Capa da publicação Crédito consignado para servidores como ativo especial a ser licitado
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Da necessidade do crédito consignado em folha de pagamento de servidores públicos ser considerado ativo especial a ser licitado

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Resumo:


  • A Administração Pública tem buscado reduzir custos e delegar à iniciativa privada atividades como a consignação em folha de pagamento de servidores, utilizando softwares especializados para a gestão dessas operações.

  • Essa prática tem se difundido, mas muitas contratações são realizadas sem licitação, desconsiderando o valor econômico do serviço de crédito consignado, o que pode representar um desrespeito aos princípios da legalidade e isonomia.

  • É imprescindível a realização de licitação para a contratação desse tipo de serviço, seja por meio de concorrência ou pregão, e a Administração deve valorar economicamente o ativo especial da consignação em folha, assegurando a melhor proposta para a gestão pública e seus servidores.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

O artigo procura discutir a necessidade de licitação para a prestação relacionada a serviços de crédito consignado a servidores, por representar verdadeiro bem da Administração Pública, que não pode ser simplesmente entregue gratuitamente a terceiros.

1 – INTRODUÇÃO.

Vem crescendo, no âmbito da Administração Pública, a busca pela redução de custos, pela diminuição do aparelho estatal e mesmo a aferição de receitas de algumas funções não essenciais, entre elas a consignação em folha de pagamento de servidores públicos.

Há alguns anos, em meio a esse processo, viu-se a terceirização da folha de pagamento dos servidores públicos e, hoje – embora não tão recente assim –, temo-nos deparado com o repasse à iniciativa privada de serviços de consignação em folha de pagamento de servidores, que implica na criação e participação de um intermediário na relação entre as instituições financeiras e os municípios detentores das folhas de pagamento, na oferta de serviços dessa natureza aos seus servidores.

Dada a informatização dos tempos modernos, muitas vezes, essa atividade é sistematizada, ou seja, prestada através de softwares, alguns especificamente desenvolvidos para esse desiderato, visando reserva de margem e controle de consignações, com desconto em folha de pagamento dos servidores públicos, dentre outras ferramentas agregadas.

Dado esse contexto, essa sorte de serviços tem se espalhado rapidamente entre os órgãos públicos, até mesmo entre aqueles voltado ao controle estatal.

Ocorre que as contratações deste segmento têm sido menoscabadas pela maioria dos entes públicos, que promovem contratações diretas e descuram do valor agregado ao serviço de crédito consignado em folha de pagamento, conferindo-o à iniciativa privada sem qualquer valoração econômica, por vezes, tratando o assunto como mero comodato, quando envolve licença para o uso de software; ou indicando a desnecessidade de licitação, por não envolver gastos públicos – conquanto envolva, por equiparação, como se demonstrará, um bem público, sujeito a procedimento licitatório.

Ora, a contratação direta restaria afastada pelo mero fato de que há outras empresas que oferecem, no mercado, softwares com instrumentalidade, se não idêntica, ao menos semelhante, porque não equivalente, descurando, quase sempre, as administrações, de promover alguma análise comparativa indicando deficiências, diferenças fundamentais ou impossibilidades de ordem prática que inviabilizem, de plano, e, no mínimo, em tese, a consulta ou utilização dos demais sistemas passíveis de fornecimento.


2 – O SEGMENTO DE SERVIÇOS DE CRÉDITO CONSIGNADO EM FOLHA.

Na verdade, ao aprofundar-nos sobre a questão, verificamos tratar-se de um mercado próprio que, com maior ou menor expressividade quantitativa entre os fornecedores, dispõe, atualmente, de diversas empresas com atuação regional ou nacional.

Mas, possível obtemperar, a matéria não se resume a um mero licenciamento de software para reserva de margem e consignação em folha. A contratação em questão trata, ao nosso sentir, outrossim, da inserção de um intermediário no processo de viabilização da concessão de créditos consignados, valendo observar que, ainda que não haja despesa pública evidente, nitidamente haverá uma nova participação comercial, através da empresa comodante do referido software, atuando junto aos bancos que realizem a atividade creditícia correlata, podendo haver até mesmo o repasse de eventual custo adicional aos servidores mutuários.

