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A penhora de bens imóveis.

Alguns apontamentos sobre a atual sistemática e os projetos de reforma do Código de Processo Civil

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A penhora de bens imóveis detém particularidades que exigem garantias adicionais, como a intimação do cônjuge e o registro da penhora. Abordar-se-á o atual estágio da penhora destes bens, e a proposta de modificação trazida nos "projetos de reforma" do Código de Processo Civil.

Palavras-chave. Penhora. Bens Imóveis. Limites. Atual situação. Alterações segundo os Projetos de Reforma do Código de Processo Civil.

Resumo: A penhora de bens imóveis, dada a natureza do bem que agride, detém particularidades que exigem do legislador garantias adicionais, como, por exemplo, a intimação do cônjuge e o registro da penhora. Abordar-se-á, então, qual o atual estágio da penhora destes bens, e a proposta de modificação trazida nos "projetos de reforma" do Código de Processo Civil.

Sumário: 1. Introdução; 2. Breves apontamentos históricos; 3. Da penhora; 4. Gradação legal da penhora; 5. O que são imóveis?; 6. Da necessidade da intimação do cônjuge; 7. Do registro da penhora. 8. Bem de família; 9. Bibliografia.


1.Introdução

A penhora de bens imóveis, também chamados de bens de raiz, traz atrelada a si questões bastante complexas, como os limites desta penhora, a necessidade de intimação do cônjuge, a imperiosidade ou não do registro público da constrição, bem como a impenhorabilidade de alguns destes imóveis, em face de limitações legais e voluntárias.

Ademais, o movimento reformista do Código de Processo Civil, que teve início em 1994, cujo segundo momento deu-se com as leis 10352, de 26-12-2001, 10358, de 27-12-2001, e 10444, de 07-05-2002, acena com novas mudanças, na medida em que foram apresentados "projetos de lei" propondo alterações na execução de títulos extrajudiciais, no cumprimento das sentenças e das medidas cautelares, além da instituição da mediação no processo civil [1]. E essas reformas trazem modificações significativas que afetam as penhoras incidentes sobre os bens imóveis, como abaixo ver-se-á:


2. Breves apontamentos históricos

Quando um devedor não cumpre espontaneamente uma obrigação, quer representada por um título extrajudicial, quer reproduzida por uma sentença condenatória, "pode o credor obter a satisfação do crédito através de medidas coativas que, a seu requerimento, são aplicadas pelo Estado no exercício do poder jurisdicional." [2]

Assim, o inadimplemento de uma obrigação gera a possibilidade do credor promover a execução coativa ou forçada, judicialmente.

Os romanos definiam as obrigações como um vínculo jurídico, sendo que a garantia do seu cumprimento era exclusivamente pessoal, "daí decorrendo as crueldades com que os devedores eram obrigados a satisfazer seus compromissos". [3]

Essa postura jurídica derivava do fato de que os bens, notadamente as terras, não eram encarados como patrimônio pessoal, mas sim familiar. E para esse povo, os bens da gens (família romana) eram destinados ao culto dos deuses. Neste sentido são as lições de Manoel Inácio de Carvalho Mendonça [4]:

"Nesse período, o devedor respondia com sua própria pessoa, porque nas origens da civilização ariana greco-romana, seu patrimônio essencial – a terra – pertencia à família e era intimamente ligado à religião, ao culto dos deuses lares e dos mortos, e portanto, sempre inalienável e indivisível."

Álvaro Villaça Azevedo [5] argumenta adicionalmente que neste período havia proibição de alienar patrimônio da família, dados os rígidos princípios de perpetuação dos bens dos antepassados, que se consideravam sagrados.

A famosa lei Romana das "XII Tábuas", de 450 a.C., era vigorosamente impiedosa com os devedores, impondo-lhes flagelos pessoais, e paradoxalmente não permitindo que seu patrimônio fosse atingido. A propósito eis o teor da "Tábua Terceira" [6], que exatamente dispunha sobre os direitos de crédito:

"4. Aquele que confessa dívida perante o magistrado ou é condenado terá 30 dias para pagar;

5. Esgotados os trinta dias e não tendo pago, que seja agarrado e levado à presença do magistrado;

6. Se não paga e ninguém se apresenta como fiador, que o devedor seja levado pelo seu credor e amarrado pelo pescoço e pés com cadeias com peso até o máximo de 15 libras; ou menos, se assim quiser o credor;

7. O devedor preso viverá à sua custa, se quiser; se não quiser, o credor que mantém preso dar-lhe-á por dia uma libra de pão ou mais, a seu critério;

8. se não há conciliação, que o devedor fique preso por 60 dias, durante os quais será conduzido em 03 dias de feira ao comitium, onde se proclamará, em altas vozes, o valor da dívida;

9. se são muitos os credores, é permitido, depois do terceiro dia de feira, dividir o corpo do devedor em tantos pedaços quantos sejam os credores, não importando mais ou menos; se os credores preferirem, poderá vender o devedor a um estrangeiro, além do Tibre."

