrescenta valor, mas apenas o atualiza em face da inflação) incide mesmo a partir dos desembolsos e os juros de mora de 1% ao mês, a contar da citação (momento em que a mora se configurou), neste ponto, não acolhida a pretensão recursal.

Ante o exposto, apenas para alterar o percentual de retenção das quantias pagas, dou parcial provimento ao recurso das rés.

Relator Desembargador Augusto Rezende

Conclusão do Escritório Rodrigues Advocacia:

Diversamente do que acreditam muitos operadores do direito, apesar de ter sido celebrado um termo de distrato de compra de imóvel com devolução de 70% dos valores pagos pelo comprador, mesmo assim o Judiciário entendeu que a construtora não poderia reter 30% dos valores desembolsados pelo comprador e mandou devolver 80%, corrigindo os valores desde as datas dos pagamentos +1% de juros a partir da citação e a devolução tem que ser a vista.

Trata-se de um caso típico de revisão de distrato por este ser interpretado como abusivo e que coloca o comprador do imóvel na planta em grande desvantagem frente à construtora fornecedora.

Aplicando princípios protetivos do Código de Defesa do Consumidor, cada vez mais os Tribunais vem percebendo a necessidade de ampliar a proteção ao comprador de imóvel, antes da compra, onde ele muitas vezes é enganado no stand de vendas, depois da compra e até e não menos importante, após o distrato da compra do imóvel.

Ora, em uma situação hipotética, onde o consumidor tenha pago 200 mil reais para a construtora, em sendo devolvido 70 desse valor, ficam retidos com a construtora 60 mil reais. Considerando que o imóvel será vendido novamente é de uma abusividade gritante.  

O Juiz de primeiro grau, apesar de ter havido devolução de 70% dos valores pagos em sede de distrato firmado entre comprador e construtora, entendeu por bem aumentar o valor da restituição para 90%.

A construtora não se contentando, propôs recurso e o Tribunal baixou o percentual para 80%.

Muito compradores, não sabem que podem sim, mesmo estando escrito no contrato o contrário, pedir revisão de cláusula abusiva e até revisão de distrato de compra de imóvel na planta.

As construtoras como regra, ao restituírem pequeno percentual do que foi pago, não o fazem com correção monetária + 1% de juros e a vista como determina o Judiciário paulista.

As ações de distrato/rescisão de compra de imóvel tem sido rápida em São Paulo capital. Como não há audiência, em torno de 6 meses em média tem-se proferida uma decisão judicial.

Assim, entendemos que o melhor caminho para o comprador, é contratar um advogado especialista e propor uma ação para rescisão contratual com devolução da unidade imobiliária  e recebimento dos valores pagos. Afinal a construtora, segundo o Judiciário, retém cerca de 10% do que foi pago e pode vender o imóvel novamente obtendo lucro.    

No presente caso, nos surpreendeu de forma positiva a determinação de, mesmo tendo sido feito um distrato de compra e venda anterior a ação judicial, com devolução de 60% dos valores pagos na compra do imóvel, o Judiciário entendeu como sendo abusiva a devolução deste percentual que se mostra de certa forma expressivo, tendo em vista que as construtoras, em regra, costumam devolver cerca de 30%, sem correção e parcelado. Foi levado em conta, o indevido enriquecimento ilícito por parte da construtora. Haja vista que a construtora venderá novamente a unidade imobiliária e obterá lucros.

Veja perguntas e respostas sobre o tema

http://www.rodriguesadvocaciabr.adv.br/#!d/c1513

Veja esta e outras Decisões mandando devolver, em sede de distrato/rescisão de compra e imóvel 90% ou 80% dos valores pagos

http://www.rodriguesadvocaciabr.adv.br/#!distrato/sz7z4

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Sobre o autor
Carlos Rodrigues

Formado em Direito no ano de 1998 - atua há mais de 20 anos - Advogado - Pós-Graduado em Direito - Palestrante - professor e escritor. Especialistas em Direito Imobiliário. Distrato de Compra de Imóvel Novo. [email protected] site www.rodriguesadvocaciabr.adv.br ou www.juridicorodrigues.adv.br whatsapp (11) 9 8139-4074

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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