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A acusação de homicídio sem cadáver da vítima e uma longa prisão preventiva

20/03/2017 às 11:00
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O artigo examina caso concreto de homicídio sem cadáver e ainda a longa duração da prisão preventiva.

Fala-se na morte de Eliza Samúdio.  

É certo que seu cadáver nunca apareceu. Como ainda nunca apareceu o cadáver de Dana de Teffé. Pela morte da milionária checa Dana de Teffé falou-se que o principal acusado, advogado Leopoldo Heitor, não poderia ser condenado.

Leopoldo Heitor, conhecido como advogado do diabo, foi acusado de ter matado Danna de Teffé, em 1964, com quem supostamente mantinha um relacionamento amoroso. O cadáver da vítima não foi encontrado e o advogado absolvido em três julgamentos pelo Tribunal do Júri. O caso teve grande repercussão na imprensa, obrigando a polícia a vasculhar vários locais em busca da ossada e a justiça ficou de mãos atadas pois não tinha o corpo de delito.

Daci Antonio Porte, na cidade de Uberlândia, em 1988, foi condenado a 13 anos de prisão por ter matado sua companheira Denise Lafetá Saraiva, cujo cadáver também não foi encontrado. Apesar de ter sido impronunciado em razão da ausência do cadáver, o TJ acatou o recurso ministerial e veio a pronunciá-lo. Os jurados entenderam que as provas documentais e testemunhais eram suficientes para demonstrar a materialidade.

No caso de Elisa Samúdio bem argumentou o Professor Luiz Flávio Gomes (Existe homicídio sem o corpo da vítima?): “Caso o corpo de Eliza Samudio não seja encontrado é possível, mesmo assim, haver indiciamento dos suspeitos? É possível dar início ao processo (contra eles)? É possível haver pronúncia? (ou seja: o caso ser remetido ao julgamento do tribunal do júri). É possível que haja condenação final, pelos jurados, mesmo não sendo encontrado o corpo da vítima? Há homicídio sem o corpo da vítima?”

Disse o Professor Flávio Gomes:

“O  Código de Processo Penal (art. 167) admite a prova indireta (testemunhal) quando o corpo da vítima desaparece. Por que existe essa regra processual? Para evitar a impunidade. Se essa regra não existisse bastaria matar a vítima e fazer desaparecer o seu corpo (para se garantir a impunidade). A doutrina avaliza esse direcionamento legal (Avena, Aury Lopes Júnior, Nucci, Tucci etc.). A jurisprudência também: STJ, HC 110.642, j. 19.03.2009; STJ, HC 79.735, j. 13.11.2007; STJ, HC 51.364, j. 04.05.2006; STJ, HC 39.778, j. 05.05.2005; STJ, HC 30.471, j. 22.03.2005; STJ, HC 23.898, j. 21.11.2002.

Sintetizando: a comprovação da morte da vítima (que constitui a materialidade da infração) exige prova direta (perícia do próprio corpo). Essa é a regra. Excepcionalmente, para suprir-lhe a falta (em virtude do desaparecimento dos vestígios), a lei processual admite a prova indireta (testemunhal). Um terceiro meio probatório sozinho, isolado (outros indícios da morte: sangue, cabelo da vítima etc.), a lei não prevê. Mas junto com a prova indireta (testemunhal) pode ser que vários outros indícios sejam encontrados (e provados). Nesse caso, tais indícios reforçam a prova indireta. Esse conjunto probatório indireto + indiciário pode alcançar o patamar de uma convicção que afasta todo tipo de dúvida. Isso pode gerar condenação.”

A jurisprudência  dá amparo à sentença de pronúncia mesmo quando não há prova direta da materialidade do crime de homicídio e tem aceito a prova da materialidade baseada em prova testemunhal.

