IX Considerações finais
Inferiu-se do presente escrito que o Direito, enquanto fenômeno cultural é modelado pela civilização vigorante no espaço e tempo, sofrendo os influxos culturais que projetam a civilização. Neste ponto o Direito é um produto da cultura.
O Direito, outrossim, mostra-se como uma das mais poderosas ferramentas na mantença do status civilizationes, pois confirma toda a plataforma de valores necessários para forjar o modelo cultural manifesto na civilização vigorante.
Nesse contexto jurídico embebecido de cultura e civilização, é que surge a figura do juiz, como agente político executor e mantenedor da ordem cultural reinante, que se mostra e sedimenta através de textos legais, sendo a Constituição o mais relevante deles, pois guarda e exprime todo o plexo de princípios e regras que encerram os valores (morais, religiosos, etc.) presentes num dado contexto histórico.
A Constituição é o arquétipo de atuação dos agentes políticos, sobretudo do Magistrado, pois é quem tem o condão de realizar – de modo especial, pois em ultima ratio – o arcabouço cultural da sociedade consagrado no Texto Maior, pondo fim a qualquer discussão que surja dos conflitos de interesses entre cidadãos, concretizando, por fim, os direitos fundamentais incidentes sobre a espécie.
Motivado pelo seu papel de realizador da Constituição (vontade de Constituição), o juiz deve se pautar por toda sorte de compromisso ético, técnico, humanístico, tendente a entregar ao cidadão aquilo que lhe foi gerado de expectativa pelo Direito. Este é o seu compromisso ético. Se assim não procede, presta um "desserviço" à justiça, ao Estado e – de forma menos sintomática, por isso mesmo mais nociva – à civilização e ao modelo de cultura que fez gerar toda a estrutura social (valores, regras, direitos, etc.).
Melindrando subversão: do sistema, da civilização, da cultura, é que bate o sentimento de irresignação quanto ao "atual momento", clamando ciência, sobretudo "consciência" do juiz, enquanto agente político realizador e mantenedor do status civilizacional, rogando que se acumplicie da Constituição enquanto "lugar comum" do seu gosto e modo comportamental, inclusive da sua visão de mundo, não apenas jurídico...
A Constituição, usando frase de Streck, "ainda constitui", em especial, a virtude política do Magistrado. Sim, é a sua seiva de vitalidade. E o mesmo deve beber deste néctar ou do contrário nunca terá a dimensão da sua importância, quiçá da sua responsabilidade! Daí já é subversão e o juiz vira sabotador... "Levar os direitos a sério", outra frase de efeito... Pois é: o caminho sem volta do juiz... Reclamo do papel político que exerce em qualquer República, inclusive na democrática de terrae brasilis!
Então, à questão de início, sustenta-se que o sistema brasileiro, exige de tu, oh juiz!, na realização da força normativa do Texto Magno, que simboliza e encerra a "vontade" de realizar o Direito Político do Estado, relação, deferência e cooperação com as partes e advogados, na concreção dos valores formadores e conformadores do modelo de processo institucional brasileiro. Relação que deve realizar-se na Ágora moderna: a Constituição, que consagra um plexo de valores, princípios e regras a serem concretizados. Ao revés, o juiz – realizador em ultima ratio da Carta Política – será para a República persona non grata e poderá coloca-la em risco. Mal que deve ser evitado...
A guisa de conclusão, inclusive de maturação, roga-se ciência, sobretudo "consciência" e animus politicus dos agentes imbuídos de realizar e manutenir a plataforma de valores, princípios e regras da Lex Fundamentalis. Documento raiz da democracia brasileira, que necessita ser confirmada e reconfirmada na vontade de Constituição, pois repisando o alerta de Ortega y Gasset: "a civilização não está aí, não se sustém a si mesma. É um artifício e requer um artista ou artesão", e vindo a desmoronar, cai todo o resto!
Referências
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Notas
[1] REALE, Miguel. Filosofia do Direito. Saraiva. São Paulo: 1993, p. 218.
[2] Idem, ibidem.
[3] Idem, ibidem.
[4] REALE, Miguel. Lições Preliminares de Direito. Saraiva. São Paulo: 2015, p. 27.
[5] ORTEGA y GASSET, José. A Rebelião das Massas. Relógio D’Água. Lisboa, p. 96.
[6] GUSMÃO, Paulo Dourado de. Introdução ao Estudo do Direito. Forense. Rio de Janeiro: 2003, p. 45.
[7] PASSOS, J.J. Calmon de. Direito, Poder, Justiça e Processo: julgando os que nos julgam. Forense. Rio de Janeiro: 2001, passim.