O que se verifica, infelizmente, por vezes, é que o Poder Público não percebe, a tempo, que está, não a deixar de gastar, mas a conferir à iniciativa privada bem ou serviço economicamente valorável, sem maiores preocupações com possíveis receitas financeiras envolvidas ou com os ônus decorrentes dessa prática. No caso, confere à iniciativa privada, cremos, no mais das vezes, por falta de conhecimento, a exclusividade das negociações da operação de consignação em folha com os bancos mutuantes, dando a essas empresas sólidas ferramentas de negociação, inflacionando os preços praticados nesse peculiar mercado.

Dado o desconhecimento, o desinteresse, entre outros motes, a administração dos dados e processamento capaz de viabilizar a concessão de empréstimos em questão, quando realizado diretamente – e, mais uma vez diga-se, pelas diversas Administrações Públicas Brasil afora –, talvez não observem o valor econômico agregado à sua atuação ou à relação de seus servidores públicos na condição de possíveis mutuários, limitando-se, simplesmente, a um mero viabilizador ou repassador de informações aos bancos, reduzindo ou tornando insignificante sua expressão econômica efetiva nesse mercado.

Nem mesmo a falta de condições da Administração executar diretamente os serviços que serão automatizados pelo software em questão afasta a valoração das atividades em análise, uma vez que, em qualquer caso, a viabilização desse mercado implica na necessidade de integração de seus agentes e intermediários com cada respectivo ente ou entidade da Administração, no que tange à operação de consignação de pagamentos a seus respectivos servidores.

Essa matéria deve sobrepor-se à mera pretensão de dispor de um sistema apresentado “gratuitamente”. Em outras palavras, as operações de consignações, com desconto em folha de pagamento, pelo Poder Público, enquanto etapa essencial de concretização do processo de empréstimo consignado, precisam ser alvo de valoração e percepção econômica pelo Poder Público antes da “terceirização”.

Embora as empresas proponentes deste segmento não disponham, em regra, de fato e de direito, da exclusividade do desenvolvimento e disponibilização de softwares que permitam viabilizar o objeto em questão o que já exigiria a observância de regular processo de licitação pública, também, a meu sentir, a própria concessão, ao particular, do direito de explorar economicamente os serviços de operação de consignação em folha de pagamento pública, realizados, de per si, prescrevem a mesma observação, pela absoluta e obrigatória condição licitável do objeto.


3 – A CONSIGNAÇÃO COMO ATIVO ESPECIAL.

Com a auferição de receita da operação em questão, pela Administração, poderia, inclusive, e sem prejuízo de entendimento da douta autoridade competente, conduzir a seu emprego, por exemplo, para fins sociais e/ou aos próprios servidores municipais, na constituição de benefícios.

Assim, mediante a modificação de “concebido” modelo que não exigiria remuneração, por outro em que se passe a cobrar, da(s) empresa(s) interessada(s) na prestação, pelo processamento do débito das parcelas na folha, poder-se-ia dar lugar à recepção de receita, com base em valores fixos ou variáveis, conforme o valor do crédito.

De acordo com a NBC T 16.1, que trata das Normas Brasileiras de Contabilidade Aplicadas ao Setor Público (conceituação, objeto e campo de aplicação), o conceito de Patrimônio Público é assim definido:

“... o conjunto de direitos e bens, tangíveis ou intangíveis, onerados ou não, adquiridos, formados, produzidos, recebidos, mantidos ou utilizados pelas entidades do setor público, que seja portador ou represente um fluxo de benefícios, presente ou futuro, inerente à prestação de serviços públicos ou à exploração econômica por entidades do setor público e suas obrigações.”

Por seu turno, segundo a NBC T 16.2, o Patrimônio Público divide-se em três grupos: Ativo, Passivo e Patrimônio Líquido. O Ativo é assim conceituado:

“Ativo – compreende os direitos e os bens, tangíveis ou intangíveis adquiridos, formados, produzidos, recebidos, mantidos ou utilizados pelo setor público, que represente um fluxo de benefícios, presente ou futuro.”

O passivo, por outro lado, é assim definido:

“Passivo – compreende as obrigações assumidas pelas entidades do setor público ou mantidas na condição de fiel depositário, bem como as contingências e as provisões.”

