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Sistema constitucional de crises brasileiro:

controle de poder e restrições aos direitos fundamentais

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21/10/2021 às 11:00
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CONSIDERAÇÕES FINAIS

A história nos mostrou como uma situação de crise pode dar azo a uma série de arbitrariedades e ilegalidades, não sendo poucos os governos que se utilizaram de um regime extraordinário para que pudesse ser implantada uma determinada política ou ideologia.

Entretanto, nossa Carta Magna de 1988 não seguiu os exemplos nefastos de outrora, prezando em estabelecer, em suas normas, os procedimentos, limites, duração, localização, dentre outros elementos do Sistema Constitucional de Crises.

A situação de emergência demanda a fiscalização dos órgãos consultivos presidenciais (Conselho de Defesa Nacional e Conselho da República) que irão fazer a fiscalização e o acompanhamento das medidas restritivas, não olvidando de sua importante função opinativa no momento da decretação dos estados de defesa e de sítio.

Mais do que isso, a Constituição Federal de 1988 previu o controle político a ser feito pelo Congresso Nacional durante todas as fases do regime extraordinário, podendo, inclusive, modificar o conteúdo dos decretos presidências.

O controle exercido pelo Congresso Nacional se caracteriza pelo poder de revogar o estado de defesa, de não autorizar o estado de sítio, além da possibilidade de suspender ambos os regimes.

Assim sendo, além de uma análise dos pressupostos jurídico-constitucionais, o Poder Legislativo tem o aval para examinar o mérito das medidas do estado de defesa de e do estado de sítio, podendo estipular o que é conveniente ou oportuno de ser decretado.

Além disso, há o controle judicial, que deve ser sempre garantido, como forma de impedir que ilegalidades sejam cometidas, não havendo nisso nenhuma mácula à separação de poderes, uma vez que tal procedimento é corolário da teoria dos freios e contrapesos.

O princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional é garantia que não pode ser afastada nem mesmo em um Estado de Emergência, conforme foi visto nos tratados dos quais o Brasil é signatário.

Quanto às medidas, foi estabelecido um sistema híbrido, ou seja, ao mesmo tempo que temos um sistema rígido no tocante ao estado de defesa e ao estado de sítio presente na hipótese do art. 137, I, da CRFB/88, no que se refere ao estado de sítio decretado devido à declaração de estado de guerra ou resposta a agressão armada estrangeira, se previu um sistema flexível, porquanto não há um delimitação expressa das restrições possíveis de serem adotadas no Estado Extraordinário de Direito.

Derradeiramente, há de se ressaltar a importância desse tema – apesar de muitas vezes não ter seu devido valor reconhecido -, porquanto é essencial que saibamos de antemão quais as regras constitucionais que terão de ser observadas numa situação de crise, o que permitirá uma melhor análise crítica da população acerca das medidas tomadas, sempre se tendo em mente que o Estado de Salvaguarda visa o fortalecimento da democracia e do próprio Estado, pautando-se sempre por dois princípios de fundamental relevância: temporariedade e proporcionalidade.


REFERÊNCIAS

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1 SANTOS, Aricê Moacyr Amaral. O Estado de Emergência. 1 ed. São Paulo: Sugestões Literárias, 1981, p. 32.

2 Ibid, p.32.

3 CUNHA JÚNIOR, Dirley da. Curso de Direito Constitucional.6 ed. Salvador: JusPodivm, 2008, p. 1202.

4 FERREIRA, Olavo Alves. Sistema Constitucional de Crises: restrições a direitos fundamentais. Rio de Janeiro: Método, 2009, p.25.

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5 MELÉNDEZ, Florentín. Los Derechos Fundamentales em lós Estados de Excepcíon según el Derecho Internacional de lós Derechos Humanos, 1997. Tese (Doutorado) – Facultad de Derecho, Universidad Complutense de Madrid, p.19: “Se pode observar o surgimento de certo tipo de funcionários que exercem plenos poderes. Estes são conhecidos como Comissários Extraordinários” (tradução nossa).

6 TAVARES, Marcelo Leonardo. Estado de Emergência: O Controle do Poder em Situação de Crise. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008, p.53.

7 FERREIRA, Olavo Alves. Op. cit., p.47.

8 SANTOS, Aricê Moacyr Amaral. Op. cit., p. 11

9 FERREIRA, Olavo Alves. Op. cit., p.50.

10 AGAMBEN, Giorgio. Estado de Exceção. 2 ed., São Paulo: Boitempo, 2004, p.29.

11 LOWENSTEIN apud FERREIRA, ibid. p. 53.

12 MELÉNDEZ, Florentín. Op. Cit., p.61: “O Executivo ou o Presidente da República não somente têm a faculdade extraordinária de suspender os direitos e garantias fundamentais assinalados anteriormente mas também afetam todas as relações jurídicas mencionadas de maneira geral nas leis” (tradução nossa).

