1. Introdução
O instituto da prescrição sempre foi objeto de controvérsia. Passada longa data desde o seu surgimento e consolidação na legislação brasileira em suas mais diversas searas jurídicas, ainda hoje não há unanimidade acerca dos temas que envolvem a contagem dos prazos, suas modalidades e forma de aplicação, sobretudo em razão da influência que sofre das diferentes diretrizes político-ideológicas do legislador.
O trabalho em questão, para além de reconhecer essa complexidade que cerca a matéria em nosso ordenamento jurídico, e sem ter a pretensão de esgotar o necessário debate a respeito do assunto, aborda a necessidade de que os lapsos prescricionais de que trata a Lei de Improbidade Administrativa sejam examinados à luz de institutos que convirjam com o fim pretendido pelo legislador ao consagrar o princípio da moralidade como um dos norteadores da Administração Pública e, mais tarde, veicular tipificação e sanções aos atos considerados ímprobos, conformando esse panorama aos conceitos de inércia e segurança jurídica que gravitam em torno da prescrição.
Procurar-se-á, também, interpretar os marcos de contagem prescricional previstos na Lei de Improbidade Administrativa em consonância com as demais normas que animam o sistema material e processual da tutela coletiva, especialmente a disciplina de integração trazida pelo Código Civil, ao privilegiar a teoria ou princípio da actio nata, de modo que a prescrição não se torne apenas um instrumento apto a facilitar a impunidade do agente ímprobo diante da inércia estatal, e mesmo contribuir para o aviltamento do trabalho desenvolvido pelos órgãos legitimados à propositura das ações de responsabilização, ensejando que o instituto, assim, seja desvirtuado da efetiva finalidade que lhe foi conferida no âmbito do Estado Democrático de Direito.
2 O instituto da prescrição
Reconhecida hodiernamente pela grande maioria dos sistemas jurídico-legais vigentes, a prescrição origina-se do termo latino praescriptio, derivado do verbo prescribere, significando um escrito posto antes,1 e revela-se associada a fundamentos de pacificação social e segurança da ordem jurídica, a partir do transcurso do tempo, de modo a consagrar a máxima de que “o direito não socorre aos que dormem”.
Com efeito, partindo-se da premissa de que uma pretensão lícita visa à recomposição da ordem jurídica lesada por uma ação ou omissão antecedentes, conforme assevera Emerson Garcia,2 tem-se que todo aquele que contribui para a permanência de uma situação de desequilíbrio, não adotando as medidas necessárias à sua eliminação, deixa de cooperar para a estabilização da ordem pública. O tempo, ademais, além de dificultar a colheita do material probatório, enfraquece a lembrança dos fatos e atenua o desejo da punição. Assim, e tendo por objetivo estabilizar as relações jurídicas incertas, evitando que as controvérsias sejam perpetuadas, terminou-se por fixar lapsos dentro dos quais haveriam de ser exercidas determinadas pretensões.
Para José Henrique Pierangeli, a prescrição constitui verdadeira garantia trazida pela recepção da Convenção Americana sobre Direitos Humanos – o chamado Pacto de São José da Costa Rica – em nosso ordenamento jurídico, pois o artigo 7°, n.° 5, dessa Convenção, ao assegurar ao cidadão o seu julgamento num prazo razoável, resta por reconhecer a ligação entre o instituto e o princípio da razoabilidade.3 Celso Delmanto,4 seguindo esse mesmo entendimento, destaca que a prescrição é fundamental em um Estado Democrático de Direito, na medida em que confere segurança jurídica ao cidadão, impondo ao Estado que efetivamente se movimente em sua atividade jurisdicional, em prol da própria sociedade.
