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Direitos humanos e implementação de políticas públicas

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19/08/2019 às 17:10
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III – EFETIVIDADE DAS NORMAS CONSTITUCIONAIS SOBRE POLÍTICAS PÚBLICAS

Há normas meramente programáticas, com uma carga mínima de impositividade, e, por outro lado, normas impositivas de políticas de ação governamental acompanhadas de parâmetros de concretização e sanções por sua inobservância.

Exemplos das normas impositivas de políticas de ação está no artigo 208, § 2.°, da Constituição, com relação ao não oferecimento e a oferta irregular de ensino obrigatório. É caso, inclusive, de ajuizamento de ação de improbidade, apurando-se a responsabilidade do administrador.

E nas normas meramente programáticas pode-se falar em eficácia mínima? Penso que sim.

Convém lembrar o conceito de efetividade que significa que a realização do Direito, o desempenho concreto de sua função social, a lição de Luis Roberto Barroso.[22]

O Direito Constitucional não pode ser um Direito sem sanção. Existe, em tal sede, uma responsabilidade política, pois, do contrário, teríamos o absurdo de conviver com noções absurdas como a norma constitucional não jurídica.

Verifique-se o caso de normas constitucionais atributivas de direitos sociais. Há, por certo, uma categoria de normas constitucionais que contemplam interesses cuja realização depende da edição de norma infraconstitucional integradora. É o caso do direito à participação nos lucros, ou resultados, desvinculada da remuneração, consoante definido em lei (art. 7, XI) e o direito à proteção em face da automação, na forma da lei (art. 7, XXVII).

As novas exigências da ordem coletiva determinam-se numa Democracia aberta e participativa, que não mais se conforma com uma postura liberal que vê o indivíduo fraco escondido na apologia da livre iniciativa.

Isso quer dizer que o exercício democrático apenas por meio de mandatários é insuficiente.

Surge a tutela da ação civil pública, na forma da tutela específica no artigo 461 do Código de Processo Civil, como instrumento para superar a inércia em prestações positivas da Administração, pois é necessário assegurar a efetivação dos direitos sociais.

Aí, o papel prestimoso do Ministério Público para exigir, na tutela do artigo 461 do Código de Processo Civil de 1973, o ensino público primário obrigatório, em estabelecimentos oficiais, o atendimento especializado aos portadores de deficiência, por exemplo. Pode-se duvidar da imperatividade dessas normas? Por certo, que não. Será o caso de solicitação de expedição de tutela mandamental contra a Administração, de cunho inibitório.

O argumento de que tais direitos surgem por normas programáticas não impressiona. Não se negue que as normas constitucionais programáticas hão de informar a atuação do legislativo, ao editar leis, bem como a da Administração ao aplicá-las.

É o pensamento de Rosah Russomano[23], de que fazem nascer um direito subjetivo “negativo” de exigir do Poder Público que se abstenha de praticar atos que contrariem seus ditames.

Bem aduz José Afonso da Silva[24], a Constituição de 1988, diferentemente das Cartas de 1946, 1934 e a de 1967, inócuas que eram nas medidas sociais, contém normas de princípio programático, sejam de princípio da legalidade (art. 7.°, XI; art. 7.°, XX; art. 7.°, XXVII, dentre outros); normas programáticas referidas aos Poderes Públicos (art. 21, IX, art. 184, art. 215 (pleno exercício dos direitos culturais); (art. 217, quanto ao fomento pelo Estado de práticas esportivas) e, finalmente, normas programáticas dirigidas à ordem econômica-social em geral (art. 170; art. 193).

Os Direitos sociais são direitos fundamentais. É o caso, por exemplo, do direito à habitação, cabendo ao Estado programar e executar uma política de habitação inserida em plano de reordenamento do solo urbano.

J. J. Gomes Canotilho[25] afirma que esses direitos são regras jurídicas diretamente aplicáveis, vinculativas de todos os órgãos do Estado. As normas programáticas se revelam com eficácia tão plena como qualquer outra, revogando normas anteriores contrárias.

