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Aspectos jusambientais da implantação de parques eólicos em superfície terrestre no nordeste brasileiro

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A energia eólica tem sido apontada como uma das soluções energéticas sustentáveis para o desenvolvimento econômico do país. No presente artigo, abordamos os aspectos positivos e negativos da implantação de parques eólicos no Nordeste brasileiro.

1. Introdução

A energia eólica tem sido apontada como uma das soluções energéticas sustentáveis para o desenvolvimento econômico do país. Trata-se de matriz energética renovável, dependente, unicamente da disponibilidade suficiente de ventos em condições de acionar aerogeradores, especialmente desenhados para a geração desse tipo de energia.

No que diz respeito ao potencial de geração de energia eólica, levando-se em consideração fatores naturais como força dos ventos e topografia apropriada para instalação de aerogeradores, o Brasil se apresenta em posição privilegiada em relação a outros países do globo. Sendo assim, é possível afirmar, com segurança, que as perspectivas para o desenvolvimento desse tipo de energia no Brasil são muito promissoras.

No entanto, vale destacar que essa atividade, pelo seu porte e peculiaridades nos processos de instalação e operação, traz consigo impactos ambientais negativos que precisam ser dimensionados e controlados, de modo que possa haver uma maximização dos benefícios e uma minimização de passivos ambientais, colocando-se em prática a difícil, mas possível, equação que fundamenta o chamado desenvolvimento sustentável.

Nas linhas que se seguem, faremos uma abordagem da temática proposta, de modo a destacar o potencial eólico que a região do Nordeste brasileiro apresenta, apontando-se as perspectivas para um verdadeiro desenvolvimento econômico regional com lastro na sustentabilidade. Para que esta realidade deixe de ser apenas um discurso, com baixa ou nenhuma efetividade, convém que o federalismo cooperativo revele sua força. Isso porque, mostra-se fundamental que União, Estados e Municípios estejam alinhados de modo que possam criar regulações que se complementem, somando esforços que garantam a minimização de impactos ambientais negativos e a maximização de impactos sociais e econômicos positivos.

Neste sentido, o licenciamento ambiental apresenta-se, na prática, como ferramenta estratégica para que as melhores práticas de gestão ambiental se tornem uma realidade fática e não apenas um discurso desejável. Tais instrumentos, cada um com sua finalidade intrínseca, servem à concretização de inúmeros princípios do Direito Ambiental, tão caros à proposta de efetivação de um Estado de Direito Ambiental no Brasil, tal como idealizado pelo constituinte no Texto da Constituição de 1988.

Eis, em síntese, o principal objetivo da reflexão e pesquisa que se segue: apresentar o cenário e as perspectivas para o desenvolvimento da energia eólica no Nordeste brasileiro, destacando-se eventuais externalidades ambientais negativas de modo que estas, na medida do possível, sejam impedidas ou, ao menos, mitigadas, reduzindo-se assim os riscos de danos irreversíveis ou de difícil reparação ao ambiente que coloquem em perigo a vida, a segurança ou o bem-estar da população inserida nas áreas de influência direta ou indireta dos empreendimentos citados.

2. Energia Eólica no Nordeste Brasileiro: A Força dos Ventos

Segundo informações do grupo Neoenergia, a energia eólica deixou de ser considerada uma fonte “alternativa” para ser uma fonte consolidada de geração de energia, passando a ter um papel fundamental na matriz energética brasileira. O salto da capacidade instalada das usinas eólicas em todo o país é surpreendente. Pulou de 935,4 MW, em 2010, para 12.966 MW em 2017[1].

Trazendo dados atualizados do ano de 2021, o Canal Energia informa que a energia eólica atingiu, em fevereiro de 2021, a marca de 18 GW de capacidade instalada, o que corresponde a 10,3% da matriz elétrica nacional. Esta fonte ainda informa que de acordo com dados apresentados pela Associação Brasileira da Energia Eólica, são 695 parques e mais de 8.300 aerogeradores. Uma década atrás o segmento ainda contava com menos de 1 GW de capacidade e hoje é a segunda maior, ficando atrás apenas da hidrelétrica que possui 58,7% do parque instalado no país, que produz 103 GW de energia[2]. Vale ainda considerar que a energia eólica já impacta cerca de 80 milhões de brasileiros, de acordo com dados da ABEEólica (Associação Brasileira de Energia Eólica)[3].

Estes dados revelam o grande crescimento desse setor e uma perspectiva de crescimento ainda maior para os próximos anos. O fato de ter-se tornado a segunda maior matriz energética do Brasil, em pouco mais de uma década também aponta para a viabilidade técnica e econômica dessa fonte energética.

Convém destacar, por oportuno, o grande impacto desse crescimento no Nordeste Brasileiro. Basta lembrar que dos 18.010,1 MW de energia eólica instalados no Brasil, 15.904,8 MW são produzidos no Nordeste brasileiro (RN, BA, PI, CE, PE, MA, PB e SE), o que representa 88,31% da produção nacional. Vale ainda destacar a grande relevância da participação do Estado do Rio Grande do Norte, maior produtor de energia eólica do Brasil, com produção de 5.154,2 MW em 2021. O segundo maior produtor de energia eólica do Brasil é o Estado da Bahia, com 4.879,6 MW. Juntos, apenas o Rio Grande do Norte e a Bahia representam 55,71% da produção de energia eólica do país, totalizando 10,033,8 MW[4].

