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Interpretação constitucional:

a importância de uma sociedade aberta de intérpretes para a consolidação e efetividade da democracia no Brasil contemporâneo

11/07/2017 às 16:00

Resumo:


  • Peter Härbele defende a interpretação constitucional em uma sociedade aberta de intérpretes, ampliando o processo para incluir não apenas juízes, mas também cidadãos e grupos sociais.

  • A hermenêutica constitucional envolve métodos e princípios específicos, como o método jurídico hermenêutico clássico, o princípio da unidade da Constituição e o princípio da proporcionalidade.

  • A teoria de Härbele influenciou o fortalecimento do Estado Constitucional e a consolidação da democracia, promovendo a participação pluralista na interpretação da Constituição, inclusive com a institucionalização do amicus curiae no Brasil.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

Expõem-se aspectos gerais da hermenêutica constitucional, com princípios e métodos intrínsecos, juntamente com a teoria de uma sociedade aberta dos intérpretes da Constituição, formulada por Peter Härbele.

1 INTRODUÇÃO

Härbele defende que a interpretação constitucional não é um evento exclusivo do Estado. Ele explica que há uma sociedade fechada quando a hermenêutica constitucional se concentra na interpretação dos juízes e nos procedimentos formalizados (1997, p. 12). De acordo com o autor, “a teoria da interpretação deve ser garantida sob a influência da teoria democrática”. Percebe-se no contexto sociopolítico brasileiro uma política cada vez mais judicializada e um Judiciário que se politiza a passos largos juntamente com uma sociedade cada vez mais plural. Nesse cenário, qual a importância de uma sociedade aberta de intérpretes?


2 HERMENÊUTICA CONSTITUCIONAL: ASPECTOS GERAIS

De acordo com Carlos Maximiliano (1979, p. 1), a hermenêutica "tem por objeto o estudo e a sistematização dos processos aplicáveis para determinar o sentido e o alcance das expressões do Direito". A Hermenêutica Constitucional seria, pela ótica de Nagib Filho, o estudo e a sistematização dos processos aplicáveis para determinar o sentido e o alcance das normas constitucionais. A interpretação constitucional dispõe de métodos e princípios como ferramentas de auxílio na decodificação do texto da Constituição e na solução de possíveis conflitos que podem surgir. Também pela perspectiva de Luís Roberto Barroso (2001, p.103), a interpretação da Lei Maior é a atividade relativa à práxis de revelar o conteúdo, o significado, e o alcance da norma, pra aplicá-la ao caso concreto. Essa aplicação da norma jurídica, segundo o autor, seria o resultado do processo interpretativo. A priori apura-se o conteúdo da norma e faz-se a subsunção do dos fatos.

A particularidade da hermenêutica constitucional em detrimento da interpretação jurídica da norma infraconstitucional dá-se pelo fato de que ela se serve de alguns princípios próprios e se apresenta como uma espécie de objeto sui generis ao passo que possui complexidades intrínsecas, contudo, esse mesmo fato não a exclui do campo da hermenêutica jurídica. Barroso (2001, p. 105) afirma que no sistema brasileiro as regras de interpretação positivadas são escassas no ordenamento jurídico do país, sendo que as existentes encontram-se na Lei de Introdução ao Código Civil, nos artigos 4° e 5º. O autor ressalta (p.106) que o objeto da interpretação constitucional consiste na determinação do significado das normas que integram a Constituição em seu sentindo formal e material do Estado. Esse processo pode ter duas formas: a da aplicação direta da norma no caso jurídico, ou na verificação do controle de constitucionalidade (onde se analisa a compatibilidade de uma norma infraconstitucional com o texto da Lei Maior).