No âmbito do Direito Civil brasileiro, o instituto passou a ser relacionado não a um direito público abstrato de ação, mas à perda do exercício de uma pretensão, sobretudo a partir da vigência do Código Civil de 2002, o que significa dizer que “mantém relação com deveres, obrigações e com a responsabilidade decorrente da inobservância das regras ditadas pelas partes ou pela ordem jurídica”.5
Essas premissas civilistas encontraram eco no Direito Administrativo e também na forma como a pretensão da aplicação de sanções e o reconhecimento da prescrição são tratados pela Lei de Improbidade Administrativa: o ato tipificado como caracterizador de enriquecimento ilícito, causador de dano ao erário ou violador de princípio norteador da Administração Pública implica a violação a normas jurídicas tuteladas pelo Estado, deflagrando em favor deste a pretensão de aplicar sanções ao agente que perpetra condutas contrárias à legislação, a qual então se materializará mediante a possibilidade de propositura da competente ação judicial que veiculará pedido de natureza condenatória, por meio de seus órgãos assim legitimados.
3 A Lei de Improbidade Administrativa e o transcurso da prescrição: uma nova perspectiva à luz do princípio da “actio nata”
A Lei de Improbidade Administrativa, após enumerar de forma exemplificativa diversas condutas aptas à caracterização de atos ímprobos, inseridos como aqueles que podem originar enriquecimento ilícito, causar dano ao erário ou violar de princípio norteador da Administração Pública (artigos 9º, 10 e 11), e nominar sanções variadas em razão de sua prática, como a perda da função pública, ressarcimento integral do dano, suspensão dos direitos políticos e multa (artigo 12), estabeleceu em dispositivo subsequente as hipóteses em que se faz possível o reconhecimento da prescrição da pretensão condenatória para a aplicação dessas penas, a saber:
Art. 23. As ações destinadas a levar a efeitos as sanções previstas nesta lei podem ser propostas:
I - até cinco anos após o término do exercício de mandato, de cargo em comissão ou de função de confiança;
II - dentro do prazo prescricional previsto em lei específica para faltas disciplinares puníveis com demissão a bem do serviço público, nos casos de exercício de cargo efetivo ou emprego.
III - até cinco anos da data da apresentação à administração pública da prestação de contas final pelas entidades referidas no parágrafo único do art. 1º desta Lei.
A regra geral estabelecida pela Lei de Improbidade Administrativa, portanto, é de que a inércia do titular da ação, incluindo o Estado, enseja a prescritibilidade das pretensões, como forma de assegurar a estabilidade das relações jurídicas e evitar que perdurem ad infinitum,6 ressalvada a imprescritibilidade da medida de ressarcimento ao erário, a qual é consagrada pelo artigo 37, § 5º, da Constituição Federal e que, a despeito de estar tipificada como sanção ao agente ímprobo, constitui, em verdade, corolário lógico do princípio geral de direito segundo o qual quem quer que cause dano a outrem é obrigado a repará-lo, previsto no artigo 186 do Código Civil.7
Veja-se, assim, que a prescrição do ato ímprobo está umbilicalmente ligada ao conceito material albergado pelo Direito Civil contemporâneo quanto à perda do exercício de uma pretensão por seu titular, distanciando-se da ideia do perecimento de uma ação propriamente dita, como já abordado anteriormente.
Partindo-se desse pressuposto, e conjugadas essas disposições da Lei de Improbidade Administrativa com as demais normas que animam o microssistema material-processual da tutela coletiva, sobretudo diante do papel subsidiário e complementar que assumem nesta seara, resta inequívoca a necessidade de que a forma de implemento e contagem da prescrição para os atos ímprobos sejam aplicadas em consonância com a regra do artigo 189 do Código Civil, a qual estabelece que “violado o direito, nasce para o titular a pretensão, a qual se extingue, pela prescrição, nos prazos a que aludem os arts. 205 e 206”.
E o artigo 189 do Código Civil, de acordo com a lição de José Carlos Barbosa Moreira,8 teve como fonte inspiradora o § 194, I, do Código Civil Alemão (BGB), que dispõe: “O direito de exigir de outrem um fazer ou um não fazer (pretensão) se sujeita à prescrição”. Nesse dispositivo, encontra-se a consagração da teoria ou princípio da actio nata, segundo o qual o surgimento da pretensão – e, portanto, o início da fluência do prazo prescricional – não se dá necessariamente no momento em que ocorre a lesão ao direito, mas sim quando o titular do respectivo direito violado toma conhecimento do fato e da extensão de suas consequências.