O Supremo Tribunal Federal, em decisão de lavra do Ministro Carlos Veloso, entende que na ausência do corpo de delito, mas havendo indícios veementes da existência do crime e da autoria, as dúvidas quanto à certeza do crime e da autoria deverão ser dirimidas durante o julgamento pelo Tribunal do Júri:

“PENAL. PROCESSUAL PENAL. “HABEAS CORPUS”. SENTENÇA DE PRONÚNCIA. TRIBUNAL DO JÚRI. CORPO DE DELITO: AUSÊNCIA. INDÍCIOS VEEMENTES DA EXISTÊNCIA DO CRIME E DA AUTORIA. CPP, art.408.I. - Por ser a pronúncia mero juízo de admissibilidade da acusação, não é necessária prova incontroversa do crime, para que o réu seja pronunciado. As dúvidas quanto à certeza do crime e da autoria deverão ser dirimidas durante o julgamento pelo Tribunal do Júri. Precedentes do STF. II. – H.C. indeferido”.III. (HC n° 73522/MG – STF - DJ 26/04/96) (grifou-se)

Na mesma linha, entendem o Superior Tribunal de Justiça e o Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul:

“CRIMINAL. HC. HOMICÍDIO QUALIFICADO. OCULTAÇÃO DE CADÁVER. FORMAÇÃO DE QUADRILHA. AUSÊNCIA DE LAUDO COMPROBATÓRIO DA MATERIALIDADE. IRRELEVÂNCIA. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA NÃO DEMONSTRADA. ORDEM DENEGADA. I. Havendo nos autos outros meios de provas capazes de levar ao convencimento do julgador, não há falar em nulidade processual por ausência do exame de corpo de delito. II. A impetração não conseguiu ilidir a prova da materialidade nem os indícios de autoria, não restando evidenciada qualquer ausência de suporte probatório para o oferecimento da exordial acusatória. III. O trancamento da ação penal, por falta de justa causa, só é possível quando, de pronto, sem a necessidade de exame valorativo do conjunto fático ou probatório, evidenciar-se a atipicidade do fato, a ausência de indícios a fundamentarem a acusação ou, ainda, a extinção da punibilidade, hipóteses não verificadas no caso dos autos. IV. Ordem denegada.” (HC n.º 39788-ES. STJ) (grifou-se)“REVISÃO CRIMINAL. - O requerente busca o reexame da condenação sem apresentar prova nova, alegando a precariedade da prova que ensejou sua condenação. Não é possível tratar a Revisão Criminal como uma segunda apelação. Precedentes. - Do voto do eminente Desembargador MANUEL JOSÉ MARTINEZ LUCAS, quando do julgamento do apelo, se constata claramente que a manutenção da condenação tem apoio em elementos de prova que constam dos autos. - Lembramos, quanto ao tema (''Prova da materialidade do homicídio''), passagem das lições do mestre HUNGRIA (''Será possível o êxito de um processo penal por crime de homicídio sem que apareça o cadáver da vítima? Dizia CARRARA: "Não se pode afirmar que existe crime de homicídio, enquanto não esteja averiguado que um homem tenha sido morto por obra de outro. E não se pode dizer que um homem haja morrido, enquanto não se encontra o seu cadáver ou, pelo menos, os restos deste, devidamente reconhecidos." Tal critério é demasiadamente rigoroso, e poderia, na sua irrestrição, conduzir à impunidade de manifestos autores de homicídio. Haja vista o caso citado por IRURETA GOYENA: dois indivíduos, dentro de uma barca no rio Uruguai, foram vistos a lutar renhidamente, tendo sido um deles atirado pelo outro à correnteza, para não mais aparecer. Foram baldadas as pesquisas para o encontro do cadáver. Ora, se, não obstante a falta do cadáver, as circunstâncias eram de molde a excluir outra hipótese que não fosse a da morte da vítima, seria intolerável deixar-se de reconhecer, em tal caso, o crime de homicídio. Faltava a certeza física, mas havia a absoluta certeza moral da existência do homicídio. Conforme justamente observa GOYENA, não se deve confundir o "corpo de delito" com o "corpo da vítima", e para a comprovação do primeiro basta a certeza moral sobre a ocorrência do evento constitutivo do crime.''). - Por outro lado, a alegação de insuficiência de provas não dá ensejo a revisão. Precedentes. - Tratando-se de processo da competência do Júri, não podemos olvidar da posição defendida pelo eminente DESEMBARGADOR IVAIR NOGUEIRA ITAGIBA, apoiada pelo ilustrado DESEMBARGADOR NELSON HUNGRIA, quando da discussão que resultou na aprovação da Conclusão XLV, da Conferência dos Desembargadores (in CÓDIGO DE PROCESSO PENAL BRASILEIRO ANOTADO, EDUARDO ESPÍNOLA FILHO, edição histórica, Tomo II, Vol VI, pág. 135, Editora Rio). REVISÃO CRIMINAL IMPROCEDENTE.” (Revisão Criminal Nº 70017801481, Primeiro Grupo de Câmaras Criminais, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Marco Aurélio de Oliveira Canosa, Julgado em 03/08/2007) (grifou-se)

