Conforme sabido, pelo contrato de seguro, o segurador se obriga a garantir o interesse do segurado contra riscos predeterminados, sendo obrigado a pagar, em dinheiro, o prejuízo resultante do risco assumido, ressalvada a hipótese, contratualmente convencionada, de substituição da coisa (CC, artigos 757 e 776).
Muito embora a exigência legal de autorização estatal para atuação no mercado de seguros (art. 757, p.ú.), existem hoje no Brasil uma série de empresas, cooperativas e associações, sob as mais variadas denominações, comercializando irregularmente seguros, fato este que por si só tem causado prejuízo para uma extensa gama de consumidores, que são atraídos, muitas das vezes, através da veiculação, nos meios de comunicação, de proteção integral do seu patrimônio, mediante a contraprestação de valores irrisórios.
Apesar de grave, este aspecto não constitui objeto de estudo neste artigo, sendo oportuno apenas para registro de que a única forma, legalmente admitida, destas empresas atuarem no mercado de seguros, se dá na condição de estipulante do contrato, ou seja, contratando a apólice coletiva de seguro junto a sociedades seguradoras devidamente habilitadas.
Com efeito, seja no mercado regular de seguros, exercido através de sociedades seguradoras, seja no mercado informal ou “pirata”, exercido precipuamente por associações e cooperativas, tem havido uma crescente negativa de pagamento das indenizações devidas ao segurado, ao argumento de agravamento do risco contratado.
De fato, existe a possibilidade de recusa do pagamento da indenização com base no agravamento do risco, contudo, por força de lei, aludida hipótese somente se revela válida quando demonstrado, de modo cabal e inequívoco, que o segurado, e somente ele, firasa-se, agravou, de modo intencional, o risco objeto do contrato de seguro (CC, art. 768).
A propósito, Arnold Wald preceitua que: "para desconstituir o direito do beneficiário do seguro, incumbe à seguradora demonstrar, cabal e inequivocamente, que o proponente agiu com má-fé, alterando, intencionalmente, a verdade, com o propósito de influir na aceitação. Na interpretação do contrato de seguro, deve-se adotar a mesma regra dos de adesão; na dúvida, a favor do aderente, bastando a simples ignorância para a prova da boa-fé" (Curso de Direito Civil Brasileiro - Obrigações e Contratos, 12ª edição, 1995, p. 443).
Conforme ponderado, o ato de agravamento do risco, além de intencional, deve ser praticado pelo segurado, ou seja, pela pessoa que contratou o seguro, não sendo legítima a recusa do pagamento da indenização por parte do segurador quando não intencional o ato ou quando ele for praticado por terceiro.
Debruçado na análise destes casos, o Colendo Superior Tribunal de Justiça já teve ocasião de assentar que a culpa exclusiva de terceiro na ocorrência de acidente de trânsito não constitui causa ou justa causa para a negativa do pagamento da indenização securitária. Vejamos:
AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE COBRANÇA. ACIDENTE DE TRÂNSITO. SEGURO. EMBRIAGUEZ DE TERCEIRO CONDUTOR. FATO NÃO IMPUTÁVEL À CONDUTA DO SEGURADO. EXCLUSÃO DA COBERTURA. IMPOSSIBILIDADE. PRECEDENTES. 1. A culpa exclusiva de terceiro na ocorrência de acidente de trânsito, por dirigir embriagado, não é causa de perda do direito ao seguro, por não configurar agravamento do risco provocado pelo segurado. Precedentes. 2. Agravo regimental não provido. (STJ - AgRg no REsp: 1408030 RS 2013/0333715-0, Relator: Ministro MOURA RIBEIRO, Data de Julgamento: 18/11/2014, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 28/11/2014)
Conforme se observa da leitura do precedente invocado, o segurador negou o pedido do segurado de pagamento da indenização securitária, ao fundamento de que no momento do evento danoso (acidente), o veículo objeto do contrato de seguro firmado entre as partes estava sendo conduzido por terceiro alcoolizado, fato este que supostamente teria majorado o risco do seguro.
Apesar do dano ter sido causado, em princípio, pelo cometimento de um ilícito (embriaguez ao volante), tal fato não pode ser atribuído ao segurado, uma vez que não era ele quem conduzia o veículo no momento do acidente, não sendo lícito, portanto, responsabilizá-lo pela prática de uma conduta antijurídica perpetrada pelo condutor do veículo.
Resta claro, desta forma, que à luz da lei e do entendimento jurisprudencial, notadamente do Superior Tribunal de Justiça, que a causa de exclusão do dever de indenizar o bem segurado, por conta do agravamento do risco contratado, somente se revela válida ou lícita, quando comprovada uma ação intencional do segurado de fraudar o contrato de seguro e, com isso, majorar o risco inicialmente contratado.