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Pandemia, Lei de Responsabilidade Fiscal e eleições 2020: três ingredientes de uma bomba-relógio!

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06/06/2020 às 08:30
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A poucos meses das eleições de 2020, o Brasil, ainda imerso em calamidade pública, começa a refletir sobre as prováveis combinações para o desarmamento desse imbróglio.

Os coronavírus constituem-se numa família de vírus que costuma causar infecções nos seres humanos. Normalmente essas infecções afetam o sistema respiratório, podendo ser semelhantes à gripe ou evoluir para uma doença mais grave, como pneumonia.

Em anos anteriores, foram identificados alguns coronavírus que provocaram surtos e infeções respiratórias graves em humanos. Exemplos disto foram: entre 2002 e 2003, a síndrome respiratória aguda grave (infecção provocada pelo coronavírus SARS-CoV); e em 2012, a síndrome respiratória do Médio Oriente (infecção provocada pelo coronavírus MERS-CoV).

O novo coronavírus, designado COVID-19, foi identificado pela primeira vez em 31/12/2019 na China, na cidade de Wuhan. Este novo agente nunca tinha sido identificado anteriormente em seres humanos. A fonte da infecção é ainda desconhecida.

A decisão do governo federal está ligada ao uso de recursos para combater a crise instalada com a disseminação do vírus no Brasil (COVID-19). Isso porque o estado de calamidade pública permite que o governo não atinja sua meta de resultado fiscal.

A pergunta que não quer calar: teremos eleições? O que se sabe é que o adiamento das eleições municipais caberá ao Congresso Nacional e qualquer prorrogação de mandato, seja ao menos em um dia, ferirá de morte a Constituição.

Calamidade ou catástrofe significa desgraça pública, flagelo. Podemos definir como estado de calamidade pública uma situação anormal, provocada por desastres, causando danos e prejuízos que impliquem o comprometimento substancial da capacidade de resposta do poder público do ente atingido.

O termo calamidade pública costuma ser associado também à expressão estado de emergência. Ambas estão relacionadas, mas não significam exatamente a mesma coisa em termos legais.

A decisão do governo federal está ligada ao uso de recursos para combater a crise instalada com a disseminação do vírus no Brasil (COVID-19). Isso porque o estado de calamidade pública permite que o governo não atinja sua meta de resultado fiscal.

A Lei de Responsabilidade Fiscal, sancionada em 2000 pelo então presidente Fernando Henrique Cardoso, impõe uma série de exigências sobre como o dinheiro público deve ser empregado. Entre elas está a determinação de que haverá uma meta de resultado primário que deve ser cumprida pelo governo. O resultado primário é a diferença entre o que o governo arrecadou e o que gastou, sem contar o dinheiro que foi usado para pagamento de juros da dívida pública.

Na prática, decretar estado de calamidade pública permitirá ao governo gastar mais do que o previsto com medidas para conter os efeitos da Covid-19, e de forma mais rápida. A Lei de Licitações, por exemplo, prevê dispensa de licitação nesses casos, "quando caracterizada urgência de atendimento de situação que possa ocasionar prejuízo ou comprometer a segurança de pessoas, obras, serviços, equipamentos e outros bens, públicos ou particulares". Os efeitos devem valer até 31 de dezembro de 2020.

É a primeira vez que o Brasil entrará em estado de calamidade desde o início dos efeitos da Lei de Responsabilidade Fiscal, em 2000. A União ficará dispensada de obedecer à meta fiscal prevista para este ano – a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) permite a suspensão das regras fiscais e da necessidade de bloqueio de gastos durante ao período. O orçamento de 2020, sancionado pelo presidente Jair Bolsonaro, admite déficit fiscal de até R$ 124,1 bilhões nas contas públicas. Sem a limitação, o governo poderá gastar o quanto julgar necessário para reduzir os danos do coronavírus, podendo socorrer setores em crise, como companhias aéreas, e flexibilizar o pagamento de impostos.

