Com a entrada em vigor da Lei Complementar Nº 160 (LC 160), publicada no Diário Oficial da União, no dia 8 de agosto de 2017, foi declarado o fim da “guerra fiscal” do ICMS recorrente entre os Estados Federados e foi sinalizada a intenção do Governo Federal de acabar de vez com todos os incentivos fiscais em vigor.
Você sabe o que isso significa, na prática, e como afeta o comércio eletrônico?
Para entender a problemática resultante do tema é necessário compreender: as técnicas de concessão de incentivos fiscais, a forma como são instituídos e as circunstâncias que os definem legalmente para que, então, possamos fixar algum posicionamento acerca da aprovação da LC 160 originada no Congresso Nacional.
São as técnicas possíveis para a concessão de incentivos fiscais: imunidade; isenção ou não incidência de caráter não geral; redução de alíquota; redução de base de cálculo ou dedução; crédito (real, fictício, presumido); diferimento; anistia; e remissão.
Quanto aos aspectos de legalidade dos incentivos fiscais, até a publicação da LC 160, estavam todos eles definidos, em regra, pela Constituição Federal (CF/88) e pela Lei Complementar Nº 24/1975 (LC 24), sobre o que passamos a comentar.
No texto da CF está a previsão de que cabe às leis do tipo “complementares” sintetizar, após a deliberação dos Estados e do Distrito Federal, a forma como as isenções, os incentivos e os benefícios fiscais devem ser concedidos ou revogados.
Porém, a LC 24, que tem a sua aplicação assegurada pelo princípio da recepção das leis, estrutura que a celebração de convênios entre as Unidades da Federação, para fins de concessão ou revogação de incentivos fiscais, no âmbito do ICMS, deve submeter-se às formalidades por ela fixadas.
Desta forma, a LC 24 é norteadora da concessão dos incentivos fiscais, determinando, que as isenções do ICMS só poderão ser concedidas ou revogadas nos termos de “convênios” celebrados e ratificados pelos Estados e pelo Distrito Federal.
Assim, os Estados passaram a regulamentar os incentivos fiscais mediante a aprovação (ou não) de convênios.
Dentre as regulamentações da LC 24 consta a regra de que será rejeitado o convênio que não for expressa ou tacitamente ratificado pelo Poder Executivo e por todas as Unidades da Federação.
Ainda, os convênios, segundo a LC 24, só serão aprovados ou revogados nas reuniões realizadas em âmbito do Conselho Nacional de Política Fazendária (CONFAZ).
Esta exigência da ratificação de 100% dos Estados interessados parece ter estimulado o legislador estadual a criar incentivos fiscais em total desrespeito à citada regra, ou seja, tem instituído e cobrado incentivo fiscal sem qualquer participação do CONFAZ.
Assim, em desacordo com o que a CF 88 e a LC 24 exigem, os Estados vêm instituindo leis e exigindo a obediência dos sujeitos que com eles têm contratado (contratos de compra e venda ou de prestação de serviços, quando cabível a incidência do ICMS).
Esta situação de ilegalidade é antiga, pois foi inaugurada com a entrada em vigor da atual CF, datada de 1988. Assim, na tentativa de apaziguar a “guerra fiscal”, foi publicada a LC 160 pelo legislador federal.
Com o texto da LC 160 foram criadas normas que tratam dos convênios e garantem aos Estados e ao Distrito Federal a deliberação sobre a remissão de créditos tributários decorrentes de isenções, incentivos e benefícios fiscais ou financeiro-fiscais, que tenham sido instituídos de maneira ilegal pelos Estados.
Deste modo, os débitos de ICMS que partiram de incentivos fiscais, na sua nascente, ilegais, podem vir a ser perdoados e tendem a resultar na resolução de ações judiciais, que foram embasadas na tese da inexigibilidade destes convênios.
Por outro lado, outra alteração da LC 160 ordena que poderá ser declarada a “reinstituição” de benefícios fiscais ou financeiro-fiscais de convênios nativos na ilegalidade.
Podem ser convalidados incentivos e benefícios publicados nos diários oficiais dos entes estaduais que os tenham autorizado e cujos atos concessivos tenham sido registrados e depositados junto à Secretaria Executiva do Confaz.
Para que ocorra a reinstituição do convênio será necessário o voto de, ao menos, 18 unidades federadas (2/3) dentre as quais devem constar, no mínimo, 1 da Região Sul, 2 da Região Sudeste, 2 da Região Centro-Oeste, 3 da Região Nordeste e três da Região Norte (1/3), sendo que a decisão final da reinstituição deverá ser exarada em até 180 dias.
Ademais, foi fixado prazo de vigência dos convênios reinstituídos, sendo o prazo da entrada em vigor de cada convênio contado a partir da data de publicação do mesmo pelo CONFAZ. Isto posto, estes prazos não poderão ultrapassar o final do:
a) 15º ano, em relação aos destinados ao fomento das atividades agropecuária e industrial, inclusive agroindustrial, e ao investimento em infraestrutura rodoviária, aquaviária, ferroviária, portuária, aeroportuária e de transporte urbano;
b) 8º ano, em relação aos destinados à manutenção ou ao incremento das atividades portuária e aeroportuária vinculadas ao comércio internacional, incluída a operação subsequente à da importação, praticada pelo contribuinte importador;
c) 5º ano, em relação aos destinados à manutenção ou ao incremento das atividades comerciais, desde que o beneficiário seja o real remetente da mercadoria;
d) 3º ano, em relação aos destinados às operações e prestações interestaduais com produtos agropecuários e extrativos vegetais in natura;
e) 1º ano, em relação aos demais.
Com a aprovação da reinstituição dos incentivos pelo CONFAZ, respeitados os prazos máximos acima dispostos, as unidades federadas deverão, ainda, prestar informações sobre as isenções, os incentivos e os benefícios fiscais ou financeiro-fiscais vinculados ao ICMS e mantendo-as atualizadas no Portal Nacional da Transparência Tributária.
Com o não cumprimento destas medidas, os Estados não poderão: receber transferências voluntárias; obter garantia, direta ou indireta, de outro ente; ou contratar operações de crédito.
Agora, para a iniciativa privada, os efeitos da LC 160 serão variados. Por exemplo, empresas que fizeram investimentos em determinadas localidades mediante a promessa de desoneração fiscal e que podem perder o benefício prometido.
A situação de risco para estas empresas é possível com o cumprimento efetivo da LC 160; assim, é importante para o Estado concessor, a regularização dos incentivos fiscais concedidos para proporcionar segurança jurídica para o setor empresarial.
Críticos às concessões de incentivos fiscais apontam seus aspectos negativos, que são: falta de transparência; problemas federativos (guerra fiscal + “cortesia com chapéu alheio”); criação de benefícios “enraizados” - lobby setorial; aumento da complexidade do sistema tributário; dificuldade de controle e de medição de resultados etc.
Em suma, todos concordam com o fato de que o sistema financeiro nacional precisa ser revisto e principalmente respeitado, isto para que a lei seja cumprida por todos os 24 Estados brasileiros igualitariamente, porém, é claro, que os efeitos da LC 160 só poderão ser efetivamente medidos com o decorrer da sua aplicação.