A teoria ou princípio da actio nata hoje encontra respaldo em boa parte da doutrina nacional e aceitação crescente também pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça,9 por conferir ao artigo 189 do Código Civil interpretação convergente à finalidade do instituto da prescrição, obstando que o titular do direito subjetivo violado tenha contra si iniciado o transcurso do lapso prescricional em circunstâncias nas quais não detém qualquer possibilidade de exercitar a sua pretensão.
Por conseguinte, é forçoso concluir que os lapsos prescricionais nas hipóteses previstas pelo artigo 23 da Lei n.º 8.429/92 não devem iniciar sua contagem ou implemento enquanto os sujeitos legitimados à propositura da ação para a imposição das sanções não tomarem conhecimento inequívoco da prática dos ilícitos, ainda que estes tenham se materializado no mundo dos fatos em época pretérita.
Colha-se, a propósito, a orientação do Superior Tribunal de Justiça, em caso em que a Corte reconheceu que a prescrição do ato ímprobo tratado em ação civil pública apenas se iniciou quando o INSS tomou conhecimento da fraude documental cometida em face da autarquia por agente público lotado na FUNAI:
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. DECRETAÇÃO DA PRESCRIÇÃO RELATIVAMENTE A UM DOS RÉUS. TERMO INICIAL. DATA NA QUAL A ADMINISTRAÇÃO TEVE CIÊNCIA DO SUPOSTO ATO ÍMPROBO. PRECEDENTES. REVISÃO DO TERMO INICIAL. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA N. 7/STJ. NÃO APLICAÇÃO DO ART. 142, § 2º, DA LEI N. 8.112/1990. NÃO AJUIZAMENTO DE AÇÃO PENAL. CABIMENTO DO APELO NOBRE PELA ALÍNEA "C" DO PERMISSIVO CONSTITUCIONAL. SÚMULA N. 83/STJ. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO, ACOMPANHANDO A RELATORA, SRA. DESEMBARGADORA CONVOCADA MARGA TESSLER.
(AgRg no REsp 1509971/SP, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, julgado em 23/06/2015, DJe 01/07/2015).10
Aplicando a teoria ou princípio da actio nata em relação ao lapso prescricional para o ajuizamento das ações de improbidade administrativa, observe-se também recente precedente oriundo do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. RECEBIMENTO DA INICIAL. PRESCRIÇÃO. INOCORRÊNCIA. AGRAVANTES OCUPANTES DE CARGO EFETIVO. TERMO INICIAL DO PRAZO PRESCRICIONAL. DATA EM QUE O SUPOSTO ATO ÍMPROBO SE TORNOU CONHECIDO. INAPLICABILIDADE DO DECRETO Nº 20.910/32. INCIDÊNCIA DA LEI ESPECÍFICA (LEI Nº 8.429/92). DECISÃO AGRAVADA MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.
(TJPR - 5ª C.Cível - AI - 1393265-7 - Região Metropolitana de Maringá - Foro Regional de Nova Esperança - Rel.: Luiz Mateus de Lima - Unânime - - J. 22.03.2016).11
Em outras palavras, o marco inicial da contagem prescricional das hipóteses de que trata o artigo 23 da Lei nº 8.429/92, levando-se em conta a teoria ou princípio da actio nata, não pode ser inferior à data em que quaisquer dos órgãos de persecução elencados no artigo 17, caput, da Lei nº 8.429/92, e que detêm legitimidade exclusiva para a propositura da ação de responsabilização pela prática de ato de improbidade administrativa, isto é, órgãos do Ministério Público ou as pessoas jurídicas interessadas, tomarem efetivo conhecimento da prática do ilícito.
A ciência quanto ao cometimento da conduta que violou a legislação e pode tipificar ato ímprobo, sob essa perspectiva, pode se dar a partir do momento em que o órgão legitimado receba notícia ou representação efetuada por terceiro, denúncia por meio da imprensa, sobrevenha inquérito policial que tenha investigado crime contra a Administração Pública, ou quando tenha em mãos relatório de auditoria realizado por órgão de controle ou decisão exarada pelo Tribunal de Contas, dentre outras hipóteses. Ocorrendo representação dos próprios órgãos legitimados para que ocorra investigação e propositura da ação pelo Ministério Público – o que tem se mostrado bastante comum, quando aqueles apresentam pouca eficiência e técnica em seus setores de controle e quadro jurídico, como é o caso de centenas de pequenos Municípios que compõem nossa federação –, evidentemente que o lapso prescricional para a aplicação das sanções da Lei de Improbidade Administrativa se iniciará quando o respectivo órgão administrativo interessado tenha conhecimento dos fatos, e não quando a representação decorrente aportar no Ministério Público.