O(s) direito(s) sobre a exploração econômica das operações de consignação em folha de pagamento da Administração Pública são evidentemente ativos, do ponto de vista jurídico e contábil. Na verdade, ativo especial, em conceito análogo ao identificado no Manual de Contabilidade das Sociedades por Ações, dos autores Sérgio de Iudícibus, Eliseu Martins e Ernesto Rubens Gelb:“... podem ou não ser tangíveis, sendo que predominantemente apresentam-se como intangíveis; o uso do ativo especial não implica necessariamente que este se esgote; esses ativos estão diretamente relacionados ao processo de obtenção de receitas; e deixam de ser ativos não pela venda, mas pela perda do potencial de obtenção de receitas.” (Manual de contabilidade das sociedades por ações (aplicável às demais sociedades). 6. ed. São Paulo: Atlas, 2003, p. 95).

O ativo especial constitui justamente a faculdade de o ente público, no exercício de seu poder-dever de auto-administração, poder contratar a prestação de serviços de exploração econômica das consignações em sua folha de pagamento. O ativo especial, intangível (NBC T 16.2) ou incorpóreo é o direito ou capacidade de contratar ou explorar, que se diferencia do resultado financeiro auferido pelo particular com a prestação ou exploração do serviço. Nas palavras da Nota Técnica nº 1.777/2007 da STN, ao tratar da folha de pagamento de benefícios, ao nosso sentir com aplicação análoga ao caso:

“No caso estudado, o ativo especial é a capacidade do ente público de contratar uma instituição financeira prestadora de serviços bancários, enquanto o seu fruto é a receita originada desse contrato. Em nenhum instante há o esgotamento desse ativo em função da receita auferida com o mesmo, não havendo relação direta entre o seu valor e os frutos gerados pela sua exploração.”

Concluindo sobre a possibilidade de classificação como um ativo de operação em muito assemelhada, a citada Nota Técnica da STN defende o entendimento de que:

“... o poder do Ente público de contratar uma instituição financeira prestadora de serviços bancários para pagamento da folha de salários e outros benefícios dos servidores ou pensionistas, em função de estar gerando receitas, é um ativo especial intangível para o Ente público.”

Esta definição, perfeitamente adequada do ponto de vista da doutrina contábil, pode ser, por analogia, estendida para o caso em exame. A exemplo de entendimentos para citados outros casos, a STN corretamente entendeu que um ativo especial é a capacidade do ente público de contratar uma instituição prestadora de serviços, enquanto o seu fruto é a receita originada desse contrato e que em nenhum instante há o esgotamento desse ativo em função da receita auferida com o mesmo, não havendo relação direta entre o seu valor e os frutos gerados pela sua exploração. Em complemento, o poder do ente público de contratar uma instituição financeira prestadora de serviços, no caso para consignação em folha de pagamento de salários e outros benefícios dos servidores ou pensionistas, em função de estar gerando receitas, é um ativo especial intangível para o ente público.

No mais, resta assente a impossibilidade lógica de a receita aqui analisada ser classificada como de capital, uma vez que não se pode considerar a operação em tela como uma alienação propriamente dita. Além disso, a operação em questão importará necessariamente, do ponto de vista contábil, num incremento da situação líquida patrimonial do ente público, uma vez que haverá ingresso de receitas sem haver a desincorporação de um ativo permanente, constituindo uma receita efetiva, de acordo com a classificação adotada pela contabilidade pública. Como não há a transferência do poder do ente de constituir as margens e consignações, mas apenas o uso dos seus benefícios, por período determinado, não pode haver o entendimento de que houve a alienação de algum ativo, pois, para que tal fato ocorra, tem que haver a transmissão da propriedade do bem ou direito, o que não aconteceria.

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Nessa mesma medida, a nosso ver, e sem prejuízo da análise pelo setor competente, como o fato gerador desta receita pública está desvinculado da noção de alienação de ativos e das outras modalidades de geração de receita de capital, tais como constituição de dívidas, amortização de empréstimos e financiamentos, decorre que seja classificada como Receita Corrente (categoria econômica), devendo ser contabilizada na natureza da receita 1990.99.00 - Outras Receitas Correntes, em consonância com o Manual das Receitas Públicas.


4 – NECESSIDADE DE LICITAÇÃO.

Ocorre que a conclusão anterior leva a outra, a de que não se está diante de caso de um comodato gratuito ou de mera ausência de despesa pública que justifique a supressão de procedimento licitatório.

