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Lei Maria da Penha: Do descumprimento das medidas protetivas de urgência

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24/12/2020 às 12:00
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3 DO DESCUMPRIMENTO DAS MEDIDAS PROTETIVAS

No dia 4 de abril de 2018, foi publicada a Lei n. 13.641, que altera dispositivos da LMP e tipifica o crime de descumprimento de medidas protetivas de urgência impostas em razão de violência contra mulheres. In verbis: Art. 24-A. Descumprir decisão judicial que defere medidas protetivas de urgência previstas nesta Lei: Pena – detenção, de 3 (três) meses a 2 (dois) anos. §1º A configuração do crime independe da competência civil ou criminal do juiz que deferiu as medidas. §2º Na hipótese de prisão em flagrante, apenas a autoridade judicial poderá conceder fiança. §3º O disposto neste artigo não exclui a aplicação de outras sanções cabíveis. (BRASIL, 2018, p. 1) O núcleo do tipo penal, ou seja, o verbo que descreve a conduta proibida pela lei penal é “descumprir”, o que denota que somente é admitido o dolo, a vontade livre e consciente para a caracterização do delito, visando o agente ao abalo à integridade física e psicológica da ofendida (AMARAL, 2018, p. 1).

De acordo com o texto, em caso de descumprimento das medidas, será aplicada de três meses a dois anos de detenção. A norma ainda estabelece que a configuração do crime independe de competência civil ou criminal do juiz que deferir a medida, e que em casos de prisão em flagrante, somente a autoridade judicial poderá conceder o direito à fiança (BRASIL, 2018).

De acordo com Amaral: na prática, sabe-se que a vigência e desenvolvimento das medidas protetivas de urgência envolvem a complexa discussão e acerto de muitas matérias relacionadas ao juízo de família. Não é raro a própria ofendida, ignorando a vigência da medida protetiva a seu favor, manter contato com o agressor para debater acerca da pensão alimentícia, guarda de filhos menores, divisão de bens etc. Nesses casos, os juízes terão muito trabalho para aplicar a nova lei, dada a diversidade das próprias medidas de proteção. (AMARAL, 2018, p. 1)

A Lei n. 13.641/2018, apesar de prever uma pena branda para o crime de descumprimento de medida protetiva de urgência (três meses de detenção), autorizando o regime aberto, em alguns casos, a condenação poderá importar no regime fechado se o agressor já tiver sido condenado pela violência doméstica com trânsito em julgado, caracterizando-se, assim, sua reincidência para fins do art. 33, § 2º, “c”, do CP. De acordo com Amaral (2018), isso pode fazer com que aumente o número de apelações contra a sentença condenatória por lesões corporais e ameaça, obstaculizando a formação do prematuro trânsito em julgado. 11

De acordo com a lei em comento, descumprida a medida protetiva de urgência deferida pelo juízo cível, o caso será de prisão em flagrante do agressor, com o seu encaminhamento à autoridade policial para lavratura do auto de prisão (BRASIL, 2018).

A fiança poderá ser arbitrada pelo delegado de polícia nos crimes que envolvam violência doméstica e familiar contra a mulher, como autoriza o art. 322 do CPP, mas somente poderá ser concedida pelo juiz no crime de descumprimento de medidas protetivas de urgência.

O art. 24-A, §2º, da Lei 13.641/2018, prevê que a imputação do crime de descumprimento de medidas protetivas de urgência não exclui a aplicação de outras sanções cabíveis (BRASIL, 2018). Segundo Amaral (2018), isso autoriza a dizer que o agressor, mesmo autuado em flagrante por esse delito, poderá, de outro lado, ver sua prisão preventiva decretada nos autos da violência doméstica anteriormente praticada.

Por fim, cabe ressaltar que a violência contra a mulher é uma realidade constante. É fato que o descumprimento de medidas protetivas de urgência não poderia ficar impune, pois suas consequências podem chegar à morte da vítima protegida. Agora, além das sanções de natureza civil (multa), administrativa (força policial) e penal (prisão preventiva), existe uma figura criminal específica que garante a punição do agressor com pena de prisão. 


