A inconstitucionalidade na cobrança de custas ao reclamante na Justiça do Trabalho

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Resumo:


  • A reforma trabalhista alterou a concessão da justiça gratuita na CLT, restringindo o acesso à justiça para trabalhadores de baixa renda.

  • Antes da reforma, a gratuidade era concedida com base na declaração de hipossuficiência econômica, mas agora é necessário comprovar renda inferior a 40% do teto do RGPS.

  • A inconstitucionalidade da alteração do artigo 790 da CLT tem sido discutida no meio jurídico, alegando violação ao princípio do livre acesso à justiça e ao não retrocesso social.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

4 Da gratuidade judiciária na Justiça do Trabalho. Alterações promovidas pela Reforma Trabalhista.

A Lei 13.467 de 13 de julho de 2017, trouxe diversas alterações no âmbito processual, dentre elas, uma das que mais chamou a atenção dos operadores do direito bem como da população, foi a mudança na concessão da gratuidade judiciária.

Antes da reforma, a súmula 463 do TST regulamentava a concessão da gratuidade judiciária, sendo que para a concessão da justiça gratuita à pessoa física, bastava a mera declaração de hipossuficiência econômica apresentada pela parte ou por seu advogado, e para a concessão da justiça gratuita à pessoa jurídica, era necessário provar a insuficiência econômica.

Portanto, em regra, a gratuidade da justiça na justiça do trabalho, via de regra, era deferida ao empregado através da mera apresentação da declaração de hipossuficiência, sob o fundamento de que tal declaração gozava de presunção legal de veracidade.

Agora, a Lei 13.467 criou nova regra para a concessão da gratuidade judiciaria, incluindo o §3 no artigo 790 da CLTin verbis:

Art. 790. Nas Varas do Trabalho, nos Juízos de Direito, nos Tribunais e no Tribunal Superior do Trabalho, a forma de pagamento das custas e emolumentos obedecerá às instruções que serão expedidas pelo Tribunal Superior do Trabalho. (Redação dada pela Lei nº 10.537, de 27.8.2002)

§ 3o É facultado aos juízes, órgãos julgadores e presidentes dos tribunais do trabalho de qualquer instância conceder, a requerimento ou de ofício, o benefício da justiça gratuita, inclusive quanto a traslados e instrumentos, àqueles que perceberem salário igual ou inferior a 40% (quarenta por cento) do limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social. (Redação dada pela Lei nº 13.467, de 2017)

Desta forma, a reforma trabalhista faculta ao juiz conceder o benefício da justiça gratuita apenas àqueles que perceberem salário igual ou inferior a 40% do limite máximo dos benefícios do RGPS. Não bastante, foi incluído também o § 4º, que regulamenta que o benefício da justiça gratuita será concedido à parte que comprovar insuficiência de recursos para o pagamento das custas do processo.

Portanto, a justiça gratuita será concedida apenas em duas hipóteses, quais sejam, para aqueles que receberem salário igual ou inferior a 40% do limite máximo dos benefícios do Regime geral de previdência social, ou para aqueles que comprovarem absolutamente não ter recursos para arcar com as despesas do processo.

Desta forma, para se valer da justiça gratuita, deverá a parte comprovar sua insuficiência de recursos.

Percebe-se que antes, para o empregado que fosse hipossuficiente e não tivesse condições de arcar com as custas, bastaria apenas anexar uma declaração de hipossuficiência ao processo, e esta declaração seria suficiente para que o juiz concedesse a justiça gratuita a parte.