Não são tais normas constitucionais programáticas meros enunciados de programas políticos. Tal visão jusnaturalista não se amolda a modernidade. No passado, tais normas eram vistas como incômodas para os donos do Poder. São essas normas programáticas preceptivas, regulando comportamentos públicos e, como tal, à luz do próprio mestre Canotilho[26], têm a mesma dignidade constitucional das demais, dentro do princípio da unidade hierárquica normativa. São, sim, portadoras de um programa de valores eleitos pela Constituição.

Hoje, chega a estarrecer o propósito do Constituinte de 1891, de perfil liberal e burguês, na busca da manutenção dos estamentos existentes, ao não conceber o voto do analfabeto mas ao não estabelecer como obrigação do estado a educação social.


IV – O MINISTÉRIO PÚBLICO E A IMPLEMENTAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICA

Possui o Ministério Público a iniciativa de defesa da ordem democrática.

Longe está o Ministério Público Federal, com a feição que lhe foi dada pela Constituição de 1988, de um “funcionário Promotor do crime”.

Sua ação, num quadro democrático, vai desde o exercício da ação penal até a fiscalização dos interesses de pessoas carecidas de proteção (menores, incapazes), passando pela defesa da constitucionalidade e legalidade e, por fim, da defesa de interesses difusos (ambiente e patrimônio).

É advogado da sociedade e não do Estado, pois a magistratura do Parquet não se exerce em nome do Estado-Pessoa.

Com isso, sua tutela se dirige no dos interesses coletivos, dos interesses individuais homogêneos e dos interesses difusos.

Lembro, aqui, o Professor Marcelo Navarro Ribeiro Dantas[27], na linha de Péricles Prade[28], aduzindo que os interesses difusos são os titularizados por uma cadeia abstrata de pessoas, ligadas por vínculos fáticos exsurgidos de alguma circunstancial identidade de situação, passíveis de lesões disseminadas entre todos os titulares, de forma pouco circunscrita e num quadro de abrangente conflituosidade. Por sua vez, têm com características os interesses coletivos: transindividualidade, porquanto superam a dimensão individual, traduzindo anseios comuns vinculados a um grupo, a indivisibilidade, já que visam a um a satisfação que é da coletividade como um todo, não podendo ser do indivíduo; o vínculo associativo, que traduz a relação jurídica de base que dá consciência ao agrupamento; e, por fim, a determinabilidade dos sujeitos[29].

Os direitos individuais homogêneos (Lei n.°  8.078/90) são vinculados à pessoa, de natureza divisível e de titularidade plúrima, decorrentes de origem comum. Fala sobre eles João Batista de Almeida, sustentando que a via própria para o pleito de direitos individuais homogêneos é a ação civil coletiva (art. 91 a 100 do Código de defesa do Consumidor)[30].

Em matéria de implementação de políticas públicas deve-se levar em conta a noção de interesses legítimos.

Na linha de Campos Batalha[31], entendemos que a ação civil pública visa a assegurar proteção a interesses ou direitos abrangentes de toda a coletividade, ou de parte dela. Visa-se a uma pretensão geral de execução da lei, diverso do direito subjetivo, que fica à disposição do respectivo titular, pois no direito subjetivo há uma garantia legislativa de utilidade substancial e direta para o titular.

Na Itália, fala-se um interesses ocasionalmente protegidos, marcada por uma garantia instrumental da legalidade do comportamento administrativo. Para tanto, Alessi[32] configura o interesse legítimo como situação marcada por uma garantia instrumental da legalidade do comportamento administrativo.

Está o Ministério Público com legitimidade (estar em face de) processual concorrente para o processo, em matéria de implementação de políticas públicas.

Fala-se numa legitimidade, dita extraordinária ad processum. Corresponde ao direito de conduzir um processo (Prozessführungsrecht).

