Capa da publicação O ônus da prova no Código de Defesa do Consumidor: afinal, quais seus reais efeitos?
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Os efeitos da inversão do ônus da prova no Código de Defesa do Consumidor

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26/10/2017 às 15:00
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3 A INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA NO CDC E SEUS EFEITOS

Refletindo sobre o conceito de ônus da prova, não podemos menosprezar que vigora no sistema processual vigente a regra da distribuição estática do ônus probandi. Assim, como vimos, conforme depreendido na leitura do artigo 333 do Código de Processo Civil, a repartição do ônus da prova no processo incumbe ao autor provar os fatos constitutivos de seu direito, em regra, e ao requerido a prova da existência de fatos modificativos, extintivos e impeditivos do direito do autor da demanda.

Deste modo, constatamos que na estrutura do atual ordenamento jurídico, incumbir a cada parte do processo comprovar o que apresentou, nada mais é do que uma distribuição estática do ônus da prova. Ideia confirmada por João Batista Lopes (2002, p. 42)

Enquanto o interesse em afirmar é unilateral (cada parte tem interesse em afirmar só os fatos que constituem a base de sua pretensão ou defesa), o interesse em provar é bilateral (uma parte quer provar a existência do fato; a outra a inexistência). Diante disso, conclui que o critério para a determinação do ônus da prova reside no interesse na afirmação, o que se harmoniza com o conteúdo da lide e corresponde a uma regra de experiência, porque, quase sempre, as partes procuram munir-se dos meios necessários para provar os fatos que lhes interessam.

No mesmo sentido, o CPC, pretendendo acolher uma metodologia de partilha do ônus incorporou ao sistema jurídico a teoria estática de distribuição do ônus da prova.

Ressalta-se que, o Direito Consumeirista trata-se de uma matéria que busca defender os interesses próprios do consumidor e sua relação de consumo, conclui-se, portanto, que esta teoria estática de distribuição do ônus da prova não seria logicamente aplicável, uma vez que, como próprio nome da teoria sugere, a distribuição é invariável, predominando uma regra rígida e imutável.

Como se vê, a teoria adotada pelo Código de Processo Civil não leva em conta as peculiaridades do direito material colocadas a julgamento e, certamente, não confere o cuidado necessário às condições exclusivas das partes, como corrobora Humberto Theodoro Júnior (2013, p. 462):

Não poucas vezes o acesso à verdade real por parte do juiz fica comprometido ou prejudicado se se mantiver o esquema de apreciação do litígio rigorosamente imposto no momento de concluir a instrução processual, e de enfrentar o julgamento do mérito segundo a fria aplicação das presunções que haveriam de defluir da literalidade do art. 333.

O julgador, como se pode verificar, conduz o julgamento por regras fixas, objetivas e imutáveis, fato que evidentemente será passível de alguma injustiça, distanciando cada vez mais a isonomia do processo.

À vista disso, advém a falsa premissa de que as partes processuais estariam em igualdade na lide e que, de antemão, as regras impostas gozariam do condão de decifrar todos os conteúdos expostos ao estudo da atividade jurisdicional.

Diante das especificidades do Direito Consumerista, à essa regra existem duas necessárias exceções. A primeira delas é a convenção das partes sobre o ônus presente no parágrafo único do artigo em estudo. E a inversão do ônus da prova nas lides referentes ao consumidor, objeto de nosso estudo, contida no artigo 6º, inciso VIII do Código de Defesa do Consumidor, vejamos

Art. 333. O ônus da prova incumbe:

[...]

Parágrafo único. É nula a convenção que distribui de maneira diversa o ônus da prova quando:

I - recair sobre direito indisponível da parte;

II - tornar excessivamente difícil a uma parte o exercício do direito.

Art. 6º São direitos básicos do consumidor:

[...]

VIII - a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências; (grifo nosso)

Destarte, esta visão estática apresentada a priori, que convencionou ao autor comprovar os fatos constitutivos de seu direito alegado e, ao réu os fatos obstativos articulados contra ele, sem, contudo, levar em conta as conjunturas probatórias de cada sujeito do processo, não se ajusta aos ensinamentos do Direito do Consumidor.