O estado de calamidade pública é um termo definido por um decreto de 2010, editado pelo então presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Segundo o texto, é caracterizado por "uma situação anormal, provocada por desastres, causando danos e prejuízos que impliquem o comprometimento substancial da capacidade de resposta do poder público do ente atingido". Ele pode ser decretado por prefeituras, Estados e União. Em geral, a calamidade é decretada quando, em razão da magnitude dos danos, o estado requer auxílio direto e imediato para arcar com os custos do atendimento. É o nível mais grave de atenção possível.

Com a decretação de estado de calamidade pública, algumas barreiras e impeditivos legais para a concessão de novos socorros e empréstimos podem ser superadas, e até financiamentos de órgãos federais poderiam ser liberados. Além disso, recursos carimbados para determinadas áreas podem ser remanejados para outros compromissos. O documento também determina a criação de uma comissão mista, formada por seis deputados e seis senadores, para acompanhar a situação fiscal e a execução orçamentária e financeira das medidas relacionadas à emergência de saúde pública.

A Constituição permite que, em casos de calamidade pública, o governante tome os chamados empréstimos compulsórios, sobre os quais falamos em nossa trilha sobre tributos. Além disso, o governante pode passar a parcelar as dívidas, atrasar a execução de gastos obrigatórios e antecipar o recebimento de receitas. O estado ou município afetado também pode ficar dispensado de realizar licitação em obras e serviços enquanto durar a calamidade. Finalmente, a população atingida pode sacar parte do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS).

O Governo Federal normalmente ajuda em emergências com itens de ajuda humanitária, envio da Defesa Civil ou até das Forças Armadas, além de recursos financeiros. O sistema constitucional das crises prevê, como formas de defesa do Estado e das instituições, os Estados de Defesa, de Sítio e a Intervenção Federal. A Calamidade Pública não está expressamente prevista no texto constitucional, derivando de uma interpretação sistemática de dispositivos estaduais, municipais e da Lei de Responsabilidade Fiscal, em seu art. 65, numa perspectiva de diálogo de fontes.

Infere-se que o fundamento do Estado de Calamidade é eminentemente financeiro, pois impõe maiores gastos para o governo, além do que foi orçado para o ano, relativizando o orçamento público.

Na situação atual, estão sendo usados bilhões de reais a mais para gastos com a saúde pública: investimento em leitos, respiradores, insumos, mais médicos, transportes e UTIs. Concomitantemente a isto, as empresas estão suspendendo suas atividades, o que contribui para uma menor geração de renda e tributos. Em resumo: os gastos vão aumentar, a receita e a tributação diminuirão e um grande déficit será gerado.

A calamidade pública decretada não tem natureza constitucional. Ela é prevista na LRF. Por não ter natureza constitucional, é voltada para a questão fiscal, não de outra natureza. A medida tampouco impede aprovação de Propostas de Emenda Constitucional (PECs) e outro tipo de matéria. A vedação a PECs ocorreria em situações de estado de defesa, de sítio ou intervenção federal.

A medida não estende seus efeitos de liberar o cumprimento de regras fiscais previstas na Lei de Responsabilidade Fiscal aos Estados e Municípios, que tendem a seguir o mesmo caminho do governo federal. A decretação de calamidade não libera o governo de cumprir o teto de gastos e a “regra de ouro” das contas públicas, que são dispositivos fiscais previstos na constituição.

O objetivo, evidentemente, é municiar o Estado de “armas legais” para que possa combater a crise sistêmica instalada, preservando vidas e protegendo o patrimônio particular e a segurança da população.

Situações extremas requerem medidas extremas. É por isso que, em caso de estado de calamidade pública, o governante tem à sua disposição poderes que em situações normais seriam considerados abusivos, a fim de salvaguardar a população atingida. Além disso, o governante passa a compartilhar responsabilidades com outros entes, principalmente o Governo Federal.