Entendimento em sentido contrário quanto ao início do transcurso da prescrição permitira que os agentes ímprobos pudessem simplesmente acobertar a prática de suas ilegalidades e, assim, beneficiar-se de sua própria torpeza com o decurso do tempo, o que não se pode admitir, sobretudo porque a prescrição consagra a segurança jurídica em face da inércia, e esta última somente pode restar caracterizada a partir do momento em que os fatos se tornam conhecidos para aquele que teve o direito violado e pode de fato exercer o direito de ação.
A propósito, a lição de Tarcísio Humberto Parreiras Henriques Filho:12
A efetividade das disposições da Lei n. 8.429/1992, nesse aspecto, torna necessária uma interpretação “racional” e “razoável” do inciso I do art. 23. Isso é essencial para um melhor aprimoramento dos instrumentos de combate à improbidade administrativa, que só acontecerá com modificação do critério para contagem do termo inicial do prazo prescricional para os casos disciplinados no mencionado inciso I do art. 23 da Lei n. 8.429/1992. Nossa proposta é fazer tal contagem a partir do momento em que o ato de improbidade administrativa se torna conhecido, estendendo a disciplina do inciso II do mencionado art. 23 aos agentes que hoje têm sua situação jurídica disciplinada pelo inciso I do mesmo artigo.
Como já afirmamos acima, a prescrição pressupõe a inércia do titular do direito e só essa situação pode legitimar e justificar o reconhecimento dos efeitos jurídicos do instituto da prescrição. Quem não é inerte não pode sofrer as consequências da prescrição.
Trata-se de guardar observância, dessa forma, ao princípio da boa-fé objetiva em favor da Administração Pública. Isso porque, embora jungida e com larga aplicação hoje às relações obrigacionais do Direito Privado, não se pode olvidar que a boa-fé objetiva, enquanto “modelo de conduta social, arquétipo ou standard jurídico” que veicula deveres de honestidade, lealdade e probidade,13 não pode ser desassociada da moralidade administrativa que o legislador constituinte estabeleceu como um dos nortes para a condução dos Poderes Públicos, porque sintetiza normas de comportamento voltadas à concretização de valores como a ética e a retidão.
A Lei n.º 9.784/99, que regula o processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal, inclusive positivou a boa-fé, reconhecendo sua importância para o Direito Administrativo, como dever para a Administração e para as pessoas privadas que com ela interagem. Seu artigo 2°, parágrafo único, inciso IV, assim o fez, ao determinar a observância, nos processos administrativos, do critério de atuação segundo padrões éticos de probidade, decoro e boa-fé, e, do mesmo modo, o artigo 4°, inciso II, ao dispor que são deveres do administrado, perante a Administração, proceder com lealdade, urbanidade e boa-fé.
Além do mais, é necessário se ter em mente que o legislador, ao contrário do que estabeleceu na disciplina de outras ações de natureza coletiva, adotou na Lei de Improbidade Administrativa – no já citado artigo 17, caput – rol restrito de legitimados ativos,14 conferindo a possibilidade de propositura da ação de responsabilização pela prática de atos ímprobos apenas ao Ministério Público e à pessoa jurídica de direito público interessada, de modo que a única interpretação consentânea com a finalidade da norma e com o interesse público que rege a matéria, bem assim com a eficiente proteção do princípio da moralidade administrativa, é de que o início da contagem dos prazos prescricionais ocorra apenas quando estes respectivos órgãos tomem conhecimento da prática dos ilícitos que possibilitem a pretensão de responsabilização.