Por conseguinte, o Código de Defesa do Consumidor foi revolucionário ao conduzir normas peculiares e especificas que lidam estritamente das questões probatórias entre fornecer e consumidor.

Modificou, neste sentido, em proporcionar ao julgador da demanda a deliberação sobre o ônus da prova em favor do consumidor, trazendo uma exceção à regra processual exposta no artigo 333 do CPC.

Verifica-se, diante da elucidação do artigo 6º do CDC que, o legislador deixou, de maneira subjetiva, a cargo do magistrado a missão de, uma vez presentes os pressupostos legais da hipossuficiência e verossimilhança das alegações, a capacidade de modificar o ônus da prova.

É cediço que a norma tem grande relevância jurídica, visto ser o consumidor a parte mais fraca da relação jurídica instituída com os fornecedores e demandar, por isso, mais atenção do ordenamento jurídico. Sobressalta-se que esta vulnerabilidade do agente de consumo é admitida pela Lei 8.078/90, no artigo 4º, in verbis:

Art. 4º A Política Nacional das Relações de Consumo tem por objetivo o atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito à sua dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus interesses econômicos, a melhoria da sua qualidade de vida, bem como a transparência e harmonia das relações de consumo, atendidos os seguintes princípios:

 I - reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor no mercado de consumo;

[...]

A regra proposta pela inovação do Código de Defesa do Consumidor é necessária, visto que a prestação jurisdicional, na maioria das vezes, não apresenta a justiça fidedigna à causa, haja vista a subjunção axiomática à regra decorrente do artigo 333 do CPC, isto, pois, atendendo a regra geral, o ônus incidiria sobre o sujeito mais fraco da controvérsia.

Ou seja, sobre a parte que não teria, na atual conjuntura, condição de produzir a prova de maneira apropriada a endossar-lhe o direito por ele alegado, ao mesmo tempo em que o julgador não teria a capacidade de fazer algo para atenuar a injustiça presumida.

Assim, a proposta indicada pelo CDC é de que caso o julgador, ao examinar a demanda proposta, reconhecer que, pela determinação legal, o ônus probatória irá incidir àquele mais desfavorável à suportá-lo, poderá ele alterar a distribuição em favor do consumidor, parte presumidamente hipossuficiente.

Este dogma passou a ser observado no Código de Defesa do Consumidor, visto que as relações materiais de consumo, quando exposta a julgamento, precisam de uma interpelação especificada, diante do desequilíbrio entre as partes.

Visto isso, a regra processual apresentada pelo artigo 6º do Código Consumeirista, aponta claramente que consignado um dos dois requisitos presentes, quais sejam, a existência da hipossuficiência ou da verossimilhança das alegações, o magistrado tem a comprometimento de inverter o ônus da prova.

Este é o entendimento ratificado por Carlos Roberto Barbosa Moreira, em Notas sobre a Inversão do Ônus da Prova em Benefício do Consumidor (1997, p.141), no momento em que afirma que

o ato judicial, devidamente motivado, indicará a ocorrência de um dentre essas duas situações: a) a alegação do consumidor é verossímil; ou b) o consumidor é hipossuficiente. O emprego da conjunção alternativa e não da aditiva ‘e’, significa que o juiz não haverá de exigir a configuração simultânea de ambas as situações, bastando que ocorra a primeira ou a segunda

Desse modo, basta a presença de uma das duas hipóteses indicadas no dispositivo legal para se configurar a inversão.

A inversão do ônus da prova, portanto, é uma facilitação de defesa ao consumidor em virtude da desigualdade aparente entre fornecedor e consumidor. Barbosa Moreira (1997, p. 136), continua em sua elucidação afirmando que

ao dispensar o consumidor de provar determinado fato, supostamente constitutivo de seu alegado direito, está-se transferindo para o fornecedor o ônus da prova de algum outro que venha a elidir a presunção estabelecida em benefício do consumidor. Equivale dizer que, em relação ao consumidor, a inversão tem efeito de isenção de um ônus, mas, para o fornecedor, a inversão importa em criação de novo ônus probatório, que se acrescenta aos demais

O escopo, consequentemente, da inversão do ônus da prova em favor do consumidor, é garantir ao máximo a igualdade formal entre os sujeitos do processo.