Por conseguinte, por todos os ângulos que se observa questão, não é possível enxergar a contratação pretendida sem o estribo da prévia licitação pública. E, uma vez superada tal discussão, tem vez a escolha da modalidade a ser empregada, ao que se nos apresentam como mais adequadas, embora ambas possíveis, a concorrência ou o pregão público.

Claro que, para a adoção da figura do pregão, há necessidade de melhor averiguação da realidade do mercado em questão, observando a possibilidade jurídica de caracterização do objeto da licitação como um bem comum, nos termos do art. 1º da Lei nº 10.520/2002, a ser verificado pela autoridade competente.

Não obstante, parece-me que, uma vez pretendendo a contratação, não de sistema a ser desenvolvido, mas de algum sistema existente e de uso já bastante disseminado junto aos entes e entidades da Administração Pública, a afirmar a existência de um mercado próprio que se destina à satisfação da necessidade pretendida, e, sendo possível a descrição objetiva do objeto, não vejo razão para não se adotar, em igualdade de condições, a modalidade pregão.

Doutro tanto, o critério da maior oferta é o que melhor atenderia ao interesse público, uma vez que viável, senão reclamado, do ponto de vista mercadológico. Nesse sentido, a realização da modalidade pregão adotando critério de julgamento não previsto na legislação somente seria, em princípio, admissível em caráter excepcional, tendo em vista o relevante interesse público da aplicação deste critério alternativo para o atingimento dos objetivos da Municipalidade. Nessa toada, o TCU relembra importante lição do renomado publicista Marçal Justen Filho, a respeito da alegada proibição positivada no art. 22, §8º, da Lei nº 8.666/93 de criar ou combinar modalidades de licitação:

“Insiste-se em reafirmar, nesse ponto, que a regra do § 8º deve ser interpretada em termos. Nada impede que a Administração produza modalidades inovadoras, inclusive combinando soluções procedimentais, para a promoção de contratos não abrangidos no âmbito específico da Lei nº 8.666. O exemplo, já apontado anteriormente, relaciona-se com a concessão ou permissão de uso de bem público.

[...]

Não se exige que a Administração pratique apenas contratações nominadas, explicitamente disciplinadas por lei. Adotar essa tese conduziria, aliás, a gravíssimos problemas. Ter-se-ia de localizar um modelo legislativo para todas as contratações praticadas pela Administração, o que se transformaria em obstáculo invencível em inúmeros casos práticos.

Um exemplo permitiria compreender a dificuldade. Até há poucos anos, inexistia tipificação legislativa para o contrato de concessão de serviço público. Nunca se imaginou, no entanto, que tanto importaria a impossibilidade da delegação de serviço público a particulares por via dessa figura.

Ou seja, a competência discricionária propicia a construção de novas figuras contratuais, as quais vão sendo incorporadas ao acervo jurídico do Direito Administrativo mediante seu refinamento pela prática concreta.” (Acórdão nº 3.042/2008, Plenário, Rel. Min. Augusto Nardes, DOU, 12 dez. 2008)

Claro que tal especificidade deve obrigatoriamente ser motivada e justificada pelo ente público no processo relativo ao certame, além de ter demonstrada sua viabilidade mercadológica.

A matéria, poderia, ainda, porventura, ser visualizada com interpretação assemelhada à das chamadas taxas administrativas negativas, uma vez que, na prática, as empresas concessoras da licença de uso do software em testilha possivelmente conseguirão garantir margem razoável de lucro com base nas negociações com bancos e/ou outros intermediários do processo de concessão de crédito consignado.

Mesmo porque a apresentação de ofertas de taxas de administração negativas ou de valor zero não torna as propostas inexequíveis, devendo ser averiguada a compatibilidade da taxa oferecida em cada caso concreto, a partir de critérios objetivos previamente fixados no edital, como já decidiu o Colendo TCU, conforme Acórdão n.º 1.034/2012-Plenário, nos autos do processo TC 010.685/2011-1. Se possível adequar-se essa concepção com o caso concreto, compatibilizar-se-ia o uso do tipo menor preço, tanto para o licenciamento pretendido, quanto para a exploração econômica da operação de reserva de margem e consignações em folha.