“CÓDIGO PENAL. ART. 121, § 2°, INC. II E III DO CP. HOMICÍDIO QUALIFICADO. MOTIVO FÚTIL E MEIO CRUEL. [...]Prova suficiente de que o corpo da vítima foi jogado, com o intuito de garantir a impunidade, em uma sanga, ou seja, com o objetivo de evitar ou dificultar sua descoberta e a investigação do crime. PRELIMINARES REJEITADAS. APELAÇÃO MINISTERIAL PROVIDA, EM PARTE, PARA AUMENTAR A PENA. UNÂNIME. APELO DEFENSIVO PARCIALMENTE PROVIDO. POR MAIORIA.” (Apelação Crime Nº 70016163941, Primeira Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Ivan Leomar Bruxel, Julgado em 11/10/2006) (grifou-se)

“APELAÇÃO CRIME. HOMICÍDIO DUPLAMENTE QUALIFICADO CONTRA DESCENDENTE, OCULTAÇÃO DE CADÁVER E ABANDONO DE MENOR. A materialidade, na falta do corpo de delito, pode ser comprovada pela prova testemunhal. Inteligência do art. 167 do Código de Processo Penal. [...]” (Apelação Crime Nº 70013588066, Primeira Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Manuel José Martinez Lucas, Julgado em 29/03/2006) (grifou-se)

A prova direta dirá respeito ao próprio fato probando. São exemplos: a prova testemunhal, meio de prova sobre o fato; exame do corpo de delito; a confissão do acusado.

A prova indireta é a que não se dirige ao próprio fato probando, mas, por raciocínio que se desenvolve, se chega a ele. Na prova indireta há uma construção lógica através do qual se chega ao fato ou às circunstâncias que se quer provar.

Estamos, na prova indireta, no campo dos indícios e das presunções.

Indícios são certas circunstâncias que nos permitem chegar á verificação da existência de um fato.

Na lição de MAGALHÃES NORONHA(Curso de Direito Processual Penal, São Paulo, Saraiva, 1978, pág. 130j).deve se fazer a diferença entre indício e presunção. O indício é o fato, ao passo que a presunção encontra a sua fonte na experiência; o indício é a circunstância certa e que se realizou. A presunção considera-se como realizado um fato não provado, fundando-se, entretanto, na experiência. A presunção é um processo intelectual, chamando-se a presunção o fato presumido. O fato indicativo é o indicio  e a presunção é  o fato indicado.

O indício constitui a premissa menor do silogismo que, associado a um principio empírico, ou a uma regra de experiência, vai permitir alcançar uma convicção sobre o fato a provar. O indício assim deve estar plenamente demonstrado, por prova direta(prova testemunhal, documental, por exemplo). Além disso, dir-se-á que a presunção  é a inferência que aliada ao indício permite demonstrar um fato distinto. A presunção é a conclusão do silogismo, construído sobre uma premissa maior: a lei baseada na experiência.