Falo  em  legitimidade  extraordinária  concorrente  primária,  que  tem  lugar  quando qualquer dos legitimados extraordinários pode agir independentemente da ação do outro, uma vez que a Lei da Ação Civil Pública (Lei n.° 7.347/85) discrimina, além do Parquet, os legitimados para tal ajuizamento.

Entendida a substituição processual pela voz autorizada de Waldemar Mariz de Oliveira Jr.[33], como instituto pelo qual é conferido a alguém legitimação para, em nome próprio, agir em juízo como autor ou réu, na defesa do direito alheio, lembro o Mestre Barbosa Moreira[34] que nega possa ocorrer substituição processual, na legitimação extraordinária autônoma concorrente, porque, se por substituir se entende retirar qualquer pessoa do lugar para colocar outra, a denominação substituição processual pareceria adequada para a substituição autônoma e exclusiva. Porém, data vênia do Mestre Barbosa Moreira, em casos de legitimação concorrente (como na Ação Civil Pública), nos quais existe uma pluralidade de pessoas legitimadas, com autonomia, se a lei autoriza um dos legitimados a agir individualmente, não pode deixar de atribuir eficácia ultra partes a tal atividade, o que faz revestindo a sentença com autoridade de coisa julgada35, para quem é parte, e para quem é substituído. A Lei da Ação Civil Pública traz patente exemplo de legitimação autônoma concorrente primária, sempre que existir para qualquer dos legitimados extraordinários, a possibilidade de instaurar o processo.

Não é fácil a sedimentação da ideia do Ministério Público como grande guardião da tutela dos interesses legítimos. Tem-se negado o interesse de agir do Parquet, no controle incidental de constitucionalidade nas ações civis públicas36. Porém, em decisão monocrática de 24.11.2000 (Reclamação n.° 1.733-8-SP, Rel. Min. Celso de Mello, j. 24.11.2000, DJ de 1.12.2000, p. 103-104) decidiu por acolher a tese do controle incidental de constitucionalidade em ação civil pública.

Mesmo na Itália, berço de construção da doutrina dos interesses legítimos, Vicenzo Vigoritti37, afasta a possibilidade do Ministério Público de representar os interesses coletivos por entender que a Instituição não se ajusta à funções que deveria desempenhar nesse terreno. Trata-se de posição anacrônica, data vênia.


V – A TUTELA ESPECÍFICA POSTA NO ARTIGO 461 DO CPC DE 1973

Tutela genérica é toda forma que tenda à obtenção de dinheiro no âmbito da responsabilidade patrimonial do devedor. A tutela específica é aquela que tende à consecução de bens jurídicos outros, que não dinheiro. É o caso da tutela estabelecida no artigo 461 do CPC, que tem origens nos interditos romanos e na cominatória lusitana (Ordenações Manuelinas, Livro III, tít. 62, §§ 5-7). Reprodução bastante fiel ao art. 84 do Código de Defesa do Consumidor no entender de Cândido Rangel Dinamarco[35], diz respeito a obrigações legais e contratuais.

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O artigo 461 do Código de Processo Civil é a base da tutela inibitória, que para ser efetiva deve contar com a tutela antecipatória (art. 461, § 3.º ). A ação inibitória visa impedir a prática, a continuação ou a repetição do ilícito e não tem o dano como um dos seus pressupostos. É tutela preventiva, porém não cautelar.

Por certo, Eduardo Talamini[36], destaca que o artigo 461 do CPC não se limita a estabelecer a tutela que consideramos inibitória, por ser preventiva. As regras, pois, para o Prof. Eduardo Talamini disciplinam a consecução do resultado de deveres derivados de direitos relativos (obrigacionais ou não) e absolutos (reais, da personalidade, etc.), públicos e privados, dando a expressão obrigação um sentido larguíssimo de dever jurídico.