A par de tudo que foi exposto, verifica-se que a contratação direta e sem licitação do objeto em exame tem sido apreciada pelos órgãos de fiscalização e controle, que têm considerado essencial a licitação do mesmo, como se pode observar, exemplificativamente, no seguinte julgado do TCE/RO, em que há informações, até mesmo sobre a aplicação de sanção ao responsável por ente público contratante, em regime de comodato de sistema para as mesmas finalidades ora debatidas:

“ACÓRDÃO Nº 03/2012 – PLENO Vistos, relatados e discutidos os presentes autos, que tratam de Representação com suporte em notícias veiculadas nos meios de comunicação local, segundo as quais a empresa Multimargem Sistema de Inovação de Margens e Consignável Ltda. estaria prestando serviços de controle, processamento e averbação das consignações em folha de pagamento dos servidores públicos estaduais sem a precedência de processo licitatório, formulada pela digna representante do Ministério Público de Contas, Dra. Yvonete Fontinelle de Melo, como tudo dos autos consta. ACORDAM os Senhores Conselheiros do Tribunal de Contas do Estado de Rondônia, em consonância com o Voto do Relator, Conselheiro WILBER CARLOS DOS SANTOS COIMBRA, em conhecer da representação e julgá-la procedente à unanimidade e no que se refere ao valor da multa consignada no item II, por maioria de votos, vencidos os Conselheiros JOSÉ GOMES DE MELO e FRANCISCO CARVALHO DA SILVA. O Presidente em Exercício, Conselheiro PAULO CURI NETO, proferiu Voto de Minerva acompanhando o Relator no item II e em: I – CONHECER da Representação formulada pelo Ministério Público de Contas e, no mérito, julgá-la procedente, ante a ilegalidade da contratação direta da empresa Multimargem Sistema de Inovação de Margens e Consignável Ltda., para prestar ao Estado de Rondônia, o serviço de controle, processamento e averbação das consignações em folha de pagamento dos servidores públicos e pensionistas estaduais, em desrespeito ao artigo 37, caput e inciso XXI da Constituição Federal e normas incertas na Lei Federal nº 8.666/93; II – MULTAR em R$ 5.000,00 (cinco mil reais) o senhor Confúcio Aires Moura, na condição de Governador do Estado de Rondônia, por ter subscrito o Decreto nº 15.654/2011, permitindo a contratação ilegal da empresa Multimargem Sistema de Inovação de Margens e Consignável Ltda., ante a sua capacidade pessoal de Gestor Público experimentado, o que lhe impunha a abstenção da prática de tal ato, cuja sanção se lhe imputa com fundamento no artigo 55, II, da Lei Complementar nº 154/96; III – FIXAR o prazo de 15 (quinze) dias, a contar da notificação da Decisão, para que o agente político supramencionado proceda ao recolhimento à conta do Fundo de Desenvolvimento Institucional do Tribunal de Contas (Banco do Brasil, Agência nº 2757-X, Conta Corrente nº 8358-5), da multa consignada no item II, na forma do artigo 3º, III, da Lei Complementar nº 194/97, atualizando-se o valor da multa à época do recolhimento; IV – DETERMINAR: a) com fulcro no artigo 108-A do Regimento Interno, ao Governador do Estado de Rondônia, Confúcio Aires Moura, e a Coordenadora Geral da Comissão Especial de Consignações, Andréa Maria Rezende, que suspendam, imediatamente, sob pena de multa prevista no artigo 55, IV, da Lei Complementar nº 154/96, a executoriedade do contrato firmado com a empresa Zetrasoft, ou de qualquer instrumento jurídico que permita a utilização, por parte da Comissão Especial de Consignações – CECON ou qualquer outro ente do Estado, de sistema particular de informática — que vise o controle, processamento e averbação das consignações em folha de pagamento dos servidores públicos