Vale destacar os fatores técnicos e naturais que favorecem o desenvolvimento da energia eólica no Nordeste brasileiro. Neste sentido, o grupo Neoenergia[5] explica que:

“No Nordeste do Brasil, as condições favoráveis do vento, levaram a geração de energia por fonte eólica a bater recordes nos últimos anos. Por isso, podemos dizer que, hoje, o Nordeste é movido pelo vento! Dos 619 parques eólicos instalados no país, 523 estão localizados nesta região. Com a característica redução das chuvas no segundo semestre do ano, os reservatórios ficam escassos e desfavoráveis para produção de energia hidrelétrica. É justamente neste período que os ventos estão mais intensos, compensando o desequilíbrio com a produção de energia eólica que caminha em plena potência. O bom resultado também é consequência do aumento na quantidade de parques eólicos. Em um ano, 81 foram inaugurados no país, com aerogeradores mais modernos e potentes. Quase 90% da energia consumida no Nordeste é oriunda dessa fonte renovável e a região é responsável por gerar, hoje, 86% de toda energia eólica produzida no país. Em agosto de 2019, em apenas um dia, 89% de toda a energia consumida na região vieram dos ventos. No dia 13 de novembro de 2018, por um período de duas horas, 100% da energia consumida no Nordeste veio dos parques eólicos instalados na região” (3).           

3.  Contribuições da energia eólica para a recuperação da economia global e para a economia do Nordeste brasileiro.

Com documento intitulado “Energia eólica: um pilar para a recuperação da economia global”, o Global Wind Energy Council afirma que a energia eólica tem sido uma fonte de investimento, sendo um dos nove setores industriais com rápido crescimento no mundo. Somente de 2015 a 2019, a energia eólica gerou mais de US$ 652 bilhões em investimentos. Aumentar a capacidade eólica instalada para 2TW de capacidade até 2030 criará um investimento anual adicional de cerca de US$ 207 bilhões à US$ 2 trilhões. Segundo esse mesmo documento, a indústria eólica também continuará a ser um dos principais impulsionadores da inovação e investimento em pesquisa e desenvolvimento, com o avanço da próxima geração de turbinas eólicas[6].

Este estudo afirma que a energia eólica tem sido uma importante geradora de empregos e benefícios para comunidades. As agências e órgãos internacionais estimam que os empregos diretos e indiretos devem triplicar no setor de energia eólica ao redor do mundo, passando de 1,2 milhões em 2018 para aproximadamente 4 milhões em 2030[7].

Segundo Lúbia Tamires Rintzel - que realizou pesquisa em nível de mestrado sobre a análise dos impactos econômicos decorrentes da instalação de parques eólicos nos municípios brasileiros - os municípios com parques eólicos foram mais dinâmicos que municípios vizinhos sem parques eólicos. Tal dinâmica se refere a aumento de empregos, incremento na receita de impostos e até mesmo aumento do valor adicionado dos setores da economia[8].

Além dos supracitados impactos positivos, podemos citar ainda outros, como a) movimentação do comércio (setor hoteleiro, setor de alimentação, setor imobiliário e de habitação); b) prestação de serviços variados; c) comercialização de peças de reposição ou ferramentas variadas; d) mão-de-obra não - ou pouco - qualificada (serviços gerais); e) locação de maquinário; f) mão-de-obra especializada e pesquisas, que podem ser supridas por instituições de ensino superior; entre outros.

Indubitavelmente, a instalação, operação e manutenção de parques eólicos têm um elevado potencial para geração de emprego e renda. No entanto, é necessário que se defina de forma mais enfática e clara, quais os tipos de contrapartidas que podem ser exigidos pelo Estado brasileiro quando da autorização ou licenciamento ambiental da atividade, de modo que medidas compensatórias ou contraprestações econômicas e sociais possam ser ofertadas à União, ao Estado, aos Municípios ou aos participares inseridos na área de influência direta ou indireta do empreendimento instalado ou em vias de instalação. Tal fato se justifica por um imperativo de justiça social e ambiental, já que a instalação e operação de tais empreendimentos, além dos benefícios acima apontados também traz externalidades negativas que precisam ser compensadas ou mitigadas. Tais externalidades estão ligadas aos impactos ambientais que acompanham o desenvolvimento dessa atividade, os quais serão destacados no próximo item.

4. Principais impactos ambientais na instalação e operação de parques eólicos de superfície.

Como qualquer outra atividade de grande porte, a instalação e operação de parques eólicos traz consigo impactos ambientais, os quais precisam ser identificados, avaliados e controlados, tarefa que deve ser realizada, especialmente, pelo órgão responsável pelo seu licenciamento ambiental ou pelos órgãos do SISNAMA responsáveis pela fiscalização da atividade.

Os principais impactos identificados nas fases de instalação e operação dos parques eólicos de superfície são: a) poluição visual causado pelos aerogeradores[9]; b) ruídos das turbinas (geradores) ou das pás; c) mortandade de aves, especialmente aves em rota migratória; d) interferências eletromagnéticas – quando aerogeradores são instalados entre transmissores e receptores de ondas de televisão; e) impacto em sítios arqueológicos[10]; f) problemas fundiários; g) desmatamento de áreas e outros impactos na instalação dos parques eólicos; entre outros.

Como destacamos em outro artigo, um dos principais impactos ambientais relatados nos estudos de impactos ambientais estão relacionados à fauna do local onde estão instaladas as torres eólicas. Tais impactos estão relacionados, basicamente, a dois momentos distintos: a) os impactos ambientais quando da instalação, propriamente dita, das torres eólicas, momento em que pode haver desmatamentos no terreno objeto da referida instalação, com impactos sobre todo o ecossistema, e principalmente sobre a fauna e flora do local, e; b) impactos ambientais durante o funcionamento das torres eólicas, com a possibilidade de choques, principalmente de aves, com as pás das referidas torres eólicas. Destacamos, inclusive, que esse último impacto é ainda maior no caso do litoral oriental do Rio Grande do Norte, em especial na região próxima ao município de Touros, devido ao grande número de aves que ocorrem no local, muitas delas estando em rotas migratórias[11].