Não é surpresa para o leitor que o Professor Talamini, em sua obra citada, de folhas 427, sintetiza que, “depois da reforma do Código, apenas deixou de se formar, como ‘título executivo judicial’, a sentença condenatória proferida no processo civil (art. 584, I), que tenha por objeto “obrigações de fazer e não fazer”.

Primordialmente, o provimento concessivo de tutela do art. 461 é de eficácia mandamental (tendente à tutela específica), na terminologia da lei, e, ao seu lado, executivo lato senso, pois autoriza a tomada de providências destinadas à obtenção do resultado prático equivalente, independente do concurso do réu, operando-se a substituição da conduta do demandado pela do próprio Estado, através de seus agentes. É assim, na tutela inibitória, na tutela preventiva executiva, na tutela reintegratória (eliminação do ilícito) e na tutela ressarcitória, em que se permite a postulação das sentenças mandamental (ordem sob pena de multa) e executiva (determinação de que o fazer seja prestado por um terceiro às custas do réu).

Presta-se a tutela do artigo 461 do CPC à proteção de direitos absolutos, cuja eficácia é erga omnes. Tal é o caso dos direitos da personalidade, deveres decorrentes de prestações estatais. Isso porque, na lição de Salvatore Satta[37], Calamandrei, a sentença condenatória adequa-se a “direitos a posições instrumentais, entre os quais o direito de crédito, cuja violação se dá pelo ressarcimento do equivalente”. Esse é o terreno dos direitos relativos.

Data vênia do entendimento de Nelson Nery Jr.[38], Marcelo Guerra[39], não se pode descartar a aptidão de o provimento final, ex vi art. 461, fazer-se efetivar no processo em que é proferido. Os ilustres autores citados reputam sentença condenatória o provimento do art. 461. Por sua vez, data vênia, não podemos concordar com Teori Zavascki[40] que estabelece que, pelo menos em certos casos, o art. 461 do CPC produz sentença condenatória e não executivo lato senso, que, para ele, só aconteceria quando a própria natureza da obrigação exigir (não fazer com tutela preventiva) e deferimento com base no art. 461, § 3.º . Ora, não há fundamento legal que autorize tal ilação, não se concebendo que a lei tenha adotado mecanismo menos eficiente para o caso, como o previsto no art. 632 do CPC. As raízes desse raciocínio, com a devida vênia, são fruto de violação do texto de Gaius, parece-nos introduzido nas Instituições Justinianeias  (4, 13, 5) e consolidada pela relativização dos direitos absolutos trazidas pelas ideias de Kant, a partir do Século XIX, no sentido de que seja ela real ou pessoal, resume-se numa relação interpessoal[41].

Tutela-se o direito à personalidade, além de direitos coletivos à correta Administração, para que não se negue prestações necessárias de serviços à população, como educação, água, luz, etc. Protege-se o meio ambiente com proibição de edificações contrárias à lei ou o consumidor com a busca e apreensão de produtos nocivos à saúde. No caso de grave epidemia sem que a Administração nada faça, há violação do dever constitucional imposto.

Esse o alcance do art. 461 do CPC, em que se requer tutela mandamental ou executiva lato senso. Deixa-se para a sentença condenatória, que tem o condão de autorizar o emprego de mecanismos de sujeitação em processo subsequente, para os direitos relativos.

Soma-se a tutela do art. 461 do CPC a outras como a da antiga e superada posse dos direitos pessoais, de origem canônica e introduzida no País, por Ruy Barbosa, do mandado de segurança, do habeas data, das ações possessórias, da reivindicatória, das ações cautelares, da ação de despejo, da nunciação de obra nova (para Tito Fulgêncio, possessória), da ação de imissão de posse (petitória, para Savigny), como lídimos herdeiros dos interditos romanos.