estaduais — que não tenha sido previamente submetido às normas da Lei nº 8.666/93, tendo em vista os efeitos jurídicos emanados da Decisão nº 80/2011-PLENO-TCERO; b) ao Governador do Estado de Rondônia, Confúcio Aires Moura, e à Coordenadora Geral da Comissão Especial de Consignações, Andréa Maria Rezende, solidariamente, que comprovem perante esta Corte de Contas a adoção da medida constante do item IV, alínea “a”, desta Decisão no prazo de 05 (cinco) dias, a contar da notificação desde decisum, fazendo publicar o respectivo ato administrativo no Diário Oficial do Estado, a ser juntado nos presentes autos, sob pena de multa prevista no artigo 55, IV, da Lei Complementar nº 154/96; c) ao Governador do Estado de Rondônia, Confúcio Aires Moura, que em optando a Administração Pública Estadual por terceirizar inteiramente os serviços relacionados à consignação em folha de pagamento ou por adquirir software para operar o serviço em questão, encaminhe a esta Corte o respectivo processo administrativo com vistas a apreciar sua legalidade, sob pena de multa prevista no artigo 55, IV, da Lei Complementar nº 154/96; d) à Secretaria Geral de Controle Externo que incontinenti, ou seja, sem demora, extraia cópia dos presentes autos e adote providências eficazes, por intermédio de instrumentos próprios, no sentido de apurar a notícia de que a delegação do serviço, versado nos autos, já vinha sendo perpetrada nos últimos três Governos do Estado de Rondônia que antecederam à atual gestão pública; e) igualmente, a extração de cópia integral dos presentes autos, encaminhando-a ao Ministério Público Estadual, como dever de ofício desta Corte, para que aquele órgão promova as medidas legais que entender de Direito, à luz das normas de regência; f) à Secretaria das Sessões que providencie com urgência a extração de cópia dos autos do processo nº 1227/2011 das fls. 289/477, constituindo-se novos autos tendentes a analisar a legalidade do procedimento de contratação da empresa Zetrasoft Ltda., encaminhando-os à Divisão de Documentos e Protocolo para autuação como “Fiscalização de Atos e Contratos”, fazendo a eles juntar, como prefacial, a presente decisão; V – FIXAR ASTREINTES, com fundamento no artigo 286-A do Regimento Interno combinado com o artigo 461, § 4º, do Código de Processo Civil, no importe de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), a incidir diariamente caso ocorra o descumprimento do preceito inserto no item IV, “a”, desta Decisão, a ser suportada, pessoalmente, pelo Governador do Estado de Rondônia, CONFÚCIO AIRES MOURA, e pela Coordenadora Geral da CECON, ANDRÉA MARIA REZENDE, caso não haja a suspensão da executoriedade do contrato firmado com a Zetrasoft ou com outra empresa que lhe tenha sucedido, sem as formalidades litúrgicas previstas na Lei Federal nº 8.666/93; VI – AFASTAR a aplicação das astreintes fixadas na alínea “e” da parte dispositiva da Decisão monocrática liminar nº 33/2011, bem como aquelas constantes do item VI da Decisão nº 80/2011-PLENO, visto que tais sanções foram previstas coercitivamente para obstar a prorrogação do negócio jurídico existente entre o Estado de Rondônia e a empresa Multimargem, não subsistindo, portanto, razão para o seu aperfeiçoamento de forma coativa, ante a não ocorrência de fatos aptos a atrair a incidência das sobreditas astreintes; VII – DETERMINAR à Administração Pública Estadual que dê preferência a sistema de domínio público gratuito em qualquer avença que exija contratação de licença de software, a menos que se comprove a impossibilidade técnica de fazê-lo, ocasião na qual deverá atentar para as normas contidas na Lei Federal nº 