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Preempção ou preferência do arrendatário no caso de venda do imóvel rural arrendado

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18/01/2018 às 12:10
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18. QUAL O VALOR A SER DEPOSITADO PELO ARRENDATÁRIO NA AÇÃO DE ADJUDICAÇÃO?

De regra a notificação deve conter o valor que o proprietário quer pela venda do imóvel ou pelo menos o valor oferecido pelo terceiro interessado na compra.

O arrendador deve notificar o arrendatário de sua intenção de venda e as condições desta, como preço, forma e prazo de pagamento etc., nas mesmas condições dadas a terceiros. Quando a notificação contiver omissão ou dubiedade quanto à clareza das condições da venda, interpreta-se em favor do proprietário. De outro norte, quando omissa no tocante às condições de pagamento, interpreta-se que o preço nela referido deva ser à vista.

Mas há casos em que as partes fazem um pré-contrato estabelecendo um valor e acabam escriturando e registrando outro valor. Qual é o valor que o arrendatário deve depositar no caso de ter que propor a ação de anulação e adjudicação do imóvel?

Muitas vezes, o terceiro que compra o imóvel arrendado faz contrato preliminar, e, ao registrá-lo, a escritura definitiva fica divergente daquele. Perante o arrendatário, o que vai valer, podendo gerar seu direito de adjudicação, é o que estiver escriturado no Cartório de Registro de imóveis. A eficácia do contrato preliminar ficará apenas perante as partes contratantes.

No caso de promessa de compra e venda, o arrendador continua com a obrigação de notificar o arrendatário, isto porque a promessa de venda e a promessa de cessão, definitiva e com cláusula de irretratabilidade, de acordo com a Lei nº 649/49, equiparou o compromissário comprador ao adquirente.

Oswaldo Opitz e Sílvia C. B. Optiz[19] perfilham de igual modo esse entendimento, acrescentando como fundamento o fato de que o pré-contrato sem o devido registro pode caracterizar burla à lei, com intenções de afastar o arrendatário.

O arrendador deve notificar o arrendatário de sua intenção de vender o imóvel e das condições de venda, bem assim, do preço e de propostas já recebidas, para que o arrendatário possa exercer o direito de preferência em iguais condições com terceiros. A notificação levando conhecimento da proposta de venda do imóvel, que o arrendador deve fazer ao arrendatário, deve guardar estrita similitude com a proposta de compra formulada por terceiros, no tocante ao preço e prazo de pagamento, sob pena de ser ineficaz a venda que fizer a estes. Esse também é o entendimento da Ministra Nancy Andrighi. Veja-se:

CIVIL. DIREITO AGRÁRIO. RECURSO ESPECIAL. ARRENDAMENTO RURAL. DIREITO DE PREFERÊNCIA PARA AQUISIÇÃO DO IMÓVEL. NOTIFICAÇÃO QUE NÃO GUARDOU ESTRITA SIMILITUDE COM A PROPOSTA DE COMPRA FORMULADA POR TERCEIROS, NO TOCANTE AO PRAZO DE PAGAMENTO. RECONHECIMENTO DE ILEGALIDADE. INEFICÁCIA DA VENDA AOS ARRENDATÁRIOS, COM REABERTURA DE PRAZO PARA QUE ESTES MANIFESTEM SEU INTERESSE EM ADQUIRIR A ÁREA RURAL. ESTATUTO DA TERRA. FUNÇÃO SOCIAL DA TERRA.

– Precedentes do STJ admitem que a preferência para a compra do imóvel rural, conforme prevista no Estatuto da Terra, é direito concedido ao agricultor familiar, sob a ótica da proteção à parte menos favorecida e da justiça social.

– O acórdão consignou que o arrendatário não se enquadra no perfil de agricultor familiar traçado pelo Estatuto. Excepcionalmente, porém, tal circunstância não é suficiente para provocar a revisão do julgado, pois, na hipótese, o próprio contrato de arrendamento possuía cláusula expressa concedendo ao arrendatário o direito de preferência em caso de venda do imóvel. As razões de especial se ressentem de melhor adequação quanto à correta delimitação da controvérsia, pois não abordam a questão na perspectiva contratual.