Segundo Barroso (p.107), a Constituição tem quatro aspectos que tornam a suas normas peculiares: a superioridade hierárquica, a natureza da linguagem, o conteúdo especifico e o caráter político. A supremacia da Constituição é o que atribui à Lei Maior o caráter subordinante da norma infraconstitucional ao seu texto, de forma que nenhuma dessas normas possa contradizê-lo. A linguagem constitucional possui maior grau de abertura e abstração, o que leva a ter menor densidade jurídica. Além de conter normas que preveem o fato e atribuem uma sanção ao seu descumprimento, a Constituição também possui normas de caráter instrumental que estruturam organicamente o Estado e disciplinam essa organização (exemplo: atribuição de competências a instituições). Além disso há as normas que dispõem sobre valores a serem preservados e finalidades sociais a serem alcançadas, um exemplo disso é a erradicação da pobreza e do analfabetismo determinada no texto constitucional. Também a Constituição possui um viés político que remonta a sua origem, seu objeto e os resultados de sua aplicação, pois materializa a tentativa de conversão do poder político em poder jurídico.

A hermenêutica constitucional poderá também, de acordo com Barroso (2011, p. 115), legislativa, administrativa, judicial, doutrinária e autêntica.  A legislativa é realizada para a própria estruturação do Poder Legislativo. A administrativa é feita pelo Poder Executivo, para pautar a conduta desse poder. A interpretação judicial dá-se pela aplicação direta de um preceito constitucional ou pela atividade do controle de constitucionalidade. A interpretação doutrinária é o produto do trabalho intelectual dos profissionais jurídicos. E, por fim, a autêntica refere-se à edição de uma norma interpretativa de outra preexistente, logo, emanaria unicamente do poder constituinte originário.

Quanto aos métodos e princípios hermenêuticos constitucionais estão: o método jurídico hermenêutico clássico, método tópico-problemático, o hermenêutico-concretizador, o científico-espiritual, o normativo-estruturante, o método da comparação constitucional, o princípio da unidade da Constituição, o princípio da harmonização, o princípio da correção funcional, o princípio da eficácia integradora, o princípio da força normativa da Constituição, o princípio da máxima efetividade, o princípio da interpretação conforme a Constituição e o princípio da proporcionalidade.  O método jurídico hermenêutico clássico, de acordo com Inocêncio Mártires Coelho (2011, p. 141) é uma concepção baseada na ideia de verdade como conformidade, ou seja, na ideia de que toda norma possui um sentido em si; o interprete, portanto, irá descobrir o verdadeiro significado da norma e será guiado pelo mesmo na sua interpretação. O método tópico-problemático, segundo Canotilho (1993, p. 213) parte de três premissas: do caráter prático da interpretação  constitucional, pois, como toda a interpretação, procura resolver os problemas concretos; do caráter aberto, fragmentário ou indeterminado da lei constitucional; da preferência pela discussão do problema em virtude da abertura das normas constitucionais que não permitam qualquer dedução subsuntiva a partir delas mesmas.  Sobre o método hermenêutico-concretizador,  Canotilho (1993, p. 214) afirma: “ao ler a norma inicia-se pela pré-compreensão do seu sentido através do intérprete. A interpretação é o entendimento de sentido, que o intérprete efetua uma atividade prático-normativa, definindo a norma a partir de uma situação histórica concreta”.