Será a presunção um argumento probatório de simples probabilidade e nunca de simples certeza?

A  condenação decorrente de indícios constantes do processo ainda é admitida, pois resulta da formação de um verdadeiro quebra-cabeça, unindo-se dados de conhecimento de uma e outra pessoa, até que se verifique tenha sido realmente o agente o autor do fato imputado.

A questão da prova indiciária já foi objeto de estudos no direito comparado.

Assim, nos Estados Unidos, na condenação pelo crime de branqueamento de capitais, nomeadamente provenientes da droga, a prova fundamenta-se, muitas vezes, em elementos circunstanciais, ou seja, em prova indireta. Enumeremos alguns exemplos:

a) Em United States v. Abbel, 271 F3d 1286 (11 Cir. 1001), decidiu-se que a prova de que o cliente do acusado por crime de lavagem era um traficante, cujos negócios legítimos eram financiados por proventos do tráfico, era suficiente para concluir que as transações do acusado com seu cliente envolviam bens contaminados;

b) Em United States v. Calb, 69 F3d 1417 (9th Cr. 1995), entendeu-se que, quando o acusado por crime de lavagem faz declarações de que o adquirente de um avião é um traficante, e quando o avião é modificado para acomodar entorpecentes pode-se concluir que o dinheiro utilizado na aquisição era proveniente de tráfico de entorpecentes;

c) Em United States v. Reiss, 186 f. 3d 149 (2nd Cir. 1999), a utilização de subterfúgios para o pagamento de um avião envolvendo conhecido traficante foi considerada suficiente para estabelecer a procedência ilícita dos recursos empregados na compra;

d) Em casos como United States v. Hardwell, 80 F. 3d 1471 (10th Cir. 1996), e United States v. King, 169 F. ed 1035(6th Cir. 1999), quando se decidiu que a falta de prova de proveniência dos fundos empregados era prova suficiente da origem criminosa dos recursos empregados.

A prova indiciária pode conduzir a uma condenação, porém, somente quando veemente,  sólida e induvidosa, obedecido o devido processo legal e o necessário contraditório.

O ex-goleiro de futebol Bruno foi condenado pelo Tribunal do Júri  pela morte de Eliza  Samudio.

Mas ainda não trânsitou  em julgado a  decisão condenatória.  O que há até lá é a aplicação do princípio da presunção de inocência. 

Ele ainda está sob o regime da prisão provisória, preventiva.

A prisão preventiva é espécie de prisão provisória,  que surge no transcorrer da persecução penal.

Assim é possível que se faça o encarceramento do indiciado ou mesmo do réu, antes do marco final do processo. É a prisão sem pena, a prisão cautelar, provisória ou processual, que milita no âmbito da excepcionalidade do que se lê do artigo 5º, LVII, da Constituição, observando-se que ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado da sentença penal condenatória.

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A prisão preventiva, que é um dos exemplos de prisão provisória, antes do trânsito em julgado da sentença, só pode ser decretada ¨quando houver prova de existência do crime e indícios suficientes de autoria¨, como se lê do artigo 312 do Código Penal. Há de se comprovar a materialidade do crime, a existência do corpo de delito, que prova a ocorrência do fato criminoso, seja por laudos de exame de corpo de delito ou ainda por documentos, prova testemunhal.

A isso se soma como requisito a existência de ¨indícios suficientes de autoria¨, que deve ser apurada em via de fumaça de bom direito.

Tal despacho que decretar a prisão preventiva, a teor do artigo 315 do Código de Processo Penal, deve ser fundamentado.

O certo é que a Lei 12.403/11 manteve os requisitos da prisão preventiva: prova da existência de crime(materialidade); indícios suficientes de autoria(razoáveis indicações da prova colhida); garantia da ordem pública; garantia da ordem econômica; conveniência da instrução criminal; garantia da aplicação da lei penal.