8.666/93 para adquirir software particular; VIII – AUTORIZAR a cobrança judicial, após o trânsito em julgado sem o recolhimento da multa consignada no item II, nos moldes do artigo 27, II da Lei Complementar 154/96; IX – DAR CIÊNCIA, IMEDIATAMENTE, da Decisão aos interessados, quais sejam, Confúcio Aires Moura na qualidade de Governador do Estado de Rondônia, Rui Vieira, Secretário de Estado da Administração, Andréa Maria Rezende, Coordenadora Geral da Comissão Especial de Consignações, e Maria Rejane Sampaio dos Santos, Procuradora Geral do Estado de Rondônia, na forma da lei; X – CONFIRMAR, em juízo meritório, os efeitos deferidos na modulação consubstanciada na Decisão nº 80/2011-PLENO, de 09 de junho de 2011, pelos seus próprios fundamentos; XI – SOBRESTAR os autos na Secretaria das Sessões para cumprimento e acompanhamento do feito; XII – PUBLIQUE-SE. Participaram da Sessão os Senhores Conselheiros: JOSÉ GOMES DE MELO, EDILSON DE SOUSA SILVA, FRANCISCO CARVALHO DA SILVA e WILBER CARLOS DOS SANTOS COIMBRA (Relator); o Presidente em Exercício, Conselheiro PAULO CURI NETO; a Procuradora-Geral do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas, ÉRIKA PATRÍCIA SALDANHA DE OLIVEIRA. 02. Com efeito, verifica-se que, em 20/09/2013, sob alegação de recolhimento da multa outrora imposta, o interessado informou o cumprimento do que fora decidido no Acórdão n. 003/2012-Pleno em sua integralidade conforme Petição de fls. 618/622, protocolo n. 11646/2013, de 19/09/2014. 03. Em pertinente manifestação de fl. 634/635, de 30/04/2014, a Secretaria de Controle Externo sugeriu fosse concedida a quitação ao interessado, levando em consideração que teria havido a comprovação do adimplemento da obrigação imposta por esta Eg. Corte. 04. Registro que, por força do inciso II do Provimento n. 03/2013, o Parquet de Contas se abstém de proferir manifestação nos processos relativos à quitação de débito e multa. 05. Eis o relatório bastante. DA FUNDAMENTAÇÃO 06. Sem maiores digressões, consoante alinhavado no relatório pretérito, verifico a existência de provas nos autos no sentido de que o requerente procedeu ao recolhimento integral do valor da multa que lhe fora cominada no item II do Acórdão n. 003/2012-Pleno. 07. Anoto que o comprovante de pagamento de fl. 620 atesta que o valor efetivamente recolhido pelo interessado, de R$ 5.572,26 (cinco mil quinhentos e setenta e dois reais e vinte e seis centavos), está compatível com o valor imposto no item II do retromencionado Acórdão de fls. 538/541. 08. Desta feita, na esteira do art. 26 da Lei Complementar n. 154/1996, comprovado o recolhimento integral da multa, tenho que não pode esta Corte se arredar de conceder a quitação, com a consequente baixa da responsabilidade, o que procedo nesta assentada. DO DISPOSITIVO Diante do exposto, DECIDO: I - CONCEDER quitação ao Senhor Confúcio Aires Moura – Governador do Estado de Rondônia, com pertinência à multa constante no item II do Acórdão n. 003/2012-Pleno, tendo em mira o integral adimplemento da dívida atualizada monetariamente, de R$ R$ 5.572,26 (cinco mil quinhentos e setenta e dois reais e vinte e seis centavos), devendo, por consectário, em seu favor, ser expedido o respectivo termo de quitação, com baixa de responsabilidade, nos moldes do art. 26 da Lei Complementar n. 154/1996, c/c o art. 35 do Regimento Interno desta Corte de Contas; II – REMETA-SE, os autos ao DEPARTAMENTO DO PLENO, para as notificações necessárias do que fora decidido; PUBLIQUE-SE; Cumpra-se e, para tanto, expeça-se o necessário. Porto Velho/RO, 09 de junho de 2014. Conselheiro WILBER CARLOS DOS SANTOS COIMBRA Relator” (destacou-se)