Este quadro não estava previsto no planejamento orçamentário de 2020, pois jamais se imaginou que seríamos atingidos por uma pandemia de tamanho impacto. Por isso, a decretação de calamidade pública, como forma de viabilizar a execução financeira da Lei 13.979/2020, foi acertada e necessária.

No ano de eleições municipais a pandemia fez surgir questionamentos quanto à realização das eleições, cabendo ao Congresso Nacional decidir sobre o tema, a decisão sobre a prorrogação de mandato, seja ao menos em um dia, fere a Constituição Brasileira. Mudança da Lei, necessária para garantir a segurança de todos deverá acontecer por meio de uma Proposta de Emenda Constitucional.

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Líderes partidários da Câmara dos Deputados e do Senado Federal estão costurando um acordo para adiar as eleições municipais de outubro para o dia 6 de dezembro, em decorrência da pandemia de covid-19. A data já havia sido citada pelo presidente Rodrigo Maia (DEM-RJ), que disse também considerar o dia 15 de novembro como outra data possível.

Entre líderes da Câmara há quase unanimidade pela escolha do dia 6 de dezembro, mas ainda não há um acordo fechado. No Senado também há expressivo apoio ao adiamento das eleições municipais para 6 de dezembro. A alteração está em uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC), apresentada pelo senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP).  A proposta foi subscrita por outros 26 senadores e prevê que o segundo turno será no dia 20 de dezembro de 2020. Por ora, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) decidiu por manter o calendário eleitoral. Sendo assim, foi redigida a Resolução nº 23.615/2020, pelo TSE, em que trata da realização de sessões por meio de videoconferência para buscar soluções viáveis para o andamento dos processos na Justiça Eleitoral em meio às medidas impostas pela Organização Mundial da Saúde de restrição de circulação de pessoal.

É constitucional o rompimento dos limites estabelecidos na Lei de Responsabilidade Fiscal em tempos de crise causada por epidemia, deferível a todos os entes da federação. Com esse entendimento, o Supremo Tribunal Federal referendou a liminar do ministro Alexandre de Moraes, concedida em uma ação direta de inconstitucionalidade, posteriormente foi promulgada pelo Congresso a Emenda Constitucional 106, chamada de "orçamento de guerra", que traz a mesma disposição.

O adiamento das eleições municipais para 2022 caberá ao Congresso Nacional e qualquer prorrogação de mandato, seja ao menos em um dia, fere a Constituição Brasileira. Uma mudança da lei, necessária para garantir a segurança de todos, deverá acontecer por meio de uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC). Para que uma PEC entre em vigor, é necessário votação em dois turnos no Senado e na Câmara com apoio de, no mínimo, três quintos dos congressistas em cada casa legislativa.


Referências bibliográficas

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Sobre o autor
Benigno Núñez Novo

Pós-doutor em direitos humanos, sociais e difusos pela Universidad de Salamanca, Espanha, doutor em direito internacional pela Universidad Autónoma de Asunción, com o título de doutorado reconhecido pela Universidade de Marília (SP), mestre em ciências da educação pela Universidad Autónoma de Asunción, especialista em educação: área de concentração: ensino pela Faculdade Piauiense, especialista em direitos humanos pelo EDUCAMUNDO, especialista em tutoria em educação à distância pelo EDUCAMUNDO, especialista em auditoria governamental pelo EDUCAMUNDO, especialista em controle da administração pública pelo EDUCAMUNDO, especialista em gestão e auditoria em saúde pelo Instituto de Pesquisa e Determinação Social da Saúde e bacharel em direito pela Universidade Estadual da Paraíba. Assessor de gabinete de conselheiro no Tribunal de Contas do Estado do Piauí.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

NOVO, Benigno Núñez. Pandemia, Lei de Responsabilidade Fiscal e eleições 2020: três ingredientes de uma bomba-relógio!. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 25, n. 6184, 6 jun. 2020. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/82727. Acesso em: 21 nov. 2024.

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