[8] LASSALE, Ferdinand. A essência da Constituição. Lumen Juris. Rio de Janeiro: 2007, passim.
[9] GOYARD-FABRE, Simone. Os fundamentos da Ordem Jurídica. Martins Fontes. São Paulo: 2007, prefácio, p. XIV.
[10] Apud GUSMÃO, Paulo Dourado de. Introdução ao Estudo do Direito. Forense. Rio de Janeiro: 2003, p. 47.
[11] STRECK, Lenio Luiz. Jurisdição Constitucional e Decisão Jurídica. 3ª ed., Revista dos Tribunais: São Paulo, 2013, p. 30.
[12] Apud HESSE, Konrad. A força normativa da Constituição. Sergio Antonio Fabris. Porto Alegre: 1991, p. 05.
[13] HESSE, Konrad. Op. cit., p. 24.
[14] HESSE, Konrad. Op. cit., p. 19.
[15] STRECK, Lenio Luiz. Jurisdição Constitucional e Decisão Jurídica. 3ª ed., Revista dos Tribunais: São Paulo, 2013, p. 39.
[16] GOYARD-FABRE, Simone. Os princípios filosóficos do Direito Político Moderno. Martins Fontes. São Paulo: 2002, passim.
[17] REALE, Miguel. Lições Preliminares de Direito. Saraiva. São Paulo: 2015, p. 04.
[18] Idem, ibidem.
[19] Idem, ibidem.
[20] Cf. GOYARD-FABRE, Simone. O que é democracia. Martins Fontes. São Paulo: 2003, p. 10.
[21] Idem, ibidem.
[22] BONAVIDES, Paulo. Ciência Política. Malheiros. São Paulo: 2014, p. 288.
[23] Idem, ibidem.
[24] Idem, ibidem.
[25] Apud HESSE, Konrad. A força normativa da Constituição. Sergio Antonio Fabris. Porto Alegre: 1991, p. 17.
[26] Cf. PASSOS, J.J. Calmon de. Direito, Poder, Justiça e Processo – Julgando os que nos julgam. Forense. Rio de Janeiro: 2000, p. 05, sobretudo as páginas 67-92.
[27] CARVALHO JÚNIOR, Odilair. Dos provimentos antecipatórios e o Devido Processo Legal. Disponível em: <http:// www.dominiopublico.gov.br/download/teste/arqs/cp099374.pdf>. Acesso em 05/01/2016.
[28] GONÇALVES, William Couto e GAVIORNO. Gracimeri Vieira Soeiro de Castro, O Devido Processo Legal e o Processo Justo. Disponível em: <http://www.fdv.br/publicacoes/periodicos/revistadepoimentos/n10/6.pdf>. Acesso em 04/01/2016.
[29] STRECK, Lenio Luiz. Jurisdição Constitucional e Decisão Jurídica. 3ª ed., Revista dos Tribunais: São Paulo, 2013, p. 39.
[30] GONÇALVES, William Couto e GAVIORNO, Gracimeri Vieira Soeiro de Castro. O Devido Processo Legal e o Processo Justo. Disponível em: <http://www.fdv.br/publicacoes/periodicos/revistadepoimentos/n10/6.pdf>. Acesso em 04/01/2016.
[31] CARVALHO JÚNIOR, Odilair. Dos provimentos antecipatórios e o Devido Processo Legal. Disponível em: <http:// www.dominiopublico.gov.br/download/teste/arqs/cp099374.pdf>. Acesso em 05/01/2016.
[32] Idem, ibidem.
[33] MARINONI, Luiz Guilherme. Coisa Julgada Inconstitucional. 2º ed. Saraiva. São Paulo, 2010, p. 14.
[34] MARINONI, Luiz Guilherme. Princípio da Segurança Jurídica dos Atos Jurisdicionais. Disponível em: <http://www.marinoni.adv.br/artigos.php#>. Acesso em 05/01/2016.
[35] SARLET, Ingo Wolfgang. A Eficácia do direito fundamental à segurança jurídica: dignidade da pessoa humana, direitos fundamentais e proibição de retrocesso social no direito constitucional brasileiro. Revista de Direito Constitucional, v. 57, p. 11.
[36] BOBBIO, Norberto. A Era dos Direitos. Elsevier, Rio de Janeiro, 2004, p. 23.
[37] MARTINS, Ives Gandra da Silva. Corrupção: a vicissitude do poder. Disponível no endereço eletrônico: <http://www.livrariart.com.br/pagina/revista-dos-tribunais-vol967-2016>. Acesso em 10/06/2016.
[38] TOCQUEVILLE, Alexis de. A Democracia na América: Leis e Costumes. Martins Fontes, São Paulo, 2005, p. 05.