13 LENZA, Pedro. Direito Constitucional. 14 ed., São Paulo: Saraiva, 2010, p.104

14 FERREIRA, Olavo Alves. Op. cit., p.78.

15 CICCHINI, Guigo Puig. Derechos Humanos y Garantías en los Estados de Excepción. Revista Electrónica Del Instituto de Investigaciones Ambrosio L. Gioja. Buenos Aires,ano v, número especial, 2011, p. 59. Disponível em: <http://www.derecho.uba.ar/revistagioja/articulos/R000E01A005_0008_p-d-constitucional1.pdf> Acesso em: 19 set. 2012: “Uma vez decretado o estado de exceção, a extensão das faculdades das autoridades em correlação com a diminuição das garantias dos cidadãos, acarreta ou facilita, em grande medida, abusos contra os direitos humanos fundamentais da população” (tradução nossa).

16 CANELLAS, Alfredo. Direito de crise na constituição de 1988. O emprego do estado de defesa e do estado de sítio. Disponível em: <http://www.advogado.adv.br/artigos/2003/alfredocanellas/estadodesalvaguarda.htm>. Acesso em: 19 set. 2012.

17 MELÉNDEZ, Florentín. Op. cit., p.101: “O Estado que recorre a instituições de exceção está obrigado a proclamar ou dar a conhecer previamente e de maneira geral a toda a população a existência da situação de emergência de caráter excepcional” (tradução nossa).

18 FERREIRA, Olavo Alves. Op. cit., p.159.

19 BARROSO, Luís Roberto. Curso de Direito Constitucional Contemporâneo: os conceitos fundamentais e a construção do novo modelo. 3 ed., São Paulo: Saraiva, 2011, p. 328-329

20 CICCHINI, Guigo Puig. Op. cit., p.62.

21 ZOVATTO, Daniel. Los Estados de Excepción y los Derechos Humanos em América Latina. Caracas/San José: Editorial Jurídica Venezolana, 1990, p. 99.

22 MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 19 ed., São Paulo: Atlas, 2006, p.716.

23 TAVARES, Marcelo. Op. Cit., p.259.

24 Estando suspensas as garantias, alguns dos limites legais de atuação do poder público podem ser distintos dos vigentes em condições normais, mas não devem se considerar inexistentes nem cabe, por consequência, entender que o governo esteja investido de poderes absolutos além das condições em que tal legalidade excepcional está autoriza. Como já apontado pela Corte em outra oportunidade, o princípio da legalidade, as instituições democráticas e o Estado Direito são inseparáveis (tradução nossa).

25 DANTAS, Ivo. Da Defesa do Estado e das Instituições Democráticas na Nova Constituição (Direito Constitucional de Crise ou Legalidade Especial). 1 ed., Rio de Janeiro: Aide Editora, 1989, p.48.

26 FERREIRA, Olavo Alves. Op. cit., p.211.

27 SANTOS, Aricê Moacyr Amaral. Op. cit., p.34.

28 FERREIRA, Olavo Alves. Op. cit., p.231.

29 TAVARES, Marcelo. Op. cit., p.244.

30CANELLAS, Alfredo. Cf: http://www.advogado.adv.br/artigos/2003/alfredocanellas/estadodesalvaguarda.htm#_ftn93

31 TAVARES, Marcelo. Op. cit., p.234.

32 AMARAL, Thiago Bottino do. Estudo comparativo dos regimes excepcionais no Brasil e na França. Estados de defesa, urgência e sítio. Jus Navigandi, Teresina, ano 10, n. 803, 14 set. 2005. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/7292>. Acesso em: 20 set. 2012.

33 FERREIRA, Olavo Alves. Op. cit., p.180.

34 BULOS, Uadi Lammêgo Bulos. Curso de Direito Constitucional. 3 ed., São Paulo: Saraiva, 2009, p. 1178.

35 FERREIRA, Olavo Alves. Op. cit., p.191.

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Sobre o autor
Fabio Correia Pimenta

Analista Judiciário da Justiça Federal. Graduado em Direito e Especialista em Direito Constitucional.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PIMENTA, Fabio Correia. Sistema constitucional de crises brasileiro:: controle de poder e restrições aos direitos fundamentais. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 26, n. 6686, 21 out. 2021. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/93876. Acesso em: 19 abr. 2024.

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