CONSIDERAÇÕES FINAIS
Como se percebe, a condenação do jogador Robson de Souza por crime de estupro coletivo na Justiça italiana reacende a discussão sobre a violência sexual no mundo, e no Brasil não é diferente, sobretudo quando do tema advém abordagem sobre a repercussão dos efeitos das sentenças estrangeiras, homologação, extradição e possibilidade da implantação da impunidade por questões meramente de ordem formal.
Poder-se-ia cogitar, na aplicação da extraterritorialidade penal, art. 7º, II, § 2º do CP, em face da entrada do agente em território brasileiro e da dupla tipicidade penal. Todavia, faltariam os requisitos de não ter sido o agente absolvido no estrangeiro ou não ter aí cumprido a pena e não ter sido o agente perdoado no estrangeiro ou, por outro motivo, não estar extinta a punibilidade, segundo a lei mais favorável.
Não há que se falar em extradição, mesmo porque a Constituição da República, em seu artigo 5º, inciso LI, preceitua que nenhum brasileiro será extraditado, salvo o naturalizado, em caso de crime comum, praticado antes da naturalização, ou de comprovado envolvimento em tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, na forma da lei, o que não é o caso.
Respeitando a diferença entre Extradição e Entrega, CAPEZ ensina que o Brasil poderá promover a entrega de cidadão brasileiro para ser julgado pelo Tribunal Internacional, sem violar o disposto no art. 5º, LI, de nossa CF, que proíbe a extradição de brasileiro nato e naturalizado (salvo se este último estiver envolvido em tráfico ilícito de entorpecentes ou tiver praticado crime comum antes da naturalização). Não se pode confundir extradição com entrega. O art. 102. do Estatuto de Roma deixa clara a diferença: “Por entrega, entende-se a entrega de uma pessoa por um Estado ao Tribunal, nos termos do presente Estatuto; por extradição, entende-se a entrega de uma pessoa por um Estado a outro Estado, conforme previsto em um tratado, em uma convenção ou no direito interno”. Na extradição, há dois Estados em situação de igualdade cooperando reciprocamente um com o outro, ao passo que, na entrega, um Estado se submete à jurisdição transnacional e soberana, estando obrigado a fazê-lo ante sua adesão ao tratado de sua criação.
Resta, por último, analisar a hipótese dos efeitos da sentença do artigo 9º do Código penal, segundo o qual a sentença estrangeira, quando a aplicação da lei brasileira produz na espécie as mesmas consequências, pode ser homologada no Brasil para obrigar o condenado à reparação do dano, a restituições e a outros efeitos civis, ou sujeitá-lo à medida de segurança.
Assim, verifica-se que, considerando que a sentença penal condenatória se traduz em aplicação de sanção privativa de liberdade, 09 anos de prisão, esta hipótese não é contemplada textualmente pela lei penal, e assim não pode o condenado ser preso no Brasil, nem mesmo para cumprimento de pena em algum estabelecimento penal no sistema prisional do Brasil. Existem posições contrarias, que argumentam na existência de compromissos bilaterais ou mesmo internacionais entre as Nações, o que também passam a exigir formalidades especiais em razão da soberania nacional, o que demoraria uma eternidade em busca da prescrição.
A Corte de Milão certamente representa a exuberância e beleza da cidade, da região de Lombardia. Milão, capital do design, com maior influência global no comércio, música, literatura, artes e mídia, uma das cidades principais do mundo, a musa da Justiça, e ao referendar a decisão da primeira Instância italiana, claramente o faz com base em provas robustas produzidas na instrução de primeira Instância, inclusive com apresentação de provas técnicas divulgadas para o mundo em fontes abertas.
Entretanto, diante da ausência de previsão legal no arcabouço jurídico brasileiro, mesmo em se tratando de um crime gravíssimo, hoje no Brasil, rotulado como hediondo, a teor do artigo 1º, incisos V e VI da Lei nº 8.072/90, não restaria outra solução a não ser assistir de pé toda a roupagem policroma da impunidade absurda e cruel da lei penal brasileira, que permite que um criminoso pratique condutas ignóbeis no estrangeiro e retorne ao país para desfrutar os encantos incandescentes da impunidade.
Para estancar a criminalidade organizada transnacional, e, mais que isso, evitar a propagação da impunidade no país, com recheios vexatórios, deveria o Parlamento brasileiro sair do seu conforto e de suas mordomias, propondo efetivamente a elaboração de uma lei processual penal clara, proativa, prevendo EXPRESSAMENTE a execução rápida, célere, de sentença penal condenatória estrangeira em estabelecimento penal no Brasil, após imediata homologação da decisão por autoridade judiciária cometente, que ficará tão somente adstrita às questões de ordem legal, com rigorosa observância ao princípio do devido processo legal, sobretudo, os seus corolários da autoridade competente, ampla defesa e contraditório, observância do duplo grau de jurisdição e outras previstas no art. 15. da Lei de Introdução ao Direito Brasileiro.
