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O direito de resposta ou desagravo pós ab-rogação da norma penal especial

O direito de resposta ou desagravo pós ab-rogação da norma penal especial

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Em que pese a opinião de que a revogação da Lei de imprensa criara um vácuo normativo, os códigos Civil, Penal e processuais vigentes e a própria Constituição possuem mecanismos que suprem suficientemente os da lei mencionada.

Resumo: Ao dar provimento in totum ao pedido de cassação da Lei 5.250/67, formulado pelo Partido Democrático Trabalhista (PDT) em sede de Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF), a Suprema Corte baniu do ordenamento jurídico brasileiro todos os dispositivos, civis e penais, regulamentadores da atividade jornalística que se encontravam exclusivamente na referida legislação. Subsistem, naturalmente, os tópicos relacionados à mesma matéria com previsão nos códigos Civil e Penal – e respectivos códigos processuais – e demais legislação vigente. É o caso do direito de resposta expresso na Constituição da República, no Código Eleitoral, na Lei das Eleições e na Convenção Americana sobre Direitos Humanos, celebrada em São José, capital da Costa Rica, e ratificada pelo Brasil. O presente estudo aponta o advento da natureza cível do direito de resposta na nova ordem constitucional-democrática e aborda aspectos processuais pós ab-rogação da referida lei federal especial.

Palavras-chave: ADPF 130/08. Comunicação social. Direito de resposta. Direitos da personalidade. Lei de Imprensa. Liberdade de informação e expressão. Responsabilidade civil.

 “Todo homem tem direito a receber dos tribunais nacionais competentes remédio efetivo para os atos que violem os direitos fundamentais que lhe sejam reconhecidos pela constituição ou pela lei.” (Declaração Universal dos Direitos do Homem, art. 8.º).


Introdução

Após as atrocidades contra civis durante a Segunda Guerra (1939-1945), que não poupou crianças, idosos, enfermos, os direitos da personalidade passaram a merecer especial atenção por parte da comunidade internacional. Não somente pelos milhões de indivíduos perseguidos e massacrados – na Itália, pelo Fascismo; na Alemanha, pelo Nacional-Socialismo – em decorrência de convicções religiosas, opiniões políticas, origem étnica ou mesmo aptidões sexuais, mas também pelos outros milhões de civis e prisioneiros das tropas do Eixo (germânicos e nipônicos, principalmente) vítimas de crimes de guerra perpetrados pelas Potências Aliadas (notadamente Estados Unidos da América, Reino Unido e a então União das Repúblicas Socialistas Soviéticas).

Na Carta de 10 de dezembro de 1948, os estados-membros da recém-criada Organização das Nações Unidas, “considerando que o desprezo e o desrespeito pelos direitos do homem resultaram em atos bárbaros que ultrajaram a consciência da Humanidade”, se comprometem a observar o “respeito universal aos direitos e liberdades fundamentais do homem” (Declaração Universal dos Direitos Humanos (preâmbulo). Nova Iorque: ONU, 1948).

Todo o homem tem capacidade para gozar os direitos e as liberdades estabelecidos nesta Declaração sem distinção de qualquer espécie, seja de raça, cor, sexo, língua, religião, opinião política ou de outra natureza, origem nacional ou social, riqueza, nascimento, ou qualquer outra condição. (Idem, art. 2°, I)

Nas modernas civilizações em que predominam o estado de direito e o regime democrático a liberdade de comunicação e expressão e os princípios inerentes aos direitos da personalidade – intimidade, liberdade, honra e imagem – permanecem em constante tensão.

Dois leading cases do Supremo Tribunal Federal que marcaram o ano de 2009 no País dizem respeito a essa dicotomia: a polêmica decisão que declarou a desnecessidade do diploma para o exercício da atividade jornalística e a revogação total da lei federal que regulou “a liberdade de manifestação do pensamento e de informação”, sendo esta o objeto do presente estudo, mais precisamente a alteração na natureza jurídica do direito de resposta após a suspensão da eficácia da norma penal especial.


Gênese da ADPF 130

 Com fundamento na Lei 5.250/67, de 9 de fevereiro de 1967, integrantes da Igreja Universal do Reino de Deus ajuízam em todo o País ações indenizatórias múltiplas contra empresas jornalísticas e profissionais que questionaram a licitude do patrimônio de pessoas ligadas à igreja, inclusive seu fundador, o bispo Edir Macedo.

  Em reportagem especial publicada em 15 de dezembro de 2007, a repórter Elvira Lobato, um dos alvos das investidas de fiéis e pastores da Universal, afirma que “a relação entre a igreja e as empresas dos bispos é obscura”, aventa a hipótese de que “os dízimos dos fiéis sejam esquentados em paraísos fiscais” e cita “o suposto uso de bispos como ‘laranjas’ da igreja na compra de emissoras”.

Em 30 anos de existência, completados em julho, a Igreja Universal do Reino de Deus construiu não apenas um império de radiodifusão, mas um conglomerado de [sic] empresarial em torno dela. Além das 23 emissoras de TV e 40 de rádio, o levantamento da Folha identificou 19 empresas registradas em nome de 32 membros da igreja, na maioria bispos[1]. [...] A legislação em vigor não permite que igrejas explorem, diretamente, o serviço de radiodifusão. A Igreja Católica tem a maioria de suas emissoras (12 TVs e 215 rádios) em nome de fundações. A Iurd ultrapassou as Organizações Globo em número de concessões próprias de televisão.[2]

Em 12 de fevereiro do ano seguinte, o Partido Democrático Trabalhista (PDT) ingressa com Ação de Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) contra a Lei 5.250/67 e endossa editorial de O Globo segundo o qual o verdadeiro e inconfessável objetivo dos evangélicos era “intimidar jornalistas e empresas de comunicação”. Ressalta que “o diploma legal impugnado é produto de um Estado Autoritário, que restringiu as liberdades civis em geral, e as de comunicação em particular” e formula pedido de medida liminar de suspensão de todos os processos e decisões com base no “autoritarismo congênito” da lei especial, e, no mérito, a ab-rogação dos 77 artigos, pedido este provido pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em 30 de abril de 2009.

