Este texto foi publicado no Jus no endereço https://jus.com.br/artigos/19150
Para ver outras publicações como esta, acesse https://jus.com.br

Ilegalidade de presumir-se o enriquecimento ilícito.

Necessidade de ato comissivo ou omissivo no exercício da função pública

Ilegalidade de presumir-se o enriquecimento ilícito. Necessidade de ato comissivo ou omissivo no exercício da função pública

Publicado em . Elaborado em .

A Receita Federal instaura processos administrativos disciplinares sob o fundamento de “enriquecimento ilícito presumido” do Auditor Fiscal, por suposta variação patrimonial a descoberto, sem demonstrar conduta funcional ímproba.

I - CONSIDERAÇÕES INICIAIS:

A análise sobre o presente tema se faz necessária e urgente, até como um alerta, em decorrência de sua extrema gravidade, por presenciarmos, no exercício da advocacia, várias vezes violações constitucionais, abusos de autoridades, extrapolação dos limites legais, não observância dos princípios da ampla defesa, do contraditório e da transparência e desconsideração total do contido na defesa apresentada pelo Requerido(a), em se tratando do direito de investigar e de acusar; portanto, tais arbitrariedades, em especial, vêm ocorrendo no âmbito da Receita Federal do Brasil, onde o servidor que possui movimentação bancária e patrimonial tida como incompatível com a renda declarada possui sua conduta subsumida no descrito pelo artigo 9º, inciso VII, da Lei nº 8.429/92, mesmo que não tenha praticado qualquer ato funcional (omissivo ou comissivo) irregular no exercício do cargo ou da função pública.

Esse vem sendo o modus operandi das autoridades lotadas na Receita Federal do Brasil, com total violação de todos os dispositivos legais pertinentes de nosso ordenamento jurídico. Para essas autoridades não vige a busca da verdade real mas sim, ocorre um retrocesso a época da tão famigerada verdade sabida.

O servidor público lotado na Receita Federal vem sendo vítima de grave e inconcebível perseguição, pois para que seja instaurado o processo administrativo disciplinar faz-se necessário a existência de uma prova direta da prática de uma conduta irregular, bem como, da materialidade do fato, constatada no exercício ou em razão do vínculo público, pois do contrário haverá atipicidade de conduta (ou falta de justa causa para instauração do PAD).

Não resta dúvida que o servidor público ostenta também a posição de contribuinte do imposto de renda e qualquer irregularidade em sua declaração de rendas, tal qual, omissão de informações ou variação patrimonial a descoberto estará sujeito ao processo tributário (fiscalização) como qualquer outro contribuinte, sem nenhum privilégio ou tratamento discriminatório. Contudo, para que tal fato se direcione para a esfera disciplinar, é necessário, antes de mais nada, que seja demonstrado o nexo de causalidade (terceiro elemento do fato típico), [01] resultante de possíveis atos funcionais infracionais capazes de impulsionarem uma possível variação patrimonial incompatível com o cargo ou a função pública exercida pelo servidor(a). [02]

Caso ocorra a instauração de um PAD contra o servidor público, não poderá em hipótese alguma ocorrer o cerceamento do seu direito de defesa, em flagrante violação ao que vem estatuído no artigo 5º, LV, da CF, em decorrência de que ele se defende, desde a fase inicial de instauração no processo administrativo disciplinar, da descrição dos fatos que lhe são imputados em tese, e não da tipificação legal constante da Portaria inaugural.

Constatada a prática de uma irregularidade funcional, através de prova direta, com a comprovação inequívoca de sua autoria, bem como, da materialidade, por ocasião do juízo de admissibilidade do processo administrativo disciplinar, a Autoridade Administrativa competente determinará a instauração do processo. Sem esses requisitos, não há dúvida que faltará justa causa para iniciar-se a persecução disciplinar.

Contudo, na prática, com uma atuação sem qualquer observância aos dispositivos legais constantes da Lei nº 8.112/90 e de igual modo da Lei nº 8.429/92, a Receita Federal do Brasil vem instaurando inúmeros processos administrativos disciplinares sob o inconstitucional e ilegal fundamento de que ocorre "enriquecimento ilícito presumido" do Auditor Fiscal, quando ele é acusado de uma pseudo variação patrimonial a descoberto, sem que seja demonstrada uma única conduta funcional caracterizada, em tese, como ímproba.

Essa postura da Receita Federal do Brasil gera verdadeiro estado de insegurança e de permanente ilegalidade, resultado do abuso de poder do direito de se manejar um processo administrativo disciplinar, sem que seja, de forma minuciosa, descrita, em tese, a conduta funcional ilícita ou irregular do servidor público, lá lotado.

A instauração de processo administrativo disciplinar é obrigatória, quando demonstrado, por provas diretas, a prática de ato ilícito no exercício ou em decorrência do vínculo público do servidor investigado (art. 143, da Lei nº 8.112/90).

É a denominada e tão necessária "justa causa", que deve estar presente, para poder-se dar início à persecução disciplinar. Sem ela, é mais prudente que seja instaurado o procedimento de sindicância, para a busca de evidências em relação à autoria e materialidade de uma infração disciplinar, condições essenciais para a instauração do processo administrativo disciplinar.

Jamais uma suspeita, um indício, ou seja, uma prova indireta, poderá ensejar a instauração de processo administrativo disciplinar contra o servidor público, pois para que isso ocorra há necessidade da comprovação do fato ilícito praticado através de uma prova direta, justamente porque o referido servidor possui o direito fundamental a intimidade, imagem, honra e inviolabilidade, bem como, de seus dados protegidos por cláusulas constitucionais rígidas, que somente se relativizam se houver uma justa causa.

Por outro lado, o enriquecimento ilícito do agente público, no exercício de seu cargo ou função pública, exige a demonstração inequívoca através de prova direta, além de outros elementos, da vontade livre e consciente do mesmo em praticar o disposto no referido tipo legal; em sendo assim, para a configuração do ilícito sub oculis (ou outro ilícito), necessita estar presente na sua conduta o elemento subjetivo do tipo, qual seja, o dolo, e por tratar-se de um ato omissivo ou comissivo, não é admissível a mera "presunção" de variação patrimonial incompatível com a renda declarada (responsabilidade objetiva), como fundamento para a subsunção da conduta do servidor público no disposto pelo artigo 9º, inciso VII, da Lei nº 8.429/92. Observando-se que em nosso ordenamento jurídico pertinente, a responsabilidade deverá ser sempre subjetiva.

Apesar de tal fato ser inequívoco, ocorre que de forma inconstitucional e ilegal, com total abuso de autoridade, estão sendo instaurados vários processos administrativos disciplinares contra servidores lotados na da Receita Federal sem que estejam presentes e descritos de forma detalhada os fatos praticados na Portaria inaugural, com a tão necessária subsunção de suas condutas em um tipo legal, haja vista que é defeso por Lei a imputação da prática de uma infração administrativa a um servidor(a) fundamentada em responsabilidade objetiva, como se fosse o "corpo de delito" a variação patrimonial incompatível com a renda recebida pelo agente público, mas sem qualquer vinculação com o cargo ou a função pública exercida.

Para dar-se impulso ao início da persecução disciplinar há necessidade da presença de uma justa causa, capaz de respaldar a instauração do processo administrativo disciplinar contra o servidor público, uma vez que é absolutamente necessária, no mínimo, que sejam descritas detalhadamente as irregularidades praticadas no exercício do cargo ou da função pública, na forma do disposto pelo artigo 143, da Lei nº 8.112/90, em decorrência de que o(a) Requerido(a) se defende dos fatos descritos que lhe são imputados na fase de instauração e instrução do PAD, e somente após a fase do indiciamento é que ele se defenderá do contido no tipo legal, cuja prática lhe foi imputada.

Isso porque, é necessária a demonstração do ilícito funcional, praticado pelo servidor público, por intermédio de uma prova direta, porquanto a situação de mero contribuinte do imposto de rendas não pode ser confundido com o ilícito em questão, se não houver nexo de causalidade com o cargo ou função público exercidos, vinculados com a esfera disciplinar.

Aliás, o artigo 117, inciso X, da Lei nº 8.112/90 permite, inclusive, que o servidor público tenha atividade privada (participe de sociedade civil), exceto na qualidade de sócio gerente, o que reforça ainda mais a assertiva, que o pseudo ilícito tributário - quando identificado -, por si só não gera a responsabilidade funcional do mesmo.

Os fatos praticados pelo servidor público, que servem de fundamento para a instauração do processo administrativo disciplinar devem se subsumir necessariamente (a conduta do mesmo) em uma infração funcional, pois do contrário ocorrerá abuso do direito de investigação, bem como cerceamento do direito de defesa, pois o servidor investigado não poderá exercer os seus direitos constitucionais no PAD, sem que haja a demonstração de uma possível violação aos seus deveres ou obrigações estabelecidas no Estatuto do Servidor Público ao qual se vincula.


II - O ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA - ILEGALIDADE DE SE PRESUMIR O ENRIQUECIMENTO ILÍCITO DO AGENTE PÚBLICO:

A partir do mês de janeiro de 2003, o enriquecimento sem causa – até então construção da doutrina e da jurisprudência - passou a integrar a redação do artigo 884, do Código Civil, assim disposto: "Aquele que, sem justa causa, se enriquecer à custa de outrem, será obrigado a restituir o indevidamente auferido, feita a atualização dos valores monetários."

O enriquecimento injusto possui em sua origem um desequilíbrio patrimonial, que seria definitivo e real se não fosse coibido pelo ordenamento jurídico e, sobretudo, pela obrigação restituidora daquele que deu causa ao mesmo ou foi beneficiado ilegitimamente pelo empobrecimento alheio.

Transportado esse princípio para o âmbito da Lei de Improbidade Administrativa, assim ficou redigido o texto do artigo 9º, inciso VII, da Lei nº 8.429/92: "Art. 9° Constitui ato de improbidade administrativa importando enriquecimento ilícito auferir qualquer tipo de vantagem patrimonial indevida em razão do exercício de cargo, mandato, função, emprego ou atividade nas entidades mencionadas no art. 1° desta lei, e notadamente:  VII - adquirir, para si ou para outrem, no exercício de mandato, cargo, emprego ou função pública, bens de qualquer natureza cujo valor seja desproporcional à evolução do patrimônio ou à renda do agente público." –[negrito e g.n.]-.

