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Limitações ao poder de tributar em correlação aos direitos e garantias fundamentais do cidadão

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10/07/2020 às 14:40
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4 IMUNIDADES TRIBUTÁRIAS

Por imunidades tributárias compreende-se instituto de caráter constitucional que objetiva impedir, por motivos que o constituinte considera de especial relevo, que os poderes de tributação pertencentes ao Estado invadam áreas que, no interesse da sociedade, devam ser preservadas[21]. Consonante aos ensinamentos de Leandro Paulsen:

As regras constitucionais que proíbem a tributação de determinadas pessoas, operações, objetos e de outras demonstrações de riqueza, negando, portanto, competência tributária, são chamadas de imunidades tributárias. Isso porque tornam imunes à tributação as pessoas ou base econômicas nelas referidas relativamente aos tributos que a própria regra constitucional negativa de competência específica. (...)

Por se tratar de normas de competência, ainda que negativas, as imunidades têm foro exclusivo na Constituição, são numerus clausus[22].

Antes de citarmos as espécies de imunidades tributárias previstas no texto constitucional, devemos diferenciar os termos técnicos "imunidade" e "isenção". Conforme já conceituado, imunidades seriam os mandamentos constitucionais de caráter proibitivo que, destinados ao legislador, possuem o condão de obstar a atividade legiferante sobre determinadas normas tributárias. Já a isenção pode ser conceituada como uma das causas excludentes do crédito tributário que, prevista exclusivamente em lei (infraconstitucional), poderia ser revogada a qualquer tempo, desde que não seja concedida por prazo determinado[23] (CTN, arts. 176-178). Ressalta-se que tal diferenciação é necessária, pois, embora o texto constitucional preveja sobre determinadas hipóteses de isenção (CF, art. 195, § 7º), quis o constituinte, na verdade, se referir à imunidades, pois estas é que são as normas de caráter constitucional que possuem a capacidade de impor limites à tributação do Estado.

4.1 Imunidade recíproca

Conforme dispõe o art. 150, inciso VI, alínea a), da Constituição Federal, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios instituir impostos[24] sobre o patrimônio, a renda ou serviços, uns dos outros. Trata-se da chamada imunidade recíproca. O proibitivo constitucional possui fundamento na forma federativa adotada pelo Estado brasileiro. Se assim não o fosse, poderia a União, por exemplo, criar impostos de maneira excessiva sobre patrimônio ou renda de determinado Estado que não estivesse alinhado com as suas políticas públicas, acabando por interferir na autonomia deste. Sendo assim, padeceria de vício de inconstitucionalidade Proposta de Emenda à Constituição que visasse revogar a referida garantia, ao passo que teria teor de abolir a forma federativa do Estado (CF, art. 60, § 4).

Como outra forma de fundamentar a imunidade recíproca, pode ser citada lição doutrinária que afirma ser a tributação por meio de impostos - pelo fato desse tributo não depender de atuação estatal - pressuposto uma supremacia de quem tributa em relação ao tributado. Levando em consideração que entre os entes da federação existe relação de autonomia, e de não subordinação, seria contrário aos preceitos da Carta Constitucional à instituição de impostos sobre rendas e serviços entre as pessoas políticas do Estado, mesmo que não houvesse disposição expressa no texto da Norma Fundamental[25].

4.2 Imunidade aos templos de qualquer culto

De acordo com o art. 5º, inciso VI, da CF/88, é inviolável a liberdade de consciência e de crença. Ademais, é garantido o livre exercício dos cultos religiosos[26]. De forma que é vedado ao Estado embaraçar o funcionamento dos cultos em questão (CF, art. 19, inciso I), não seria de se estranhar que houvesse imunidade tributária nesse sentido. Conforme já entendeu o Supremo Tribunal Federal, caso a entidade religiosa possua um imóvel e o alugue a terceiro, esse bem continuará imune à incidência dos impostos[27]. Esse é o teor da súmula vinculante nº 52:

Súmula Vinculante 52: Ainda quando alugado a terceiros, permanece imune ao IPTU o imóvel pertencente a qualquer das entidades referidas pelo art. 150, VI, "c", da Constituição Federal, desde que o valor dos aluguéis seja aplicado nas atividades para as quais tais entidades foram constituídas.

Ainda de acordo com a jurisprudência, o cemitério utilizado em celebrações pela entidade religiosa também goza de imunidade tributária, desde que o cemitério faça parte de sua extensão[28]. Por fim, a Suprema Corte fixou o entendimento de que as organizações maçônicas não gozam da imunidade concedida aos templos religiosos, pois não estariam incluídas no conceito de "templos de qualquer culto", na medida em que a maçonaria é vista como uma ideologia de vida, e não como uma religião[29].

4.3 Imunidade sobre o patrimônio, renda ou serviços dos partidos políticos, inclusive suas fundações, das entidades sindicais, dos trabalhadores, das instituições de educação e de assistência social sem fins lucrativos

São os partidos políticos, pessoas jurídicas de direito privado, que possuem o objetivo de assegurar, no interesse do regime democrático, a autenticidade do sistema representativo e a defender os direitos fundamentais definidos na Constituição Federal[30]. As fundações a que o postulado se refere são aquelas de caráter privado e mantidas pelos partidos políticos, conforme dispõem as normas do Código Civil (CC, art. 62). As entidades sindicais seriam as associações de pessoas físicas ou jurídicas, que têm atividades econômicas ou profissionais, visando à defesa dos interesses coletivos ou individuais dos membros da categoria[31].

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Ao estabelecer a presente imunidades às referidas pessoas jurídicas, quis o constituinte assegurar os direitos fundamentais ao pluralismo político (CF, art. 1º, inciso V), à liberdade de associação civil (CF, art. 5º, incisos XVII, XVIII, XX, XXI) e sindical (CF, art. 8º).