O método científico-espiritual tem como sustentação a ideia de Constituição como instrumento de integração em sentido amplo, não apenas do ponto de vista jurídico-formal, mas também sob uma perspectiva política e sociológica (COELHO, 2011). O método normativo-estruturante parte da premissa de que “existe uma implicação necessária entre o programa normativo entre os preceitos jurídicos e a realidade que eles intentam regular” (COELHO, 2011), sendo atribuída a tarefa de “concretizar” a Constituição ao aplicador do direito, que dessa forma não deverá considerar apenas os elementos que resultam da interpretação do programa normativo mas também aqueles que resultam da investigação do âmbito normativo. O método da comparação constitucional constaria no “processo de busca e constatação de pontos comuns ou divergentes entre duas ou mais constituições” (COELHO, 2011). Já o princípio da unidade da Constituição, de acordo com o mesmo autor (2011, p. 159), considera que as normas constitucionais devem ser vistas como preceitos integrados num sistema único de regras e princípios instituídos no texto da Lei Maior, e não devem ser vistos de forma isolada. O princípio da harmonização, que é conhecido também como princípio da concordância prática, consiste numa recomendação para que o aplicador, deparando-se com situações de conflito entre normas, adote uma solução que não resulte na negação das mesmas (2011, p. 160). O princípio da correção funcional tem como finalidade orientar o intérprete do texto constitucional a não chegarem a resultados que perturbem o esquema organizatório-funcional na Constituição estabelecido (2011, p. 163). O princípio da eficácia integradora visa que o aplicador, ao dar soluções para os problemas jurídico-constitucionais, procure dar preferência aos critérios e perspectivas que favoreçam a integração social e a unidade política (2011, p. 164). O princípio da força normativa da Constituição orienta que os aplicadores da Lei Maior na solução de problemas jurídico-constitucionais, procurem preferir os pontos de vista que se ajustem historicamente ao sentido das normas, dando-lhes dessa forma maior eficácia ( 2011, p. 165). Já o principio da máxima efetividade, que é vinculado ao princípio da força normativa da Constituição, aconselha os aplicadores da Constituição para que interpretem as normas com a finalidade de aperfeiçoar a sua eficácia, mas sem alterar o seu conteúdo (2011, p. 166). O princípio da interpretação conforme a Constituição é um instrumento situado no campo do controle de constitucionalidade, ele consiste em uma diretriz de prudência política constitucional que aconselha aos aplicadores que escolham a solução para o problema mas que esta não resulte numa inconstitucionalidade da norma (2011, p. 167). E, por fim, o princípio da proporcionalidade: princípio que é emanado das ideias de justiça, equidade, bom senso, prudência, justa medida, moderação, direito justo e valores semelhantes, e que também designa-se como um princípio geral do direito.

2.1. A INTERPRETAÇÃO CONSTITUCIONAL SEGUNDO PETER HÄRBELE: De uma sociedade fechada para uma sociedade aberta de intérpretes.

Peter Härbele (1997, p. 14) defende uma democratização da hermenêutica constitucional, propondo, em sua tese fundamental, para essa finalidade, que no processo de interpretação constitucional estejam potencialmente ligados todos os órgãos estatais, as potências públicas, todos os cidadãos e grupos sociais, não se estabelecendo assim um número limite aos participantes do processo hermenêutico, sendo estes as forças produtivas de interpretação, sem as quais seria impossível uma interpretação democrática da Constituição. De acordo com o autor, a hermenêutica da Lei Maior é muito atribuída apenas a uma “sociedade fechada”, ao passo que concentra-se o seu campo de análise e investigação na interpretação de juízes e nos procedimentos formalizados. Härbele (1997, 13) afirma que “quem vive a norma acaba por interpretá-la, ou pelo menos co- interpretá-la”, dessa forma, toda atualização do texto constitucional pela ação de qualquer indivíduo constitui, ainda que em parte, uma interpretação antecipada. O autor, segundo Flávio Riche, deseja operar uma síntese entre o texto constitucional e a realidade constitucional, evidenciando o papel fundamental exercido pelos agentes que vivem essa realidade. A sua metodologia gira em torno do modelo aberto e pluralista de sociedade, tendo como fator mais importante nesse processo os seus participantes, pois todos aqueles que vivem a norma em sua realidade devem ser considerados com “forças produtivas da interpretação”, ou seja, interpretes em latu sensu da Constituição. Dessa forma, de acordo com Riche, como os aplicadores do direito não são os únicos que vivem a norma, não podem monopolizar a atividade interpretativa. Nesse mesmo sentido, Peter Härbele afirma:

Todo aquele que vive no contexto que vive no contexto regulado por uma norma e que vive com este contexto, é, indireta ou, até mesmo diretamente, um interprete da norma. O destinatário da norma é participante ativo, muito mais ativo do que se pode supor tradicionalmente, do processo hermenêutico. Como não são apenas os interpretes jurídicos da Constituição que vivem a norma, não detêm eles o monopólio da interpretação. (p. 15)

Härbele (1997, p.23) defende também que é própria da força produtiva da interpretação, a opinião pública democrática e pluralista, obtendo um importante papel, nesse processo, a mídia (imprensa, rádio, televisão, etc..), e também os cidadãos, as associações, os partidos políticos, igrejas, editoras, teatros, escolas, dentre outros. A participação do indivíduo é potencialmente integradora de todas as forças da comunidade política no processo, em que a ampliação desse círculo de intérpretes decorre da necessidade de integrar a realidade no processo interpretativo. Neste o cidadão formula um recurso constitucional, ou seja, atua como intérprete direito do texto da Lei Maior, já que essa interpretação é uma atividade que, em geral, diz respeito a todos.

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De acordo com Gilmar Mendes (2009), Härbele defende a necessidade de que os instrumentos de informação dos juízes constitucionais sejam ampliados, especialmente no que se refere a audiências públicas e a “intervenções de eventuais interessados” assegurando-se novas formas de participação das potências públicas pluralistas como intérpretes em sentido amplo da Constituição. Ou seja, no tocante ao papel dos juízes, Peter afirma que esse não pode existir só, e sim consonante a outras forças produtivas de interpretação.

Segundo Härbele, a teoria da interpretação constitucional tradicional indagava-se essencialmente apenas sobre a função e os objetivos dessa interpretação constitucional e o sobre os métodos, processos de interpretar e as regras e princípios da hermenêutica. A nova teoria de interpretação pluralista proposta por Härbele rompe com a metodologia tradicional da hermenêutica jurídica tradicional, pois chama atenção para a problemática dos participantes do processo de interpretação constitucional.


3  A IMPORTÂNCIA HERMÊUTICA CONSTITUCIONAL ABERTA PARA A CONCRETUDE DEMOCRÁTICA EM UM ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO BRASIL

O processo político segundo Härbele (1997, p. 26) é apresentado como uma subespécie de processo livre em face da interpretação constitucional: “(...) Representa, constitucione lata de fato, um elemento importante – mas importante que se supõe geralmente – da interpretação constitucional (política como interpretação constitucional).” (1997, p. 26). O processo político, segundo o autor, não é eliminado da Constituição, ele designa um elemento essencial ou central. Este deve ser comparado a um “motor” que impulsiona esse processo. De maneira alguma o processo político é um processo liberto do texto constitucional. A Constituição Federal de 1988 consagra o regime democrático como processo político brasileiro. Nas primeiras linhas de seu preâmbulo ela determina:

Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembleia Nacional Constituinte para instituir um Estado democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiã como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacifica das controvérsias, promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte Constituição da Republica Federativa do Brasil.

O método concretista de Härbele “respira” democracia. Segundo Luís Roberto Barroso (2011, p. 120), a teoria de uma sociedade aberta dos intérpretes da constituição é um processo aberto, no qual estão envolvidos não só os poderes estatais, órgãos públicos, mas também os cidadãos e grupos sociais. Não há, dessa forma, um elenco limitado, numerus clausus, de interpretes da Constituição. Não sendo um evento apenas e puramente estatal, todos podem potencialmente interpretar a Lei Maior.

Flávio Riche traça a fundamental ligação entre a teoria de Harbele e a teoria democrática, segundo o autor, o abandono do modelo hermenêutico clássico, construído a partir de uma sociedade fechada, reconhece que não apenas o processo de formação é pluralista, mas também todo o desenvolvimento posterior, de modo que a teoria da Constituição – assim como a teoria da democracia – exercem um papel mediador entre Estado e sociedade

Desse modo, a tese fundamental de Peter Härbele objetiva uma democratização do processo hermenêutico constitucional.