Em sendo assim, não há como se presumir vantagem patrimonial indevida em razão do vínculo público, pois o princípio é inverso, imperando a presunção de inocência em favor do indivíduo/agente público.

Somente uma prova direta (inquestionável e extreme de dúvida) é que poderá elidir a presunção de inocência; Contudo, quando ocorre a prática de um ato ilícito por parte de um agente público e o referido ilícito estiver invencivelmente caracterizado, bem como, a sua materialidade, não há mais que se falar em presunção de inocência (que não mais poderá ser elidida), mas sim em condenação.

O nexo causal terá que estar obrigatoriamente presente, proveniente do enriquecimento ilícito do agente público vinculado ("em razão") única e exclusivamente ao cargo ou à função pública, sem presunções ou dúvidas. Justamente porque os doutrinadores entendem parecer não haver crime sem resultado. Não podendo olvidar-se que os crimes de mera conduta não possuem resultado.

Retornando a presunção do dano, demonstramos de forma plena e cabal, que o mesmo não se presume, e muito menos o enriquecimento ilícito, pois exige a necessidade e obrigação da restituição do indevidamente auferido, como aduzido anteriormente nos comentários a figura do empobrecido (Art. 884, do Código Civil).

Com relação a lesividade ao erário público, essa decorre necessariamente da prática de um ato ilícito, e não da presunção do mesmo.

É juridicamente impossível caracterizar/comprovar um dano decorrente da presunção de que houve enriquecimento ilícito do agente público. O enriquecimento ilícito deve estar inequivocamente presente no núcleo do ato ilícito (do tipo), demonstrando-se com a conduta ilícita do servidor público o elemento subjetivo do tipo, quanto o seu elemento objetivo. E conforme o caso o elemento normativo do mesmo.

De igual forma sem a demonstração do nexo de causalidade, não há que se falar na prática do enriquecimento ilícito por parte do agente público, e muito menos presumido.

A lesividade presumida no âmbito pecuniário, mercê da lesividade à ordem jurídica, é aquela que onera, sem benefícios, o erário público, em proveito próprio do agente público que deu causa a prática do ato ilícito dolosamente.

É essencial, portanto, que restem provados três requisitos simultâneos: a ilegalidade do ato impugnado, a lesão aos cofres públicos e o enriquecimento ilícito do agente público. [03]

O agente público no exercício de seu cargo ou função, não enriquece aleatoriamente, para tanto é necessário a prática de um ato lesivo ao erário público, salvo casos de enriquecimento não doloso, v.g., recebimento de uma herança, doação etc.

Nesse sentido, cita-se síntese do voto do Des. Fed. Olindo Menezes: [04] "[...] 1 – A Lei nº 8.429/92, de 02.06.1992, alude à indisponibilidade cautelar de ‘bens que assegurem o integral ressarcimento do dano’, no caso, de lesão ao patrimônio público, ou ‘acréscimo patrimonial resultante do enriquecimento ilícito’, na hipótese de enriquecimento ilícito (art. 7º, parágrafo único), mas em qualquer das hipótese, é indispensável que haja razoável demonstração dos supostos danos, ou do enriquecimento sem causa; enfim, de indícios veementes de responsabilidade [...]." [aspas no original].

Segundo o posicionamento do Des. Fed. Tourinho Neto, sobre o tema sub oculis: [05] "[...] 1 – O enriquecimento ilícito se dá com o que se obteve com a prática dos atos de improbidade. Perde-se o que ganhou ilicitamente [...]."

Por fim, a Primeira Seção do STJ considerou ser indispensável a prova da existência de dano ao patrimônio público para que se tenha configurado o ato de improbidade, "inadmitindo o dano presumido", sendo "imprescindível, na avaliação do ato de improbidade, a prova do elemento subjetivo." [06]

Como demonstrado, através de decisões judiciais, o dano não se supõe, ou ele é decorrente de um ato ilegal, ou não há que se falar em enriquecimento ilícito presumido, em decorrência de que o caput do art. 9º, da Lei n. 8.429/92 estabelece o tipo legal vinculado ao exercício da função ou do cargo público do agente, o que significa dizer que ele deverá estar inequivocamente demonstrado e não presumido, sendo que: "A responsabilidade pelo ressarcimento deve ser proporcional aos atos praticados pelo causador do dano." [07]

A improbidade administrativa, mais do que um ato ilegal, pressupõe, necessariamente, a falta de boa-fé, através de um ato desonesto, [08] ou amoral, que deverá estar devidamente comprovado, por intermédio de uma prova direta, em decorrência de que é defeso a sua presunção, em face da inversão do princípio onde o ônus da prova é do Poder Público e não do acusado, ao qual milita constitucionalmente em seu favor o princípio da presunção da inocência, até que se demonstre o contrário.

Ratificando o que foi aduzido, muito próprio foi o julgado do TJ/MG que afastou a indenização sobre "suposto/remoto dano ao erário": "Indenização. Suposto/Remoto dano. Improcedência. Não se indeniza suposto dano ou dano remoto, incerto e eventual, mas somente aqueles diretos e efetivos, decorrentes, imediatamente, do ato omissivo/comissivo, culposo ou doloso imputado a outrem e cuja prova incumbe ao prejudicado demonstrar." [09]

Cabendo ressaltar que o ônus da prova dos fatos tidos, em tese, como irregularidades (Ilícitos) é da Administração Pública [10], no processo administrativo disciplinar.

Somente possui direito a uma reparação ou indenização o sujeito que demonstre de forma inequívoca um prejuízo decorrente de um dano indevidamente praticado por terceiros.

A presunção de um enriquecimento ilícito ou de um suposto dano viola dispositivos de nosso ordenamento jurídico, que não permite esse tipo de situação, justamente porque o enriquecimento ilícito ou o dano devem ser diretos e efetivos, sobejamente provados por intermédio de provas diretas e jamais remotas, incertas, supostas e presumidas, observando-se que tal ocorre inclusive, em prol da segurança jurídica.

Em pronunciamento extremamente oportuno a eminente Ministra Eliana Calmon, [11] em seu magistral voto no REsp. nº 621.415-MG, 2ª T., do STJ, manifestou-se no seguinte sentido: "O conceito de ato de improbidade não é fluido ou intuitivo".

Agrega-se a esse lúcido e jurídico posicionamento o do Ministro Castro Meira, que ao votar no citado REsp. nº 621.415-MG, explicitou bem a matéria aqui analisada: "Como se vê, na hipótese de enriquecimento ilícito (art. 9º), a ação de improbidade não será procedente se não houver prova da lesão (locupletamento sem causa do gestor público). Condenado o réu, perderá os bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio".

A condenação ao ressarcimento de danos causados ao erário exige a prova direta do efetivo prejuízo, que não é presumido, e sim certo e líquido. [12]

Entendemos ser essa a mais plausível solução jurídica, a mais correta e justa, pois não é vedado, pela lei, que o servidor público, regido pela Lei n º 8.112/90, possa ser acionista, cotista ou comanditário de empresa privada, consoante determinação expressa do art. 117, X, do citado estatuto, verbis: "Art. 117. Ao servidor é proibido: [...] X – participar de gerência ou administração de sociedade privada, personificada ou não personificada, salvo a participação nos conselhos de administração e fiscal de empresas ou entidades em que a União detenha, direta ou indiretamente, participação no capital social ou em sociedade cooperativa constituída para prestar serviços a seus membros, e exercer o comércio, exceto na qualidade de acionista, cotista ou comanditário;". –[g.n.]-.

Onde estaria a prática do enriquecimento ilícito por parte do agente público, no exercício de seu cargo ou função, se a conduta do mesmo estivesse adaptada nas situações estipuladas no acima citado e transcrito art. 117, inc. X, da Lei nº 8.112/90?

A Lei de Improbidade Administrativa não proíbe a ascensão lícita financeira/patrimonial do agente público, no exercício de seu cargo ou função, justamente porque um de seus objetivos é combater a prática de atos ilegais que importarem enriquecimento ilícito, lesividade, através do exercício corrompido, abusivo ou imoral da função pública.

Outra situação, que, aliás, é frequente, dá-se quando o agente público possui conta corrente bancária conjunta com seu cônjuge ou filho(a) e eles não são funcionários públicos, mas exercem atividade profissional remunerada. Nesses casos, poderá ocorrer uma movimentação bancária superior ao recebimento mensal do servidor, sem que haja necessariamente subsunção da conduta do referido servidor no disposto pelo inciso VII, do art. 9º, da Lei de Improbidade Administrativa. Portanto, deverá ser provado de forma direta, pelo Poder Público, como já aduzido anteriormente, que o agente público se enriqueceu, ilicitamente, através da prática de um ato devasso ou imoral, no exercício de seu cargo ou função.

Nesse sentido, Marino Pazzaglini Filho [13] afirma: "A meu ver, data venia, incumbe, na ação civil de improbidade, a seu autor provar que o agente público adquiriu valores incompatíveis com a evolução de seu patrimônio e rendimentos em decorrência do exercício abusivo, corrompido, subvertido de seu mandato, cargo, emprego ou função pública.

Não há, na espécie, qualquer previsão legal, explicitamente, de inversão do ônus da prova. E sua adoção, por ser excepcional e afastar a regra processual geral actori encumbit probatio, tem que ser expressa e não tácita ou presumida.

Ademais, a norma do art. 9º, da qual o ‘enriquecimento sem causa’ é uma

sa lícita de acréscimo patrimonial desmedido, mas decorrente do uso indevido da atividade pública para se enriquecer, que configura tal ato de improbidade administrativa.