– A notificação para exercício de direito de preferência sobre a área integral do imóvel, e não apenas sobre a parcela arrendada, é faculdade dos arrendantes. Os terceiros, pretensos compradores, não podem se insurgir contra o arrendatário em face de tal opção, pois este não tem ingerência quanto à abrangência da notificação no tocante à área a ser negociada.

(STJ – RESP. 1.103.241/RS – REL. MIN. NANCY ANDRIGHI – J. EM 03.09.2009 – DJ 16.10.2009)

O Superior Tribunal de Justiça julgou, por meio da sua Quarta Turma, o Recurso Especial nº 1.175.438 – PR, cujo Relator foi o Ministro Luis Felipe Salomão, ser necessária a notificação do arrendatário, no caso de alienação do imóvel objeto de arrendamento rural a terceiros, tendo em vista o direito de preferência contido no art. 92, § 4º, da Lei nº 4.504/1964 (Estatuto da Terra), além de dispor que, havendo divergência entre o valor constante no contrato particular de compra e venda e na escritura pública registrada no Registro de Imóveis, o valor expresso nesta última deve prevalecer, considerando a publicidade do ato e o efeito erga omnes decorrente do registro.

Os recorrentes, na origem, ajuizaram ação de adjudicação compulsória em face dos proprietários do imóvel, buscando o reconhecimento do seu direito de preferência em razão do contrato de arrendamento rural entabulado, tendo em vista a alienação do imóvel a terceiros, sem a prévia notificação dos recorrentes, oportunidade em que depositaram o preço. A ação foi julgada procedente, afastando eventual alegação de ocorrência de notificação verbal, bem como definindo que o preço do negócio deveria ser aquele constante na escritura pública de compra e venda ora impugnada. Uma vez interposta apelação ao Tribunal de Justiça do Estado do Paraná (TJPR), o recurso foi julgado provido, sustentando-se que não houve o depósito integral do preço real da venda, apto a ensejar a adjudicação, que não seria o valor constante da escritura pública.

Inconformados com a decisão proferida pelo TJPR, os recorrentes arrendatários, interpuseram recurso especial (REsp) alegando ofensa ao disposto no art. 92, §§ 3º e 4º do Estatuto da Terra. Em suas razões, os recorrentes sustentaram que, por serem arrendatários rurais e não terem sido notificados acerca da alienação do bem, têm direito de preferência à adjudicação do imóvel em questão. E argumentaram que o preço a ser depositado seria aquele constante na escritura pública de compra e venda, eis que foi o efetivamente pago pela alienação do imóvel e não a quantia prevista no instrumento particular de compra e venda, a qual o TJPR considerou como sendo o valor real do negócio. Por fim, salientaram que a escritura pública é documento oficial, possuindo presunção de veracidade, não tendo esta a mesma serventia de um contrato particular de compra e venda que foi devidamente impugnado.

Ao julgar o REsp, o Relator, Ministro Luis Felipe Salomão, observou que havia um contrato de arrendamento rural firmado entre as partes, em plena vigência, quando ocorreu a alienação do imóvel a terceiros, com desrespeito ao direito de preferência dos arrendatários que não foram devidamente notificados, surgindo a pretensão à adjudicação compulsória. Apontou, ainda, que o art. 92 do Estatuto da Terra e o art. 45 do Decreto nº 59.566/1966 conferem expressamente o direito de preferência, legal e real, outorgado ao arrendatário como garantia do uso da terra explorada por ele, sendo exclusivo do preferente em adquirir o imóvel arrendado, em igualdade de condições e sendo uma forma de restrição ao direito de propriedade do arrendador.

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Quanto ao preço, o Relator entendeu que a interpretação sistemática e teleológica do comando legal leva à conclusão de que o melhor norte para definição do preço é aquele consignado na escritura pública de compra e venda registrada no Registro de Imóveis. De acordo com o Relator, a própria Lei estabelece como marco legal para o exercício do direito de preferência a data da transcrição da escritura pública no registro de imóveis, ou seja, confere ao arrendatário o prazo de 6 (seis) meses para depositar o preço constante do ato de alienação do imóvel a que teve conhecimento por meio da transcrição no cartório imobiliário.

