O pedido de vista do ministro Luís Roberto Barroso suspendeu o julgamento conjunto dos Recursos Extraordinários (REs) 566471 e 657718, analisados pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) na sessão desta quinta-feira (15). Os recursos, que tiveram repercussão geral reconhecida, tratam do fornecimento de remédios de alto custo não disponíveis na lista do Sistema Único de Saúde (SUS) e de medicamentos não registrados na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).
O único voto até o momento foi o do relator, ministro Marco Aurélio, que se manifestou no sentido de negar provimento aos dois recursos.
No caso do RE 566471, o Estado do Rio Grande do Norte se recusou a fornecer medicamento – citrato de sildenafila – para uma senhora idosa e carente, alegando que o alto custo e a ausência de previsão no programa estatal de dispensação de medicamentos seriam motivos suficientes para recusa. A idosa acionou a Justiça para pleitear que o estado fosse obrigado a fornecer o fármaco. A sentença de primeiro grau determinou a obrigação do fornecimento, decisão que foi confirmada pelo Tribunal de Justiça estadual.
Autor do recurso contra a decisão do TJ-RN, o procurador do Rio Grande do Norte disse que é preciso dar a máxima efetividade ao princípio da eficiência. Ele explicou que os medicamentos de alto custo têm uma política pública definida pelo Ministério da Saúde, que estabelece a relação de medicamentos a serem disponibilizados aos usuários. Essa relação contempla vários fármacos, dividindo-os por competências da União, de estados e de municípios. É essa divisão, segundo o procurador, que não vem sendo respeitada. Assim, o cidadão que precisa de um remédio que é de competência da União pode demandar o município, que pode ser obrigado a fornecer o medicamento, desorganizando as finanças do ente federado.
Mais uma vez se vê diante de um grande problema: as dificuldades financeiras do Estado, muitos deles em estado de insolvência, e o direito a saúde e a vida, que são direitos indisponíveis e garantidos ao cidadão pela Constituição.
A solução apresentada pela Procuradoria do Rio Grande do Norte é de cunho eminentemente burocrático e financeiro, e não resolve o problema.
Aponto na matéria as lições de Andreas Joaquim Krell, quando disse que a Constituição confere ao legislador uma margem substancial de autonomia na definição da forma e medida em que o direito social deve ser assegurado e que a eficácia dos direitos fundamentais sociais depende dos recursos públicos disponíveis. No entanto, a negação de qualquer tipo de obrigação a ser cumprida na base dos Direitos Fundamentais Sociais tem como consequência a renúncia de reconhecê-los como verdadeiros direitos, de modo a permitir a intervenção do Judiciário em caso dessas omissões.
O certo é que não há discricionariedade na adoção de políticas públicas, pois a Constituição já determina sua realização.
Há casos em que há normas impositivas de ação governamental que são acompanhadas de parâmetros de concretização e sanções por sua inobservância.
O princípio da separação de poderes não pode ser usado para descumprimento de deveres públicos em caso de grave epidemia, quando se exige da Administração uma obrigação de fazer.
Aqui aplica-se o princípio da proporcionalidade.
Admite-se o acesso do Ministério Público ao Judiciário, objetivando o fornecimento de medicamentos, em defesa do direito à saúde, direito indisponível, como se lê do julgamento no AgRg no Ag 1247323/SC, Relator Ministro Herman Benjamin, Dje de 1º de julho de 2010.Na ação civil pública ajuizada, objetivando que a Administração supra postos de saúde com remédios e instalações adequadas para a defesa da saúde da população, está em discussão o princípio da dignidade da pessoa humana, um princípio impositivo, que norteia o Estado Democrático de Direito.
De toda sorte, a decisão tomada pelo Ministro Marco Aurélio alerta para um bom caminho: que nos casos de remédios de alto custo não disponíveis no sistema, o Estado pode ser obrigado a fornecê-los, desde que comprovadas a imprescindibilidade do medicamento e a incapacidade financeira do paciente e sua família para aquisição, e que o Estado não pode ser obrigado a fornecer fármacos não registrados na agência reguladora.