Do contrário, não sendo identificado o exercício irregular ou imoral do servidor público, não havia a subsunção de sua conduta no tipo infracional do art. 9º, inc. VII, da Lei nº 8.429/92." –[Itálico e aspas no original]-.

das espécies em exame, trata de enriquecimento indevido, sem causa lícita, em razão do exercício da função pública. Assim, não é qualquer cau

Benedicto de Tolosa Filho [14] faz, com muita propriedade, a devida distinção entre a diferença do enquadramento legal do acréscimo patrimonial para o Direito Tributário e para a Lei de Improbidade Administrativa, sublinhando a necessidade de uma prova contundente do Poder Público contra o agente público, para que não haja a indevida inversão do ônus da prova: "O cerne da ação que tipifica ato de improbidade administrativa é o aumento pessoal de patrimônio ou a aquisição disfarçada para terceiros de bens de qualquer espécie, desde que por agente público, no exercício do mandato, cargo, emprego ou função pública, cujo valor não guarde proporção com renda auferida. Para que o Fisco inicie procedimento na área tributária, basta virem à luz os chamados ‘sinais exteriores de riqueza’, cabendo ao averiguado provar que os ditos ‘sinais’ são compatíveis com seus rendimentos. Essa premissa precisa ser tomada com o devido cuidado, quando transposta para a esfera dos atos de improbidade administrativa, sob pena de consagração da inversão do ônus da prova. Se na esfera tributária a presunção é suficiente para desencadeamento de procedimento averiguatório, para apuração de eventual ato de improbidade administrativa mister se faz que o autor da ação civil comprove que o patrimônio do agente público é incompatível, decorrente do exercício de mandato, cargo, emprego ou função pública. A inversão do ônus da prova, embora possa parecer clara pela redação do inciso analisado, deve ser afastada em homenagem ao próprio fundamento do Estado Democrático de Direito. O nexo causal de ato de aumento patrimonial indevido pelo exercício de mandato, cargo, emprego ou função pública, deve ser demonstrado cabalmente pelo autor da ação civil pública." -[Aspas no original]-.

Para a configuração do tipo legal em questão, é necessária a comprovação por intermédio de provas diretas do enriquecimento ilícito ocorrido em razão do exercício de cargo, mandato, função, emprego ou atividades nas entidades públicas. Esse é o nexo causal, sem o qual ficará prejudicada a subsunção da conduta do agente público no presente dispositivo legal: "O inc. VII é extensão e exemplificação do caput, denunciado pelo uso do advérbio notadamente. Este, ao conceituar o enriquecimento ilícito, refere-se a ‘qualquer tipo de vantagem patrimonial indevida em razão do exercício de cargo, mandato, função, emprego ou atividade nas entidades’, o que leva à inexorável conclusão de que deve ser evidenciado o nexo etiológico entre o enriquecimento e o exercício público, ou seja, que a causa do enriquecimento é ilícita porque decorre do tráfico da função pública. Portanto, para a caracterização dessa modalidade de enriquecimento ilícito é imprescindível que a aquisição de valores incompatíveis com a receita do agente público tenha ocorrido em decorrência do subvertido exercício de cargo, mandato, função, emprego ou atividade na Administração Pública direta, indireta, fundacional ou nas entidades a que se refere o art. 1º da Lei Federal nº 8.429/92." [15] –[Itálico e aspas no original]-.

E mais à frente aduzem os ilustres publicistas: [16] "Tendo em vista as rigorosas sanções estipuladas no diploma em questão e sua repercussão na esfera privada e, levando-se em conta que sua aplicação conduz ao desapossamento de bens, à privação de direitos políticos e à interdição para o exercício de função pública, quer dizer, na privação de direitos fundamentais garantidos pela CF, não se pode aceitar a tese da presunção da ilicitude do enriquecimento calcada em também presumida, genérica e vaga improbidade administrativa. No Estado Democrático de Direito é inconcebível exigir do cidadão que prove que é inocente."

A figura do enriquecimento ilícito presumido, justamente por não haver um tipo legal que a preveja, é injurídica, pois muitas injustiças poderão surgir se manejada ação de forma abusiva, precipitada e sem prova direta para tal, tendo em vista que a interpretação levada a efeito pela Administração Pública é como se tratasse de um tipo aberto, em absoluto conflito com o tipo descrito na LIA que é "fechado".

Em crítica aberta a essa elasticidade do inc. VII, do art. 9º, da LIA, o Procurador da República de MG, Dr. José Adércio Leite Sampaio, [17] deixou registrado: "Assim, por exemplo, o art. 9º, inc. VII, cria a figura do ‘enriquecimento ilícito presumido’, ao qualificar como improbidade a aquisição, para si ou para outrem no exercício de mandato, cargo, emprego ou função pública, de bens de qualquer natureza cujo valor seja desproporcional à evolução do patrimônio ou à renda do agente público. Haverá necessária vinculação entre a aquisição de um imóvel que tenha valor desproporcional à renda ou evolução patrimonial do agente público e as funções públicas desse agente? Se atentarmos para todo o art. 9º, veremos presente, para além de uma vantagem patrimonial indevida, o nexo entre a vantagem e a condição ou situação de agente público. O inc. VII silencia a esse respeito: será absoluta a presunção que estatui, ou haverá necessidade desse vínculo, transformando-se a presunção em relativa com ou sem a inversão do ônus da prova?"

Em seguida, o eminente Procurador da República conclui: [18] "Se em vez de custos marginais pensarmos que as normas jurídicas são recortes lingüísticos, orientados por pressupostos comunicativos, para formação de consensos informados, chegaremos à mesma conclusão de falta de clareza e precisão do dispositivo."

Portanto, ilegal é a inversão do ônus da prova, pois o titular da persecução disciplinar deverá provar de forma direta que houve enriquecimento ilícito do agente público em decorrência do exercício do seu mandato, cargo, função ou emprego. Sem essa prova direta, a investigação disciplinar é natimorta, por faltar-lhe requisito essencial para a validade da própria execução, sendo a mesma inepta. [19]

Aliás, é de se ressaltar, por oportuno, que a inversão do ônus da prova só ocorre em nosso direito positivo em situações especialíssimas de relevante interesse público ou de proteção a hipossuficientes, como verba gratia: Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8078/90), em prol do consumidor de produtos ou serviços lesados e Lei de Proteção ao Meio Ambiente (Lei nº 6.938/81) onde o agressor é que tem de provar a falta de nexo causal entre a sua atividade e o desastre ambiental ocorrido.

Para que ocorra a subsunção da conduta do agente público no presente tipo legal, necessário se faz que haja a comprovação explícita de que o agente público, no exercício da função, se corrompeu ou aceitou rendimentos ou vantagens, para atuar em favor de terceiros. Esse liame – função pública e recebimento de vantagens econômicas – é de suma importância para a tipificação da conduta do agente público no dispositivo sub oculis.

Existe a hipótese de um agente público que invista na Bolsa de Valores, recebendo dividendos, ou ganhe um bilhete premiado da loteria, fatos esses que certamente fariam com que o referido servidor público tivesse movimentação bancária desproporcional à renda recebida por exercer a função pública.

Por igual, se o agente público recebesse uma herança, uma doação ou vendesse um imóvel, também estaria configurada movimentação bancária superior à remuneração recebida como integrante de determinado ente de direito público.

Por outro lado, não se pode presumir que elevada movimentação financeira em determinado CPF/MF seja de plano, movimentação ilícita incompatível com a renda do agente público/contribuinte, pois:

a) caso existam aplicações financeiras vinculadas à conta corrente bancária do contribuinte, a cada saída para a conta investimento considera-se uma movimentação, mesmo que essa movimentação se trate do mesmo dinheiro. O mesmo ocorre no caso de utilização de cheque especial.

Exemplo: Determinado servidor público possuía em conta R$ 100.000,00 (cem mil reais). Emprestou para amigo José R$ 90.000,00 (noventa mil reais), José na semana seguinte pagou R$ 80.000,00 (oitenta mil reais) e na outra semana pediu de volta R$ 50.000,00 (cinqüenta mil reais) emprestados, o que aconteceria em termos de movimentação na conta do Investigado? Uma tabela ilustra a situação:

EXEMPLO HIPOTÉTICO

01.01.11

Saldo na conta

100.000,00

02.01.11

Servidor Investigado transfere para José

90.000,00 (-)

09.01.11

José paga parte

80.000,00

16.01.11

Servidor Investigado re-empresta para José

50.000,00 (-)

20.01.11

Servidor Investigado emprestou

30.000,00 (-)

Analisando esses fatos hipotéticos, tem-se que o servidor investigado, com apenas R$ 100.000,00 (cem mil reais) movimentou R$ 170.000,00 (cento e setenta mil reais) durante vinte dias e se essa situação perdurar durante um ano, ele movimentará milhões de reais com o mesmo valor inicial, sem que a sua conduta seja subsumida em um fato típico.

Nessas situações, sobreleva salientar que o agente público não estaria transgredindo o disposto no inciso VII, do art. 9º, da Lei de Improbidade Administrativa, justamente porque inexiste o tipo legal de enriquecimento ilícito presumido.

Esse esclarecimento faz-se necessário, pois o dispositivo legal em questão determina que somente no exercício irregular da função pública é que haverá o nexo de causalidade prova, em tese, de que a aquisição de bens incompatíveis com a renda declarada, aí se inclui, em sentido lato, depósito em dinheiro ou em títulos em bancos, recebidos pelo agente público, e nessa qualidade é que será responsabilizado, por um possível enriquecimento ilícito. Sem esse liame, função pública e acréscimo patrimonial, não há que se falar em improbidade administrativa, pois a lei não pune quem alcança uma situação financeira de destaque licitamente, em decorrência de que a infração disciplinar reside na utilização da função pública para a obtenção de vantagem ilícita ligada ao oferecimento de uma contraprestação que impulsiona a evolução ilícita do patrimônio ou a renda a maior do agente público. Observando-se que em hipótese alguma não poderá haver o elemento subjetivo do tipo legal, qual seja, o dolo, de forma presumida.

Demonstrada e comprovada através de prova direta a licitude da evolução patrimonial ou da renda do servidor público inexiste justa causa para a investigação, podendo-se falar inclusive em direito à obtenção de ressarcimento por danos morais e materiais em prol do servidor público – probo, é claro – investigado por mera emulação ou erro evidente.