O juiz, a teor do artigo 311 do Código de Processo Penal, em qualquer fase da investigação policial ou do processo penal, poderá decretar a prisão preventiva, de ofício, se no curso da ação penal, ou a requerimento do Ministério Público, do querelante ou do assistente, ou por representação da autoridade policial. Na fase da investigação policial, não cabe ao juiz decretar, de oficio, a prisão preventiva, mas, sempre a pedido do Ministério Público, da autoridade policial, do assistente da acusação, do querelante.

As alterações havidas dizem respeito à legitimidade e oportunidade da decretação: a) somente o juiz pode decretá-la, de oficio durante o processo (não mais pode fazê-lo, como antes, durante a investigação; b) permite-se ao assistente da acusação requerê-la, o que antes não ocorria. Tal expediente praticamente esvazia a prisão preventiva durante o inquérito levando a necessidade de oportunizar a chamada prisão temporária, quando for o caso.

Daí porque a prisão preventiva está sujeita a prazo.

Para Eugênio Pacelli (Curso de Processo Penal, São Paulo, 2013), a jurisprudência construiu entendimento no sentido de que o prazo para encerramento da instrução criminal ocorreria após 81 (oitenta e um) dias, atualmente, 86 (oitenta e seis) dias de prisão, em flagrante ou preventiva, após o que seria possível a impetração de habeas corpus, fundado no excesso de prazo, no âmbito da Justiça Federal, à luz da Lei 11.719/08, prazo que pode chegar a 107 (cento e sete) dias se houver prorrogação no prazo do inquérito.

Sempre que houver ilegalidade da prisão, cabe o relaxamento. Assim se há liberdade provisória, não estamos diante de prisão ilegal. Quero dizer que com o reconhecimento do relaxamento da prisão, com a soltura do preso, não haverá qualquer imposição a ele de restrições de direitos, pois é caso de anulação, não revogação, de ato praticado em violação à lei.

Da mesma forma, se há excesso de prazo na prisão preventivamente decretada, o tribunal, por via de habeas corpus ou mesmo de recurso nominado, deverá cassar a decisão, determinando o relaxamento da prisão, cuja continuidade seria ilegal.

O anteprojeto do Código de Processo Penal dispõe:

Quanto ao período máximo de duração da prisão preventiva, observar-se-ão, obrigatoriamente, os seguintes prazos:

I – 180 (cento e oitenta) dias, se decretada no curso da investigação ou antes da sentença condenatória recorrível, observado o disposto nos arts. 15, VIII e parágrafo único, e 32, §§ 2º e 3º;

II – 180 (cento e oitenta) dias, se decretada ou prorrogada por ocasião da sentença condenatória recorrível; no caso de prorrogação, não se computa o período anterior cumprido na forma do inciso I deste artigo.

§1º Não sendo decretada a prisão preventiva no momento da sentença condenatória recorrível de primeira instância, o tribunal poderá fazê-lo no exercício de sua competência recursal, hipótese em que deverá ser observado o prazo previsto no inciso II deste artigo.

§2º Acrescentam-se 180 (cento e oitenta) dias ao prazo previsto no inciso II deste artigo, incluindo a hipótese do §1º, se houver interposição, pela defesa, dos recursos especial e/ou extraordinário.

§3º Acrescentam-se, ainda, 60 (sessenta) dias aos prazos previstos nos incisos I e II deste artigo, bem como nos §§1º e 2º, no caso de investigação ou processo de crimes cujo limite máximo da pena privativa de liberdade cominada seja igual ou superior a 12 (doze) anos.

§4º Os prazos previstos neste artigo também se aplicam à investigação, processo e julgamento de crimes de competência originária dos tribunais.

Nessa linha de pensar, tem-se que as cortes europeias têm limitado o tempo a no máximo seis meses, mesmo no caso de suspeitos de terrorismo, fugindo do chamado “direito penal do inimigo”.

Certamente não se pode manter uma prisão preventiva diante da possibilidade do acusado/investigado colaborar com a apuração da infração penal.