Mas porque as aves são afetadas pelas torres eólicas? Destacamos no artigo referido, que não é só porque as torres eólicas estão no espaço de voo das aves, onde estas, por acaso, colidem com as pás daquele equipamento. Sugerindo uma resposta para o problema, apontamos que consta no site da Carbon Brief, algumas razões pelas quais as aves são afetadas pelas ‘fazendas eólicas’. Explicamos que empreendimentos de vento tendem a ser colocados em zonas de montanhas, com correntes de ventos fortes, em face do grande potencial para gerar energia. Pássaros - especialmente aves de rapina, como águias ou abutres, costumam usar essas correntes de ar como rodovias – e assim são susceptíveis de entrar em contato com as turbinas. Esse site especializado afirma ainda que não são apenas as pás da turbina que representam um risco para as aves, mas também, a evolução do vento pode atrapalhar as rotas de migração[12].

Ainda pode acontecer de aves serem afetadas pelas correntes e turbulências geradas nos parques eólicos, o que pode ocasionar a emissão de lufadas de ventos que arremessem aves ao chão, árvores ou construções presentes na área.

Sendo assim, é importante que ainda na fase de licença prévia o órgão ambiental possa se manifestar, de forma analítica, sobre a existência de eventuais correntes de ar que sejam utilizadas por aves, especialmente aquelas que estejam em rota migratória e que, coincidentemente, seja o mesmo fundamento técnico para justificar o empreendimento naquele local. Em situações como essas, o órgão ambiental deve realizar a avaliação de impactos ambientais e decidir sobre a emissão ou não da licença ambiental para o empreendimento proposto, impondo, caso entenda necessário, condicionantes restritivos e medidas compensatórias.

Enfim, seja qual for o impacto identificado, os órgãos responsáveis pelo licenciamento ambiental, bem como todos os demais, que estejam no exercício do poder de polícia ambiental, devem estar atentos, atuando de forma diligente com vistas a identificação de possíveis danos ambientais, de danos ambientais efetivos ou já concretizados, de modo que seja possível evitá-los ou minimizar seus efeitos nocivos no ambiente e na sociedade.

5. A produção da energia eólica no contexto da Política Nacional sobre Mudança do Clima – PNMC

A Lei Federal nº 12.187, de 29 de dezembro de 2009 instituiu a Política Nacional sobre Mudança do Clima – PNMC, estabelecendo seus princípios, objetivos, diretrizes e instrumentos.

Esta lei, de suma importância no combate ao aquecimento global no Brasil traz uma série de recomendações e também exigências no sentido de que o país faça a sua parte no combate a um mal que pode prejudicar não apenas o Brasil, com seu meio ambiente, mas o mundo inteiro. Tudo faz parte de compromissos internacionais firmados pelo Brasil, decorrente de sua participação em fóruns ambientais de escala global.

Esta política, bem como as ações dela decorrentes, executadas sob a responsabilidade dos entes políticos e dos órgãos da administração pública, devem observar os princípios da precaução, da prevenção, da participação cidadã, do desenvolvimento sustentável e o das responsabilidades comuns, porém diferenciadas, este último no âmbito internacional, e, quanto às medidas a serem adotadas na sua execução, será considerado o seguinte: a) todos têm o dever de atuar, em benefício das presentes e futuras gerações, para a redução dos impactos decorrentes das interferências antrópicas sobre o sistema climático; b) serão tomadas medidas para prever, evitar ou minimizar as causas identificadas da mudança climática com origem antrópica no território nacional, sobre as quais haja razoável consenso por parte dos meios científicos e técnicos ocupados no estudo dos fenômenos envolvidos; c) as medidas tomadas devem levar em consideração os diferentes contextos sócio-econômicos de sua aplicação, distribuir os ônus e encargos decorrentes entre os setores econômicos e as populações e comunidades interessadas de modo equitativo e equilibrado e sopesar as responsabilidades individuais quanto à origem das fontes emissoras e dos efeitos ocasionados sobre o clima; d) o desenvolvimento sustentável é a condição para enfrentar as alterações climáticas e conciliar o atendimento às necessidades comuns e particulares das populações e comunidades que vivem no território nacional; e) as ações de âmbito nacional para o enfrentamento das alterações climáticas, atuais, presentes e futuras, devem considerar e integrar as ações promovidas no âmbito estadual e municipal por entidades públicas e privadas (art. 3º, incisos I a V)[13].

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Essas diretrizes e princípios acima destacados apontam para a necessidade de adoção de uma agenda de desenvolvimento econômico que incorpore, definitivamente as dimensões sociais e econômicas. Neste sentido, soluções sustentáveis devem ser buscadas, com incentivo máximo, de modo que as relações produtivas da ordem econômica possam se consolidar com o mínimo de impactos adversos ao ambiente.

A referida política destaca a importância da energia eólica, uma vez que essa fonte energética é sempre apontada como matriz renovável e de reduzidos impactos ambientais. Basta recordar que a referida lei dispõe que a Política Nacional sobre Mudança do Clima - PNMC visará: à compatibilização do desenvolvimento econômico-social com a proteção do sistema climático; à redução das emissões antrópicas de gases de efeito estufa em relação às suas diferentes fontes; ao fortalecimento das remoções antrópicas por sumidouros de gases de efeito estufa no território nacional; à implementação de medidas para promover a adaptação à mudança do clima pelas 3 (três) esferas da Federação, com a participação e a colaboração dos agentes econômicos e sociais interessados ou beneficiários, em particular aqueles especialmente vulneráveis aos seus efeitos adversos; à preservação, à conservação e à recuperação dos recursos ambientais, com particular atenção aos grandes biomas naturais tidos como Patrimônio Nacional; à consolidação e à expansão das áreas legalmente protegidas e ao incentivo aos reflorestamentos e à recomposição da cobertura vegetal em áreas degradadas; e ao estímulo ao desenvolvimento do Mercado Brasileiro de Redução de Emissões – MBRE (art. 4º, incisos I ao VIII)[14].

O parágrafo único deste mesmo artigo 4º sintetiza os objetivos da referida lei ao destacar que a Política Nacional sobre Mudança do Clima deverá estar em consonância com o desenvolvimento sustentável a fim de buscar o crescimento econômico, a erradicação da pobreza e a redução das desigualdades sociais.        