III - SEM A PRÁTICA DE ATO ILÍCITO DOLOSO NO EXERCÍCIO DA FUNÇÃO PÚBLICA NÃO CONFIGURA-SE O TIPO LEGAL DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA:

Para fins de comprovação da improbidade administrativa, é indispensável que haja o elemento subjetivo na conduta caracterizado pelo dolo do agente público, [20] pois do contrário não ocorrerá, nem em tese, ato ímprobo.

Esse posicionamento consolidado pelo Superior Tribunal de Justiça, da necessidade de identificação do dolo, para se concluir pela presença do elemento subjetivo do tipo legal a orientar a conduta ímproba, impede que se estabeleça a figura jurídica do dano presumido ao erário público, proveniente de enriquecimento ilícito.

Ora, a variação patrimonial a descoberto não é ilícito funcional, mas poderá advir da prática de ato ilícito, como decidido pela 3ª Seção do Superior Tribunal de Justiça: [21] "Administrativo. Mandado de Segurança. Servidor Público. Abertura de Sindicância. Direito-dever da Administração. Movimentação financeira superior a patrimônio e renda declarados. Indícios de irregularidades. Justa Causa. Ordem denegada. 1. A abertura de sindicância constitui direito-dever da Administração que, em tese, não fere direito líquido e certo do servidor. Inteligência do art. 143 da Lei 8.112/90 e art. 11, inc. II, da Lei 8.429/92. 2. Tendo em vista os princípios da boa-fé e da segurança jurídica e, ainda, a repercussão negativa na esfera funcional, familiar e pessoal do servidor público, mostra-se indispensável a necessidade de justa causa para a abertura de sindicância ou processo disciplinar. 3. Havendo indícios de que a movimentação financeira de servidor público mostra-se incompatível com a renda e patrimônio declarados, cabe à autoridade competente apurar a suposta irregularidade, porquanto dela pode originar a prática de ilícito administrativo. 4. Segurança denegada." –[g.n.]-.

Nesse sólido posicionamento da 3ª Seção do STJ, foi pacificado o entendimento de que havendo indícios de que a movimentação financeira de servidor público mostra-se incompatível com a renda e patrimônio declarados, deve a autoridade administrativa apurar a suposta irregularidade, "porquanto dela pode originar a prática de ilícito administrativo". Isso porque, não é tipo infracional disciplinar a movimentação financeira incompatível com a situação funcional de servidor público, mas poderá advir da função pública, quando diretamente demonstrado um ato comissivo ou omissivo ilícito praticado no exercício ou em decorrência do munus profissional.

Isso porque, a responsabilidade civil, penal e administrativa do servidor está vinculada ao exercício irregular de suas atribuições (artigo 121, da Lei nº 8.112/90) e como tal é exigida a violação de seus deveres e obrigações, devidamente explicitados pela Lei acima referida, em seus artigos 116, 117 e 132.

Sobre a responsabilidade disciplinar do servidor público averbamos: [22] "A responsabilidade disciplinar do servidor público é aquela verificada no exercício de seu cargo de provimento efetivo ou provisório, que incorra na prática de ato ilícito, por ação ou omissão."

Nesse sentido, o artigo 124 da Lei nº 8.112/90, estabelece que a responsabilidade civil-administrativa resulta de ato omissivo ou comissivo praticado pelo servidor público no desempenho do cargo ou função.

Apesar de ser dificílima a coleta da prova direta de recebimento de vantagem econômica por parte do servidor público no desempenho de seu munus público, é dever do poder público produzir tal prova, posto que o tipo legal previsto no artigo 9º, inciso VII, da Lei nº 8.429/92 exige, para sua configuração o elemento subjetivo do tipo, o dolo, resultante da prática de ato funcional imoral e devasso.

Não basta para a Administração Pública presumir que a variação patrimonial incompatível com a renda auferida no cargo ou função pública é decorrente da prática de um ilícito funcional, ela possui o dever de provar de forma direta que houve o favorecimento de outrem, ou que o exercício corroído, abusivo ou imoral da função pública trouxe para o servidor público vantagens financeiras, de forma a contribuir para com o seu enriquecimento ilícito.

Essa obrigação da Administração Pública fica ainda mais evidente quando se constata que o disposto no artigo 143, da Lei nº 8.112/90 impõe a abertura de investigação disciplinar, mediante sindicância ou processo administrativo disciplinar, quando a autoridade "tiver ciência de irregularidade no serviço público". Ou seja, a irregularidade não é a variação patrimonial incompatível com a renda recebida pelo servidor, mas sim o exercício irregular de sua função, capaz de proporcionar-lhe, através de benefício direto ou indireto para terceiros, o enriquecimento ilícito.

E para não deixar a menor margem de dúvida, o artigo 148, da Lei nº 8.112/90 define o processo administrativo disciplinar como: "o processo disciplinar é o instrumento destinado a apurar responsabilidade de servidor por infração praticada no exercício de suas atribuições, ou que tenha relação com as atribuições do cargo em que se encontre investido."

Após a leitura e interpretação acurada do acima transcrito artigo 148, da Lei nº 8.112/90, fica demonstrado que o enriquecimento ilícito do servidor público, terá, por obrigação legal, que ter relação direta com as atribuições do seu cargo, pois do contrário não estará presente o elemento subjetivo do tipo, o dolo, necessário para a subsunção de sua conduta no artigo 9º, inciso VII, da Lei nº 8.429/92.

Isso porque, na aplicação das penalidades no processo administrativo disciplinar "[...] serão consideradas a natureza e a gravidade da infração cometida, os danos que dela provierem para o serviço público, as circunstâncias agravantes ou atenuantes e os antecedentes funcionais." (art. 128, da Lei nº 8.112/90).

Dessa forma, torna-se obrigatório para o poder público demonstrar qual foi o ato ilícito praticado no exercício do cargo ou da função, ou em decorrência do mesmo, os danos que dele provieram, para que seja aplicada a regra da proporcionalidade quando da imposição da sanção disciplinar.

Ausente uma causa administrativa disciplinar, por não ser explicitada a conduta funcional irregular, bem como o dano ao erário, não há razoabilidade na imputação objetiva de enriquecimento ilícito presumido, decorrente de variação patrimonial incompatível.

A presunção de que houve enriquecimento ilícito decorrente do exercício da função pública é imoral e fere a regra de razoabilidade, porquanto a responsabilidade pela variação patrimonial elevada não decorrente de um ilícito praticado no exercício da função pública, exclui a responsabilidade disciplinar e geral do servidor público contribuinte do imposto de renda, ocorrendo uma possível infração tributária ou penal, sendo essa última decorrente de uma sonegação fiscal, se for a hipótese do caso concreto.

Jamais a sanção administrativa imposta poderá representar um ato arbitrário e ilegal, contrário ao fundamento legal de sua própria validade, porquanto deverá guardar correlação com a prova direta produzida no processo respeitada a regra de proporcionalidade da infração ("exercício irregular da função pública") praticada pelo servidor público.

No processo administrativo disciplinar vigora o princípio da tipicidade, como corolário do princípio da legalidade, porquanto a Constituição Federal estabelece que não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal (art. 5º, XXXIX). Mesmo direcionado para o direito penal, o princípio da tipicidade passou a ter ampla aplicação em todo o ius puniendi do Estado, inclusive no processo administrativo disciplinar.

E na improbidade administrativa a tipicidade vem interligada à indispensabilidade da demonstração do elemento subjetivo da conduta, que é o dolo. [23]

Sem que haja e fique demonstrada uma conduta dolosa praticada pelo servidor público no exercício de sua função, ou em decorrência da mesma, não há como se presumir o dano ao patrimônio público. [24]

Sobre o tema, magistral é a lição do Ministro Luiz Fux: [25] "1. O caráter sancionador da Lei 8.429/92 é aplicável aos agentes públicos que, por ação ou omissão, violem os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, lealdade às instituições e notadamente: (a) importem em enriquecimento ilícito (art. 9º); (b) causem prejuízo ao erário público (art. 10); (c) atentem contra os princípios da Administração Pública (art. 11) compreendida nesse tópico a lesão à moralidade administrativa. 2. A má-fé, consoante cediço, é premissa do ato ilegal e ímprobo e a ilegalidade só adquire o status de improbidade quando a conduta antijurídica fere os princípios constitucionais da Administração Pública coadjuvados pela má-intenção do administrador. 3. A improbidade administrativa está associada à noção de desonestidade, de má-fé do agente público, do que decorre a conclusão de que somente em hipóteses excepcionais, por força de inequívoca disposição legal, é que se admite a sua configuração por ato culposo (artigo 10, da Lei 8.429/92). 4. O elemento subjetivo é essencial à caracterização da improbidade administrativa, sendo certo, ainda, que a tipificação da lesão ao patrimônio público (art. 10, caput, da Lei 8429/92) exige a prova de sua ocorrência, mercê da impossibilidade de condenação ao ressarcimento ao erário de dano hipotético ou presumido. Precedentes do STJ: REsp 805.080/SP, PRIMEIRA TURMA, DJe 06/08/2009; REsp 939142/RJ, PRIMEIRA TURMA, DJe 10/04/2008; REsp 678.115/RS, PRIMEIRA TURMA, DJ 29/11/2007; REsp 285.305/DF, PRIMEIRA TURMA; DJ

13/12/2007; e REsp 714.935/PR, SEGUNDA TURMA, DJ 08/05/2006; (...)."

Em sendo assim, é de se destacar que torna-se absolutamente necessário a demonstração da existência do nexo de causalidade entre a possível prática de ato funcional ilícito e a verificação de um patrimônio incompatível com a renda do servidor público, visto que a Comissão Disciplinar não possui poderes para usurpar a competência tributária da Receita Federal e fazer um verdadeiro "lançamento tributário", constituindo crédito fiscal contra o investigado, com a finalidade de demonstrar uma única prática de exercício irregular na função pública.


