4 Considerações finais
A conduta do comandante ao dar o “sinal verde” para o atirador de elite efetuar o disparo contra o agressor, após serem esgotadas as alternativas táticas da negociação e técnicas menos letais, estará amparada pela excludente de ilicitude da legítima defesa de terceiros, vez que tomou tal decisão unicamente para resguardar a vida da vítima e pela excludente de culpabilidade da inexigibilidade de conduta diversa, pois não podia agir de modo diverso, já que o agressor poderia matar o refém a qualquer instante. Quanto à conduta do sniper, ficou claro que estará resguardada pela legítima defesa de terceiros quando agir sem a ordem do comandante da crise; pelo estrito cumprimento do dever legal de obediência à ordem legal do comandante da crise e pela inexigibilidade de conduta diversa, na modalidade da obediência hierárquica, quando a ordem do gerente da crise for ilegal. Ressaltamos que de qualquer forma haverá o devido processo legal, onde serão apurados os fatos da crise, condenando o comandante e/ou sniper, caso suas condutas extrapolem os limites dos permissivos legais.
Percebemos que apesar das condutas do comandante e do sniper terem vários permissivos legais que podem absorvê-los num processo judicial, deveria existir uma norma como a Lei do Abate, que lhes dê um respaldo mais concreto, de modo que não se precisaria verificar as excludentes de ilicitude e culpabilidade para absolvê-los; simplesmente o tiro seria atípico no âmbito de uma crise de alta complexidade. Podemos afirmar, pelas crises reais de alta complexidade surgidas no Brasil, que a maioria dos policiais, principalmente os comandantes das operações, têm receio de agirem, mesmo sabendo que estão atuando dentro da legalidade, por medo de responder a um processo judicial e perder seu cargo ou por medo que a imagem de sua corporação e a sua própria se fira perante a mídia, que enfatiza de forma mais abrangente as notícias policiais reprováveis em seus meios de comunicação.
Uma crise de alta complexidade que é bem gerenciada, tendo uma resolução aceitável, trás repercussões altamente positivas à comunidade e engrandecem o nome das instituições de segurança pública, através dos meios de comunicação levados pela mídia. Assim, toda a população se sente segura e vê na figura do policial uma mão amiga em quem podem confiar, sentindo segurança ao andarem pelas ruas tranquilamente. Entretanto, uma crise sem o devido e regular gerenciamento, data venia, traz consequências trágicas e irreversíveis, como no caso Eloá em São Paulo.
Diante do crescimento considerável do índice dos crimes violentos com alto teor ofensivo no Brasil, principalmente aqueles em que os criminosos fazem pessoas de reféns, formando-se uma crise de alta complexidade e o aumento do potencial ofensivo dos criminosos contra toda a sociedade, as Instituições brasileiras de segurança pública sentem dificuldades diversas para solucionarem tais problemas, sendo necessário que exista unidades especializadas bem treinadas e capacitadas para lidarem com estes eventos críticos e devolver a tranquilidade aos cidadãos.
Pelo presente trabalho notamos que a grande maioria dos doutrinadores criminais brasileiros pouco menciona a atividade policial nas suas obras e parecem desconhecer a importância do emprego do sniper no âmbito do gerenciamento de crises nos dias atuais. Destaca-se o trabalho do ilustre doutrinador Rogério Greco que publicou algumas edições do livro “Atividade Policial: aspectos penais, processuais penais, administrativos e constitucionais”, mostrando interesse e preocupando-se com os policiais de todo Brasil, que arriscam suas vidas diuturnamente em prol da comunidade, a qual muitas vezes a discrimina de forma generalizada. Através de suas obras, o policial tem mais condições de desempenhar sua funções com profissionalismo e transparência, respeitando principalmente a dignidade da pessoa humana, bem como as normas penais.
Concluímos que as atividades do comandante da crise, do sniper e demais integrantes do teatro de operações, servidores públicos responsáveis pela aplicação da lei, estarão resguardadas por preceitos internacionais e institucionais de direitos humanos, bem como pela legislação brasileira, desde que tenham como objetivo maior de servir e proteger vidas de pessoas inocentes, ainda que necessitem abrir mão de uma vida para restabelecer a ordem pública, trazendo a paz social à comunidade.
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