Lembre-se, sob esse prisma, que o princípio da supremacia do interesse público sobre o interesse privado é princípio geral de Direito inerente a qualquer sociedade, representando, em verdade, a própria condição de sua existência, conforme adverte Celso Antônio Bandeira de Mello.15 O princípio da moralidade, por sua vez, foi estatuído na Constituição Federal vigente como reflexo da preocupação com a ética na Administração e com o combate à corrupção e à impunidade no setor público,16 ideários estes incompatíveis com um sistema jurídico que oportunize ao agente público, ou ao particular que com a Administração Pública se relacionar, a possibilidade de se beneficiar com o simples transcurso do tempo, independentemente de os órgãos que têm o poder-dever de velar pela defesa da probidade administrativa e proteção ao patrimônio público tomarem sequer conhecimento da prática dos ilícitos.
E, como bem adverte José Roberto Pimenta Oliveira,17 a adoção desse mecanismo de contagem do lapso prescricional não visa a premiar a inércia dos sistemas de controle da Administração Pública, pois não é possível a caracterização da inércia sem a prévia ciência da violação do direito pelos órgãos legitimados a agir:
(...) não raro o servidor faltoso consegue manter oculto o ilícito funcional durante o prazo prolongado de tempo, em razão das vantagens, facilidades, influência ou poderes hierárquicos surgidos do desempenho do cargo público. (…). Não há como cogitar de inércia da instituição administrativa sem que haja prévia ciência da violação do direito contra o qual tem o dever-poder de reagir.
Acentue-se que não trata de premiar eventual inércia dos sistemas de controle administrativo de legalidade, em não detectar oportunamente o ilícito funcional (…). Cogita-se, pois, de enfrentamento adequado pelo tecido normativo de efeitos fáticos que podem conduzir à inefetividade da competência punitiva, instituída em prol do interesse público. (…). Tornar-se a improbidade conhecida é tê-la revelada, divulgada, denunciada, descoberta ou desvelada, tomando dela ciência o agente público que detém o dever-poder de determinar a apuração integral dos atos ímprobos e agentes públicos/terceiros responsáveis, dentro da estrutura dos entes estatais ou governamentais lesados, bem como dos membros do Ministério Público competente para atuação no caso.
O conhecimento quanto à ocorrência do ato ímprobo, como requisito essencial para que a prescrição da pretensão condenatória possa ter seu transcurso iniciado, acolhendo assim a teoria ou princípio da actio nata, nos parece ter sido adotado expressamente pelo legislador ordinário a partir da inclusão do inciso III ao artigo 23 da Lei de Improbidade Administrativa, que ocorreu por meio da Lei n.º 13.019/2014.
De fato, o inciso III, ao disciplinar que as ações destinadas a levar a efeitos as sanções previstas podem ser propostas até cinco anos da data da apresentação à Administração Pública da prestação de contas final pelas entidades que recebam subvenção, benefício ou incentivo, fiscal ou creditício, de órgão público, bem como daquelas para cuja criação ou custeio o erário haja concorrido ou concorra com menos de cinquenta por cento do patrimônio ou da receita anual, estabeleceu que a prescrição não pode ser iniciada, ao menos em face dos possíveis órgãos legitimados à propositura da ação de improbidade administrativa, antes que estes possam tomar conhecimento – por meio da prestação de contas – de eventuais ilegalidades que envolvam as verbas públicas que despenderam e que possam tipificar enriquecimento ilícito, dano ao erário ou violação de princípios norteadores da Administração Pública.
O novo dispositivo em questão apenas segue a trilha do que já vem sendo adotado por outras legislações em matéria de prescrição administrativa. O artigo 142, § 1º, da Lei n.º 8.112/90 (dispõe sobre o regime jurídico dos servidores públicos civis da União, das autarquias e das fundações públicas federais), por exemplo, previu que “o prazo de prescrição começa a correr da data em que o fato se tornou conhecido”. Da mesma forma, o artigo 203, § 1º, da Lei Estadual n.º 16.024/2008 (estabelece o regime jurídico dos funcionários do Poder Judiciário do Estado do Paraná), referiu que “O prazo de prescrição começa a correr da data em que o fato se tornou conhecido da autoridade competente para ordenar a instauração do procedimento administrativo disciplinar.