IV - INEXISTÊNCIA DE "IMPROBIDADE TRIBUTÁRIA" NA ESFERA DO DIREITO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR PARA FINS DE ENRIQUECIMENTO ILÍCITO:

Ausente uma causa legítima (justa causa) para a instauração e desenvolvimento do processo administrativo disciplinar, que não demonstre o exercício irregular praticado pelo agente público, quando investigado, mas que prende-se somente ao resultado de uma auditoria patrimonial, que a todo custo tenta apontar equívocos tributários do servidor contribuinte, constantes na sua declaração de rendas, ou na movimentação bancária; entretanto, não compete à Comissão Disciplinar constituir o crédito tributário ou rever as respectivas declarações de rendas, utilizando-as como provas contra o investigado, por total incompetência funcional.

E essa incompetência funcional decorre de dois fatores. O primeiro aspecto está vinculado à ausência de competência legal da persecução disciplinar de investigar servidor público que não tenha cometido irregularidade no âmbito do serviço público (elemento subjetivo do tipo legal para a configuração do ato ímprobo), na forma do artigo 143, da Lei nº 8.112/90. Trata-se da justa causa para iniciar-se o processo administrativo disciplinar.

Quanto a esse fato já ficou bem nítido, a necessidade da demonstração na conduta do investigado da comprovação do elemento subjetivo do tipo legal, qual seja, o dolo; portanto, deve praticar o ilícito de modo doloso (elemento subjetivo do tipo do artigo 9º, inc. VII, da Lei nº 8.429/92), capaz de legitimar a acusação de enriquecimento ilícito, visto ser essencial à caracterização da improbidade administrativa.

Sobre esse tema, já existe a devida sedimentação jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça, como já declinado alhures e reafirmado nos seguintes julgados: " (...) 1. Recentemente, o Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento pela imprescindibilidade do elemento subjetivo para a configuração do ato de improbidade administrativa. 2. "As duas Turmas da 1ª Seção já se pronunciaram no sentido de que o elemento subjetivo é essencial à configuração da improbidade: exige-se dolo para que se configurem as hipóteses típicas dos artigos 9º e 11 da Lei 8.429/92, ou pelo menos culpa, nas hipóteses do art. 10" (REsp 479.812/SP, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, 1ª Seção, DJe 27/9/10). 3. O aresto impugnado reformou a sentença e entendeu pela não consumação do ato de improbidade do art. 11, II, da Lei 8.429/92 em face da ausência de dolo na conduta (fl. 1.383e). Assim, estando o acórdão recorrido em perfeita consonância com a jurisprudência deste Tribunal, incide, na espécie ora em exame, a Súmula 83/STJ. 4. Agravo regimental não provido." [26] e "(...) 3. "A jurisprudência desta Corte já se manifestou no sentido de que se faz necessária a comprovação dos elementos subjetivos para que se repute uma conduta como ímproba (dolo, nos casos dos artigos 11 e 9º e, ao menos, culpa, nos casos do artigo 10), afastando-se a possibilidade de punição com base tão somente na atuação do mal administrador ou em supostas contrariedades aos ditames legais referentes à licitação, visto que nosso ordenamento jurídico não admite a responsabilização objetiva dos agentes públicos." (REsp nº 997.564/SP, Relator Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, in DJe 25/3/2010). 4. Agravos regimentais providos." [27]

Não se presume a má-fé e muito menos o dolo (elemento subjetivo do tipo legal) sub oculis, visto que eles devem estar presentes na conduta do agente público que pratica o delito em tela e não em atos da vida privada do servidor público, v.g., entrega de sua declaração de rendas.

Por sua vez, a segunda incompetência da esfera disciplinar decorre do que vem descrito no artigo 142, do CTN, visto competir privativamente à autoridade administrativa tributária constituir o crédito tributário pelo lançamento, "assim entendido o procedimento administrativo tendente a verificar a ocorrência do fato gerador da obrigação correspondente."

Dessa forma, quando a Comissão Disciplinar invade a competência exclusiva da Receita Federal para fiscalizar a declaração de rendas do servidor público investigado e estabelecer irregularidades fiscais/tributárias, induzindo a um pseudo enriquecimento ilícito quando verificado um patrimônio a descoberto, ou variação patrimonial superior a renda declarada, sem que seja apontada uma irregularidade funcional, ocorre, de modo ilegal, o abuso de poder em relação a persecução disciplinar, em face da ausência de justa causa.

Sem o nexo de causalidade, consistente na ação e resultado em relação a prática de um ato ilícito funcional, a Comissão Disciplinar não possui poderes para efetuar o "lançamento tributário", com base na declaração de rendas do servidor investigado, por ser tal ato privativo da autoridade fazendária.

Aliás, sobre o tema, o artigo 147, do CTN dispõe, litteris: "Art. 147 - O lançamento é efetuado com base na declaração do sujeito passivo ou de terceiro, - quando um ou outro, na forma da legislação tributária presta à autoridade administrativa informações sobre matéria de fato, indispensável à sua efetivação."

Em sendo assim, a Comissão Disciplinar, sem a demonstração de infração disciplinar, não pode, nem em tese, arvorar-se em autoridade tributária para devassar a vida fiscal e bancária do servidor público investigado, em total violação constitucional, para demonstrar uma variação patrimonial incompatível com a renda de servidor público e, via de consequência, fiscalizá-lo tributariamente, a ponto de constituí-lo em patrimônio a descoberto ou qualquer outra irregularidade tributária.

Somente a autoridade fazendária é que pode fiscalizar, através da expedição do Mandado de Procedimento Fiscal - MPF, o servidor contribuinte, que caiu na "malha" ou em algum critério objetivo estabelecido pelo fisco, em face ao princípio da isonomia tributária.

Em momento algum a lei outorga poderes para a Comissão Disciplinar fiscalizar as declarações de rendas do servidor público, para fins de possível verificação da prática de ato de improbidade administrativa "tributária", descrita no tipo legal de enriquecimento ilícito (art. 9٥, da Lei nº 8.429/92).

Isso porque, a competência para fiscalizar, lançar, glosar e etc., é indelegável da Receita Federal e não da Comissão Disciplinar. Além do mais, a Comissão Disciplinar apenas possui poderes para investigar o exercício irregular do cargo ou da função pública do servidor, e não arrogar-se a qualidade de fiscal tributário.

Na prática vem ocorrendo essa grave distorção de funções, onde a Receita Federal confunde a esfera tributária com a disciplinar, independentemente de suas atribuições legais.

Não resta dúvida que, embasado por uma Auditoria Patrimonial, antecedente a instauração do PAD, após ter obtido a autorização judicial para investigar a vida fiscal ou bancária do servidor, é lícito ao Poder Público, após a aludida conclusão, fazer o juízo de admissibilidade e preconizar pela abertura do processo administrativo disciplinar.

Isso porque, a variação patrimonial incompatível com a função pública do servidor pode dar causa a prática de ato ilícito funcional.

Contudo, na realidade, a Comissão Disciplinar não se desincumbe de demonstrar o exercício irregular da função pública do servidor investigado, e sem competência legal, se torna o verdadeiro "fiscal tributário". Quase sempre as Comissões Disciplinares descambam para a presunção de dano ao patrimônio público quando estabelecem o enriquecimento ilícito do servidor investigado, sem que haja o devido nexo de causalidade da conduta do servidor contribuinte, com a sua função pública.

Essa situação, embora usual, é ilegal e fere o plasmado do princípio da legalidade, porquanto o poder disciplinar não pode ser irresponsável ao ponto de violar a regra de competência, e imputar a qualquer custo a figura do enriquecimento ilícito presumido (inexistente na LIA), sem a demonstração do elemento subjetivo do tipo, que é o dolo, e da existência do mesmo na conduta do servidor investigado (vontade livre e consciente de concretizar as características objetivas do tipo legal).

Constatado um incorreto uso do poder julgador administrativo disciplinar como na situação descrita, ocorre a desproporcionalidade da sanção imposta, tendo em vista que "a punição administrativa há de se nortear, porém, segundo o princípio da proporcionalidade, não se ajustando à espécie a aplicação de penalidade para um tipo não previsto na lei de enriquecimento ilícito presumido, desatrelado da função pública." [28]

O julgamento do processo administrativo disciplinar não pode pautar-se em ato desproporcional ou arbitrário, sob pena de nulidade, como preconizado pelo STJ: [29] "(...) 1. O Poder Judiciário pode e deve sindicar amplamente, em mandado de segurança, o ato administrativo que aplica a sanção de demissão a Servidor Público, para verificar (a) a ocorrência dos ilícitos imputados ao Servidor e, (b) mensurar a adequação da reprimenda à gravidade da infração disciplinar, não ficando a análise jurisdicional limitada aos seus aspectos formais. 2. A previsão legal da possibilidade de o agente administrativo superior agravar a pena sugerida pela Comissão Processante tem limite na ocorrência de contrariedade à prova dos autos; fora dessa hipótese, se afrontarão, abertamente, as garantias processuais na via administrativa; a compreensão da atividade de agravamento de sanção deve ser temperada com limite rígido, para que não se abra a porta ao arbítrio da autoridade hierárquica, que, ao final, aplica a sanção administrativa. 3. A materialização do dever-poder estatal de punir deve estar compatibilizada com os preceitos fundamentais que tutelam a dignidade da pessoa humana, de sorte que o julgamento do Processo Administrativo Disciplinar não pode consubstanciar ato arbitrário pautado em presunções subjetivas, mas deve sempre estar calcado em prova robusta e coerente, assegurando a aplicação do princípio da segurança jurídica às partes. 4. Os danos materiais e morais derivados de uma punição injusta ou desproporcional ao ato infracional cometido são insuscetíveis de eliminação, por isso a imposição de sanção disciplinar está sujeita a garantias muito claras, entre as quais avulta de importância a observância da razoabilidade e proporcionalidade entre a conduta imputada e a sanção aplicada. 5. Neste caso, a autoridade superior não apontou objetivamente que a Comissão Processante teria concluído por apenação destoante das provas dos autos; na verdade, o agravamento da sanção (de detenção para exclusão da Corporação) se deu apenas com base na gravidade do comportamento inadequado, violador da ética e disciplina, que devem fazer parte da honra militar. 6. Não obstante a orientação que apregoa não repercutir a sentença penal, ainda que absolutória, no Juízo Cível, não se pode desprezar o fato de que sequer foi instaurado qualquer procedimento criminal em relação ao ilícito imputado ao Militar, reforçando a desproporcionalidade entre a sanção aplicada e a conduta a ser punida, que, frise-se, também constitui ilicitude punível na seara penal (porte ilegal de arma de fogo). 7. Recurso parcialmente provido para anular o ato de exclusão do recorrente da Polícia Militar de Pernambuco, determinando sua imediata reintegração, remanescendo a aplicação da sanção sugerida pela Comissão Processante, em seu grau mínimo, a dizer, detenção por 21 dias." –[g.n.]-.