3.1 A interpretação constitucional aberta e os direitos fundamentais garantidos na Constituição de 1988          

Segundo Gilmar Mendes, a teoria constitucional de Peter Häberle é voltada à defesa da tolerância e da aceitação do outro e à proteção dos direitos fundamentais. Diante da complexa realidade do mundo atual, especificamente a realidade brasileira, que demonstra uma enorme pluralidade em vários aspectos, a hermenêutica proposta pelo professor alemão, contribuiu de modo grandioso para o fortalecimento do Estado Constitucional, sobretudo em países de transição democrática. Mendes afirma:

No Brasil, sua contribuição tem sido inestimável para o desenvolvimento do direito constitucional. São muitos os doutrinadores brasileiros de renome que defendem a necessidade de consolidação da ideia de uma sociedade aberta de intérpretes da Constituição, formulada por Peter Häberle.  Segundo essa concepção, o círculo de intérpretes da Lei Fundamental deve ser alargado para abarcar não apenas as autoridades públicas e as partes formais nos processos de controle de constitucionalidade, mas todos os cidadãos e grupos sociais que, de uma forma ou de outra, vivenciam a realidade constitucional.

A influência da teoria hermenêutica de Häberle também pode ser observada no âmbito do Supremo Tribunal brasileiro, ao passo que foi institucionalizada a figura do amicus curiae na jurisdição constitucional brasileira:

Os denominados amici curiae possuem, atualmente, ampla participação nas ações do controle abstrato de constitucionalidade e constituem peças fundamentais do processo de interpretação da Constituição por parte do Supremo Tribunal Federal. Assim, é possível afirmar que a Jurisdição Constitucional no Brasil adota, hoje, um modelo procedimental que oferece alternativas e condições as quais tornam possível, de modo cada vez mais intenso, a interferência de uma pluralidade de sujeitos, argumentos e visões no processo constitucional.¹

Da mesma forma, a sua teoria, de acordo com Inocêncio Mártires Coelho (1998), resultou no aprimoramento do modelo brasileiro de controle jurisdicional de constitucionalidade.

Antônio Silva Junior (2006) afirma que a legitimação, sob o prisma da teoria da Democracia, almeja garantir, dentro da perspectiva pluralista da sociedade, os direitos fundamentais do povo, povo no sentido de um "elemento pluralista para a interpretação que se faz presente de forma legitimadora do processo constitucional", a fim de proporcionar-lhe o melhor modo de participação na interpretação da Constituição.

Ou seja, somente através da garantia de direitos fundamentais do cidadão, pode este agente exercer livremente seu potencial interpretativo. O próprio Härbele (1997, p. 15), sobre os direitos fundamentais, diz: “Não cuida-se apenas da práxis estatal. Em se tratando de muitos direitos fundamentais já se processa a interpretação (talvez conscientemente?) no modo como os destinatários da norma preenchem o âmbito de proteção naquele direito.”. 

Flávio Riche afirma que a metodologia de Härbele “implicará na radicalização da orientação tópico-problemática no campo da teoria da Constituição”. De acordo com José Joaquim Gomes Canotilho (1993, p. 213), mediante o método tópico-problemático, a interpretação da Lei Maior reconduzir-se-ia a um “processo aberto de argumentação entre os vários participantes (pluralismo de intérpretes)”, através da qual se tenta adequar a norma constitucional ao caso concreto.

Os aplicadores e interpretadores do direito servem-se de vários pontos de vista e perspectivas, sujeitos à prova das opiniões a favor ou contra, a fim de descortinar, dentro do vasto campo de possibilidades derivadas da polissemia de sentido do texto constitucional, a interpretação mais conveniente para o problema. O método tópico-problemático seria, dessa forma, uma arte de invenção e, como tal, técnica do pensar problemático.