Neste sentido, calha trazer a lume recente decisão do TRT/MG:

JUSTIÇA GRATUITA. ISENÇÃO DE CUSTAS PROCESSUAIS. AÇÃO PROPOSTA ANTES DA "REFORMA TRABALHISTA". O §3º do artigo 790 da CLT, vigente à época da propositura da ação, previa que o juiz tinha a faculdade de concessão, a requerimento ou de ofício, dos benefícios da justiça gratuita àqueles que percebiam salário igual ou inferior ao dobro do mínimo legal, ou declararem, sob as penas da lei, que não estavam em condições de pagar as custas do processo sem prejuízo do sustento próprio ou de sua família. Assim, era suficiente que a parte autora apresentasse uma declaração em um ou em outro sentido, para que o benefício lhe fosse concedido, sendo, de conseguinte, desnecessário que também recebesse salário igual ou inferior ao dobro do mínimo legal, como resta claro na redação do item I da Súmula 463 do C. TST. A condenação ao pagamento de custas processuais não pode ser utilizada como punição à parte que exerceu o seu direito de ação constitucionalmente assegurado.

(TRT da 3.ª Região; PJe: 0011090-02.2015.5.03.0024 (RO); Disponibilização: 17/10/2018; Órgão Julgador: Primeira Turma; Relator: Luiz Otavio Linhares Renault).

https://as1.trt3.jus.br/juris/detalhe.htm?conversationId=5798

Contudo, agora a justiça gratuita só será deferida, a requerimento ou de oficio, para aqueles que receberem até 40% do teto do Regime Geral da Previdência Social. Em suma, o teto da previdência hoje é de R$5.531,31 e foi regulamentado pela portaria nº 8 de 13/01/2017 do Ministério do Trabalho. Logo, para aqueles com renda de até R$2.213,72 se tornou uma faculdade do juiz conceder ou não os benefícios da gratuidade da justiça. Assim, aquele que receber quantia que não atinja o teto estipulado, conseguira gozar dos benefícios da justiça gratuita, mas aquele que recebe mais que do que referido teto, precisará comprovar que é hipossuficiente.

Neste sentido:

JUSTIÇA GRATUITA. DEFERIMENTO APÓS A ENTRADA EM VIGOR DA REFORMA TRABALHISTA. Presume-se a ausência de condições de arcar com os custos do processo por aquele que está desempregado ao tempo da análise do pedido de concessão de justiça gratuita, porquanto a ausência de salário equipara o trabalhador àqueles que possuem rendimento inferior a 40% do limite máximo dos benefícios do RGPS. Não tendo a reclamada comprovado que o obreiro ingressou em novo posto de trabalho, percebendo salário superior ao limite estabelecido no art. 790, §4º, da CLT, prevalece a presunção de veracidade da declaração de pobreza firmada pelo reclamante.

(TRT da 3.ª Região; PJe: 0010660-62.2018.5.03.0180 (RO); Disponibilização: 10/10/2018; Órgão Julgador: Primeira Turma; Relator: Maria Cecilia Alves Pinto) https://as1.trt3.jus.br/juris/detalhe.htm?conversationId=5798

Percebe-se que a grande diferença está em comprovar a hipossuficiência, a mera declaração de que se é hipossuficiente não é mais satisfatória, não basta apenas declarar, a parte terá que comprovar a sua hipossuficiência. 


5 Gratuidade Judiciária. Posicionamento doutrinário e jurisprudencial.

Tem se tornado cada vez mais notório que, diante das referidas alterações promovidas pela lei 13.467/17, nasceu a restrição e a dificuldade de acesso dos trabalhadores à justiça do trabalho. É sabido que a reforma trabalhista alterou a CLT mas não alterou a Constituição Federal, portanto os princípios que regem o âmbito trabalhista não foram revogados, continuando sendo essenciais e fundamentais para o direito do trabalho. Contudo, ao trazer tais dificuldades para o acesso à justiça, a alteração do artigo 790contraria amplamente os princípios e garantias constitucionais previstos na Constituição Federal.

Cumpre ressaltar que, além de ferir o princípio do livre acesso ao judiciário, a alteração do artigo 790 fere, também, o princípio do não retrocesso social. Referido princípio, como sabido, é um dos princípios implícitos mais importantes para a proteção dos direitos sociais, e tem o objetivo de impedir que sejam desconstituídas as conquistas já alcançadas pela sociedade, protegendo os direitos fundamentais de qualquer imutabilidade que tenha de cunho retrocesso. 

