CNH suspensa pela lei seca, como recorrer?
Primeiramente, o que é a Lei Seca?
A chamada Lei Seca no Brasil se refere às restrições impostas pelo Código de Trânsito Brasileiro - CTB (Lei n. 9.503/97) ao condutor que esteja na condução de veículos automotores caso tenha ingerido bebida alcoólica ou entorpecente.
Não há dúvidas de que o trânsito brasileiro possui números altos de acidentes e letalidade, entretanto, ainda hoje não dispomos de números e estatísticas consolidadas de redução ou não de acidentes após o endurecimento da legislação de combate ao consumo de álcool vs direção.
Lei Seca, níveis de tolerância e a recusa ao bafômetro
A Lei 11.705, aprovada em 2008 é que definitivamente ganhou o título de Lei Seca, já que propôs reduzir drasticamente a tolerância no nível de álcool ingerido por quem dirige. Com a sanção da nova lei, o Código de Trânsito Brasileiro foi alterado e provocou grandes mudanças nos hábitos da população brasileira.
Tornou-se rotina diversas campanhas de conscientização e blitz de fiscalização.
Na prática, o mais comum é que os agentes de fiscalização usem o etilômetro (popularmente chamado de bafômetro) para aferir a ingestão de álcool por parte dos condutores.
Após várias mudanças nos níveis de ingestão de álcool por parte do condutor, atualmente, o nível máximo é tolerância zero para qualquer concentração de álcool por litro de sangue (ou seja, se feito exame de sangue qualquer concentração de álcool já será suficiente para a autuação) e de 0,05 miligrama de álcool por litro de ar alveolar expirado (0,05 mg/l), descontado o erro admissível na tabela do Anexo I da Resolução 432/2013 do Contran que regulamenta a referida Lei Seca.
No caso de concentração igual ou superior a 6 decigramas de álcool por litro de sangue ou igual ou superior a 0,3 miligrama de álcool por litro de ar alveolar, ou sinais que indiquem, na forma disciplinada pelo Contran, alteração da capacidade psicomotora, pode o condutor responder a processo criminal, que prevê pena de seis meses a três anos.
Recusa ao bafômetro e multa.
Entre tantas polêmicas que envolvem a Lei Seca, o uso do bafômetro talvez seja a principal, em especial quando há recusa por parte do condutor em ser submetido a tal teste, pois, há o entendimento em considerar a multa e demais sanções aplicadas inconstitucional.
Segundo juristas, magistrados e operadores do direito em geral, o cidadão não é obrigado a produzir provas contra si mesmo, segundo a própria Constituição Federal garante.
Apesar de ser lícita a recusa em fazer o exame, segundo o artigo 165-A do CTB – Código de Trânsito Brasileiro, o motorista estará sujeito às mesmas sanções que sofreria se tivesse feito o exame com resultado positivo.
Mesmo no judiciário há decisões nos dois sentidos, ou seja, há o entendimento de que a recusa ao teste do etilômetro é conduta que deve ser reprimida sob, basicamente, por questão de consonância com a política de segurança no trânsito ou saúde pública, mas outros juízes entendem que o artigo 165-A do CTB está em desacordo com os princípios constitucionais da presunção de inocência e de não ser obrigado a produzir prova contra si mesmo.
Fato é que a penalidade aplicada simplesmente por recusa ao bafômetro, inclusive, é suscitada no âmbito do próprio Supremo Tribunal Federal em sede da Ação Direita de Inconstitucionalidade nº 4103. E, em que pese não ter havido julgamento final de tal ação até a presente data, a inconstitucionalidade do artigo foi expressa e veementemente defendida pela Procuradoria Geral da República no Parecer 9415 – PGR-RG, por ofender justamente o princípio constitucional da Não Autoincriminação.
Além do teste do bafômetro, também são consideradas provas o testemunho dos agentes policiais ou de outras pessoas que estiverem próximas e o exame clínico, geralmente realizado no Instituto Médio Legal (IML), tal como demais sinais que denunciam características do uso de álcool ou entorpecente que podem ser anotadas no auto de infração.
Valor da multa.
Quem dirige embriagado pode ser multado em R$ 2.934,70, valor que dobra se o motorista for flagrado novamente dentro de um ano. O valor era de R$ 1.915,40 quando a lei foi sancionada e foi atualizado em 2016 com o endurecimento das regras.
As autoridades policiais podem ainda recolher a habilitação e o veículo, conforme o caso.
Suspensão do direito de dirigir e pontuação da CNH.
Além de prever uma multa de valor expressivo, o Código de Trânsito Brasileiro - CTB (Lei n. 9.503/97), ainda prevê uma penalidade de suspensão do direito de dirigir por 12 meses.
O CTB ainda prevê que a autuação da lei seca é infração gravíssima, portanto, o condutor ainda terá 7 pontos inseridos no seu prontuário.