Protege-se, no art. 461 do CPC, direito absoluto, que segundo De Plácido e Silva[42], é aquele que, “por sua própria força e plenitude, é oposto a toda e qualquer pessoa, erga omnes, tal como foi, no passado, o direito de propriedade, ou daquele que investe a pessoa no poder de exercitar um direito, sem que possa ser impedido nele. É a faculdade de agir, sem restrições, contra a pessoa que venha a atentar ou ferir o direito de que se é titular, diferenciando-se do direito relativo, que, nascido de uma relação jurídica ou de um vínculo jurídico estabelecido pela vontade de duas ou mais pessoas, somente pode ser oposto contra uma dessas mesmas pessoas. Assim, os direitos da personalidade (da vida privada) têm caráter absoluto. Assim, definidas políticas públicas, o direito à saúde, à educação, à energia, o abastecimento d’água, é dever do Estado. Tal situação é diversa das razões e conveniência da Administração na fixação orçamentária. Prioriza-se a dignidade da pessoa humana, pois não há que falar em priorização de meios a utilizar diante da inércia estatal. Pune-se, pelo art. 461 do CPC, quando o Estado não adota, no caso concreto, a solução mais adequada. Se houver uma opção ilegal por um dos caminhos trazidos pela lei ao comportamento discricionário da Administração, cabe o uso da ação inibitória

No campo do direito público, é diversa a aplicação do art. 461. Na disciplina dos planos de saúde (Lei n.° 9.658/98), na imposição de prestação de serviços públicos mediante remuneração quando indevidamente prestados (água, luz, telefone), na fruição de atividades asseguradas por direito fundamental (educação, saúde), onde há direitos subjetivos públicos[43].

As sentenças proferidas, em ações inibitórias, são aptas a produzir coisa julgada material, ao contrário das ações cautelares, onde nelas o juiz cinge-se pela aparência (fumaça de bom direito). Há cognição exauriente na sentença formulada para a tutela do art. 461 do CPC, tal qual há, no mandado de segurança.

Na tutela inibitória, hábil a ser utilizada, no art. 461 do CPC, há cognição exauriente, com base em certeza. Adota-se o rito ordinário com intervenção de terceiros, reconvenção ou ação declaratória incidental, incidindo o art. 802, p. único, II, para contestar, combinado com o art. 930, p. único.

A tutela inibitória é imposta, por sentença, ou por tutela antecipada, em que se ordena sob pena de multa, meio de coerção indireta, imposta de acordo com a capacidade econômica do demandado e de forma progressiva (ilícito continuado). Há mandamentalidade quando o juiz manda forçando. Há uso de meios de coerção para forçar o devedor adimplir.

A multa, quando fixada na tutela antecipada, tem eficácia imediata e pode ser imposta de ofício. De toda ordem, não paga, deve ser objeto de execução por quantia certa.

Diversa é a situação com relação às prestações estatais normativas, diante de um não fazer. A tutela do art. 461 do CPC, de forma alguma, substitui a ação direta de inconstitucionalidade por omissão (art. 103 da CRFB), cujos legitimados são outros e o mandado de injunção, cuja medida serviria, a exemplo da primeira ação, para certificar o Poder omisso para que adote providências regulamentadoras, descabendo a fixação de prazo para o suprimento da omissão, quando não for o próprio órgão omisso o sujeito passivo do direito cujo exercício está obstado por falta de norma regulamentadora (MI n.º  361, v. m, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, j. 08.04.94, em RDA, 1976).

Dir-se-á que o berço das medidas constritivas do art. 461 do CPC está na equity. No entanto, lembro que Ovídio B. da Silva[44], aduz ser inevitável a comparação entre a concessão de interditos pelo pretor romano e a equity inglesa. Mesmo os writs da common law são fruto da influência dos interditos romanos.