Deste modo, os romanos inadimplentes respondiam pessoalmente por suas dívidas, podendo ser presos, vendidos como escravos e até mesmo mortos e esquartejados.

Contudo, já nos últimos períodos da civilização romana, a pessoa foi lentamente substituída pelo patrimônio, que passou a suportar a garantia das obrigações.

Anota Alcides de Mendonça Lima [7] que "historicamente, a execução evoluiu dos atos contra a pessoa do devedor para o seu patrimônio. A prisão do devedor e, até, o seu esquartejamento cederam lugar a providências contra seus bens. Gradativamente, à medida que as instituições processuais progrediam, menos drásticos se tornavam os meios executivos, tanto os de coação como os de sub-rogação".

Essa tendência é mantida ao longo do tempo, e chegando à França, com o Código Napoleônico, positiva-se com a proibição de que o corpo do réu fosse objeto da execução. Surge então novo momento histórico em que a execução limitava-se em atingir exclusivamente o patrimônio do devedor.

Assim, descumprindo o devedor sua obrigação, tornando-se pois inadimplente, não poderia ser pessoalmente compelido a quitá-la, sendo a única forma de sanção possível aquela que recaísse sobre o seu patrimônio.

Atualmente basicamente em todas as legislações a responsabilidade pelas dívidas é eminentemente patrimonial [8].

E, hoje, a medida jurídica de que se pode valer um credor para agredir o patrimônio do devedor, com vistas a satisfazer seu crédito, é a execução civil, assim definida por Liebman [9]: "A execução civil é aquela que tem por finalidade conseguir por meio do processo, e sem o concurso da vontade do obrigado, o resultado prático a que tendia a regra jurídica que não foi obedecida."

No mesmo diapasão o magistério de Inocêncio Borges da Rosa, que, comentando o Código de Processo Civil de 1939, referiu-se à execução como "conjunto de meios coercitivos estabelecido pela lei para reintegração do direito reconhecido por sentença, ou por títulos de igual força jurídica." [10]

Portanto, a responsabilidade do devedor é eminentemente patrimonial! Aliás, essa é a lição que se extrai do art. 591, do Código de Processo Civil: "o devedor responde, para o cumprimento de suas obrigações, com todos os seus bens presentes e futuros, salvo as restrições estabelecidas em lei."

Nesta esteira, o art. 646, do mesmo Código, aponta que "a execução por quantia certa tem por objeto expropriar bens do devedor, a fim de satisfazer o direito do credor", sendo que a penhora é um ato neste desiderato por excelência.


3. Da penhora

Nesse contexto, a penhora destaca-se como principal fonte para garantir o crédito de um exeqüente, pois é típica medida processual, havida num processo de execução, configurando-se em "ato pelo qual se apreendem bens do devedor para empregá-los de maneira direta ou indireta, na satisfação do crédito exeqüendo." [11]

Pontes de Miranda [12] também destaca a importância da penhora no cenário da execução forçada:

"A penhora, que é medida constritiva típica, apanha o bem, em início de execução (elemento que, por certo, não surge a despeito do que pretenderam alguns juristas, no arresto e no seqüestro, decisões cautelares mandamentais). Se a penhora acautela é somente porque prende, cuja constrição é de finalidade já decidida: execução forçada de uma obrigação."

Portanto, a penhora mostra-se como uma intromissão necessária do Estado no patrimônio do devedor, com o consentimento da lei. É um meio coercitivo pelo qual se vale o exeqüente para vencer a resistência do devedor inadimplente e renitente, empregando meios legais para satisfazer o crédito, os quais recairão, de ordinário, sobre o patrimônio do executado. [13] Não é outra a lição de Ovídio Araújo Baptista da Silva [14]:

"O processo de execução cuida de submeter o patrimônio do condenado à sanção executória, de modo que dele se extraiam os bens e valores idôneos a satisfazer o direito do credor (...) A penhora é uma das muitas medidas constritivas, é o ato específico da intromissão do Estado na esfera jurídica do executado quando a execução precisa de expropriação de eficácia do poder de dispor."