Em seu magistral voto, o Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, baseando-se na doutrina, arremata: "11.Vale referir, neste ponto, ante a extrema pertinência de suas observações, o douto magistério do Professor MAURO ROBERTO GOMES DE MATTOS: (...) No processo administrativo disciplinar do século XXI, não vigora mais o absoluto e irrestrito discricionarismo da Comissão Disciplinar e da Autoridade administrativa julgadora, pois a margem de escolha e de oportunidade da decisão, como já aduzido, devem observar obrigatoriamente os elementos jurídicos objetivos previstos em Lei. Por mais grave que seja a acusação imputada ao servidor acusado, o seu julgamento deve ser justo e imparcial, totalmente adstrito ao plasmado da verdade real. A Administração Pública possui a relevante função de julgar as condutas infracionais de seus servidores, acarretando com isso sérios reflexos em suas vidas profissionais e pessoais e, em assim sendo, possui o dever ser inteiramente fiel às provas produzidas na fase da instrução e aos fatos que foram legalmente demonstrados no processo administrativo disciplinar (Lei nº 8.112⁄90 Interpretada e Comentada, Regime Jurídico Único dos Servidores Públicos da União, Rio de Janeiro, América Jurídica, 2008, pp. 1247). 12. Com efeito, a materialização do dever-poder estatal de punir administrativamente os seus Servidores deve estar compatibilizada com os preceitos fundamentais que tutelam a dignidade da pessoa humana. Os danos materiais e morais derivados de uma punição injusta ou desproporcional ao ato infracional cometido são insuscetíveis de eliminação, por isso a imposição de sanção disciplinar está sujeita a garantias muito claras, entre as quais avulta de importância a proporcionalidade entre a conduta e a sanção." –[Itálico nosso]-.

Dessa forma, não há que se falar em punição de servidor público por uma pseudo improbidade administrativa tributária, desatrelada da prática de ato ilícito funcional.


V - AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA ENSEJA O ARQUIVAMENTO DO PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR:

A atual Constituição Federal estabelece limites à atuação do Estado, conferindo ao cidadão direitos e garantias fundamentais, extensivos aos servidores públicos.

Em sendo assim, quando do juízo de admissibilidade da instauração do Processo Administrativo Disciplinar, é dever da Administração Pública demonstrar que existe uma suposta materialidade e autoria, reveladas por provas diretas. Em outras palavras, é dever demonstrar que houve a prática de ato ilícito, em tese, no exercício do cargo ou da função do servidor público, consistente em ato comissivo ou omissivo.

Em se tratando de servidor público lotado na Secretaria da Receita Federal do Brasil, deverá ser imputada a prática de um ato, que tenha beneficiado determinada pessoa, quer através de uma ação, ou de omissão, ainda mais quando se tenta provar a prática de possível enriquecimento ilícito.

Em situação similar à presente, onde o Ministério Público Federal do Rio de Janeiro-RJ ingressou com respectiva ação penal contra determinada Juíza Federal onde a imputação consistia em recebimento de vantagens ilícitas, capazes de ensejar enriquecimento ilícito, sem contudo apontar qual a solicitação de vantagem, que tipo, e se em espécie, quanto, bem como qual foi o valor da oferta e o seu autor, o Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, em sede de despacho interlocutório nos autos do HC nº 201.924, com precisão excepcional, destacou: [30] "(...) 7. A increpação de que a Juíza teria exigido ou recebido vantagens financeiras, em razão do desempenho da função judicante, embora se trate - sem dúvida - de fato de comprovação dificílima, precisa ser devidamente evidenciada na sua materialidade e cercada de indícios veementes quanto à sua autoria, o que os votos vencidos no julgamento do recebimento da denúncia do TRF2 ausente neste caso. 8. Na verdade, em crime deste jaez, como em outros em que a demonstração factual é áspera, deve o recebimento da denúncia ser avaliado e sopesado com peculiar rigor, para não se permitir o trâmite de Ação Penal sem o atendimento daquele seu requisito conspícuo, sem o qual essa iniciativa não pode ser exercida e, se exercida, não deve ser acatada, ou seja, a justa causa; dessa forma, para se ter maior segurança na apreciação do pedido de liminar, faz-se indispensável que o doutro TRF2 informe, com precisão, os seguintes pontos: (a) a quem a Magistrada teria feito a solicitação de vantagem? (b) quem teria feito a oferta de vantagem ilícita? (c) quando teriam ocorrido esses eventos? (d) quais os elementos indiciários que os comprovam? 9. Dessa forma, abstenho-me, por ora, de apreciar o pedido de tutela liminar neste HC, até que a douta Corte de origem preste as informações sobre os pontos relevantes acima relatados, requerendo urgência. 10. Publique-se; intimações necessárias."

Da mesma forma, indaga-se na hipótese da figura típica do enriquecimento ilícito de servidor público lotado na Receita Federal do Brasil:

a)a quem o servidor teria feito a solicitação de vantagem?

b)qual o contribuinte teria feito a oferta de vantagem ilícita?

c)qual foi o ato praticado no exercício da função (atuação comissiva ou omissiva) que tenha gerado indício de que o servidor prejudicou o erário, em prol do contribuinte?

d)quando teriam ocorrido esses eventos?

e)quais os meios de prova direta que os comprovam.?

Isso porque, sem a demonstração de uma acusação certa, plausível, fundamentada em fatos concretos e em provas diretas, não há como justificar-se a justa causa para a admissibilidade da persecução disciplinar.

Nesse sentido, ao justificar a necessidade dessa ponderação (justa causa) para a instauração do Processo Administrativo Disciplinar, o Ministro Arnaldo Esteves Lima, ao relatar o já citado MS nº 10.442/DF, baseando-se na doutrina vigente, assim se expressou: "Nesse sentido transcrevo a lição de MAURO ROBERTO GOMES DE MATTOS (Lei nº 8.112/90 Interpretada e Comentada, 1ª ed., Rio de Janeiro, América Jurídica, 2005, p. 745): ‘A boa fé e a segurança jurídica retiram do administrador público a faculdade da instauração do procedimento administrativo genérico, sem que haja aparente transgressão aos princípios disciplinares que regem a vida funcional. Não funciona o processo disciplinar como uma ‘caixa de surpresas’ onde a ausência de materialidade de uma possível falta funcional poderia proporcionar a instauração de inquérito administrativo para devassar a vida do servidor, no afã de se encontrar algo que possa ser usado contra ele. Não é assim que funciona." –[Itálico nosso]-.

Em outro expressivo julgado, a 5ª Turma do STJ, no RMS nº 11.587 [31] anulou uma punição levada a efeito contra um servidor público militar, exatamente por não haver ficado caracterizada a justa causa que deveria embasar o processo administrativo disciplinar, verbis: "Constitucional. Administrativo. Militar. Atividade Científica. Liberdade de expressão independente de censura ou licença. Garantia Constitucional. Lei de hierarquia inferior. Inafastabilidade. Processo Administrativo Disciplinar. Transgressão Militar. Inexistência. Falta de justa causa. Punição Anulada. Recurso Provido. I - A Constituição Federal, à luz do princípio da supremacia constitucional, encontra-se no vértice do ordenamento jurídico, e é a Lei Suprema de um País, na qual todas as normas infraconstitucionais buscam o seu fundamento de validade. II - Da garantia de liberdade de expressão de atividade científica, independente de censura ou licença, constitucionalmente assegurada a todos os brasileiros (art. 5º, IX), não podem ser excluídos os militares em razão de normas aplicáveis especificamente aos membros da Corporação Militar. Regra hierarquicamente inferior não pode restringir onde a Lei Maior não o fez, sob pena de inconstitucionalidade. III - Descaracterizada a transgressão disciplinar pela inexistência de violação ao Estatuto e Regulamento Disciplinar da Polícia Militar de Santa Catarina, desaparece a justa causa que embasou o processo disciplinar, anulando-se em conseqüência a punição administrativa aplicada. III - Recurso conhecido e provido."

Consagrado tal princípio para o Direito Administrativo Disciplinar, o Superior Tribunal de Justiça decidiu: [32] "Configura-se admissível o trancamento do Processo Administrativo Disciplinar em face da manifesta e inequívoca ausência do elemento subjetivo da conduta."

Sem a demonstração do elemento subjetivo da conduta (prevista no tipo legal), como destacado no aresto acima citado, situação idêntica que ora defendemos, deve estar presente uma justa causa para a instauração e desenvolvimento do processo administrativo disciplinar - PAD.