Nesta esteira, a inconstitucionalidade do Artigo 790 não é apenas uma suposição, mas sim um fato, tendo sido firmada por doutrinadores, jurisprudências, e os mais importantes membros do âmbito jurídico no pais.

Vale citar como principal exemplo a posição declarada pela Procuradoria Geral da República, quando ajuizou a ADI 5766 para declarar inconstitucionais algumas expressões usadas no artigo 790. A PGR afirma que o acesso à justiça é um direito humano reconhecido no plano internacional, sendo previsto na declaração universal dos direitos do homem, no pacto internacional sobre direitos civis e políticos, e na convenção americana sobre direitos humanos, mais conhecida como Pacto de San Jose da Costa Rica-1966, além de ser consagrado pela atual Constituição Federal de 1988.

A ideia da PGR é que o acesso à justiça está voltado diretamente para a dignidade humana, sendo imperioso ao provimento das condições materiais de vida do trabalhador carente, é uma garantia fundamental da população trabalhadora que é socialmente vulnerável.  Afirma ainda que “o acesso a tutela jurisdicional de seus direitos econômicos e sociais trabalhistas que integram o conteúdo mínimo existencial dos direitos fundamentais é uma garantia fundamental dos trabalhadores”.

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6.CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diante de todo o exposto, pode-se perceber que a reforma trabalhista trouxe impactos negativos aos direitos conquistados, com muito sacrifício, pelos trabalhadores. Nota-se a inconstitucionalidade da alteração do artigo 790, visto que referida alteração teve como objetivo restringir e dificultar, severamente, o acesso dos trabalhadores à Justiça do Trabalho, visto que, estabelecer um critério fixo para se conceder o benefício da justiça gratuita ofende vastamente o livre acesso ao judiciário. No entanto, ainda que não se estabeleça a compreensão de sua inconstitucionalidade, há diversos mecanismos interpretativos há serem usados para ampliar o acesso até então restringido e mitigado, frustrando, a intenção daqueles que patrocinam a reforma.


REFERÊNCIAS

Anamatra-STF-ADI-DanoMoral-Tabela-Inicial – Disponível em: http://redir.stf.jus.br/estfvisualizadorpub/jsp/consultarprocessoeletronico/ConsultarProcessoEletronico.jsf?seqobjetoincidente=5335465. Acesso em 27 de setembro de 2018.

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CALDAS, Edson . Reforma Trabalhista: indenização por dano moral será limitada e baseada no salário da vitima. Disponível em: https://epocanegocios.globo.com/Carreira/noticia/2017/07/reforma-trabalhista-indenizacao-por-dano-moral-sera-limitada-e-baseada-no-salario-da-vitima.html. Acesso em 05 de julho de 2018.

DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro – Responsabilidade Civil. 19 ed. São Paulo: Saraiva, 2003. VII.

ELIAS, Stella Muniz Campos, O dano moral na Justiça do Trabalho: elementos caracterizadores e reparação. Disponível em; http://www.ambitojuridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=18255&revista_caderno=25. Acesso em 09 de agosto de 2018.

FILHO, Roberto Dala Barba. A inconstitucionalidade da Tarifação da Indenização por dano Extrapatrimonial no Direito do Trabalho. Disponível em :https://juslaboris.tst.jus.br/bitstream/handle/20.500.12178/122554/2017_barba_filho_inconstitucionalidade_tarifacao.pdf?sequence=1&isAllowed=y. Acesso em 29 de novembro de 2018.

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VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: Responsabilidade civil. Vol. IV. 5.ed. São Paulo: Atlas, 2009.

BASTOS, Celso Ribeiro Bastos. Comentários à Constituição do Brasil. 2º volume. 1ª ed. São Paulo: Saraiva, 1989, p. 374

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Sobre as autoras
Cleidilene Freire Souza

Professora do Curso de Direito da UNIPAC de Teófilo Otoni; Especialista em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho.

Iasmim Lima Medina

Acadêmica do 10º período do curso de Direito da Faculdade Presidente Antônio Carlos – UNIPAC Teófilo Otoni-MG

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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