Contudo, o direito moderno se vê cada vez mais humanizado, impondo-se princípios norteadores a todos os procedimentos, inclusive os executivos. Todavia, como lembra Eduardo Pallares [15], essa humanização não pode impedir o cumprimento da justiça de maneira expedita e eficaz. Há, por óbvio, que se conjugar a humanização com a aplicação da justiça:

"principio da economía social, según la cual la ejecución deberá llevarse a cabo en forma de que no se ciegue una fuente de riquezas; principio de eficacia procesa, que previene que la ejecución se realice de manera que el ejcutante obtenga plena satisfacción de sus derechos; principios de humanidad, que exige que no se embarguem los bienes que sean necesarios para el sostenimiento del deudor y de su familia; principio del espeto a los derechos de terceros."

Assim, destaca-se que a execução tem de ser eficiente, a fim de plenamente garantir a satisfação do crédito exeqüendo, sem, entretanto, expor o devedor a situações vexatórias. Ao juiz impõe-se, caso a caso, a busca da linha de equilíbrio entre essas duas balizas, para não frustrar o direito do credor nem sacrificar o patrimônio do devedor além do razoável e necessário [16].

Conquanto pareça simples, a verdade é que no caso prático a dificuldade em conjugar esses princípios é muito grande.


4. Gradação legal da penhora

Buscando estabelecer uma ordem de bens que podem ser penhorados, a legislação apresenta o patrimônio do devedor de maneira hierarquizada, impondo que os primeiros bens desta hierarquia sejam penhorados, e apenas na falta destes, os previstos nas demais classes poderão ser constritados.

Sim, existe uma ordem de gradação legal dos bens passíveis de penhora, sendo que a lei, inclusive, dispõe que alguns são absolutamente impenhoráveis, e outros relativamente impenhoráveis [17]. Essa ordem ou gradação tem em vista tornar mais fácil, pronta e segura a execução, a fim de que o pagamento se faça com a maior brevidade possível e com o menor incômodo para o exeqüente, e também para que a execução seja o menos dispendiosa e onerosa possível para o executado. [18]

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O Código de Processo Civil de 1939 dispunha, no seu artigo 930, a seguinte ordem: 1. dinheiro, pedras e metais preciosos; 2. títulos da dívida pública e papéis de crédito que tenham cotação em bolsa; 3. móveis e semoventes; 4. imóveis ou navios.

Pontes de Miranda entendia que essa norma era de direito cogente, não admitindo inversão em nenhuma hipótese [19].

O Código de Processo Civil, de 1973 – portanto o atual Código processual – traz outra ordem, qual seja, aquela prevista no art. 655:

"Art. 655. Incumbe ao devedor, ao fazer a nomeação de bens, observar a seguinte ordem:

I - dinheiro;

II - pedras e metais preciosos;

III - títulos da dívida pública da União ou dos Estados;

IV - títulos de crédito, que tenham cotação em bolsa;

V - móveis;

VI - veículos;

VII - semoventes;

VIII - imóveis;

IX - navios e aeronaves;

X - direitos e ações."

Destarte, citado o executado, esse terá um prazo de 24 (vinte e quatro) horas para pagar ou nomear bens à penhora, de acordo com a seqüência acima estabelecida.

Ferindo essa seqüência, a indicação dos bens somente será tomada por termo se com isso concordar o credor. [20]

Argumenta-se que essa gradação legal estaria atendendo ao princípio da menor onerosidade possível do executado [21], conjugando-o ao princípio segundo o qual a execução se realiza no interesse do credor [22].

Todavia, não obstante o teor destes textos legais, entendemos que a melhor exegese centra-se no fato de que o juiz e o exeqüente não estão obrigados a aceitar a nomeação realizada pelo executado, mormente em se tratando de bens de difícil alienação, mesmo que atendida a ordem de gradação. Por conseguinte, a nomeação de bem à penhora deve ser indeferida sempre que se revele provável a ineficácia de tal nomeação.

Deste modo, justificar-se-ia a recusa dos bens indicados à penhora quando, por exemplo, estes se revelem de difícil alienação e sejam dependentes de mercado especialíssimo, havendo outros que ensejariam execução de forma mais eficaz.

Sendo assim, acreditamos ser possível a penhora de um imóvel mesmo ante a existência de outros bens móveis, desde que demonstrado que essa penhora seja mais conveniente para a execução, não obstante o teor do 655, do CPC.

É evidente, contudo, que entre a penhora de um numerário em dinheiro e a penhora de um imóvel, há de prevalecer a penhora daquele por questões óbvias. Havendo dinheiro, sobre ele a penhora deverá recair, excluindo-se os demais bens, uma vez que a execução deve ser realizada pela forma mais célere e menos dispendiosa possível.