O processo de suspensão é regulamentado pela Resolução nº 723/2018 do CONTRAN. E dentro do período de suspensão o condutor ainda terá de participar de um curso de reciclagem para efetivamente voltar a ter a plena regularidade da CNH.
Recurso de multa e o processo de suspensão da CNH.
Na prática, o condutor autuado na blitz da lei seca, terá contra si dois processos administrativos, um de imposição de multa, e outro de suspensão do direito de dirigir.
Portanto, que fique claro, há sempre um procedimento para percorrer antes de qualquer imposição de penalidade ao condutor!
Toda multa é um ato do poder público e todo ato do poder público deve fielmente seguir a Lei sob pena de nulidade, neste caso, o Código de Trânsito Brasileiro - CTB (Lei n. 9.503/97), Resoluções do Contran (Conselho Nacional de Trânsito), princípios constitucionais entre outros devem ser observados no rito do processo administrativo.
Portanto, toda infração, por mais leve que seja, deve passar por um processo ou procedimento administrativo para verificação de sua legalidade pela autoridade de trânsito. É o que dispõe o art. 281 do CTB. Ou seja, as infrações de trânsito geram uma ‘penalização’, é um ato do Estado que adentra na esfera particular do cidadão e gera danos, portanto, o processo serve para verificar se todas as etapas, prazos e regras foram cumpridas pelo Estado, já que, antes de se exigir o cumprimento por parte do cidadão, deve o Estado cumprir sua parte.
Assim, quando uma infração de trânsito é identificada, vale dizer, quando o condutor comete uma infração, ele é autuado, contra ele é lavrado o chamado auto de infração de trânsito, conhecido pela sigla 'AIT'! E para toda infração há um processo (ou procedimento) administrativo, ou seja, toda vez que é lavrado um auto de infração um processo administrativo é aberto, sempre.
Este processo administrativo segue regras e prazos legais específicos, e visa, de maneira geral, por parte da administração pública, a apreciação do fato, da legalidade, e ao final, ter a certeza sobre a imposição de uma penalidade ou mesmo optar pela anulação de todo o ato deflagrado desde a atuação, e por parte do administrado (condutor autuado ou proprietário do veículo), o direito ao contraditório, à defesa, de apresentar seus argumentos e provas, de pedir a anulação ou mesmo corrigir falhas no procedimento.
Autuado, o condutor receberá a notificação da autuação, onde será aberto prazo para a denominada defesa prévia, defesa preliminar ou defesa da autuação (o prazo vem descrito na carta de notificação). Aqui a defesa da autuação é dirigida ao próprio órgão de trânsito responsável pela expedição da autuação, por exemplo: Detran, Der, PRF, Dnit, etc, já o processo de suspensão da CNH é sempre aberto pelo Detran de onde a CNH está registrada.
Após, seja pelo não acatamento das razões de defesa ou mesmo pela inércia do condutor (não apresentou defesa), a autuação será convertida em multa (ou penalidade de suspensão do direito de dirigir), e mesmo assim o condutor receberá a carta de notificação da decisão, agora com prazo para recurso, que será dirigido a JARI (Junta Administrativa de Recursos de Infrações).
Esta fase é importante se atentar, pois, se o condutor perder o prazo deste recurso a JARI ele não mais poderá recorrer, assim, será encerrado o processo, operando-se a confirmação da multa ou outra penalidade imposta, como a suspensão.
E, caso o recurso à JARI ainda não seja favorável, novamente, o condutor ou proprietário do veículo receberá notificação de decisão, e poderá elaborar outro recurso, desta vez endereçado ao CETRAN (Conselho Estadual de Trânsito). Esta é a última fase ou instância administrativa do processo de trânsito, após decisão deste o processo administrativo é encerrado.
Portanto, e obviamente, o processo (ou procedimento) administrativo, desde seu nascedouro (à autuação e lavratura do auto de infração) até a fase final de apreciação e de decisão, e aplicação de possíveis sanções, demanda algum tempo, ainda que mínimo, ainda que o interessado (condutor/proprietário) não apresente nenhuma defesa.
Como observado, o procedimento é composto por três fases e duas Instâncias, em atenção aos prazos, pode o condutor recorrer em até três oportunidades. Estamos falando de um processo que pode transcorrer de 1 (um) ano a 3 (três) anos ou mais.
O importante é saber que o cumprimento das penalidades impostas (multa e suspensão) somente podem ser exigidas de fato quando do encerramento do processo administrativo, pois, enquanto não apreciado todos os recursos cabíveis não se pode ter certeza se as penalidades subsistirão até decisão final, é o chamado efeito suspensivo.
Após, esgotado o processo administrativo, poderá o condutor se socorrer ao judiciário, inclusive pleiteando medida antecipatória para não perde o direito de dirigir.
De fato é importante que o recurso seja elaborado com cautela e apresente de forma técnica os erros cometidos pela administração pública, aliado a uma boa base jurídica, o que exige conhecimento da matéria específica atinente ao caso.
Fonte: Denatran e Código de Trânsito Brasileiro (Lei nº 9.503/97)
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