Com efeito, a adoção da modalidade licitatória de Pregão, que obedece ao critério adjudicatório de menor preço, retrata a mais adequada no que tange, estritamente, à contratação de licença de uso de software, desde que este possua um mercado próprio de comercialização, em que as características individuais de cada produto observem um padrão médio de concepção, incluindo-se nessa atividade os serviços de instalação, customização, treinamento de pessoal e outros correlatos; o que evidencia ser aplicável ao caso em apreço. Nesse sentido o decidido no processo eTC nº 00000558/989/14-1 do Egrégio Tribunal de Contas Bandeirante:

“[...] Finalmente, sobre a inaplicabilidade do pregão, tema já bastante enfrentado por este Tribunal, abstenho-me de maiores comentários, lembrando que os serviços contratados são comumente oferecidos pelo mercado envolvido, como mostram inúmeros casos que chegam a este Tribunal envolvendo licitações com o mesmo objeto.”

E, de fato, tem chegado àquela Corte diversas discussões sobre editais de licitação para o objeto em debate, como se nota, verbi gratia, dos processos TC’s nº 1731.989.13-3, nº 2809.989.14-8 e  nº 1606.989.13-5, junto ao TCESP.

Isso não bastasse, também é importante pontuar que os servidores não podem ser compelidos a obter empréstimos desta ou daquela instituição. No tocante a essa matéria, como bem citado no Acórdão – TCU nº 1952-30/11-P, de sessão de 27/7/2011, sob a relatoria do Ministro Weder de Oliveira, ao julgar agravo regimental interposto pelo banco BMG, no âmbito do processo SS nº 2443-ES, o Ministro Ari Pargendler, então Presidente do STJ, reformando decisão anterior, indeferiu o pedido de suspensão de segurança ajuizado pelo estado do Espírito Santo contra decisão do Tribunal de Justiça daquele estado, em favor do banco, suspendendo os efeitos de decreto expedido pelo governador o qual estabelecia que os servidores públicos estaduais somente poderiam contratar empréstimos consignados em folha de pagamento com as instituições financeiras públicas:

"AgRg na SUSPENSÃO DE SEGURANÇA nº 2443 - ES (2011/0034950-5) DECISÃO. As bem articuladas razões do agravo regimental e documentos anexos demonstram que a decisão recorrida partiu de um falso pressuposto, o de que o credenciamento indiscriminado de instituições financeiras para operar o crédito consignado em folha de pagamento de servidores públicos oneraria o Estado do Espírito Santo. É fato confessado que o Estado do Espírito Santo se vale de um software, denominado eConsig, que gerencia os contratos de mútuo firmados entre os servidores públicos e as instituições financeiras; software, registre-se, cedido pelas instituições financeiras ao Estado do Espírito Santo. Conseqüentemente, é irrelevante quem seja o mutuante, a operação será a mesma no âmbito administrativo estadual. [...] Reconsidero, por isso, a decisão de fl. 154/156 para indeferir o pedido de suspensão. Brasília, 16 de junho de 2011."

Percebe-se dos argumentos do eminente Ministro Ary Pargendler, que a Administração não pode exigir de seus servidores que apenas contratem operações de crédito na modalidade "empréstimo consignado" com uma ou duas instituições financeiras quando houver possibilidade de tantas outras instituições aptas a conceder empréstimos consignados, o que ampliaria as alternativas disponíveis, acirraria à concorrência e permitiria aos servidores obterem taxas e condições melhores em relação às oferecidas pelas instituições privilegiadas. Somente situações restritivas, especialíssimas sob a ótica da eficiência e economicidade, devidamente evidenciadas, poderiam justificar tamanha restrição à liberdade contratual dos servidores.

Malgrado, a questão restou fulminada, em caráter normativo, com a edição da Circular nº 3.522/2011 do Banco Central do Brasil, que veda às instituições financeiras a celebração de convênios, contratos ou acordos que impeçam o acesso de clientes a operações de crédito ofertadas por outras instituições, nos seguintes termos:

"Art. 1º Fica vedada às instituições financeiras, na prestação de serviços e na contratação de operações, a celebração de convênios, contratos ou acordos que impeçam ou restrinjam o acesso de clientes a operações de crédito ofertadas por outras instituições, inclusive aquelas com consignação em folha de pagamento."

Ademais disso, a consignação em folha costuma apresentar como benefícios a obtenção de financiamentos com menores taxas de juros, dispensa de apresentação de garantias suplementares, prazos mais elásticos, redução de cada parcela, estímulo à atividade econômica, dentre outros. Claro que, apesar de ordinariamente facilitar o crédito para os mais variados usos, com pouca burocracia e a juros menores, a consignação em folha, como qualquer outra ferramenta, deve ser utilizada com responsabilidade e esmero, papel perfeitamente atribuível ao Poder Público, inclusive quanto à figura do servidor que será abrangido pelo benefício, prestando-lhe as devidas orientações e assistindo-o contra eventuais práticas mercadológicas excessivas ou prejudiciais.

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Sobre os autores
Alexandre Massarana da Costa

Advogado, pós-graduado em direito constitucional e político, com atuação na área do direito público.

Alexandre Dias Maciel

Advogado, mestrando em direitos difusos e coletivos pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC/SP.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

COSTA, Alexandre Massarana ; MACIEL, Alexandre Dias. Da necessidade do crédito consignado em folha de pagamento de servidores públicos ser considerado ativo especial a ser licitado. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 22, n. 5131, 19 jul. 2017. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/59181. Acesso em: 22 dez. 2024.

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