O Código de Processo penal, em seu artigo 788, como norma de reprodução da Lei de Introdução, aduz que a sentença penal estrangeira será homologada quando a aplicação da lei brasileira produzir na espécie as mesmas consequências e concorrem os seguintes requisitos:
I - estar revestida das formalidades externas necessárias, segundo a legislação do país de origem;
II - haver sido proferida por juiz competente, mediante citação regular, segundo a mesma legislação;
III - ter passado em julgado;
IV - estar devidamente autenticada por cônsul brasileiro;
V - estar acompanhada de tradução, feita por tradutor público.
Enquanto isso não ocorre, o povo brasileiro se acha obrigado a assistir aos conflitos políticos por conta da vacina de imunização da COVID-19, sendo coagido a conviver com pesadelos e escândalos, com concussões e peculatos de pseudo-gestores, desvios de recursos destinados à saúde, de pedaladas sem graças no jogo da vida e da zombaria Um filme de terror, sem nenhuma brisa de calmaria para lançar luzes de esperança.
Fortalecido no pensamento de Clarice Lispector, não tenho medo nem de chuvas tempestivas nem das grandes ventanias soltas, pois eu também sou o escuro da noite. E assim, diante de toda inércia do Parlamento brasileiro, um sistema oneroso, promíscuo e ineficaz, e na posição de professor e cidadão do povo, que sente na pele as injustiças da lei brasileira, gentil e humildemente apresento meu pedido de perdão ao sistema de Justiça da Nação italiana, à memória de Beccaria, e ao mundo todo pela forma benevolente de tratamento de criminosos no Brasil, fruto de uma subcultura perversa, paupérrima e avassaladora de princípios éticos, genocida de toda uma geração obrigada a conviver com o submundo dos valores amesquinhados, notadamente por ações e omissões de políticos desonestos, desalmados, que se homiziam nos porões de gabinetes suntuosos e pomposos, vivendo às custas do erário público e do sacrifício da sofrida sociedade brasileira.
Por fim, importa salientar que o Brasil aprovou recentemente a Lei de Migração, Lei nº 13.445, de 24 de maio de 2017, criando o instituto da Transferência de Execução da Pena, a partir do artigo 100, que prevê quatro requisitos, a saber:
- o condenado em território estrangeiro for nacional ou tiver residência habitual ou vínculo pessoal no Brasil;
II - a sentença tiver transitado em julgado;
III - a duração da condenação a cumprir ou que restar para cumprir for de, pelo menos, 1 (um) ano, na data de apresentação do pedido ao Estado da condenação;
IV - o fato que originou a condenação constituir infração penal perante a lei de ambas as partes; e
V - houver tratado ou promessa de reciprocidade.
Para a operacionalização do procedimento publicou-se a PORTARIA Nº 89, DE 14 DE FEVEREIRO DE 2018, que estabelece os procedimentos a serem adotados em relação à tramitação dos pedidos ativos e passivos de transferência de pessoas condenadas, no âmbito do Ministério da Justiça e Segurança Pública.
Sabe-se que o caso envolvendo o jogador Robinho foi registrado em 2013, e considerando as disposições do artigo 5º, inciso XL, da Constituição da República de 1988, que segundo as quais, a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu, não se pode aplicar no caso concreto os efeitos da Lei de Migração, que possui traços materiais.
Claro que se o jogador não pode ser extraditado e nem se aplica a ele as disposições do instituto da Transferência de Execução da Pena, em razão da irretroatividade da penal mais gravosa, a prisão não pode lhe ser importa, salvo se uma vez expedido o mandado de prisão da Justiça Italiana, agora pelo Tribunal de Cassação, o jogador for preso noutro país fora do Brasil e que haja permissão para a prisão e execução da pena.
É certo que surgirão acirradas discussões em torno do assunto na doutrina pátria, diante da falta de consenso jurídico em torno do tema, e desta forma, o indigitado jogador tem a possibilidade de lançar suas habilidosas pedaladas na fragilizada justiça brasileira, um sistema jurídico desacreditado, combalido, internado em fase terminal em Unidade de Terapia Intensiva, essencialmente falido e injusto.
E assim, em nome da sociedade brasileira é que se dirige à Justiça e ao povo italiano para apresentar o mais sincero pedido de perdão em face de um sistema legal pátrio, tão exangue e injusto, nossas eternas desculpas ao Colendo Tribunal de Milão, essa gente honesta e séria, pois nunca se imaginava um dia ter sido recebido tão bem pelo povo milanês, gente justa e séria, e agora, envergonhado pelo sistema de impunidade que se implantou no Brasil, e portanto, de joelho, grande parte da população brasileira se sente envergonhada com tudo isso, por um modelo de justiça arrogante, fraca, onerosa e injusta.
Por isso, Santo Ambrósio de Mediolano, perdoe esse povo medíocre que se sente Deus quando embrulhado numa Toga, eles não sabem que são pobres de espírito e fracos de honradez.