Convém ainda destacar o teor do artigo 11 da lei em tela, e seu parágrafo único, pela sua relevância à compreensão da mudança de perfil da política energética brasileira:

Art. 11.  Os princípios, objetivos, diretrizes e instrumentos das políticas públicas e programas governamentais deverão compatibilizar-se com os princípios, objetivos, diretrizes e instrumentos desta Política Nacional sobre Mudança do Clima.   

Parágrafo único.  Decreto do Poder Executivo estabelecerá, em consonância com a Política Nacional sobre Mudança do Clima, os Planos setoriais de mitigação e de adaptação às mudanças climáticas visando à consolidação de uma economia de baixo consumo de carbono, na geração e distribuição de energia elétrica, no transporte público urbano e nos sistemas modais de transporte interestadual de cargas e passageiros, na indústria de transformação e na de bens de consumo duráveis, nas indústrias químicas fina e de base, na indústria de papel e celulose, na mineração, na indústria da construção civil, nos serviços de saúde e na agropecuária, com vistas em atender metas gradativas de redução de emissões antrópicas quantificáveis e verificáveis, considerando as especificidades de cada setor, inclusive por meio do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo - MDL e das Ações de Mitigação Nacionalmente Apropriadas - NAMAs[15].

Percebe-se, portanto, que a direção definida nesta lei é no sentido de que o Poder Executivo deve, por meio de Decreto (Esse existe. Trata-se do Decreto nº 9.578, de 22 de novembro de 2018) estabelecer Planos setoriais de mitigação e de adaptação às mudanças climáticas, visando à consolidação de uma economia de baixo consumo de carbono na geração e distribuição de energia elétrica[16]. Tal fato coloca a produção de energia eólica como meta prioritária no desenvolvimento energético nacional.

Por fim, convém destacar que o objetivo final a ser alcançado com esta lei é reduzir entre 36,1% (trinta e seis inteiros e um décimo por cento) e 38,9% (trinta e oito inteiros e nove décimos por cento) suas emissões de gases de efeito estufa projetadas até 2020. Tudo isso como compromisso nacional voluntário (art. 12)[17].

6. Licenciamento ambiental de parques eólicos terrestres: recortes para a realidade do Nordeste brasileiro

Inicialmente, convém definir o que é licenciamento ambiental. Neste sentido, vale destacar o teor do artigo 1º inciso I da Resolução CONAMA nº 237/1997, conhecida como norma geral do licenciamento ambiental:

Art. 1º - Para efeito desta Resolução são adotadas as seguintes definições:

I - Licenciamento Ambiental: procedimento administrativo pelo qual o órgão ambiental competente licencia a localização, instalação, ampliação e a operação de empreendimentos e atividades utilizadoras de recursos ambientais, consideradas efetiva ou potencialmente poluidoras ou daquelas que, sob qualquer forma, possam causar degradação ambiental, considerando as disposições legais e regulamentares e as normas técnicas aplicáveis ao caso[18].

A referida resolução não é a única norma a trazer uma definição clara do que seria licenciamento ambiental. Convém destacar ainda o teor do artigo 2º, inciso I da Lei Complementar 140/2011 abaixo transcrito:

Art. 2º  Para os fins desta Lei Complementar, consideram-se:

I - licenciamento ambiental: o procedimento administrativo destinado a licenciar atividades ou empreendimentos utilizadores de recursos ambientais, efetiva ou potencialmente poluidores ou capazes, sob qualquer forma, de causar degradação ambiental[19].

Como sabido, o licenciamento ambiental é um dos instrumentos da Política Nacional do Meio Ambiente, tal como previsto no artigo 9º, inciso IV da Lei 6.983/1981, abaixo transcrito.

Art. 9º - São Instrumentos da Política Nacional do Meio Ambiente:

(...)

IV - o licenciamento e a revisão de atividades efetiva ou potencialmente poluidoras[20];

A Lei nº 6.938/1981 tem sua relevância histórica, pois foi a primeira lei no Brasil a dar ao meio ambiente um tratamento sistemático. Antes, a legislação brasileira tutelava ou visava tutelar bens ambientais de forma esparsa, como se não fosse necessária uma compreensão de seu conjunto. Esse tratamento fragmentado se observava partindo-se dos próprios textos constitucionais, de 1824 até a EC nº 01/1969. Inaugura-se, portanto, um novo momento que aponta para uma necessária compreensão do fenômeno ambiental e sua tutela pelo Estado brasileiro. Tal mudança de mentalidade e perspectiva desaguou nos trabalhos do constituinte, a ponto de ter forjado a Constituição de 1988, que recebeu a alcunha de Constituição Verde, pela quantidade de artigos e princípios que incorporam a dimensão ambiental nas bases do direito brasileiro, em respeito ao direito à vida, qualidade de vida e dignidade da pessoa humana. Neste sentido, pode-se afirmar, sem medo de erras, que a Lei 6.938/1981 foi amplamente recepcionada pelo Texto Constitucional vigente.

Neste sentido, basta lembrar o teor do artigo 225, §1º, incisos IV e V, que lança as bases para a realização do licenciamento ambiental

§ 1º.  Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público:

(...)

IV - exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade;

V - controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente[21];

A exigência, pelo Poder Público, de estudo prévio de impacto ambiental ao agente (público ou privado) que pretenda a instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significa degradação ambiental ocorre no âmbito de um procedimento administrativo denominado licenciamento ambiental. Tal exigência se fundamenta na necessidade que o órgão ambiental licenciador tem de conhecer a fundo o empreendimento proposto, em todas as suas fases e etapas, de modo que possa orientar e exigir do empreendedor (pessoa física ou jurídica, de direito público ou de direito privado) a observância da legislação ambiental aplicável. Trata-se, portanto, de um dever estatal de zelar pela observância da legislação ambiental e de efetivar as melhores práticas de gestão, definidas em políticas públicas ambientais específicas.

