Capa da publicação O imbróglio Cracolândia em São Paulo: questão de saúde ou de segurança pública?
Capa: Joel Silva / Folhapress

O imbróglio Cracolândia em São Paulo: questão de saúde ou segurança pública?

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Análise da propagação do tráfico de drogas na popular região central da capital paulistana, bem como do agonizante e deprimente estado dos dependentes do crack.

Há ao menos duas décadas os moradores da capital paulista assistem ao avanço da denominada “cracolândia”, termo pejorativo que denomina o centro velho da cidade, sitiado pelo tráfico e usuários de drogas. Os viciados perambulam pelas imediações cometendo crimes na ânsia de satisfazer o seu vício.

Em meados dos anos 2000 a prefeitura paulista iniciou um plano de revitalização nos arredores do centro em busca de retomar o prestígio de outras décadas, com a isenção de impostos prediais para novos moradores, benesses tributárias em busca de fomentar o comércio local e o fechamento de locais utilizados direta ou indiretamente no comércio e uso de entorpecentes, tais como pequenos hotéis, meretrícios e bares. Ainda com esses investimentos, o desencadeamento de ações policiais, ainda que voláteis, mas com o objetivo de inibir a aglomeração dos usuários e o comércio de entorpecentes pelas ruas bem como o livre direito de ir vir dos moradores e transeuntes, vítimas colaterais desse imbróglio.

O termo cracolândia remonta à mistura de cocaína, água e toda sorte de química, tais como bicarbonato, cal ou sal, o que dá origem, assim, ao famigerado crack. Por se tratar de uma combinação química que causa alta dependência e de pouca qualidade, torna-se mais acessível, sendo que o seu consumo se propagou de forma endêmica principalmente pelos menos afortunados e população de rua. Em pouco tempo o indivíduo está totalmente dependente e, a partir daí, passa a perder brio e assemelha-se a um fantasma ambulante, doente, desprovido de qualquer vaidade e objetivos, cujo desejo é apenas consumir mais droga.

Inicialmente, cuidar dessa problemática como questão policial pareceu desastrosa, o que foi duramente rechaçado por alguns especialistas, pois é notória a situação calamitosa a que o dependente químico é exposto, alguns buscando ajuda para se livrar do vício e muitos outros encabeçando as estatísticas de mortos em decorrência do uso dessa substância nefasta.

No entanto, a mídia revelou que, por trás do flagelo dos viciados que se amontoam pelas ruas em busca da droga, uma facção criminosa lucra muito com a situação, desenvolvendo uma espécie de feira livre da droga e sem ser incomodada. Diante das irrefutáveis constatações, parece mais uma questão interdisciplinar e que requer o envolvimento dos poderes municipal e estadual, abandonando disputas político-partidárias e o velho discurso de remeter o problema somente para os profissionais de saúde e assistência social. Estima-se que, por mês, a organização criminosa lucre oito milhões de reais, em detrimento de vidas e sonhos que se perdem diuturnamente no cachimbo da droga. Logo, é caso também de interferência do aparato de segurança pública, pois é dever do Estado manter a paz social.

Cortar o mal pela raiz parece, num primeiro momento, uma medida drástica e pouco popular, mas que se faz necessária para restabelecer a ordem e o direito das pessoas voltarem a transitar nessas ruas, incentivar o comércio local a emergir novamente, a revitalização das residências que possuem grande valor para o patrimônio histórico e arquitetônico, bem como os moradores da região a terem orgulho de residir nas imediações novamente. Apenas dissipar a concentração dos viciados do centro velho não será o suficiente, pois isso propicia a criação de outras pequenas zonas de usuários pela cidade, não resolvendo o problema por completo.  

Combater o tráfico de forma enérgica é a saída árdua, na área em questão e em todo território nacional, visto que as fronteiras brasileiras são verdadeiros queijos suíços, pelos quais adentram facilmente armas e drogas. Ademais, deve-se destacar a falta de políticas públicas de saúde para esse enfrentamento, a ineficácia dos centros de acolhimento de tratamento para usuários e parcos recursos humanos empregados num problema tão espinhoso. Conclui-se, portanto, que esforços coordenados, como a criação e expansão de consultórios itinerantes, aumento dos centros de atenção psicossociais, equipes interdisciplinares, envolvendo psiquiatras, enfermeiros, psicólogos e assistentes sociais, além de outros profissionais afetos, auxiliarão de forma ímpar nesse processo de transformação urbana e social, contando com o envolvimento de toda a sociedade civil, atuando nas bases do controle formal na repressão e combate ao tráfico, junto aos profissionais da saúde, famílias dos doentes, ex-viciados e instituições religiosas.

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Sobre o autor
Rafaelle Jhonathas de Sousa Guimarães

Pós-Graduado em Direito Penal. Bacharel em Direito pela Universidade Paulista com aprovação no XIX Exame de Ordem Unificado. Servidor Público desde 2005, atualmente é Policial Civil do Estado de São Paulo desenvolvendo suas atividades junto ao Centro de Operações Integradas. Realizou diversos cursos de especialização pela Academia de Polícia Civil de São Paulo- ACADEPOL, Ministério da Aeronáutica, Ministério da Justiça-SENASP, Escola Paulista da Magistratura de São Paulo e outras instituições coirmãs. Postulante ao cargo de Delegado de Polícia.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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