Sobranceiro está o pensamento de Galeno Lacerda[45], sobre o vínculo entre writs e interditos romanos, aludindo, inclusive, à semelhança das fórmulas latinas, em que claramente se criam remédios sumários. Não resta dúvida, entretanto, que foi, na Inglaterra, em 1830, que se conferiu às cortes de eqüidade o poder para, em caso de descumprimento da prestação ordenada, autorizar a prestação de fato por terceiro, por conta do réu, nos moldes da estrutura sub-rogatória, que empregamos no art. 461 do CPC. Nesse particular, percebe-se a nítida influência dos interditos com a injunction, ordem do órgão judiciário a alguém para que pratique um ato específico ou deixa de praticar, seja em conflitos públicos ou privados. A eficiência do caráter pessoal da injunction é assegurar através da ameaça de sancionamento por contempt of court, sempre que há desobediência.

A injuction, no direito anglo-americano, decorre da sua possibilidade de ajuste a diversas necessidades, vinculando-se como uma proibitory e uma mandatory. Temos daí, inibitórias positivas, quando se receia a reiteração de omissão e inibitórias negativas, contra prática, repetição de conduta comissiva.

O artigo 461 do CPC não parece ser unicamente fonte da tutela inibitória mandamental. Some-se a ela, pelo menos, a tutela preventiva executiva que implica, através de meios de coação direta, uma interferência na esfera jurídica do réu sem que ele se dê a oportunidade de, por vontade própria, praticar o ato temido. Tal é o caso da designação de um administrador provisório ou a designação de um oficial de justiça para impedir atividade. Isso ao contrário da tutela inibitória em que se permite que o demandado tenha a oportunidade de não praticar o ilícito. A desobediência do réu ao mandado judicial, quando constatado o elemento do tipo dolo, dá lugar a responsabilidade penal.

Ainda, no art. 461 do CPC, Luís Guilherme Marinoni[46] identifica a tutela reintegratória, exemplificada na interdição de uma fábrica, a destruição de uma obra, a busca e apreensão de produtos, que estão sendo comercializados em desacordo com a lei, em que se busca eliminar uma situação de ilicitude. Também, aqui, a tutela não será condenatória, mas executiva lato senso, e deve ser proferida nos limites da necessidade e da efetividade e permitida a possibilidade de concessão de tutela inibitória em vez de remoção do ilícito ou vice-versa. Parece-nos que, nesse aspecto, que, dentro de uma economia capitalista, no que concerne a tutela inibitória voltada para o meio ambiente, a tutela deve ser desenvolvida de modo a causar o menor prejuízo possível às atividades produtivas. É a aplicação do princípio da necessidade, que se apresenta como atrelado ao princípio da proporcionalidade, na busca do meio mais idôneo e da menor restrição possível. Isso ocorre, no que concerne à possibilidade de o juiz poder, em vez de, por exemplo, determinar a cessação das atividades que ocasionam a poluição, ordenar a instalação de filtro, se for suficiente para conter a poluição. Nada impede que o juiz ordene um fazer ou não fazer diverso do solicitado.

Percebe-se a tutela de remoção do ilícito na ação de atentado, nas medidas provisórias como interdição e demolição de prédio. Da mesma forma, temos tutela reintegratória na ação para evitar construção contra lei ambiental.

Por fim, o artigo 461 do CPC trata de tutela ressarcitória, onde se permite a postulação de sentença mandamental (ordem sob pena de multa) e executiva (determinação de que o que fazer seja prestado por um terceiro às custas do réu). Permite-se sua utilização como instrumento processual na tutela ambiental sempre que houver necessidade de reparação específica. Pode-se ainda falar em tutela ressarcitória pelo equivalente em pecúnia caso o lesado opte por ressarcimento pelo equivalente ou impossível e tutela específica. A tutela ressarcitória, sim, é voltada para o dano.

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Sobre o autor
Rogério Tadeu Romano

Procurador Regional da República aposentado. Professor de Processo Penal e Direito Penal. Advogado.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ROMANO, Rogério Tadeu. Direitos humanos e implementação de políticas públicas. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 24, n. 5892, 19 ago. 2019. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/70274. Acesso em: 25 dez. 2024.

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