A verossimilhança das alegações, um dos requisitos necessários para que seja invertido o ônus da prova, nada mais é do que a aparência de verdade naquilo que está sendo posto à analise, para tanto não é necessário o juízo de certeza, bastando, para tanto, que o que se esta sendo afirmado tenha plausibilidade com a verdade.

Já a segunda hipótese, que ocasiona a inversão do ônus em desfavor do fornecedor, é a hipossuficiência que, como dito anteriormente, é reconhecido pelo próprio Código do Consumidor em seu artigo 4º. Trata-se, desta maneira, de deficiências no campo técnico, informativo, ou monetário, do consumidor em face do fornecedor, que são levados à analise.

Em observância a essa regra apresentada pelo artigo 6º do CDC, depreendemos que o legislador deixou a cargo do magistrado interpretar razoavelmente os fatos narrados para que, se for de sua inteligência determinar por decisão judicial a inversão do ônus probatório no momento em que verificar presentes um dos dois requisitos. Deste modo, verificamos a inversão probatória ope judice, haja vista que depende de decisão judicial fundamentada para que se inverta o ônus.

Nas palavras do Ministro Paulo Tarso Sanseverino em artigo publicado na internet:

É o trecho “a critério do juiz” que faz toda a diferença na questão. Ao contrário do artigo 14, neste caso a inversão do ônus da prova depende do entendimento de quem julga. É a inversão ope judicis, pois, em vez de decorrer da própria lei, depende de determinação do juiz.

No mesmo sentido, vemos o julgado a seguir

RECURSO ESPECIAL. CONSUMIDOR. RESPONSABILIDADE POR VÍCIO NO PRODUTO (ART. 18 DO CDC). ÔNUS DA PROVA. INVERSÃO 'OPE JUDICIS' (ART. 6º, VIII, DO CDC). MOMENTO DA INVERSÃO. PREFERENCIALMENTE NA FASE DE SANEAMENTO DO PROCESSO.

A inversão do ônus da prova pode decorrer da lei ('ope legis'), como na responsabilidade pelo fato do produto ou do serviço (arts.

12 e 14 do CDC), ou por determinação judicial ('ope judicis'), como no caso dos autos, versando acerca da responsabilidade por vício no produto (art. 18 do CDC).

Inteligência das regras dos arts. 12, § 3º, II, e 14, § 3º, I, e.

6º, VIII, do CDC.

A distribuição do ônus da prova, além de constituir regra de julgamento dirigida ao juiz (aspecto objetivo), apresenta-se também como norma de conduta para as partes, pautando, conforme o ônus atribuído a cada uma delas, o seu comportamento processual (aspecto subjetivo). Doutrina.

Se o modo como distribuído o ônus da prova influi no comportamento processual das partes (aspecto subjetivo), não pode a a inversão 'ope judicis' ocorrer quando do julgamento da causa pelo juiz (sentença) ou pelo tribunal (acórdão).

Previsão nesse sentido do art. 262, §1º, do Projeto de Código de Processo Civil.

A inversão 'ope judicis' do ônus probatório deve ocorrer preferencialmente na fase de saneamento do processo ou, pelo menos, assegurando-se à parte a quem não incumbia inicialmente o encargo, a reabertura de oportunidade para apresentação de provas.

Divergência jurisprudencial entre a Terceira e a Quarta Turma desta Corte.

RECURSO ESPECIAL DESPROVIDO.

(REsp 802.832/MG, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 13/04/2011, DJe 21/09/2011)

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Por conseguinte, fica a critério do juiz inverter o ônus probatório quando constatar a verossimilhança ou a hipossuficiência. Cumpre salientar que a inversão do ônus probatório, seja ele dado ex officio ou a pedido das partes, não possui a definição de pré-julgamento da demanda, apenas consiste em um encargo processual.

O juiz, então, é capaz de alterar a regra processual geral, a fim de assentá-la ao caso concreto, reduzindo assim, na medida do possível, a discrepância entre as partes, e desta maneira, buscar a equidade entre as partes possibilitando a parte que possivelmente tem as melhores condições de provar os fatos.