Vale ainda destacar a importância da supracitada Lei Complementar 140/2011 em matéria de licenciamento ambiental, já que esta norma surgiu com o objetivo de fixar normas, nos termos dos incisos III, VI e VII do caput e do parágrafo único do art. 23 da Constituição Federal, para a cooperação entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios nas ações administrativas decorrentes do exercício da competência comum relativas à proteção das paisagens naturais notáveis, à proteção do meio ambiente, ao combate à poluição em qualquer de suas formas e à preservação das florestas, da fauna e da flora[22].

Convém ainda destacar o teor dos artigos 7º, 8º e 9º em seus incisos XIV (comum a todos os referidos artigos), abaixo transcritos:

Art. 7º. São ações administrativas da União:

(...)

XIV - promover o licenciamento ambiental de empreendimentos e atividades:

a) localizados ou desenvolvidos conjuntamente no Brasil e em país limítrofe;

b) localizados ou desenvolvidos no mar territorial, na plataforma continental ou na zona econômica exclusiva;

c) localizados ou desenvolvidos em terras indígenas;

d) localizados ou desenvolvidos em unidades de conservação instituídas pela União, exceto em Áreas de Proteção Ambiental (APAs);

e) localizados ou desenvolvidos em 2 (dois) ou mais Estados;

f) de caráter militar, excetuando-se do licenciamento ambiental, nos termos de ato do Poder Executivo, aqueles previstos no preparo e emprego das Forças Armadas, conforme disposto na Lei Complementar no 97, de 9 de junho de 1999;

g) destinados a pesquisar, lavrar, produzir, beneficiar, transportar, armazenar e dispor material radioativo, em qualquer estágio, ou que utilizem energia nuclear em qualquer de suas formas e aplicações, mediante parecer da Comissão Nacional de Energia Nuclear (Cnen); ou

h) que atendam tipologia estabelecida por ato do Poder Executivo, a partir de proposição da Comissão Tripartite Nacional, assegurada a participação de um membro do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), e considerados os critérios de porte, potencial poluidor e natureza da atividade ou empreendimento;  

(...)”[23].

Esses são os casos, numerus clausus, definidos em hipótese taxativa, onde a competência para o licenciamento ambiental seria da União. Neste ponto uma observação. Há um debate na doutrina sobre eventual inconstitucionalidade da definição de competências por esta lei complementar. O fundamento é que uma lei complementar não poderia alterar a regra prevista no artigo 23, inciso VI da Constituição de 1988, que dispõe ser de competência (administrativa) comum da União, Estados, Distrito Federal e Municípios proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas. Como o licenciamento ambiental seria uma dessas formas de proteger o meio ambiente e esta tarefa, em âmbito constitucional, recai sobre todos os entes federativos, não poderia uma norma infraconstitucional afastar um desses entes federativos para apontar apenas um deles como o único competente.

No entanto, como o Supremo Tribunal Federal ainda não apreciou essa questão e nem declarou a inconstitucionalidade da referida Lei Complementar 140/2011, compreendemos que ela precisa ser observada na definição do ente federativo competente para a realização do licenciamento ambiental.

Neste sentido, dando sequência a nossa exposição, considere-se o teor do artigo 8º, inciso XIV dessa mesma Lei Complementar 140/2011:

“Art. 8º.  São ações administrativas dos Estados:

(...)

XIV - promover o licenciamento ambiental de atividades ou empreendimentos utilizadores de recursos ambientais, efetiva ou potencialmente poluidores ou capazes, sob qualquer forma, de causar degradação ambiental, ressalvado o disposto nos arts. 7º e 9º.

(...)”[24]

Percebe-se que a competência licenciatória dos Estados-membros é residual. Sendo assim, as hipóteses que não forem definidas especificamente como sendo de “competência” da União (art. 7º, inciso XIV) ou dos Municípios (art. 9º, inciso XIV) caem na “competência” dos Estados-membros.

Por fim, convém destacar o teor do artigo 9º, inciso XIV da referida lei complementar:

Art. 9º. São ações administrativas dos Municípios:

(...)

XIV - observadas as atribuições dos demais entes federativos previstas nesta Lei Complementar, promover o licenciamento ambiental das atividades ou empreendimentos:

a) que causem ou possam causar impacto ambiental de âmbito local, conforme tipologia definida pelos respectivos Conselhos Estaduais de Meio Ambiente, considerados os critérios de porte, potencial poluidor e natureza da atividade; ou

b) localizados em unidades de conservação instituídas pelo Município, exceto em Áreas de Proteção Ambiental (APAs);  

(...)”[25]

Como se observa pelo teor dos dispositivos acima apontados, na maioria dos casos, a “competência” para a realização do licenciamento ambiental para instalação de parques eólicos de superfície recai para o Estado-membro, que deverá criar toda a infraestrutura necessária para a realização da avaliação de impactos ambientais, que deve ser realizada no âmbito do órgão ambiental competente.

Convém ainda destacar que há uma resolução do CONAMA específica que estabelece procedimentos para o licenciamento ambiental de empreendimentos de geração de energia elétrica a partir de fonte eólica em superfície terrestre[26]. Trata-se da Resolução CONAMA nº 462, de 24 de julho de 2014, que passaremos a comentar a seguir.

A referida resolução, começa elucidando alguns conceitos, tais como a) empreendimento eólico, onde define o que é usina eólica singular, parque eólico e complexo eólico; b) microgerador eólico; e c) sistemas associados. (art. 2º, incisos I a III)[27].

Fato fundamental no processo de licenciamento ambiental de empreendimentos de geração de energia eólica é definir o seu porte, a localização e se o mesmo apresenta baixo potencial poluidor. Esta tarefa, nos termos do artigo 3º dessa Resolução em tela, cabe ao órgão licenciador. Dispõe ainda essa norma em seus §§ 1º e 2º, que a existência de Zoneamento Ambiental e outros estudos que caracterizem a região, bacia hidrográfica ou bioma deverão ser considerados no processo de enquadramento do empreendimento e que o licenciamento ambiental de empreendimentos eólicos considerados de baixo impacto ambiental será realizado mediante procedimento simplificado, observado o Anexo II dessa mesma resolução, dispensada a exigência do EIA/RIMA[28].

