Tópico importante para o planejamento tributário e pouco observado por operadores contábeis ou jurídicos diz respeito às limitações impostas pela legislação nacional para ingresso ou manutenção de empresas no sistema fiscal beneficiado do Simples Nacional.
Inicialmente, para fins de registro, a tributação ordinária brasileira é estabelecida pelo sistema do Imposto de Renda definido pelo Lucro Real, sendo que outros sistemas são considerados como “benefícios fiscais” autorizados pela autoridade fiscal aos contribuintes. Neste sentido, preenchendo determinados requisitos e cumprindo determinadas exigências, o contribuinte pode optar pela utilização do sistema diferenciado de tributação pelo Lucro Presumido (LP) ou ainda pelo Simples Nacional.
O Simples Nacional é um sistema considerado diferenciado e favorecido dispensado às empresas consideradas de pequeno porte ou microempresas, conforme a previsão da Lei Complementar n. 123/2006, e alterações posteriores.
Neste mote, o art. 3º, da referida Lei Complementar, alterado pela Lei Complementar 155/2016, estabeleceu os conceitos de microempresa e empresa de pequeno porte:
Art. 3º Para os efeitos desta Lei Complementar, consideram-se microempresas ou empresas de pequeno porte, a sociedade empresária, a sociedade simples, a empresa individual de responsabilidade limitada e o empresário a que se refere o art. 966 da Lei no 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil), devidamente registrados no Registro de Empresas Mercantis ou no Registro Civil de Pessoas Jurídicas, conforme o caso, desde que:
I - no caso da microempresa, aufira, em cada ano-calendário, receita bruta igual ou inferior a R$ 360.000,00 (trezentos e sessenta mil reais); e
II – no caso de empresa de pequeno porte, aufira, em cada ano-calendário, receita bruta superior a R$ 360.000,00 (trezentos e sessenta mil reais) e igual ou inferior a R$ 4.800.000,00 (quatro milhões e oitocentos mil reais). (Redação dada pela Lei Complementar nº 155, de 2016)
Neste sentido, podem ser consideradas empresas de pequeno porte e, por isso, beneficiárias do regime simplificado de tributação, aquelas que tiverem faturamento anual não superior a R $4.800.000,00. Importante destacar que esse valor estabelecido como limite é considerado no ano, de forma global: na média dos 12 meses o faturamento médio da empresa deve ser igual ou inferior a R$ 400.000,00 (quatrocentos mil reais) ou proporcional ao número de meses de adesão ao sistema.
Para fins de consideração da aplicação da tributação simplificada (imposto único – IU), sobre o conceito de receita bruta, a lei em questão esclarece o seguinte, no mesmo art. 3º:
“§ 1º Considera-se receita bruta, para fins do disposto no caput deste artigo, o produto da venda de bens e serviços nas operações de conta própria, o preço dos serviços prestados e o resultado nas operações em conta alheia, não incluídas as vendas canceladas e os descontos incondicionais concedidos.
§ 2º No caso de início de atividade no próprio ano-calendário, o limite a que se refere o caput deste artigo será proporcional ao número de meses em que a microempresa ou a empresa de pequeno porte houver exercido atividade, inclusive as frações de meses.”
De tal modo, para fins do Simples Nacional, a base de cálculo do tributo é a receita bruta, ou seja, os valores decorrentes exclusivamente da venda de bens e serviços em operações de conta própria, não podendo incluir outras receitas tais como recebimento de juros, capitalização monetária, etc. (receitas financeiras, por exemplo).
O benefício desse sistema, entretanto, não é amplo ou irrestrito, como antes comentado, pois a própria legislação estabelece inúmeras restrições para o ingresso e manutenção de empresas.
Uma das limitações diz respeito ao fato de uma pessoa ter mais de uma empresa ou ser sócia em mais de uma empresa, ou seja, quando ocorrer a multiplicidade de empreendimentos societários com benefícios do sistema tributário do Simples Nacional.
No caso de sócios que tenham participação no quadro societário de outras sociedades empresariais, a Lei Complementar n. 123/2006, expressa as seguintes hipóteses:
“Art. 3º (…)
§ 4º Não poderá se beneficiar do tratamento jurídico diferenciado previsto nesta Lei Complementar, incluído o regime de que trata o art. 12 desta Lei Complementar, para nenhum efeito legal, a pessoa jurídica:
I - de cujo capital participe outra pessoa jurídica;
II - que seja filial, sucursal, agência ou representação, no País, de pessoa jurídica com sede no exterior;
III - de cujo capital participe pessoa física que seja inscrita como empresário ou seja sócia de outra empresa que receba tratamento jurídico diferenciado nos termos desta Lei Complementar, desde que a receita bruta global ultrapasse o limite de que trata o inciso II do caput deste artigo;
IV - cujo titular ou sócio participe com mais de 10% (dez por cento) do capital de outra empresa não beneficiada por esta Lei Complementar, desde que a receita bruta global ultrapasse o limite de que trata o inciso II do caput deste artigo;
V - cujo sócio ou titular seja administrador ou equiparado de outra pessoa jurídica com fins lucrativos, desde que a receita bruta global ultrapasse o limite de que trata o inciso II do caput deste artigo;
(…)
§ 6º Na hipótese de a microempresa ou empresa de pequeno porte incorrer em alguma das situações previstas nos incisos do § 4º, será excluída do tratamento jurídico diferenciado previsto nesta Lei Complementar, bem como do regime de que trata o art. 12, com efeitos a partir do mês seguinte ao que incorrida a situação impeditiva."
A legislação determina a vedação de um sujeito participar de mais de uma empresa beneficiada pelo regime do Simples Nacional se a receita global de todas as sociedades beneficiadas ultrapassar o faturamento anual de R$ 4.800.000,00 (inc. III).
Igualmente, caso um dos sócios possua mais de 10% do capital societário de outra empresa (inc. VI) ou conste como administrador de sociedade com fins lucrativos (inc. V), mesmo que não beneficiária do Simples Nacional, a soma da receita global anual de todas não pode ser superior a R$ 4.800.000,00.
De tal modo, quando uma empresa se habilitar para o ingresso no sistema simplificado de tributação prescrito na Lei Complementar n. 123/2006 e existir em seu quadro societário um sócio que igualmente participe de outra sociedade beneficiada pelo Simples Nacional, a soma da receita bruta global de ambas empresas não pode ser superior ao limite estabelecido na lei complementar, sob pena da exclusão de uma delas do sistema beneficiado.
De outro lado, no caso de uma das empresas não for beneficiada pelo Simples Nacional, mas houver um sócio comum com empresa beneficiada pelo sistema, e esse sócio contar com mais de 10% do capital social, ou ser dela administrador, a receita bruta global de todas as empresas não poderá superar o limite estabelecido na legislação.
Neste caso, com fins da gestão de um planejamento tributário completo, cabe ao analista verificar a situação societária externa dos sócios de uma empresa que pretender ser beneficiária do Simples Nacional, inclusive sugerindo, se for o caso, a redução da participação do sócio em outras sociedades, ou mesmo a revisão dessa pretensa matriz fiscal, além de verificar se o faturamento global de todas as sociedades paralelas irá permitir o ingresso e a manutenção do enquadramento da empresa no Simples Nacional.