Destarte, em princípio, a observância da gradação legal é condição de validade da nomeação. Mas, justamente, para harmonizar o art. 655, do Código de Processo Civil, com as regras-princípios dos artigos 612 e 620, do mesmo diploma, vale dizer, com a necessidade de realizar a execução pelo modo menos gravoso para o devedor, mas no interesse do credor, "a gradação legal estabelecida para efetivação da penhora não tem caráter rígido, podendo, pois, ser alterada por força de circunstâncias e atendidas as peculiaridades de cada caso concreto, bem como o interesse das partes litigantes" [23].

Entendemos, ademais, que cabe ao exeqüente indicar os bens que lhe são mais pertinentes, respeitados apenas os limites da impenhorabilidade previstos em lei.

Nesta esteira é o "anteprojeto de lei que trata do cumprimento da sentença que condena ao pagamento de quantia certa". Pela proposta apresentada, sequer haverá citação para nomeação de bens à penhora, cabendo ao exeqüente "indicar desde logo os bens a serem penhorados" [24]. [25]

Pelo "Projeto de Reforma da Execução Extrajudicial [26]", a gradação passa a ser a seguinte:

"Art. 655. A penhora observará preferencialmente a seguinte ordem:

I – dinheiro, em espécie ou em depósito ou aplicação em instituição financeira;

II – títulos da dívida pública da união, Estados e Distrito Federal, salvo se de validade controvertida;

III - títulos com cotação em bolsa de valores;

IV – veículos de via terrestre;

V – bens móveis em geral;

VI – bens imóveis;

VII – navios e aeronaves;

VIII – pedras e metais preciosos;

IX - direitos e ações."

Há significativa mudança na ordem. Contudo, o que mais se destaca é que essa ordem tornar-se-á meramente "preferencial", e não obrigatória!

Deste modo, cremos que o principal interessado na penhora é o credor, e desde que respeite a impenhorabilidade de bens previstas em lei, poderá sugerir a constrição judicial de quaisquer bens, ainda que em descompasso com a ordem legal.

Sendo assim, a penhora de bens imóveis pode ocorrer independentemente de existirem outros bens penhoráveis.


5. O que são Imóveis?

Resta, então, saber o que são os bens imóveis. Pelo Código Civil brasileiro, "são bens imóveis o solo e tudo quanto se lhe incorporar natural ou artificialmente." [27] A tais se dá o nome acadêmico de imóveis pela sua própria natureza. A par destes, existem os bens que a lei diz ser imóveis, a saber: os direitos reais sobre imóveis e as ações que os asseguram [28] e o direito à sucessão aberta [29]."

Sob a égide do antigo Código Civil (Lei 3071, de 01-01-1916), a doutrina ainda perfilhava o entendimento de existirem os imóveis por acessão física [30], e aqueles por acessão intelectual [31].

A redação do artigo 79, do novo Código Civil, não deixa dúvidas: "são bens imóveis o solo e tudo quanto se lhe incorporar natural ou artificialmente." Logo, continuam a existir os imóveis pela sua própria natureza, os imóveis por determinação legal, bem como os imóveis por acessão física ou intelectual.

E são esses, então, os bens imóveis que podem ser penhorados.


6. Da necessidade da intimação do cônjuge

O artigo 948, do antigo Código de Processo Civil [32], exigia que se a penhora recaísse em bens imóveis a mulher também deveria ser intimada, sob pena de nulidade insanável.

O atual Código de Processo Civil também contempla medida semelhante, pois, a teor do art. 669, § único, "recaindo a penhora em bens imóveis, será intimado também o cônjuge do devedor."

A finalidade precípua deste dispositivo é proteger a meação do cônjuge das dívidas do seu parceiro que não lhe digam respeito, pois o art. 1659, do Código Civil brasileiro, reza que a meação só responde pelos atos ilícitos praticados pelo outro cônjuge, mediante prova que todos foram beneficiados com o produto da infração. [33]

A propósito, conforme pacificado na jurisprudência, "embora intimado da penhora em imóvel do casal, o cônjuge do executado pode opor embargos de terceiro para defesa de sua meação" [34]. Neste passo, o cônjuge intimado da penhora poderá promover embargos do devedor, para defender-se do título, da dívida e da regularidade do procedimento executivo, ou promover embargos de terceiro para defender sua meação.