O § 4º do art. 92 do Estatuto da Terra preceitua que o arrendatário tem o direito de depositar o preço, dentro do prazo de seis meses, a contar da transcrição do ato de venda realizada a terceiros, no Registro de Imóveis, caso não seja notificado legalmente para se manifestar quanto à preferência e depois adjudicar para si o imóvel.

Não raro, o arrendador e o terceiro, para burlarem a lei, firmam escritura pública de compra e venda em cartório distinto daquele em que o imóvel é registrado, e não registram a venda. Neste caso, o arrendatário, sabedor desse fato, deve notificar o arrendador quanto a seu direito de preferência, mesmo que a compra e venda ainda não esteja registrada, até porque os fraudadores poderão aguardar o término do contrato de arrendamento para registrar a compra e venda, prejudicando, assim, o arrendatário em seu direito de preferência.

Portanto, o valor a ser depositado para pagamento da compra do imóvel, quando já escriturado, sempre será o valor consignado na escritura.

O preço a ser depositado pelo arrendatário na ação corresponde ao valor atualizado monetariamente, estabelecido como o valor da venda na escritura. A correção é necessária em face da inflação que ocorre no Brasil, ainda que no momento ela seja mínima, mas outrora já foi galopante. Outrossim, a correção nada mais é do que a reposição do valor da moeda, não caracterizando qualquer adicional, devendo ainda ser acrescida de despesas de contrato e impostos que o arrendatário deveria pagar no caso da compra.

A prova do depósito do preço para a adjudicação do bem é condição de procedibilidade da ação, o que implica a inépcia da inicial.


19.   PACTO DE PREFERÊNCIA

Apesar de a preferência ser legal, sendo o arrendamento um contrato e aplicando-se a ele as normas de direito comum, as partes, então, também podem convencionar o pacto de preferência, que é um pacto adjeto ao contrato de arrendamento rural. Até porque, segundo o brocardo latino quod abundat non nocet: o que abunda não prejudica (CC, arts. 513 a 520).


 CONCLUSÃO

A preferência é um direito do arrendatário, mas é, antes de tudo, uma proteção dada pelo Estatuto da Terra (Lei nº 4.504/64) e por seu Regulamento (Decreto nº 59.566/66), proporcionando instrumentos legais que visam à função social da propriedade.

A legislação agrária impõe ao arrendador a obrigação de, quando quiser alienar seu imóvel rural, no todo ou em parte, oferecê-lo primeiramente ao arrendatário, que é o ocupante e quem já está explorando o imóvel. Decorrência disso, o maior interessado em adquiri-lo.

O arrendatário tem o direito de preferência no caso de venda do imóvel arrendado, de acordo com o previsto nos §§ 3º e 4º do art. 92 do Estatuto da Terra (Lei nº 4.504/64) e no art. 45 do Regulamento (Decreto nº 59.566/66). Esse direito é de norma imperativa, impositiva e irrenunciável, em favor do arrendatário, para adquirir, em igualdade de condições com terceiros, o imóvel arrendado.

O arrendatário pode apenas exercer seu direito de preferência quando notificado e, caso não o seja, pode depositar o preço e adjudicar o imóvel para si, nos termos do art. 92, § 3º, do Estatuto. É condição de procedibilidade da ação de adjudicação o depósito do preço de venda para a propositura da ação por parte do arrendatário que quiser ficar com o imóvel arrendado vendido a terceiro.

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Sobre a autora
Helena Maria Bezerra Ramos

Bacharel em Direito pela UFMT; Desembargadora do TJ/MT; Professora do ICEC/Cuiabá (UNIP) e Mestre em direito civil pela PUC/SP.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

RAMOS, Helena Maria Bezerra. Preempção ou preferência do arrendatário no caso de venda do imóvel rural arrendado. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 23, n. 5314, 18 jan. 2018. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/63503. Acesso em: 22 nov. 2024.

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