Contudo, a norma em tela é enfática ao afirmar que não será considerado de baixo impacto, exigindo a apresentação de Estudo de Impacto Ambiental e Relatório de Impacto Ambiental (EIA/RIMA), além de audiências públicas, nos termos da legislação vigente, os empreendimentos eólicos que estejam localizados: a) em formações dunares, planícies fluviais e de deflação, mangues e demais áreas úmidas; b) no bioma Mata Atlântica e implicar corte e supressão de vegetação primária e secundária no estágio avançado de regeneração, conforme dispõe a Lei n° 11.428, de 22 de dezembro de 2006; c) na Zona Costeira e implicar alterações significativas das suas características naturais, conforme dispõe a Lei n° 7.661, de 16 de maio de 1988; d) em zonas de amortecimento de unidades de conservação de proteção integral, adotando-se o limite de 3 km (três quilômetros) a partir do limite da unidade de conservação, cuja zona de amortecimento não esteja ainda estabelecida; e) em áreas regulares de rota, pousio, descanso, alimentação e reprodução de aves migratórias constantes de Relatório Anual de Rotas e Áreas de Concentração de Aves Migratórias no Brasil a ser emitido pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade – ICMBio, em até 90 dias; f) em locais em que venham a gerar impactos socioculturais diretos que impliquem inviabilização de comunidades ou sua completa remoção; e g) em áreas de ocorrência de espécies ameaçadas de extinção e áreas de endemismo restrito, conforme listas oficiais[29] (art. 3º, incisos I a VII).

Voltando-nos à realidade nordestina, percebe-se que dificilmente um parque ou complexo eólico não irá se encaixar em alguma das hipóteses acima destacadas e que impedem que o empreendimento seja considerado de baixo impacto. Isso por que a grande maioria dos parques eólicos instalados no Nordeste estão instalados na zona costeira, em áreas de domínio de mata atlântica, em formações dunares, em áreas próximas a mangues, em áreas regulares de rota, pousio, descanso, alimentação e reprodução de aves migratórias.

Para se ter uma ideia, há parques eólicos em diversos municípios do litoral setentrional do Estado do Rio Grande do Norte que estão instalados sobre extensos cordões dunares, especialmente à beira-mar. Neste caso, além de aspectos ligados a formações dunares, há ainda questões a serem consideradas em termos de impactos ambientais negativos, tais como: presença de aves em rotas migratórias, impactos à paisagem em área com forte vocação para o turismo e que explora muito a ideia de “paraíso natural”, entre outros.

Mas no Nordeste não há apenas parques eólicos na faixa litorânea. Há também parques eólicos em regiões serranas localizadas no interior do continente, onde a força dos ventos também atrai empreendedores do ramo. Nessas áreas, outras questões precisam ser consideradas, tais como: proximidade com unidades de conservação (zonas de amortecimento), presença de aves em rotas migratórias, questões fundiárias, áreas utilizadas para turismo de aventura, áreas de ocorrência de espécies ameaçadas de extinção e áreas de endemismo restrito, entre outros.

Não estamos a afirmar que não seja possível a instalação de parques eólicos nessas áreas, mas que uma atenção maior deve ser dada por parte do órgão licenciador. Nesses casos, por exemplo, a norma exige que seja apresentado pelo empreendedor Estudo de Impacto Ambiental e Relatório de Impacto Ambiental (EIA/RIMA), além da exigência de realização de audiências públicas, nos termos da legislação vigente, como já destacado acima.

Alguns pontos da norma em tela merecem destaque e serão apontados na sequência.           

6.1. Termo de Referência para realização de EIA/RIMA, quando cabível.

A Resolução CONAMA nº 462/2014 dispõe em seu artigo 4º que nos casos em que for exigido Estudo de Impacto Ambiental e Relatório de Impacto Ambiental (EIA/RIMA) deverá ser adotado o Termo de Referência do Anexo I, ressalvadas as características regionais e as especificações do órgão licenciador[30].

6.2. Prazos do licenciamento ambiental – regra geral.

O parágrafo único desse mesmo artigo 4º, destacado no item anterior, explica que os prazos para análise da solicitação das licenças prévia, de instalação e de operação de empreendimentos sujeitos à elaboração de EIA/RIMA permanecem regulados pela Resolução CONAMA n.º 237, de 19 de dezembro de 1997[31].

6.3. Procedimento Simplificado De Licenciamento – Resolução nº 462, de 24 de julho de 2014.

Trata-se, portanto de situações que não exigem a apresentação, por parte do empreendedor, de Estudo de Impacto Ambiental (EIA) e do respectivo Relatório de Impactos ao Meio Ambiente (RIMA). Estes estudos devem ser exigidos quando o potencial de impactos negativos ao meio ambiente seja considerado significativo.

No entanto, quando o órgão ambiental considerar, diante do projeto do empreendimento proposto, que não há riscos de danos significativos, pode exigir do empreendedor a apresentação de relatórios ambientais simplificados, como se observa pelo teor do artigo 5º abaixo transcrito

Art. 5º Os empreendimentos eólicos sujeitos ao procedimento simplificado de licenciamento deverão ser objeto de elaboração de relatórios simplificados que conterão as informações relativas ao diagnóstico ambiental da região de inserção do empreendimento, sua caracterização, a identificação dos impactos ambientais e das medidas de controle, mitigadoras e compensatórias, devendo o órgão ambiental competente adotar o Termo de Referência constante no Anexo II, resguardadas as características regionais.

Parágrafo único. O órgão licenciador poderá em uma única fase, atestar a viabilidade ambiental, aprovar a localização e autorizar a implantação do empreendimento eólico de baixo impacto ambiental, sendo emitida diretamente licença de instalação, cujo requerimento deverá ser realizado antes da implantação do empreendimento, desde que apresentadas medidas de controle, mitigação e compensação”.