Se intimado da penhora e não promovido os embargos do devedor no prazo legal de 10 (dez) dias [35], o cônjuge poderá propor, mesmo assim, os embargos de terceiro até 05 (cinco) dias depois da arrematação, adjudicação ou remição, mas sempre antes da assinatura da respectiva carta [36]. Contudo, perderá a oportunidade de discutir a dívida em si.

Quanto às regras sobre o ônus da prova, caberá ao interessado na exclusão da meação o seu ônus, no sentido de demonstrar que a dívida não beneficiou a família. [37]

A mesma regra aplicar-se-á no caso de aval prestado pelo marido em garantia de dívida de sociedade de que faz parte, cabendo então à mulher que opõe embargos de terceiro o ônus da prova de que disso não resultou benefício para a família [38].

Mas, se o cônjuge é mero avalista ou devedor solidário, a meação da mulher casada não responde por aval de seu cônjuge, por ausência de presunção de que a entidade familiar dele se houvesse beneficiado, já que constitui ato gratuito dado em favor de terceiro, cabendo, então o ônus da prova ao credor de que houve benefício da família [39].

Questão interessante é saber se a companheira ou o companheiro também devem ser intimados no caso de penhora de bens imóveis.

Para alguns, a união estável não torna exigível que da penhora seja intimado o companheiro da executada. Para nós, no entanto, muito embora o Código de Processo Civil fale somente em cônjuge, o fato é que a(o) companheira(o) também deve ser intimada(o). Quando da entrada em vigor do Código de Processo Civil, em 01-01-1974, a "união estável" não gozava de status familiar. Aliás, nesse período, era vista como mera sociedade de fato.

Com a Constituição Federal de 1988, "para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento." Logo, a "união estável" fora guindada em nível de entidade familiar, gozando de toda a proteção estatal.

Salta iniludível que o propósito do legislador, ao prever a intimação do cônjuge quando da penhora, era preservar sua meação, bem como a residência do casal. Ora, o companheiro também tem sua meação assegurada. Tanto é assim que "na união estável, salvo contrato escrito entre os companheiros, aplica-se às relações patrimoniais, no que couber, o regime da comunhão parcial de bens." [40] Por conseguinte, é imperioso que seja intimado da constrição, a fim de fazer valer a defesa de sua meação.

Mesmo porque, repita-se, conforme o texto constitucional, "para efeito de proteção do Estado" reconheceu-se a união estável como entidade familiar. Logo, levando-se em conta que a intimação da penhora sobre bem imóvel é uma forma de proteção que o Estado dá ao cônjuge, tal prerrogativa deve ser entendida ao(à) companheiro(a).

Pelo "Esboço de Anteprojeto de Lei sobre a Execução de Título Extrajudicial", o art. 655, § 3º [41], manterá a exigência de intimação do cônjuge, estendendo-a agora também para o companheiro do executado.

Ademais, o art. 655-B, traz importante inovação: "tratando-se de penhora em bem indivisível, a meação do cônjuge alheio à execução recairá sobre o produto da alienação do bem" [42].

Assim, os embargos de terceiro promovido pelo cônjuge não teriam mais o condão de suspender a execução, mas apenas de ver preservada a meação quando do praceamento. Destarte, levar-se-ia o bem à hasta pública, e do fruto desta hasta seriam pagos a meação do cônjuge, e o restante entregue ao credor.

Entretanto, o projeto peca por não inserir expressamente neste contexto também o companheiro ou a companheira. Por conseguinte, recomendável que a redação proposta ao art. 655-B, dê-se nos seguintes termos: "tratando-se de penhora em bem indivisível, a meação do cônjuge ou do companheiro alheio à execução recairá sobre o produto da alienação do bem."

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Sobre o autor
Jesualdo Eduardo de Almeida Júnior

advogado sócio do escritório Zanoti e Almeida Advogados Associados; doutorando pela Universidade Del Museo Social, de Buenos Aires; mestre em Sistema Constitucional de Garantia de Direitos; pós-graduado em Direito Contratual;pós-graduado em Direito das Relações Sociais; professor de Direito Civil e coordenador da pós-graduação da Associação Educacional Toledo (Presidente Prudente/SP), professor da FEMA/IMESA (Assis/SP), do curso de pós-graduação da Universidade Estadual de Londrina – UEL, da PUC/PR, da Escola Superior da Advocacia, da Escola da Magistratura do Trabalho do Paraná.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ALMEIDA JÚNIOR, Jesualdo Eduardo. A penhora de bens imóveis.: Alguns apontamentos sobre a atual sistemática e os projetos de reforma do Código de Processo Civil. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 9, n. 484, 3 nov. 2004. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/5872. Acesso em: 22 dez. 2024.

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