Em regra , o reconhecimento da especialidade da atividade depende da comprovação de exposição a agentes nocivos ou prejudiciais à saúde ou à integridade física.
Excepcionalmente, alguns períodos são considerados especiais mesmo sem a demonstração da especialidade, quando o afastamento do segurado ocorrer no exercício de atividade considerada especial, tais como nas suas férias ou no recebimento de benefício por incapacidade.
Ao regulamentar o assunto, o art. 65 do Decreto nº 3.048/99 passou por quatro redações diferentes:
(a) inicialmente, o dispositivo reconhecia a continuidade da especialidade durante as férias, licença médica e o recebimento de auxílio-doença, desde que, nesse último caso, o afastamento do trabalho fosse derivado do desempenho da atividade especial: “Considera-se tempo de trabalho, para efeito desta Subseção, os períodos correspondentes ao exercício de atividade permanente e habitual (não ocasional nem intermitente), durante a jornada integral, em cada vínculo trabalhista, sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, inclusive férias, licença médica e auxílio-doença decorrente do exercício dessas atividades”;
(b) contudo, menos de seis meses depois da entrada em vigor, o art. 65 foi alterado pelo Decreto nº 3.265/99, apenas para modificação do texto sobre a jornada de trabalho em cada um dos vínculos do segurado. Logo, manteve a exigência do afastamento por incapacidade laborativa em decorrência da especialidade da atividade como condição para o reconhecimento do período especial durante a fruição do auxílio-doença: “Considera-se tempo de trabalho, para efeito desta Subseção, os períodos correspondentes ao exercício de atividade permanente e habitual (não ocasional nem intermitente), durante toda a jornada de trabalho, em cada vínculo, sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, inclusive férias, licença médica e auxílio-doença decorrente do exercício dessas atividades”;
(c) na sequência, o Decreto nº 4.882/2003 modificou novamente o art. 65 do Decreto nº 3.048/99, para acrescentar os afastamentos do trabalho para recebimento dos benefícios de aposentadoria por invalidez e salário maternidade (este recebido em período de desempenho de atividade especial) e para esclarecer que apenas os benefícios por incapacidade acidentários (ou seja, decorrentes de doença ou acidente de trabalho) permitem a continuidade da contagem do tempo como especial: “(...) Parágrafo único. Aplica-se o disposto no caput aos períodos de descanso determinados pela legislação trabalhista, inclusive férias, aos de afastamento decorrentes de gozo de benefícios de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez acidentários, bem como aos de percepção de salário-maternidade, desde que, à data do afastamento, o segurado estivesse exercendo atividade considerada especial”;
(d) Por fim, nova mudança foi promovida pelo Decreto nº 8.123/2013, para substituir a menção à atividade especial pela comprovação da exposição aos fatores de risco, mas manteve o recebimento de benefício por incapacidade acidentário como condição para a contagem do tempo especial a partir do afastamento do trabalho: “(...) Parágrafo único. Aplica-se o disposto no caput aos períodos de descanso determinados pela legislação trabalhista, inclusive férias, aos de afastamento decorrentes de gozo de benefícios de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez acidentários, bem como aos de percepção de salário-maternidade, desde que, à data do afastamento, o segurado estivesse exercendo atividade considerada especial”.
Portanto, após inicialmente considerar suficiente apenas a prova da especialidade da atividade para manter a contagem do tempo especial durante o afastamento para a percepção de auxílio-doença, o Regulamento passou a exigir, a partir de 2003, a prova de que esse afastamento foi causado por doença ou acidente do trabalho, ou seja, por fator inerente à atividade prejudicial.
Ao apreciar essa mudança de regras, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu a questão no IRDR nº 8 e fixou a seguinte tese: “O período de auxílio-doença de natureza previdenciária, independente de comprovação da relação da moléstia com a atividade profissional do segurado, deve ser considerado como tempo especial quando trabalhador exercia atividade especial antes do afastamento”.
O fundamento principal da tese está na restrição indevida, pelo parágrafo único do art. 65 do Decreto nº 3.048/99, da tutela diferenciada conferida pelo art. 57, §§ 3º a 5º, da Lei nº 8.213/91, ao segurado que desempenhar atividades submetidas a condições especiais. Concluiu-se que mesmo que não haja relação direta da incapacidade com a atividade (ou que não tenha sido possível produzir essa prova), o desempenho de trabalho em condições nocivas à saúde, por si só, é um fator relevante no aumento de doenças, relacionadas – ou não – diretamente com as funções desempenhadas, o ambiente laboral etc. Logo, independentemente do nexo causal, não poderia o regulamento restringir a proteção legal.
Contra o acórdão proferido nos recursos afetados no IRDR nº 8 do TRF4, foram interpostos recursos especiais pelo INSS, que deram origem ao Tema nº 998 dos Recursos Repetitivos Superior Tribunal de Justiça.
Ao julgar o Tema nº 998, a 1ª Seção do STJ manteve a interpretação conferida pelo TRF4. Ao declarar a ilegalidade da condição imposta pelo parágrafo único do art. 65 do Decreto nº 3.048/99, a partir das modificações realizadas pelo Decreto nº 4.882/2003, o relator dos recursos afetados ao Tema ressaltou que a norma permite a contagem em situações de suspensão de contrato de trabalho (tais como férias e recebimento de salário-maternidade), ou seja, com o afastamento do segurado da exposição aos agentes agressivos, razão pela qual não depende da natureza do benefício de auxílio-doença (previdenciário ou acidentário). Por isso, conclui que a contagem – ou não – do tempo especial durante o recebimento de auxílio-doença depende apenas da comprovação do desempenho de atividade considerada especial até o dia anterior ao afastamento do trabalho.