Esta norma diz ainda que os prazos para análise da solicitação das licenças para os empreendimentos sujeitos ao procedimento simplificado são regulados pela Resolução CONAMA n.º 279, de 27 de junho de 2001 (art. 7º).

6.4. Licenças Ambientais e Autorizações para manejo de fauna silvestre – Resolução nº 462, de 24 de julho de 2014.

O artigo 8º, incisos I a IX dessa norma dispõe que as Licenças Prévia, de Instalação e de Operação deverão conter, no mínimo, as seguintes informações: a) nome ou razão social do empreendedor; b) número do CNPJ do empreendedor; c) nome oficial do empreendimento e respectivo código de registro na ANEEL; d) Município(s) e Unidade(s) da Federação de localização do empreendimento; d) potência total em megawatts do empreendimento; e) área total do empreendimento; f) área a ser licenciada e coordenadas geográficas de todos os vértices da poligonal solicitada pelo empreendimento; h) número estimado e altura das torres do empreendimento; e i) potência nominal unitária dos aerogeradores do empreendimento[32].

Convém que fique claro que mesmo no caso de haver um conjunto de parques eólicos em processo de licenciamento ambiental, cada um deverá ser analisado individualmente, levando-se em considerações os aspectos de sua instalação e/ou operação, já que estão situados em espaços geográficos específicos e distintos. É o que dispõe o parágrafo único desse mesmo artigo 8º, abaixo transcrito:

Parágrafo único. Quando a licença ambiental contemplar mais de um parque eólico de um mesmo complexo, os mesmos deverão ser identificados e as características individuais de cada parque eólico deverão constar da licença ambiental”.

Neste sentido, destaque-se que mesmo que a licença ambiental seja uma só para o complexo que contém diversos parques eólicos, as análises de cada parque eólico, com suas peculiaridades técnicas e ambientais serão consideradas em separado. Ou seja, a licença em tela deverá impor condicionantes para cada espaço territorial que contempla cada um desses parques eólicos.

Vale ainda considerar que quando estiver a requerer Licença de Instalação ao órgão licenciador o empreendedor deve apresentar a comprovação do atendimento às condicionantes da Licença Prévia, o Relatório de Detalhamento dos Programas Ambientais, Projeto de Engenharia e outras informações pertinentes (art. 9º).

Ademais, a norma também destaca que quando houver a necessidade de supressão de vegetação para a instalação dos empreendimentos eólicos, a autorização para a mesma deverá ser requerida na fase da Licença de Instalação, com a apresentação dos estudos pertinentes (parágrafo único do art. 9º).

No que tange às autorizações para manejo de fauna silvestre em licenciamento ambiental reguladas por esta Resolução, incluindo levantamento, coleta, captura, resgate, transporte e monitoramento, quando requeridas para a elaboração de estudos ambientais estas deverão ser emitidas em um prazo máximo de 20 (vinte) dias a partir de seu requerimento e da apresentação das informações solicitadas pelo órgão licenciador, nos termos de seu artigo 10.

Esta norma ainda dispõe que durante o período de vigência das licenças ambientais do empreendimento eólico ficam autorizadas as atividades de manutenção das áreas de servidão ou utilidade pública e estradas de acesso suficientes para permitir a sua adequada operação e manutenção, observados os critérios e condicionantes estabelecidos nas referidas licenças e comunicados previamente ao órgão licenciador (art. 11) e que as atividades de comissionamento e de testes pré-operacionais deverão estar contempladas no cronograma de instalação do empreendimento e a sua execução deverá ser precedida de comunicação ao órgão licenciador (art. 12).

A resolução do CONAMA em destaque dispõe ainda, em seu artigo 13 que para o complexo eólico poderá ser admitido processo de licenciamento ambiental único para a obtenção de Licença Prévia, desde que definida a responsabilidade legal pelo conjunto de empreendimentos e desde que as Licenças de Instalação e de Operação deverão sejam emitidas separadamente para cada empreendedor vencedor do leilão de energia eólica (parágrafo único do art. 13).

Aspecto interessante e que já havíamos destacado em linhas passadas é que os impactos ambientais de empreendimentos eólicos, mesmo que integrantes de um complexo eólico, devem ser considerados individualmente (levando-se em consideração aspectos do meio físico onde está inserido). No entanto, o oposto também pode acontecer, ou seja, os impactos ambientais de empreendimento eólicos diversos, mas que de alguma forma estejam interligados, geograficamente, tecnicamente, ou seja, que façam parte de um complexo eólico, devem ser considerados em seu conjunto. É o que dispõe o artigo 14 da referida resolução, abaixo transcrito. Tal fato aponta para dois tipos de impactos: a) ambientais pontuais ou locais; e b) impactos ambientais regionais ou por integração. Note-se o teor do referido artigo:

Art.14. Para fins de aplicação desta Resolução, o licenciamento ambiental poderá ocorrer por parque eólico ou por complexo eólico, sempre de forma conjunta com seus respectivos sistemas associados.

§ 1º O licenciamento em separado de parques de um mesmo complexo deverá considerar o impacto ambiental de todo o complexo para fins de aplicação da presente resolução.

§ 2º O pedido de licença ambiental para implantação de novos empreendimentos eólicos, nos quais haja sobreposição da área de influência destes com a área de influência de parques ou complexos existentes, licenciados ou em processo de licenciamento, ensejará a obrigação de elaboração de avaliação dos impactos cumulativos e sinérgicos do conjunto de parques ou complexos”.

6.5. Outros aspectos a serem considerados – Resolução nº 462, de 24 de julho de 2014.

A norma em apreço ainda dispõe que independentemente do enquadramento quanto ao impacto ambiental dos empreendimentos de geração de energia eólica, caso exista potencial de impacto ao patrimônio espeleológico, deverão ser elaborados os estudos conforme estabelecido no Decreto nº 99.556, de 1º de outubro de 1990 (art. 16) e que os empreendimentos eólicos deverão ser dotados de tecnologia adequada para evitar impactos negativos sobre a fauna (art. 17).