Isso porque sem a demonstração da prática do ilícito funcional, com a descrição dos elementos objetivos, subjetivos e normativos (se houver), viola-se o próprio plasmado do devido processo legal, da ampla defesa e do contraditório, como decidido pelo TRF - 2ª Região: [33] "Agravo de Instrumento. Direito Processual Civil. Antecipação dos efeitos da tutela. Art. 273, CPC. Processo Administrativo Disciplinar. Indícios de ausência de justa causa. Violação á ampla defesa e ao contraditório. Improvimento. 1. O agravo de instrumento interposto pela União Federal tem por objeto o requerimento de reforma da decisão que, nos autos da ação anulatória de ato administrativo, deferiu requerimento de antecipação de tutela para o fim de "determinar a suspensão dos efeitos da Portaria n. AGU 785/2008, em relação ao AUTOR". 2. A referência, em tese, da ausência de assiduidade e, consequentemente, de recebimento indevido de valores de ajuda de transporte, com efeito, viola as garantias do devido processo legal, da ampla defesa e do contraditório, eis que impede que a pessoa a quem são apontados determinadas fatos amoldados à figura típica de infração funcional, de exercer plenamente sua defesa. 3. Não houve apreciação do recurso administrativo interposto pelo Agravado e, mesmo assim, pretendeu-se dar início ao processo administrativo. 4. Em se tratando de hipótese de aplicação do art. 273, do Código de Processo Civil, deve ser prestigiada a decisão do juiz de 1º. grau, autoridade judiciária que mais próxima se encontra dos fatos narrados na petição inicial e na contestação e, por isso, somente em casos de decisão teratológica, manifestamente ilegal ou fora da razoabilidade jurídica, deve ser possível a alteração do que foi julgado. Do contrário, deve-se manter a decisão, como ocorre no caso em questão. 5. Agravo de instrumento conhecido e improvido."

De igual modo decidiu o TRF - 1ª Região, verbis: "Administrativo e Constitucional. Instauração de Processo Administrativo. Justa Causa. Inobservância das garantias constitucionais do Devido Processo Legal, da Ampla Defesa e do Contraditório. Anulação das Portarias. 1. O dever-poder da Administração Pública para sindicar eventuais ilícitos administrativos não prescinde das garantias individuais do devido processo legal, ampla defesa e contraditório. 2. A instauração de processo administrativo pressupõe justa causa, consubstanciada ao menos em indício de que tenha o impetrado cometido irregularidades no exercício de atribuições (art. 143 da Lei 8.112/90). 3. A instauração de processo administrativo para satisfação de interesses alheios à Administração Pública constitui desvio de finalidade e justifica a intervenção judicial para recomposição da finalidade e moralidade públicas. 4. Anulam-se as Portarias 1.035/97, 159/98, 160/98, 066/98, 189/989 e 291/98, que instauraram Processo Administrativo Disciplinar contra o impetrante, por ausência de suporte fático que evidencie indícios de irregularidade no serviço público. 5. Remessa oficial a que se nega provimento" [34]; "(...) 1. A instauração de processo administrativo pressupõe a existência de justa causa, consubstanciada ao menos em indício de que tenha o servidor cometido irregularidades no exercício de suas atribuições (art. 143 da Lei 8.112/90). 2. É cabível o trancamento do procedimento administrativo instaurado quando há falta de justa causa (contingente mínimo de elementos probatórios sobre a existência do ato ilícito e da autoria) em face da prova pré-constituída (...)." [35]

Assim sendo, em respeito ao mandamento constitucional da inviolabilidade da intimidade, da vida privada, honra e da imagem do servidor público, só deverá ser instaurado o Processo Administrativo Disciplinar quando haja um fundamento razoável, plausível e prova direta, pois não havendo justa causa, a instauração do mesmo é indevida, ilegal e contrária ao direito.

De modo bastante direto, o servidor público investigado não tem como se defender plenamente da acusação formal posta em Processo Administrativo Disciplinar – PAD.

A incompletude da acusação, obsta o exercício da defesa, visto que se não for descrito de modo detalhado o fato praticado ou indicado o elemento subjetivo do tipo legal, cuja prática do ato ilícito (conduta do servidor investigado), é imputada ao referido servidor no exercício de sua função pública, não estará presente a justa causa para a instauração da persecução disciplinar.

A ausência de fato concreto justifica, data venia, a inépcia da imputação, como decidido pelo STJ: [36] "Criminal. Resp. Peculato e corrupção passiva.. Trancamento da ação penal. Inépcia da denúncia. Ocorrência. Acusação baseada na qualidade de Delegado de Polícia do acusado. Ausência de fatos concretos. Recurso desprovido. I.  inepta a denúncia que deixa de descrever o modo, o lugar, tempo e circunstâncias em que perpetradas as condutas delitivas, limitando-se a referir genericamente o recebimento de supostas vantagens indevidas em razão da função pública que ocupava o acusado, sem qualquer especificação de valores eventualmente recebidos, ou mesmo de quais teriam sido os atos praticados com infringência do dever funcional. II. Não é suficiente, à acusação pelo delito de peculato, a mera referência de que o acusado desviara, de forma continuada, valores que teriam que ser recolhidos pelo Estado, sem qualquer especificação do fato delituoso em si, ou mesmo da quantia supostamente desviada. III. Não se admite acusação baseada, unicamente, na qualidade de delegado regional de polícia do acusado no período apontado. IV. A imprecisão dos fatos atribuídos ao agente, lançados de maneira vaga e genérica, impede a exata compreensão da acusação formulada e dificulta o exercício da ampla defesa, razão pela qual deve ser mantida a decisão que reconheceu a inépcia da denúncia formulada contra o recorrido. V. Recurso desprovido."

Por ser subjetiva a responsabilidade do servidor público, torna-se imperiosa a demonstração inequívoca do elemento subjetivo de sua conduta (previsto no tipo legal), na forma da Lei nº 8.429/92, pois nem todo ato tido como ilegal é ímprobo.

Por isso é que o STJ não admite a responsabilidade objetiva do servidor público para fins de improbidade administrativa, verbis: "Administrativo. Improbidade. Lei 8.429⁄92. Licitação. Necessidade de configuração do dolo do agente público. Reexame de matéria fática. Súmula 07⁄STJ. 1. Nem todo o ato irregular ou ilegal configura ato de improbidade, para os fins da Lei 8.429⁄92. A ilicitude que expõe o agente às sanções ali previstas está subordinada ao princípio da tipicidade: é apenas aquela especialmente qualificada pelo legislador. 2. As condutas típicas que configuram improbidade administrativa estão descritas nos arts. 9º, 10 e 11 da Lei 8.429⁄92, sendo que apenas para as do art. 10 a lei prevê a forma culposa. Considerando que, em atenção ao princípio da culpabilidade e ao da responsabilidade subjetiva, não se tolera responsabilização objetiva e nem, salvo quando houver lei expressa, a penalização por condutas meramente culposas, conclui-se que o silêncio da Lei tem o sentido eloqüente de desqualificar as condutas culposas nos tipos previstos nos arts. 9.º e 11. 3. É vedado o reexame de matéria fático-probatória em sede de recurso especial, a teor do que prescreve a Súmula 07 desta Corte. 4. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, improvido." [37] ; "(...) 3. A interpretação do art. 5º, da Lei nº 8.429/92 permite afirmar que o ressarcimento do dano por lesão ao patrimônio público exige a presença do elemento subjetivo, não sendo admitido a responsabilidade objetiva em sede de improbidade administrativa. (...)" [38]

Nesse sentido a Ministra Eliana Calmon, [39] aduziu: "1 - (...) para configurar-se como ato de improbidade, exige-se conduta comissiva ou omissiva dolosa, não havendo espaço para a responsabilidade objetiva. 2. Atipicidade de conduta por ausência de dolo. 3. Recurso Especial improvido."

Com efeito, não sendo descritas as práticas de ato de improbidade administrativa que estiverem ao alcance da Lei nº 8.429/92, baseando-se a Administração Pública em variação patrimonial, sem qualquer descrição da prática de ato ilícito funcional, haverá a responsabilidade objetiva, em total afronta ao ordenamento jurídico e à lei de Improbidade Administrativa que somente admite a responsabilidade subjetiva.

Cabendo ressaltar que o parágrafo único do artigo 144, da Lei nº 8.112/90 estabelece que, quando o fato narrado não configurar evidente infração disciplinar ou ilícito penal, a denúncia sobre irregularidade funcional será arquivada por falta de objeto.


VI – CONCLUSÃO:

Em conclusão e conforme aduzido no decorrer do presente estudo, procurou demonstrar-se as injustiças que estão sendo praticadas pelas autoridades da Receita Federal do Brasil, que imputam a alguns de seus servidores públicos a inusitada figura do enriquecimento ilícito desatrelada da conduta funcional de seu servidor.

Em sendo assim, a Administração Pública Fazendária vem imiscuindo-se, de forma injurídica, ilegal e abusiva, na vida fiscal e financeira de seus servidores, no intuito de acusá-los injustamente de enriquecimento ilícito (art. 9º, inc. VII, da Lei nº 8.429/92), para tanto instaurando contra os mesmos processo administrativo disciplinar, sem qualquer nexo de causalidade entre variação patrimonial incompatível com a função pública e o vínculo funcional.

Observando-se que existem conseqüências jurídicas negativas nas esferas pessoais, familiares e funcionais para o servidor público acusado que responde ao Processo Administrativo Disciplinar. [40]

Esses casos demonstram a total falta de justa causa para a persecução disciplinar, devendo o processo ser, de imediato, arquivado.