Perdoe-nos, Santo Ambrósio de Mediolano, aqui no Brasil a Justiça é acostumada a soltar bandidos perigosos em audiência de custódia, em nome do Pacto de São José da Costa Rica, por aqui são soltos perigosos traficantes de drogas, assaltantes e estupradores, por aqui inocentes são condenados, a Justiça não funciona, por aqui existe um esquema de prerrogativas para poucos, por aqui a Suprema Corte interfere nas atividades de outros Poderes, manda no Executivo e no Legislativo, por aqui o ativismo judicial age sem freios e sem parcimônia em nome de um mal costurado sistema de garantismo penal puramente monocular, intervencionismo doentio a favor do delinquente, dizendo que a expansão ocorre por conta da Constituição Cidadã.
Por essas bandas, Santo Ambrósio de Mediolano, as autoridades públicas que laboram com seriedade quase sempre são perseguidas por banditismo de todo lado, por aqui, há bandidos exalando suas peçonhas ideológicas por todo o lado, por aqui, Santo Protetor, as famílias são vilipendiadas e as nossas crianças são expostas ao ridículo, criminosos são transformados em artistas, conseguem liberdade provisória, saem da cadeia e logo são protagonistas de filmes, de bandido a herói, perdoe-nos Santo Ambrósio, por aqui gente honesta é perseguida por agentes da Justiça e por desalmados cidadãos de plantão que gostam de atacar quem tem compromisso com a sociedade e com a verdade. Perdoei, Santo Ambrósio de Mediolano, daqui a pouquinho vai aparecer um monte de aloprados para atacar o autor deste texto, desrespeitando o seu sagrado direito de liberdade de expressão e de pensamento, elevado à categoria de direitos fundamentais, a teor do artigo 5º, inciso IV, da CF/88. Por tudo isso, hoje e sempre, Amém…
BIBLIOGRAFIA
AZAMBUJA, Darcy. Introdução à Ciência Política. 13. Ed. São Paulo: Globo, 2001.
BRASIL, Constituição da República de 1988. Disponível em https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/ConstituicaoCompilado.htm. Acesso em 11 de dezembro de 2020.
BRASIL, Código Penal. Disponível em https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del2848compilado.htm. Acesso em 11 de dezembro de 2020.
BRASIL, Código Processo Penal. Disponível em https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689compilado.htm. Acesso em 11 de dezembro de 2020.
BRASIL, Código Processo Civil. Disponível em https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm. Acesso em 11 de dezembro de 2020
BRASIL, Código Civil. Disponível em https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406compilada.htm. Acesso em 11 de dezembro de 2020
BRASIL, Lei de Migração. Disponível em https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2017/lei/L13445.htm. Acesso em 11 de dezembro de 2020
BRASIL, Lei dos Crimes Hediondos. Disponível em https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L8072.htm. Acesso em 11 de dezembro de 2020.
CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal. Parte Geral. 1º Volume. 15ª edição. Editora Saraiva. 2011.
DELMANTO. Celso. Código Penal Anotado. Editora Saraiva.
Notas
1 BOTELHO, Jeferson. Linhas gerais sobre o beijo lascivo. É crime? Disponível em https://www.jurisway.org.br/v2/dhall.asp?pagina=32&idarea=17&id_dh=20530. Acesso em 10 de dezembro de 2020.
2 BORGES, Paulo César Corrêa; NETO, Gil Ramos de Carvalho. Estudo Comparado da Tutela Penal da Liberdade Sexual no Brasil e na Itália. Disponível em https://www.emerj.tjrj.jus.br/revistaemerj_online/edicoes/revista46/Revista46_279.pdf. Acesso em 10 de dezembro de 2020.
3 Declaração dos Direitos do Homem e do cidadão. Disponível em https://www.direitoshumanos.usp.br/index.php/Documentos-anteriores-%C3%A0-cria%C3%A7%C3%A3o-da-Sociedade-das-Na%C3%A7%C3%B5es-at%C3%A9-1919/declaracao-de-direitos-do-homem-e-do-cidadao-1789.html. Acesso em 11 de dezembro de 2020.
4 AZAMBUJA, Darcy. Pág. 62
5 DELMANTO, Celso. Págs. 91. e 91.
6 CAPEZ, Fernando. Págs. 118. e 119
Riepilogo: Lo scopo principale di questo articolo è quello di analizzare la possibilità dell'approvazione della pena penale straniera nel tribunale brasiliano, in particolare la decisione sulla condanna del calciatore Robson de Souza, robinho nel tribunale italiano con l'accusa di stupro di gruppo o violenza sessuale di gruppo. Si propone inoltre di studiare le questioni relative alle norme giuridiche brasiliane riguardanti la sovranità e l'autonomia del potere giudiziario come base costituzionale, il tema dell'istituto di estradizione, l'extraterritorialità e altre questioni correlate, dalla disposizione costituzionale, alle norme previste dalla legge sulle migrazioni, dal codice di procedura civile, dal codice civile e dal codice penale.
Parole chiavi: diritto brasiliano; stupro di gruppo; Milano; giudizio straniero; approvazione; Sovranità.