Os vários tópicos teriam como função servir de auxiliar de orientação para o intérprete; constituir um guia de discussão  dos problemas; permitir a decisão do problema  jurídico  em discussão. A interpretação a partir da concretização do texto  constitucional, segundo esse método, não deve partir do problema para a norma, mas desta para os problemas. Dessa forma, este método, no âmbito do direito constitucional, parte do caráter prático da interpretação constitucional, pois, como toda a interpretação, procura resolver os problemas concretos; do caráter aberto, fragmentário ou indeterminado da lei constitucional; e da  preferência pela discussão do problema em virtude da abertura das normas constitucionais que não permitam qualquer dedução subsuntiva a partir delas mesmas.


4 CONCLUSÃO

Peter Härbele, sem dúvidas, é um dos maiores juristas contemporâneos. Sua obra é de grande relevância quando trata-se de questões democráticas dentro do direito, pois ao fundamentar a mesma no pluralismo de intérpretes do texto constitucional, ele contribui para o fortalecimento e efetivação da democracia em um Estado Democrático De Direito. Tendo também em vista que as sociedades em geral, especialmente a brasileira, se transformam o tempo inteiro e se tornam cada vez mais plurais, o papel da interpretação jurídica nesse sentido não se daria simplesmente em um pensar de novo aquilo que já foi pensado, mas, pelo contrário, se daria em um pensar de novo aquilo que já começou a ser pensado por um outro (COELHO, 2007). A hermenêutica constitucional, dessa forma, não seria uma repetição do que já foi dito, mas sim um dialético levar adiante, preservado, transformado, enriquecido, um pensamento constante que não impõe limites a novas leituras. (COELHO, 2007).


REFERÊNCIAS

BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e aplicação da constituição: fundamentos de uma dogmática constitucional transformadora. . 4ª edição. São Paulo: Saraiva, 2011.

CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional. Coimbra: Livraria Almedina,1993.

COELHO, Inocêncio Mártires. Interpretação Constitucional. 4ª edição. São Paulo: Saraiva, 2011.

COELHO, Inocêncio Mártires. Métodos e princípios da interpretação constitucional: o que são, para que servem, como se aplicam. Disponível em: <http://www.portaldeperiodicos.idp.edu.br/index.php/cadernovirtual/article/viewFile/53/30> Acesso em 21 de abr. 2014.

HÄBERLE, Peter. Hermenêutica Constitucional: a sociedade aberta dos intérpretes da Constituição – contribuição para a interpretação pluralista e procedimental da Constituição. Tradução de Gilmar Ferreira Mendes. Porto Alegre: Fabris, 1997.

MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e Aplicação do Direito, 9a ed., Rio de Janeiro, Ed. Forense, 1979, p. 1.

MENDES, Gilmar. Homenagem à doutrina de Peter Häberle e sua influência no Brasil. Disponível em <www.gilmarmendes.org.br/índex.php.option?..> Acesso em: 20 abr 2014

RICHE, Flávio Elias. O Método Concretista da “Constituição Aberta” de Peter Härbele. Disponível em <www.oocities.org/flavioriche/Harbele.htm> Acesso em: 20 abr 2014

SILVA JÚNIOR, Antônio Soares. A hermenêutica constitucional de Peter Häberle. A mudança do paradigma jurídico de participação popular no fenômeno de criação/interpretação normativa segundo a teoria concretista. Jus Navigandi, Teresina, ano 11, n. 1208, 22 out. 2006. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/9070>. Acesso em: 20 abr. 2014.

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Sobre a autora
Ana Karina Campos

Áreas de atuação: Cível, Consumidor, Direito Marítimo e Portuário.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CAMPOS, Ana Karina. Interpretação constitucional:: a importância de uma sociedade aberta de intérpretes para a consolidação e efetividade da democracia no Brasil contemporâneo. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 22, n. 5123, 11 jul. 2017. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/59017. Acesso em: 22 dez. 2024.

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