Notas

  1. O primeiro elemento do fato típico do ilícito é a causa, resultante da descrição da conduta previamente estabelecida na lei. Já o segundo elemento é o efeito do ato ilícito, o resultado. Entre um e outro há uma relação de causalidade, pois aquele resultado ocorreu em relação à causa ilícita praticada pelo servidor.
  2. Observando-se que nexo de causalidade, em linhas gerais, significa: - o comportamento humano causando modificação no mundo exterior (resultado).
  3. Em um caso análogo ao que acabamos de citar, o TRF-2ª Região na Ap. Cível nº 319219/RJ, estabeleceu: "[...] 6 – Em relação à lesão aos cofres públicos, não restou claro que existiu qualquer irregularidade nos procedimentos licitatório e contratual, em ordem a se admitir que estar-se-ia diante de um caso de lesividade legalmente presumida." (TRF-2ª Região. Rel. Des. Fed. Arnaldo Lima, Ap. Cível nº 319219/RJ, 4ª T., DJ de 17 mai. 2004. p. 295).
  4. TRF-1ª Reg. Rel. Des. Fed. Olindo Menezes, AI nº 2004.01.000299245/DF, 3ª T., DJ de 8 abr. 2005. p. 33.
  5. TRF-1ª Reg. Rel. Des. Fed. Tourinho Neto, AI nº 2003.01.000135935/GO, 2ª T., DJ de 30 out. 2003. p. 71.
  6. STJ, Rel. Min. Eliana Calmon, REsp nº 621415/MG, 2ª T., DJ de 30.05.2006, p.134.
  7. TRF-1ª Reg. Rel. Des. Fed. Tourinho Neto, AI nº 2003.01.000099819/GO, 2ª T., DJ de 25 set. 2003. p. 52.
  8. Cf. STJ. Rel. Min. Luiz Fux, REsp. nº 480387/SP, 1ª T., DJ de 24 mai. 2004. p. 163.
  9. TJ/MG. Rel. Des. Geraldo Augusto, Ap. Cível nº 1.0137.03.900294-4/001, 1ª CC, DJ de 4.6.2004.
  10. AGU, Processo nº 10168.0001291/95-93, Parecer AGU/MF - 04/98, Parecer GQ 147, de 23 de abril de 1998, aprovado pelo Presidente da República em 27.04.1998 e AGU, Processo nº 03000-005894/95-10, Parcer GQ nº 136, de 19 de janeiro de 1998, aprovado pelo Presidente da República em 26.01.1998.
  11. STJ. REsp nº 621.415-MG, 2ª T, julgado em 16.2.2006.
  12. "Ação civil pública. Ato ilegal. Ressarcimento ao erário. Lesividade. Ex-administrador. A reparação de dano decorre da comprovada lesividade material causada ao patrimônio público pelo ato ilegal do ex-administrador. Se o ato impugnado não contém o ingrediente da lesividade, ainda que ilegal, não enseja o ressarcimento ao erário ou a procedência da ação civil pública, tendo por objeto o referido ressarcimento." (TJ/MG. Rel. Des. Almeida Melo, Ap. Cível nº 163.442-7, 4ª CC, DJ de 15.2.2000). No mesmo sentido: "Administrativo. Ação civil pública de reparação de danos ao erário. Prova da existência de dano efetivamente configurado. Princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. Violação. Inteligência da Lei nº 8.429/92. A procedência da ação civil pública de ressarcimento de danos ao erário está condicionada a prova da existência do dano efetivamente configurado, sob pena de violação dos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, na forma da Lei de Regência." (TJ/MG. Ap. Cível nº 1.0433.04906-7/001, 5ª CC, DJ de 19.3.2004).
  13. PAZZAGLINI FILHO, Marino. Lei de Improbidade Administrativa comentada. São Paulo: Atlas, 2002, p. 66.
  14. TOLOSA FILHO, Benedicto de. Comentários à Lei de Improbidade Administrativa. Rio de Janeiro: Forense, 2006, p. 80-81.
  15. PAZZAGLINI FILHO, Marino; ROSA, Marcio Elias; FAZZIO JÚNIOR, Waldo. Op.cit. ant., p. 70-71.
  16. PAZZAGLINI FILHO, Marino; ROSA, Marcio Elias; FAZZIO JÚNIOR, Waldo. Ibid., p. 71.
  17. SAMPAIO, José Adércio Leite. "A probidade na Era dos Desencantos. Crise e propostas de restauração da integridade dogmática da Lei nº 8.429/92". In: Improbidade administrativa – 10 anos da Lei nº 8.429/92, Belo Horizonte: Del Rey, 2002, p. 166.
  18. SAMPAIO, José Adércio Leite. Id.
  19. Waldo Fazzio Junior possui o mesmo posicionamento jurídico: "Se apenas com base na concomitância enriquecimento/exercício do mandato o Ministério Público postular sua responsabilização por enriquecimento ilícito, estará formulando pedido absolutamente inepto, porque da premissa ( enriquecimento) não se segue a conclusão (de que enriqueceu por abuso do cargo). Afinal, se da narração dos fatos não decorrer logicamente a conclusão incide a regra do art. 295, parágrafo único, inc. II. Fica faltando a conduta ilícita (ato de improbidade) que liga a premissa à conclusão, ou seja, a causa do enriquecimento, o abuso. Sem a declinação do ato antijurídico fica vazia a relação causal" (FAZZIO JUNIOR, Waldo. Improbidade administrativa e crimes de prefeitos, 2ª ed., São Paulo: Atlas, 2001, p. 8).".
  20. STJ. Rel. Min. Humberto Martins, AARE-SP nº 1193940, 2ª T., DJ de 17.11.2010.
  21. STJ. Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, MS nº 10442/DF, 3ª S., DJ de 26.09.2005. p. 172.
  22. MATTOS, Mauro Roberto Gomes de. Lei nº 8.112/90 Interpretada e Comentada Regime Jurídico Único do Servidor Público Federal. 5. ed. revista e atualizada, Niterói: Impetus, 2010, p. 685.
  23. "Administrativo. Improbidade. Tipicidade. Indispensabilidade do elemento subjetivo da conduta. Impossibilidade de incidência da Lei de Improbidade Administrativa. 1. Em que pese assistir razão ao agravante quanto à prescindibilidade do dano ao erário para a caracterização da improbidade administrativa, não foi apenas por esse motivo que a inicial não foi recebida, mas também pela inexistência do elemento subjetivo da conduta, caracterizado pelo dolo do agente. 2. No caso concreto, o dolo não foi identificado pela instância ordinária e, segundo os fatos lá estabelecidos, não haveria mesmo como se concluir pela presença do elemento subjetivo a orientar a conduta da agravada. 3. Portanto, o Tribunal de origem agiu corretamente quando concluiu que a ausência de dano, de enriquecimento ilícito e de dolo, impede a incidência da lei de improbidade administrativa, por qualquer de seus tipos (descritos nos arts. 9º, 10 e 11 da Lei n. 8.429/92), fato este que permite a rejeição da ação. Agravo regimental improvido." (STJ. Rel. Min. Humberto Martins, AgRg no AgRg no REsp nº 1193940/MG, 2ª T., DJ de 17.11.2010).
  24. "ADMINISTRATIVO – ATO DE IMPROBIDADE – CONFIGURAÇÃO. 1. Esta Corte, em precedente da Primeira Seção, considerou ser indispensável a prova de existência de dano ao patrimônio público para que se tenha configurado o fato de improbidade, inadmitindo o dano presumido. Ressalvado entendimento da relatora. 2. Após divergências, também firmou a Corte que é imprescindível, na avaliação do ato de improbidade, a prova do elemento subjetivo. 3. Recurso especial conhecido em parte e, nessa parte, improvido." (STJ. Rel. Min. Eliana Calmon, REsp nº 621415/MG, 2ª T., DJ de 30.05.2006, p. 134).
  25. STJ. Rel. Min. Luiz Fux, REsp nº 980706/RS, 1ª T., DJ de 23.02.2011.
  26. STJ. Rel. Min. Arnaldo Lima, AgRg no REsp nº 1122474/PR, 1ª T., DJ de 2.02.2011.
  27. STJ. Rel. Min. Hamilton Carvalhido, AgRg no REsp nº 1065588/SP, 1ª T., DJ de 21.02.2011.
  28. STJ. Rel. Min. Paulo Gallotti, MS nº 10828/DF, 3ª S., DJ de 2.10.2006, p. 220.
  29. STJ. Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, ROMs nº 28.169, 5ª T., DJ de 29.11.2010.
  30. STJ. HC nº 201.924, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, despacho do dia 05.04.2011.
  31. STJ. Rel. Min. Gilson Dipp, ROMS nº 11587, 5ª T., DJ de 3.11.2004, p. 206.
  32. STJ. Rel. Min. Paulo Medina, MS nº 9004/DF, 3ª S., DJ de 2.04.2004, p. 267.
  33. TRF - 2ª Reg. Rel. Des. Fed. Guilherme Calmon Nogueira da Gama, 6ª T. especializada, AG nº 1720770, p. 245.
  34. TRF - 1ª Reg. Rel. Juiz Fed. Conv. Carlos Augusto Pires Brandão, 2ª T. suplementar, REOMS nº 199901000423467, DJ de 16.09.2005, p. 200.
  35. TRF - 1ª Reg. Rel. Juiz Fed. Conv. Miguel Ângelo Alvarenga Lopes, AMS nº 1999.39.00008857-3, 1ª T., DJ de 15.01.2007, p. 12.
  36. STJ. Rel. Min. Gilson Dipp, REsp nº 562692, 5ª T., DJ de 17.10.2005.
  37. STJ. Rel. Min. Teori Albino Zavascki, REsp nº 940629/DF, 1ª T., DJ de 4.09.2008.
  38. STJ. Rel. Min. Denise Arruda, REsp nº 992845/MG, 1ª T., DJ de 5.08.2009.
  39. STJ. Rel. Min. Eliana Calmon, REsp nº 658415/RS, 2ª T., DJ de 3.08.2006, p. 253.
  40. Sobre o tema ver "Tratado de Direito Administrativo Disciplinar". MATTOS, Mauro Roberto Gomes de. 2. ed., Rio de Janeiro: Forense, 2010, ps. 598 e segs.

Autor

  • Mauro Roberto Gomes de Mattos

    Advogado no Rio de Janeiro. Vice- Presidente do Instituto Ibero Americano de Direito Público – IADP. Membro da Sociedade Latino- Americana de Direito do Trabalho e Seguridade Social. Membro do IFA – Internacional Fiscal Association. Conselheiro efetivo da Sociedade Latino-Americana de Direito do Trabalho e Seguridade Social. Autor dos livros "O contrato administrativo" (2ª ed., Ed. América Jurídica), "O limite da improbidade administrativa: o direito dos administrados dentro da Lei nº 8.429/92" (5ª ed., Ed. América Jurídica) e "Tratado de Direito Administrativo Disciplinar" (2ª ed.), dentre outros.

    Textos publicados pelo autor

    Fale com o autor

    Site(s):

Informações sobre o texto

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MATTOS, Mauro Roberto Gomes de. Ilegalidade de presumir-se o enriquecimento ilícito. Necessidade de ato comissivo ou omissivo no exercício da função pública. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 2879, 20 maio 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/19150. Acesso em: 18 abr. 2024.