Assim manter a prisão preventiva puramente para que se consiga uma confissão ou delação do réu ou investigado é exorbitar dos limites que são dados pela Constituição.

Distante disso é manter a prisão preventiva para a garantia da ordem pública.

Este conceito não se limita a prevenir a reprodução de fatos criminosos, mas também a acautelar o meio social e a própria credibilidade da justiça em face da gravidade do crime e de sua repercussão. Leve-se em conta decisão do Supremo Tribunal Federal(RTJ 124/1033) no sentido de que a conveniência da medida deve ser regulada pela sensibilidade do juiz à reação do meio ambiente à ação criminosa.

Argumente-se que se é certo que a gravidade do delito por si só não basta à decretação da custódia provisória, não é menos exato que a forma de execução do crime, a conduta do investigado somada a outras circunstâncias provocam o clamor público, abalando a própria garantia da ordem pública (RTJ 123/57; RT 535/257).

Veja-se um caso prático. 

O site de noticias do STF, de 24 de fevereiro de 2017, noticiou que "o ministro Marco Aurélio, do Supremo Tribunal Federal (STF), concedeu liminar no Habeas Corpus (HC) 139612, impetrado em favor do ex-goleiro Bruno Fernandes das Dores de Souza. O relator apontou que a defesa de Bruno apresentou apelação junto ao Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJ-MG) contra a decisão do Tribunal de Júri de Contagem (MG), que o condenou em março de 2013, mas o recurso ainda não foi analisado.

“A esta altura, sem culpa formada, o paciente está preso há 6 anos e 7 meses. Nada, absolutamente nada, justifica tal fato. A complexidade do processo pode conduzir ao atraso na apreciação da apelação, mas jamais à projeção, no tempo, de custódia que se tem com a natureza de provisória”, afirmou o ministro. Bruno foi condenado a 22 anos e 3 meses de reclusão, em regime inicial fechado, pela prática dos crimes de homicídio qualificado, sequestro e cárcere privado e ocultação de cadáver de Eliza Samudio e preso preventivamente desde julho de 2010.

Segundo o ministro Marco Aurélio, não há, na legislação brasileira, a segregação automática tendo em conta o delito possivelmente cometido, levando à inversão da ordem do processo-crime, que direciona, presente o princípio da não culpabilidade, a apurar-se para, selada a culpa, prender-se, em verdadeira execução da pena, ressaltou.

O relator afirmou que a decisão do Tribunal de Júri de Contagem de negar pedido da defesa para o ex-goleiro ser solto considerou a gravidade concreta da imputação e o clamor social. “Reiterados são os pronunciamentos do Supremo sobre a impossibilidade de potencializar-se a infração versada no processo. O clamor social surge como elemento neutro, insuficiente a respaldar a preventiva. Por fim, colocou-se em segundo plano o fato de o paciente ser primário e possuir bons antecedentes”, destacou.

O ministro Marco Aurélio determinou a expedição do alvará de soltura caso Bruno não se encontre recolhido por motivo diverso da prisão preventiva formalizada no processo do juízo do Tribunal do Júri da Comarca de Contagem.”

O tema na imprensa e nos meios jurídicos é objeto de discussão diante de pronunciamento do ministro Gilmar Mendes que disse: “Temos um encontro marcado com as alongadas prisões que se determinam em Curitiba. Temos que nos posicionar sobre esse tema, que conflita com a jurisprudência que construímos ao longo desses anos”, argumentou o ministro Gilmar Mendes logo após o primeiro julgamento de processos da Lava Jato após o sorteio que definiu o ministro Edson Fachin como relator da operação no STF.

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Sobre o autor
Rogério Tadeu Romano

Procurador Regional da República aposentado. Professor de Processo Penal e Direito Penal. Advogado.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ROMANO, Rogério Tadeu. A acusação de homicídio sem cadáver da vítima e uma longa prisão preventiva. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 22, n. 5010, 20 mar. 2017. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/56117. Acesso em: 5 nov. 2024.

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