Além disto, cumpre destacar que, nem sempre as regras de defesa do consumidor possuem uma distribuição probatória dinâmica, tendo em vista que o artigo 38 do Código Consumerista, designa que incumbe àquele que custeia a publicidade tem o ônus probandi da veracidade e correção das informações prestadas, é consideramos como propaganda enganosa. Este exemplo é apresentado por segundo Fredie Didier (2012, p. 83)

É caso de inversão ope legis. Rigorosamente falando, nem de inversão se trata, porquanto seja regra aplicável a qualquer situação. Não é o caso de inversão de ônus da prova, mas de um redimensionamento das regras do ônus da prova, em homenagem ao princípio da adequação.

O artigo 38, portanto, trata-se de uma inversão do ônus da prova ope legis, visto que, como afirmado acima, a própria lei ordena a inversão, não necessitando de uma interpretação ou da subjetividade do juiz.

Não é somente o artigo 38 que se refere à propaganda enganosa que possui esta inversão ope legis. Podemos citar, também, o artigo 12, § 3º, II, que trata da responsabilidade por defeito do produto, e o artigo 14, § 3º, I, que diz respeito a responsabilidade por danos causados relativos a prestação de serviço.

Sendo assim, nos artigos supracitados, em que pese também haver a inversão probatória, esta troca não obedece de nenhum critério de inteligência do magistrado, visto que a inversão é dada por critério de lei.

Visto isso, constatamos que um dos pontos críticos da inversão da prova é quanto ao momento conveniente para que essa distribuição seja realizada pelo magistrado, visto que doutrina e jurisprudência rebatem sobre o momento adequado.

A opinião que tem imperado é que a inversão do ônus probatório é uma regra de procedimento, visto isso, deve ela ser determinada no momento do saneamento, sendo assim, antes de prolatar a sentença, incumbiria ao juiz decidir de quem é o ônus de provar o alegado. De acordo com o entendimento de Daniel Amorim Assumpção Neves (2011, p. 420), é importante para que

[...] o réu não seja surpreendido com a inversão do quando já finalizada a instrução probatória, entendendo que, em respeito ao princípio do contraditório, a sinalização de possível inversão – se necessário for – deve ser feita expressamente já na decisão saneadora.

A argumentação apresentada acima vem auxiliada pela premissa de que, como a parte não é comunicada previamente de que o ônus recai à ela não tem como a mesma produzir a prova para refutar a alegação feita pela parte contraria. Desta maneira, a decisão final que aplicasse a modificação deste ônus surpreenderia as partes.

Logo, a sentença prolatada nesses moldes, infringiria os princípios constitucionais do contraditório e ampla defesa presentes no artigo 5º, LV da Constituição Federal, sendo este argumento um dos principais para a corrente que defende a inversão do ônus da prova como regra de procedimento.

De outro modo, parte dos doutrinadores, dentre eles Nelson Nery (2012, p. 727), interpreta a inversão da prova como regra de julgamento, e consequentemente, ocorreria somente no momento da sentença. Nas palavras de João Batista Lopes (2002, p. 51)

É orientação assente na doutrina que o ônus da prova constitui regra de julgamento e, como tal, se reveste de relevância apenas no momento da sentença, quando não houver prova do fato ou for ela insuficiente.

A escolha do momento justifica-se na alegação de que é neste momento em que o julgador possui todos os elementos necessários para definir a demanda.

Não obstante, o Superior Tribunal de Justiça já decidiu no REsp 1125621/MG que o momento de inversão da prova deve ser feita através de uma decisão judicial proferida na fase de saneamento, sendo assim, é regra de instrução, respeitando com isto as regras constitucionais, in verbis

RECURSO ESPECIAL. DIREITO DO CONSUMIDOR. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. MOMENTO. SENTENÇA. POSSIBILIDADE. REGRA DE JULGAMENTO. OFENSA AO PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO. INEXISTÊNCIA.

1. A jurisprudência do STJ não se pacificou quanto à possibilidade de o juízo inverter o ônus da prova no momento de proferir a sentença numa ação que discuta relação de consumo.

2. O Processo Civil moderno enfatiza, como função primordial das normas de distribuição de ônus da prova, a sua atribuição de regular a atividade do juiz ao sentenciar o processo (ônus objetivo da prova). Por conduzirem a um julgamento por presunção, essas regras devem ser aplicadas apenas de maneira excepcional.