7. Conclusões

Diante das exposições, reflexões e análises realizadas em linhas anteriores, é possível levantar as seguintes conclusões:

  1. A energia eólica deixou de ser considerada uma fonte “alternativa” para ser uma fonte consolidada de geração de energia, passando a ter um papel fundamental na matriz energética brasileira;
  2. Diversos fatores técnicos e naturais favorecem o desenvolvimento da energia eólica no Nordeste brasileiro. Trata-se da região administrativa brasileira com maior potencialidade para esta atividade;
  3. A energia eólica tem sido uma importante geradora de empregos e benefícios para comunidades. As agências e órgãos internacionais estimam que os empregos diretos e indiretos devem triplicar no setor de energia eólica ao redor do mundo, passando de 1,2 milhões em 2018 para aproximadamente 4 milhões em 2030;
  4. A instalação, operação e manutenção de parques eólicos têm um elevado potencial para geração de emprego e renda. No entanto, é necessário que se defina de forma mais enfática e clara, quais os tipos de contrapartidas que podem ser exigidos pelo Estado brasileiro quando da autorização ou licenciamento ambiental da atividade, de modo que medidas compensatórias ou contraprestações econômicas e sociais possam ser ofertadas à União, ao Estado, aos Municípios ou aos participares inseridos na área de influência direta ou indireta do empreendimento instalado ou em vias de instalação;
  5. Como qualquer outra atividade de grande porte, a instalação e operação de parques eólicos traz consigo impactos ambientais, os quais precisam ser identificados, avaliados e controlados, tarefa que deve ser realizada, especialmente, pelo órgão responsável pelo seu licenciamento ambiental ou pelos órgãos do SISNAMA responsáveis pela fiscalização da atividade
  6. Os principais impactos identificados nas fases de instalação e operação dos parques eólicos de superfície são: a) poluição visual causado pelos aerogeradores; b) ruídos das turbinas (geradores) ou das pás; c) mortandade de aves, especialmente aves em rota migratória; d) interferências eletromagnéticas – quando aerogeradores são instalados entre transmissores e receptores de ondas de televisão; e) impacto em sítios arqueológicos; f) problemas fundiários; g) desmatamento de áreas e outros impactos na instalação dos parques eólicos; entre outros;
  7. A Lei Federal nº 12.187, de 29 de dezembro de 2009, que instituiu a Política Nacional sobre Mudança do Clima – PNMC destaca a importância da energia eólica, uma vez que essa fonte energética é sempre apontada como matriz renovável e de reduzidos impactos ambientais;
  8. O objetivo final a ser alcançado pela Política Nacional sobre Mudança do Clima – PNMC é reduzir entre 36,1% (trinta e seis inteiros e um décimo por cento) e 38,9% (trinta e oito inteiros e nove décimos por cento) suas emissões de gases de efeito estufa projetadas até 2020. Tudo isso como compromisso nacional voluntário;
  9. O licenciamento ambiental é um dos instrumentos da Política Nacional do Meio Ambiente, tal como previsto no artigo 9º, inciso IV da Lei 6.983/1981, sendo o principal veículo para a efetivação dos princípio da prevenção, precaução e desenvolvimento sustentável;
  10. A Lei Complementar 140/2011 tem sua importância na medida em que dispõe sobre as ações administrativas da União, dos Estados, do DF e dos Municípios para a realização do licenciamento ambiental (artigos 7º, inciso XIV; 8º, inciso XIV e 9º, inciso XIV). Tais ações administrativas mais parecem, na prática, atribuição de competências, o que tem gerado críticas na doutrina do direito ambiental brasileiro;
  11. Há uma resolução do CONAMA específica que estabelece procedimentos para o licenciamento ambiental de empreendimentos de geração de energia elétrica a partir de fonte eólica em superfície terrestre. Trata-se da Resolução CONAMA nº 462/2014;
  12. Resolução CONAMA nº 462/2014 tem sua importância na medida em que traça um panorama da atividade e aponta para procedimentos e pontos que precisam ser estudados pelos analistas ambientais quando da apresentação dos estudos de impactos ambientais ou relatórios ambientais simplificados apresentados pelos proponentes de parques eólicos ou complexos eólicos;
  13. Os empreendimentos eólicos já instalados ou em processo de instalação na região do Nordeste brasileiro revelam perspectivas para um verdadeiro desenvolvimento econômico regional com lastro na sustentabilidade. No entanto, para que esta realidade deixe de ser apenas um discurso, com baixa ou nenhuma efetividade, convém que o federalismo cooperativo revele sua força e necessidade. Isso porque, mostra-se fundamental que União, Estados e Municípios estejam alinhados de modo que possam criar regulações que se complementem, somando esforços que garantam a minimização de impactos ambientais negativos e a maximização de impactos sociais e econômicos positivos.
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Sobre o autor
Carlos Sérgio Gurgel da Silva

Doutor em Direito pela Universidade de Lisboa (Portugal), Mestre em Direito Constitucional pena Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), Especialista em Direitos Fundamentais pela Fundação Escola Superior do Ministério Público do Estado do Rio Grande do Norte (FESMP/RN), Professor Adjunto IV do Curso de Direito da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (UERN), Advogado especializado em Direito Ambiental, Presidente da Comissão de Direito Ambiental da OAB/RN (2022-2024), Geógrafo, Conselheiro Seccional da OAB/RN (2022-2024), Conselheiro Titular no Conselho da Cidade de Natal (CONCIDADE).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SILVA, Carlos Sérgio Gurgel. Aspectos jusambientais da implantação de parques eólicos em superfície terrestre no nordeste brasileiro. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 26, n. 6561, 18 jun. 2021. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/91292. Acesso em: 29 mar. 2024.

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