Assim como já decidiu a Corte em favor das entidades religiosas, o imóvel pertencente às referidas pessoas jurídicas continuará imune aos impostos que poderiam, em tese, incidir sobre o bem, desde que a renda seja utilizada nas atividades essenciais da entidade (Súmula Vinculante nº 52). Ainda, o fato de o imóvel estar vago, ou sem edificação, não é suficiente, por si só, para retirar a imunidade prevista[32]. Ademais, prevê o STF na súmula de número 730:

Súmula 730: A imunidade tributária conferida a instituições de assistência social sem fins lucrativos pelo art. 150, VI, "c", da Constituição, somente alcança as entidades fechadas de previdência social privada se não houver contribuição dos beneficiários.

Por fim, cumpre ressaltar, também, que já entendeu o Superior Tribunal de Justiça que a entidade de assistência social que exerce atividade econômica, explorando o que seria uma agência franqueada dos Correios, não goza de imunidade, pois, no caso em questão, a atividade não estaria relacionada com as finalidades institucionais de assistência social[33].

4.4 Imunidade sobre livros, jornais, periódicos e o papel destinado a sua impressão

A garantia em questão objetiva retirar empecilhos ao compartilhamento do conhecimento e da informação. Visa a efetivar os direitos fundamentais da livre manifestação do pensamento, desde que não seja feita de forma anônima (CF, art. 5º, inciso IV), assim como também a liberdade de expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença (CF, art. 5º, inciso IX). Também pode ser citado como fundamento jurídico o direito de acesso à informação e proteção ao sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional (CF, art. 5º, inciso XIV). Desse modo, a referida imunidade é conhecida como imunidade tributária cultural. De acordo com balizada doutrina, a imunidade cultural seria a única puramente objetiva, de forma a impedir, tão somente, a cobrança de impostos incidentes diretamente sobre os livros, jornais, periódicos e sobre o papel destinado à sua impressão[34].

Já foi feito questionamento no sentido de existir a possibilidade do conteúdo dos livros interferir sobre a incidência (ou não) da imunidade. De acordo com a consagrada lição constitucional, não é lícito ao intérprete dar caráter restritivo às normas em questão se a própria Constituição não o faz. Dessa forma, decidiu o STF no sentido de afastar a possibilidade do aferimento do valor cultural das publicações. Aferimento esse que seria exercido com o sentido de outorgar, ou não, a imunidade[35]. Em outro importante julgado, em que se deparou com as constantes inovações tecnológicas, a Suprema corte fixou o entendimento de que a imunidade prevista no art. 150, VI, "d", da CF/88 alcança, também, o livro digital (e-book), inclusive os suportes exclusivamente utilizados para fixá-lo[36]. Por último, o Pretório Excelso julgou que os serviços de distribuição de livros[37], assim como os serviços de composição gráfica[38], não gozam do benefício da imunidade.


5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Não obstante não estarem previstas, no art. 5º da Constituição Federal, as limitações constitucionais ao poder de tributar (no que se inclui as imunidades tributárias), funcionam como verdadeiras garantias fundamentais do contribuinte. Conforme demonstrado, cada seção das limitações em questão possui correlação com um ou mais direitos fundamentais espalhados pela Carta Magna. Assim, cumpre ao legislador e ao Poder Judiciário, assim como ao administrador público, efetivar as normas tributárias em questão, dando a elas a interpretação adequada, conferindo eficácia às normas constitucionais.


REFERÊNCIAS

ALEXANDRE, Ricardo. Direito Tributário. 13. ed. Salvador: Ed. JusPodivm, 2019.

ÁVILA, Humberto. Sistema Constitucional Tributário. São Paulo: Saraiva, 2004.

CARRAZZA, Roque Antônio. Curso de Direito Constitucional Tributário. 27. ed. São Paulo: Malheiros, 2011.

CUNHA JÚNIOR, Dirley da. Curso de Direito Constitucional. 10. ed. Salvador: JusPODIVM, 2016.

GARCIA, Gustavo Filipe Barbosa. Manual de Direito do Trabalho. 11. ed. Salvador: Ed. Juspodivm, 2018.

GOMES, José Jairo. Direito Eleitoral. 13. ed. São Paulo: Atlas, 2017.

HARADA, Kiyoshi. Direito Financeiro e Tributário. 25. ed. São Paulo: Atlas, 2016.

MARTINS, Ives Gandra da Silva. Uma Teoria do Tributo. São Paulo: Quartier Latin, 2005.

MENDES, Gilmar Ferreira; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. 13. ed. São Paulo: Saraiva, 2018.

PAULSEN, Leandro. Curso de Direito Tributário Completo. 10. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2019.

PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil - v. I. 30. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2017.

SARLET, Ingo Wolfgang. A Eficácia dos Direitos Fundamentais. 12. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2015.

SUNDFELD, Carlos Ari. Fundamentos do Direito Público. 4. ed. São Paulo: Malheiros, 2009.

TARTUCE, Flávio. Manual de Direito Civil. 7. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2017.

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Sobre o autor
Thiago da Penha Lima

Mestre em Constitucionalismo e Direitos na Amazônia pela Universidade Federal do Amazonas. Especialista em Direito Tributário e em Direito Processual Civil Aplicado. Assessor Jurídico no Tribunal de Justiça do Estado do Amazonas. Professor Universitário. Advogado.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LIMA, Thiago Penha. Limitações ao poder de tributar em correlação aos direitos e garantias fundamentais do cidadão. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 25, n. 6218, 10 jul. 2020. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/83842. Acesso em: 21 nov. 2024.

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