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Oracle vs. Google:

Uma leitura a partir de Wittgenstein

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18/01/2021 às 11:50
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CONCLUSÃO

A análise filosófica de casos judiciais, que envolvem eminentemente elementos dogmáticos, se mostra desafiadora. Isso porque, em ações judiciais, o recurso a teorias pelas partes se faz, na sua grande maioria, de maneira instrumental. Os advogados trazem às suas petições os argumentos – incluindo os de elaboradas teorias jurídicas – que são convenientes à sua defesa. Reconhece-se, aqui, que não se poderia esperar a adoção de uma linha teórica coerente pela parte dos representantes legais das partes. É inerente à atividade advocatícia que se tenha de defender posições contraditórias, em diferentes casos. Se estivessem em lados opostos, seria até natural que os advogados da Oracle e da Google argumentassem de maneira diferente – ou até mesmo invertida – para assegurar a vitória de seus clientes.

Porém, a análise filosófica de casos não perde sua relevância, pois permite uma outra interpretação a leis e dogmas de determinado sistema legal. Pegue-se como exemplo algumas das exceções à proteção por Copyright do artigo 102(b) do DMCA: “ideia, procedimento, processo”. Por que foram escolhidas especificamente essas e por que nessa ordem?

Pela aplicação de Wittgenstein e de sua teoria da linguagem já se obtém parte dessa resposta: é porque uma linguagem é constituída de regras e procedimentos e esses devem ser necessariamente públicos para terem sentido, fazendo com que uma linguagem privada seja impossível. Não deixa de ser um exercício de imaginação, mas que auxilia na maior compreensão da matéria estudada.

Uma análise teórica desse viés dos casos também permite perceber algumas incongruências na argumentação utilizada pelas partes – que eventualmente podem lhes custar a vitória em uma ação. Como exemplo temos a Google, a qual argumentava que os APIs da Oracle deveriam ser públicos, porém não disponibilizava publicamente seus próprios APIs para o sistema Android. Isso fez com que o tribunal “percebesse” os intuitos comerciais da mesma e fez sua decisão ser tendencialmente mais favorável à Oracle.

Assim, ainda que uma argumentação baseada em Wittgenstein não seja possível no caso analisado, sua teoria tem muito mérito ao descrever as linguagens como sistemas de regras que devem ser públicas para garantir sua compreensão. Por fim, essa teoria também ajuda a entender como os programas de computador, que têm uma regulamentação legal recentíssima, devem ser entendidos dentro do direito para permitir a aplicação correta de conceitos jurídicos em casos que envolvam linguagem de programação.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Acórdão da Corte federal do Nono Circuito do caso Oracle America, Inc. v. Google, Inc. está disponível através do link: https://cyber.harvard.edu/people/tfisher/cx/2014_Oracle.pdf.

ASCENSÃO, José de Oliveira. Direito Autoral. 2. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 1997, p. 04

BRITTO, Rafael. O Público e o Privado em Wittgenstein. Da Definição Ostensiva aos Jogos de Linguagem. Fortaleza, vol. I, N º 1, 2005, P. 79-98.

GLOCK, Hans-Johann. Dicionário Wittgenstein. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1998.

HINTIKKA, J.; HINTIKKA, M. Uma investigação sobre Wittgenstein. Tradução de Enid Abreu Dobránszky. Campinas: Papirus, 1994.

MENEZES, Paulo Fernando Blauth. Linguagens Formais e Autômatos. 3. Ed. Porto Alegre: Editora Sagra Luzzatto, 2000.

RUY, Mateus Cazelato. O Conceito de Jogos de Linguagem nas Investigações Filosóficas de Wittgenstein. Londrina, vol. I, N º 1, 2008, p. 1-12.

VON WRIGHT, G. H. Ludwig Wittgenstein. A biographical sketch. Philosophical Review, Vol. 64, n. 4, 1955.

WACHOWICZ, Marcos. Direito Autoral. 1.ed. Florianópolis: Editora Gedai, 2010. Disponível em:http://www.gedai.com.br/sites/default/files/arquivos/artigo_marcoswachowicz_direitoautoral_6.pdf

WARAT, Luís Alberto. O direito e sua linguagem. 2. ed. Porto Alegre: Fabris, 1995.

WITTGENSTEIN, Ludwig. Investigações filosóficas. São Paulo: Ed. Nova Cultural (Col. Os Pensadores – trad.: José Carlos Bruni), 2000.


Notas

[1] Íntegra do acórdão em análise disponível em: https://cyber.harvard.edu/people/tfisher/cx/2014_Oracle.pdf

[2] Copyright seria a versão americana do Direito Autoral. Porém, ater-se-á a nomenclatura em inglês quando se referir a ele por conta de diferenças fundamentais entre o direito autoral brasileiro e o americano, especialmente no que se refere aos direitos morais do autor sobre a obra, ausentes no sistema americano. O objetivo é evitar a confusão entre os dois sistemas.

[3] Do original em inglês: Copyright protection subsists, in accordance with this title, in original works of authorship fixed in any tangible medium of expression, now known or later developed, from which they can be perceived, reproduced, or otherwise communicated, either directly or with the aid of a machine or device.

[4] Tradução livre do parágrafo 25 do Acórdão da Corte Federal do nono circuito no Caso Oracle vs. Google.

[5] Tradução livre do parágrafo 26 do Acórdão da Corte Federal do nono circuito no Caso Oracle vs. Google.

[6] Tradução livre do parágrafo 27 do Acórdão da Corte Federal do nono circuito no Caso Oracle vs. Google.

[7] Tradução livre do parágrafo 50 do Acórdão da Corte Federal do nono circuito no Caso Oracle vs. Google.

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[8] Do original em inglês: In no case does copyright protection for an original work of authorship extend to any idea, procedure, process, system, method of operation, concept, principle, or discovery, regardless of the form in which it is described, explained, illustrated, or embodied in such work.

[9] Tradução livre do parágrafo 55 do Acórdão da Corte Federal do nono circuito no Caso Oracle vs. Google.

[10] Tradução livre do parágrafo 83 do Acórdão da Corte Federal do nono circuito no Caso Oracle vs. Google.

[11] Tradução livre do parágrafo 114 do Acórdão da Corte Federal do nono circuito no Caso Oracle vs. Google.

[12] Tradução livre do parágrafo 114 do Acórdão da Corte Federal do nono circuito no Caso Oracle vs. Google.

[13] Tradução livre do parágrafo 127 do Acórdão da Corte Federal do nono circuito no Caso Oracle vs. Google.

[14] Tradução livre do parágrafo 127 do Acórdão da Corte Federal do nono circuito no Caso Oracle vs. Google.

[15] Tradução livre do parágrafo 115 do Acórdão da Corte Federal do nono circuito no Caso Oracle vs. Google.

[16] Tradução livre do parágrafo 131 do Acórdão da Corte Federal do nono circuito no Caso Oracle vs. Google.

[17] Tradução livre do parágrafo 119 do Acórdão da Corte Federal do nono circuito no Caso Oracle vs. Google.

[18] Tradução livre do parágrafo 18 do Acórdão da Corte Federal do nono circuito no Caso Oracle vs. Google.

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Sobre o autor
Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

GONÇALVES, Lukas Ruthes. Oracle vs. Google:: Uma leitura a partir de Wittgenstein. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 26, n. 6410, 18 jan. 2021. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/61385. Acesso em: 22 dez. 2024.

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