No dia 18 de janeiro de 2017, o Governo determinou, por meio de Decreto publicado no Diário Oficial da União, que as Forças Armadas devem atuar em todos os estabelecimentos prisionais brasileiros para a detecção de armas, aparelhos de telefonia móvel, drogas e outros materiais ilícitos ou proibidos [1].
Os estados e o Distrito Federal deverão concordar com essa atuação em observância ao princípio federativo. Assim, caso haja anuência, as Forças Armadas atuarão em conjunto com os agentes penitenciários do Departamento Penitenciário Nacional do Ministério da Justiça e Cidadania. O Ministério da Defesa será responsável por editar normas complementares para tratar do tema.
O ministro da Defesa, Raul Jungmann, anunciou que, inicialmente, mil integrantes das Forças Armadas serão mobilizados para as operações nos presídios. Esse número, no entanto, pode aumentar, a depender dos governadores dos estados. O gasto previsto é de R$ 10 milhões, inicialmente, podendo sofrer majorações.
No mesmo dia em que ocorreu a publicação do referido Decreto, o Ministério da Justiça determinou que a Força Nacional auxilie [2] nas ações de segurança ao sistema prisional em Roraima por 30 dias, a partir do dia 9 de janeiro de 2017.
A atividade envolverá ações de policiamento ostensivo, na modalidade de Rádio Patrulhamento, nos perímetros externos do Sistema Penitenciário do Estado de Roraima. O número de policiais disponibilizados não foi divulgado na portaria, pois obedecerá ao planejamento definido pelos entes envolvidos na operação.
A ordem foi emitida considerando a manifestação expressa da governadora do estado de Roraima, por intermédio do Ofício, quanto à necessidade do emprego da Força Nacional de Segurança Pública, com o propósito de apoiar as ações da Polícia Militar no controle do Sistema Prisional do Estado de Roraima.
As Forças Armadas são compostas pela Marinha do Brasil, pelo Exército Brasileiro e pela Força Aérea Brasileira, e são responsáveis pela defesa do território nacional, bem como devem garantir os poderes constitucionais e manter a paz e a ordem. Por outro lado, a Força Nacional é composta por policiais e bombeiros dos grupos de elite, que passam por um rigoroso treinamento no Batalhão e atendem às necessidades emergenciais dos estados. Desse modo, o sistema prisional contará com dois tipos de atuação.
O sistema prisional de Roraima ganhou destaque na mídia devido à morte de diversas pessoas. O cenário é tão grave que os próprios presos estão divulgando imagens das mortes em vídeos na internet, o que denota outra irregularidade: o uso de celulares dentro dos presídios.
Esse cenário de turbulência no sistema prisional, porém, não é exclusividade dos tempos atuais. A título de exemplo, cita-se o caso de Amazonas, onde ocorreu a morte de 56 detentos no Complexo Penitenciário Anísio Jobim, bem como as mortes na Penitenciária Juiz Plácido de Souza, em Caruaru, estado de Pernambuco. Assim, a situação vivida por Roraima não é muito diferente daquela vivida pelos presídios de todos os estados.
Os problemas perpassam a falta de infraestrutura e excesso de presos. Na busca por auxílio, nove governadores foram à Presidência da República nesta semana para discutir a crise no sistema carcerário.
Ainda diante desse cenário, o Governo criou, na última quinta-feira, 19, a Comissão de Reforma do Sistema Penitenciário Nacional, que será responsável por: avaliar o Sistema; acompanhar a implementação do Plano Nacional de Segurança Pública, no que se refere à modernização e à racionalização do Sistema; e formular propostas para a reforma do Sistema Penitenciário Nacional [3]. A Comissão é formada por representantes da Casa Civil e dos ministérios da Defesa, Relações Exteriores, entre outros. Destaca-se que um agente penitenciário que tenha carreira e seja indicado pelo diretor-geral do Departamento Penitenciário Nacional do Ministério da Justiça e Cidadania fará parte dessa Comissão.
Reflexão
A crise do sistema prisional trouxe à reflexão da nossa sociedade vários aspectos e situações que demonstram a fragilidade na aplicação do Direito. Mais grave se apresenta essa fragilidade quando se discutem direitos fundamentais.
Em São Paulo, um homem passou sete meses preso por furtar uma lata de leite condensado e três pacotes de bolacha. Os quatro produtos, somados, custavam R$ 7,48. A Defensoria Pública pediu a liberdade do acusado, e o pedido foi negado pelo juiz de primeiro grau sob o argumento de que ele não tinha comprovante de residência. Em outro caso, um homem foi condenado a cinco anos de prisão por carregar pinho sol e água sanitária durante as manifestações de junho. O Ministério Público e a Justiça entenderam que a pessoa iria fazer um coquetel molotov.
Em outro caso, uma mulher foi presa por ter furtado um xampu e um condicionador em um supermercado e perdeu um olho enquanto estava presa. Os casos são inúmeros e são divulgados todos os dias pelos jornais. Pessoas são frequentemente condenadas à prisão por terem cometido crimes em casos que poderiam ser resolvidos sem a mais grave das penalidades prevista no Código Penal: a restrição da liberdade. É preciso repensar nosso sistema prisional e o risco que os presos oferecem para a ordem pública.
O que se defende aqui é um aprimoramento urgente do sistema penal, inclusive para rever a prevenção e a forma como se poderia retomar o curso da evolução – e não o da destruição.
Este momento de debate é importantíssimo até para que a sociedade auxilie os seus representantes na elaboração de um projeto de lei que preveja alguma medida salutar para combater as rebeliões e aprimorar o sistema. Diante disso, é importante que todos acessem o Projeto de Lei do Senado nº 236/2012, que é o novo Código de Processo Penal. Atualmente, o projeto é relatado pelo senador Antonio Anastasia e está, desde de setembro de 2016, na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania. Uma norma tão impactante quanto o novo Código merece toda a nossa atenção.
É importante lembrar que algumas iniciativas deram certo, a título de exemplo, cita-se o caso do presídio de Minas Gerais, construído e operado por meio de Parceria Público-privada.
Notas
1 BRASIL. Decreto de 17 de janeiro de 2017. Diário Oficial da União [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 18 jan. 2017. Seção 1, p. 01.
2 MINISTÉRIO DA JUSTIÇA E CIDADANIA. Portaria nº 58, de 16 de janeiro de 2017. Diário Oficial da União [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 18 jan. 2017. Seção 1, p. 18.
3 BRASIL. Decreto de 18 de janeiro de 2017. Diário Oficial da União [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 19 jan. 2017. Seção 1, p. 05.