4 CONCLUSÃO

Através do estudo realizado, chega-se à conclusão de que, visando a inibir condutas violentas praticadas pelo agressor, a LMP elencou medidas de proteção. As medidas protetivas servem justamente para proteger a vítima. Percebe-se, que a lei não é omissa, mas que, em alguns casos, os agressores acabam tendo que cumprir apenas serviços comunitários à sociedade ou cumprindo a pena em regime aberto.

Tendo em vista o descumprimento das medidas impostas, foi publicada a Lei 13.641/2018, que alterou a Lei 11.340/2006, tipificando o crime de descumprimento de medida protetiva de urgência por meio da inserção do art. 24- A, que trouxe maior segurança jurídica para as partes, bem como maior proteção para vítima.

Com a inovação legal, a mulher vítima de violência doméstica não ficará sem tutela jurídica de emergência nos casos em que o agressor descumprir medida protetiva de urgência anteriormente imposta, mesmo sem a ocorrência de um novo episódio de violência, possibilitando uma punição mais severa ao agente, bem como a sua prisão em flagrante, e, dessa forma, garantindo maior efetividade às medidas protetivas de urgência aplicadas em favor das mulheres em situação de violência.


REFERÊNCIAS

ALVES, Cleide Aparecida. Feminicídio, poderá ser uma consequência da

Ineficácia da Lei Maria da Penha? 2017. Disponível em:< http://www.faculdadesabara.com.br/wp-content/uploads/MONOGRAFIA-CLEIDE-COM-CORREC%CC%A7O%CC%83ES-PDF.pdf > Acesso em: 10 abr. 2020.

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ALVES, Cornélio. et.al. Leituras de direito: violência doméstica e familiar contra a mulher. Natal: TJRN, 2017.

AMARAL, Carlos Eduardo Rios do. Descumprir medidas protetivas agora é crime (notas sobre a Lei 13.641/2018). 2018. Disponível em: < https://www.conjur.com.br/2018- abr-06/carlos-amaral-descumprir-medidas-protetivas-agora-crime >. Acesso em: 10 abr. 2020.

BRASIL. Casa Civil, Constituição Federal (1988). Brasília: Casa Civil, 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao.htm >. Acesso em: 20 mar. 2020.

______. Convenção interamericana para prevenir, punir e erradicar a violência contra a mulher, “Convenção de Belém do Pará”. Adotada em Belém do Pará, brasil, em 9 de junho de 1994, no vigésimo quarto período ordinário de sessões da assembleia geral. 1994. Disponível em:< http://www.cidh.org/basicos/portugues/m.belem.do.para.htm > Acesso em: 17 mar. 2020.

______. Lei nº 11.340, de 7 de agosto de 2006. Cria mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos do § 8o do art. 226 da Constituição Federal, da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres e da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher; dispõe sobre a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher; altera o Código de Processo Penal, o Código Penal e a Lei de Execução Penal; e dá outras providências. 2006. Disponível em:< http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/lei/l11340.htm >. Acesso em: 17 mar. 2020.

______. Lei n. 13.104 de 09 de março de 2015. Altera o art. 121 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal, para prever o feminicídio como circunstância qualificadora do crime de homicídio, e o art. 1º da Lei nº 8.072, de 25 de julho de 1990, para incluir o feminicídio no rol dos crimes hediondos. 2015. Disponível em:< http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/L13104.htm >. Acesso em: 19 mar. 2020.

______. Lei nº 13.641, de 3 de abril de 2018. Altera a Lei no 11.340, de 7 de agosto de 2006 (Lei Maria da Penha), para tipificar o crime de descumprimento de medidas protetivas de urgência. 2018. Disponível em:< http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2018/Lei/L13641.htm >. Acesso em: 10 abr. 2020.

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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PEREIRA, Brenda. Lei Maria da Penha: Do descumprimento das medidas protetivas de urgência. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 25, n. 6385, 24 dez. 2020. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/87423. Acesso em: 24 nov. 2024.

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