3. As partes, no Processo Civil, têm o dever de colaborar com a atividade judicial, evitando-se um julgamento por presunção. Os poderes instrutórios do juiz lhe autorizam se portar de maneira ativa para a solução da controvérsia. As provas não pertencem à parte que as produziu, mas ao processo a que se destinam.

4. O processo não pode consubstanciar um jogo mediante o qual seja possível às partes manejar as provas, de modo a conduzir o julgamento a um resultado favorável apartado da justiça substancial. A ênfase no ônus subjetivo da prova implica privilegiar uma visão individualista, que não é compatível com a teoria moderna do processo civil.

5. Inexiste surpresa na inversão do ônus da prova apenas no julgamento da ação consumerista. Essa possibilidade está presente desde o ajuizamento da ação e nenhuma das partes pode alegar desconhecimento quanto à sua existência.

6. A exigência de uma postura ativa de cada uma das partes na instrução do processo não implica obrigá-las a produzir prova contra si mesmas. Cada parte deve produzir todas as provas favorável de que dispõe, mas não se pode alegar que há violação de direito algum na hipótese em que, não demonstrado o direito, decida o juiz pela inversão do ônus da prova na sentença.

7. Recurso especial conhecido e improvido.

(REsp 1125621/MG, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 19/08/2010, DJe 07/02/2011)

E ainda

PROCESSO CIVIL - RECURSO ESPECIAL - CONSUMIDOR - INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA - MOMENTO OPORTUNO - INSTÂNCIA DE ORIGEM QUE CONCRETIZOU A INVERSÃO, NO MOMENTO DA SENTENÇA - PRETENDIDA REFORMA - ACOLHIMENTO - RECURSO ESPECIAL CONHECIDO EM PARTE E, NESSA EXTENSÃO, PROVIDO.

- A inversão do ônus da prova, prevista no artigo 6º, inciso VIII, do Código de Defesa do Consumidor, como exceção à regra do artigo 333 do Código de Processo Civil, sempre deve vir acompanhada de decisão devidamente fundamentada, e o momento apropriado para tal reconhecimento se dá antes do término da instrução processual, inadmitida a aplicação da regra só quando da sentença proferida.

- O recurso deve ser parcialmente acolhido, anulando-se o processo desde o julgado de primeiro grau, a fim de que retornem os autos à origem, para retomada da fase probatória, com o magistrado, se reconhecer que é o caso de inversão do ônus, avalie a necessidade de novas provas e, se for o caso, defira as provas requeridas pelas partes.

- Recurso especial conhecido em parte e, na extensão, provido.

(REsp 881.651/BA, Rel. Ministro HÉLIO QUAGLIA BARBOSA, QUARTA TURMA, julgado em 10/04/2007, DJ 21/05/2007, p. 592)

É cediço, portanto, que se trata de regra de procedimento, e evitando maiores transtornos entre as partes deve ser determinada na fase de saneamento processual.

Por todo exposto, inferimos que a inversão do ônus da prova determinada pela inovação do CDC gera modificações na regra geral trazida pelo artigo 333 do CPC, e provoca uma liberação do encargo da parte consumidora em detrimento da parte fornecedora.

Possui, ademais, o propósito de oportunizar a igualdade entre as partes processuais. Alexandre Freitas Câmara (2010, p. 410) trata muito bem os reias objetivos quando alude

Excepcionalmente, e como forma de assegurar a isonomia entre os sujeitos parciais do processo, o juiz poderá determinar, por decisão fundamentada, a inversão do ônus probatório, sempre que verificar que a parte a quem tal ônus normalmente incumbiria não tem mínimas condições de produzir a prova e a parte adversária tem condições totais de o fazer (em outras palavras, quando a parte contrária tenha domínio da prova).

Por conseguinte, frisa-se que, no que se refere as leis de defesa do consumidor, a inversão do ônus da prova é imprescindível para que a verdade real seja exposta e auferida. Pretende, assim, assegurar a consubstanciação do principio da isonomia material processual.

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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

RAMOS, Paula Mello Silva. Os efeitos da inversão do ônus da prova no Código de Defesa do Consumidor. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 22, n. 5230, 26 out. 2017. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/60256. Acesso em: 26 abr. 2024.

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