Alteração provisória da LFRE
O projeto também elenca inúmeras alterações da Lei nº 11.101/2005, todas em caráter transitório.
É importante notar que muitas economias relevantes de todos os continentes no mundo também entenderam adequado flexibilizar regras de acesso aos mecanismos de recuperação empresarial, com o propósito de oferecer às empresas oportunidades de manter suas atividades compatíveis com a gravidade da crise econômica decorrente da pandemia do Covid-19.
Nesse sentido, o substitutivo ao Projeto de Lei nº 1.397/20 está absolutamente em linha com as melhores práticas internacionais no que diz respeito ao combate aos efeitos econômicos da pandemia.
A primeira alteração importante é modificação do quórum, exigido pelo caput do art. 163 da Lei nº 11.101/2005, para o requerimento da homologação de recuperação extrajudicial, que passa a ser de metade mais um de todos os créditos de cada espécie, abrangidos pelo plano de recuperação extrajudicial. De acordo com a redação original do art. 163 da LFRE, o devedor poderá requerer a homologação de plano de recuperação extrajudicial desde que assinado por credores que representem mais de 3/5 (três quintos) de todos os créditos de cada espécie por ele abrangidos. O projeto autoriza, ainda, que o referido pedido seja apresentado com comprovação da anuência de credores que representem pelo menos 1/3 (um terço) de todos os créditos de cada espécie por ele abrangidos, acompanhado de um compromisso de, no prazo improrrogável de 90 (noventa) dias, contados da data do pedido, atingir o quórum exigido. Ademais, o devedor poderá, facultativamente, solicitar a conversão do procedimento em recuperação judicial.
Facilita-se e incentiva-se, portanto, o uso da recuperação extrajudicial como estratégia de enfrentamento da crise, caso as medidas de prevenção anteriores não tenham sido suficientes para a superação dos problemas econômicos e financeiros causados pela pandemia.
A exigibilidade das obrigações assumidas pelo devedor nos planos de recuperação judicial ou extrajudicial, já homologados, independentemente de deliberação da assembleia geral de credores, ficará suspensa pelo prazo de 120 (cento e vinte) dias. Nesse período também não poderá haver decretação da falência, fundamentada no descumprimento de qualquer obrigação assumida no plano de recuperação. Objetiva-se, no caso, dar a empresas em processo de recuperação o tempo necessário para que possam avaliar os impactos da crise e apresentar um novo plano de recuperação para avaliação dos seus credores.
O projeto autoriza também a apresentação de novos planos de recuperação judicial ou extrajudicial, independentemente de já ter havido ou não a homologação do plano original. O novo plano conferirá direito a novo período de suspensão, conforme previsto no art. 6º da Lei nº 11.101/2005, limitado ao período de suspensão de 120 (cento e vinte) dias, mencionado acima. No novo plano, deduzidos os valores pagos no cumprimento do plano anterior, serão considerados os créditos originariamente titularizados pelos credores, tanto para apuração do montante a pagar, quanto para a definição de quóruns de deliberações.
Importante destacar que o substitutivo ao Projeto de Lei nº 1.397/20 autoriza a inclusão das obrigações originadas depois do ajuizamento do pedido de recuperação no novo plano. A ideia é equacionar também esse passivo relevante que, originalmente, não estaria sujeito ao processo de recuperação e que poderia provocar a falência do devedor, independentemente da renegociação do passivo originalmente sujeito aos efeitos recuperacionais. Entretanto, o substitutivo teve o cuidado de excluir dos efeitos desse novo plano os créditos já excluídos dos efeitos da recuperação empresarial por disposição legal, bem como os créditos decorrentes de financiamento DIP (Debtor-in-possession) tomados pela devedora. Assim, protege-se esse tipo de crédito e incentiva-se que credores e demais agentes financiadores continuem fornecendo de maneira segura esse tipo de empréstimo para empresas em recuperação extrajudicial ou judicial.
Estão dispensados para o pedido de recuperação extrajudicial e judicial os requisitos do art. 48, caput, incisos II e III, e § 3º do art. 161 da Lei nº 11.101/2005. No primeiro caso, ante o teor do art. 48 da LFRE, com as modificações do projeto, mesmo os devedores que tenham obtido há menos de 5 (cinco) anos, no momento do pedido, concessão de recuperação judicial, poderão pretender a recuperação extrajudicial ou judicial. No mesmo sentido, considerando o art. 161, §3, da LFRE, o devedor poderá requerer a homologação de plano extrajudicial, ainda que pendente pedido de recuperação judicial ou que tenha objeto recuperação judicial ou homologação de outro plano de recuperação extrajudicial há menos de 2 (dois) anos.
O limite mínimo para a decretação da falência, de valor equivalente a 40 (quarenta) salários mínimos, nos termos do art. 94, I, da LFRE, passa a ser de R$ 100.000,00 (cem mil reais), na data do pedido de falência.
Com relação ao plano de recuperação judicial de microempresa e empresa de pequeno porte, previsto nos artigos 70 a 72, da LFRE, o projeto prevê basicamente o seguinte: i) o plano preverá parcelamento dos débitos em até 60 (sessenta) parcelas mensais, iguais e sucessivas, admitida a concessão de desconto ou deságio; ii) o plano estipulará o pagamento da primeira parcela no prazo máximo de 360 (trezentos e sessenta) dias, contado da distribuição do pedido de recuperação judicial ou de seu aditamento; iii) a apresentação de objeções pela maioria dos credores não mais acarretará a decretação da falência, mas simplesmente a extinção do processo sem julgamento do mérito.
Por fim, o projeto ainda prevê, no âmbito da recuperação judicial, a suspensão de atos administrativos de cassação, revogação, impedimento de inscrição, registro, código ou número de contribuinte fiscal, independentemente da sua espécie, modo ou qualidade fiscal, sob a sujeição de qualquer entidade da federação que estejam em discussão judicial. Pretende-se, assim, evitar que medidas administrativas com efeito análogo aos atos expropriatórios sejam implementados em detrimento da atividade econômica por esse breve período de tempo.
Conclusão
Pelo exposto, resta evidente que o Substitutivo ao Projeto de Lei nº 1.397/20 identifica bem os problemas causados pela crise da Pandemia da Covid-19 nas atividades das empresas e dos agentes econômicos e, na esteira da melhor prática internacional, aplica as técnicas adequadas para neutralização do desequilíbrio econômico-financeiro gerador da onda de inadimplência que teria o condão de dizimar empresas, empregos e riquezas no Brasil.
Aguarda-se, portanto, sua rápida aprovação pelo Congresso Nacional como medida necessária à preservação dos benefícios econômicos e sociais decorrentes das atividades empresariais e dos interesses maiores da Nação.
Nota
[1] Foram apensados ao Projeto de Lei nº 1.397/2020 ou outros três Projetos de Lei, que também tratam de questões relacionadas à insolvência empresarial e os efeitos da crise sanitária do Covid-19. Os Projetos de Lei são os seguintes: Projeto de Lei nº 1.781/2020; Projeto de Lei nº 2.067/2020 e Projeto de Lei nº 2.070/2020.