A tentativa de censura por meio de múltiplas ações indenizatórias não é novidade. No processo “The New York Times x Sullivan”, já mencionado[3], a Suprema Corte americana deliberou essencialmente sobre o alcance das 1ª e 14ª Emendas, no que se tornou o leading case das liberdades de expressão e de imprensa. Mas está apontada, com ênfase, nos autos, pelo Relator, o juiz Brennam, como “prova dramática” da ameaça à liberdade de imprensa e estratagema punitivo e inibidor da liberdade de manifestação, a diversidade de indenizações requeridas judicialmente pelos servidores aliados do comissário Sullivan, ele mesmo contemplado com uma indenização de 500 mil dólares, dos cinco milhões e seiscentos mil já requeridos judicialmente, pelo mesmo fato, contra o Times. Todos os processos foram soterrados pelo alcance maior da decisão, como se busca nesta ADPF.[4]

“O pensamento e sua manifestação, assim como a informação”, defende o partido arguente, “são naturalmente livres, sendo que a Constituição em vigor estabelece que nenhuma lei conterá dispositivo que possa constituir embaraço a essa liberdade, que é ‘plena’ (art. 220, §1.°)”[5].


 As razões do Supremo

A declaração de procedência do pedido do autor na ADPF 130/08 baniu do ordenamento jurídico brasileiro todos os dispositivos regulamentadores da atividade jornalística que se encontravam, exclusivamente, na legislação especial, doravante denominada Lei de Imprensa (embora mais técnica a designação genérica “Lei dos Meios de Comunicação Social” ou “Lei da Atividade Jornalística”, por abarcar outras mídias, como rádio, televisão e, atualmente, a internet[6]).

Como a ação penal se refere à prática de delitos previstos na Lei de Imprensa, e, tendo sido reconhecida pela Corte Suprema a inconstitucionalidade [sic] da referida lei, decisão proferida com eficácia contra todos e efeito vinculante, impossível o prosseguimento no julgamento dos recursos. [...] Nesse sentido: “EMENTA: APELAÇÃO CRIMINAL - LEI DE IMPRENSA – REVOGAÇÃO - EXTINÇÃO DO PROCESSO - NECESSIDADE. Julga-se extinto o feito quando revogada a lei em cujo dispositivo se ampara a ação proposta”. (TJMG, Ap. Crim nº 1.0024.05.730890-0/006, 4ª Câmara Criminal, Rel. Des. Herbert Carneiro, j. em 26/08/2009, p. em 18/09/2009). Pelo exposto, julgo extinto o processo, com fulcro no art. 3º, do CPP, c/c art. 267, VI, do CPC, em face da impossibilidade jurídica do pedido contido em lei revogada pelo Supremo Tribunal Federal” (APELAÇÃO CRIMINAL N° 1.0027.06.091847-4/001 - COMARCA DE BETIM).

Subsistem, naturalmente, os tópicos relacionados à mesma matéria com previsão na Constituição da República, nos códigos Civil, Penal e respectivos diplomas processuais, dentre outras normas vigentes, como a Lei das Eleições, o Código Eleitoral e a Convenção Americana sobre Direitos Humanos.

Ao deferir medida liminar determinando a suspensão da aplicação de artigos da Lei de Imprensa, medida esta referendada pelo Plenário do Supremo, o ministro-relator Carlos Ayres Britto destacou o nítido “viés político-ideológico” da Lei de Imprensa, cujo “projeto de poder [...] remetia às calendas gregas a devolução do governo ao poder civil”.[7]

Mesmo antes de ser levada ao banco de réus, a Lei de Imprensa já não era totalmente aplicada pelo Judiciário. A crítica maior que se fazia, principalmente pela parte interessada – os meios de comunicação –, era o fato de a 5.250/67 ter nascido durante o regime militar, e por isso teria inspiração ditatorial.

Julgados já haviam declarado a incompatibilidade com o atual sistema de alguns dispositivos da Lei de Imprensa, como a tarifação do valor da indenização, limitadas a tetos que variam de dois a duzentos salários mínimos (arts. 51, I-IV, e 52), bem como o prazo decadencial de três meses para o ofendido prestar queixa-crime (57, parte final), incompatível com o art. 103 do Código Penal[8], que estabelece o prazo de seis meses para o exercício do direito de queixa ou representação.

Outro dispositivo bastante criticado era o que criava a responsabilidade criminal sucessiva:

 Art. 37. São responsáveis pelos crimes cometidos através da imprensa e das emissoras de radiodifusão, sucessivamente: I – o autor do escrito ou transmissão incriminada (art. 28 e § 1.º), sendo pessoa idônea e residente no País, salvo tratando-se de reprodução feita sem o seu consentimento, caso em que responderá como seu autor quem a tiver reproduzido; II – quando o autor estiver ausente do País, ou não tiver idoneidade para responder pelo crime: a) o diretor ou redator-chefe do jornal ou periódico; ou b) o diretor ou redator registrado de acordo com o art. 9.º, inciso III, letra b, no caso de programa de notícias, reportagens, comentários, debates ou entrevistas, transmitidos por emissoras de radiodifusão; III – se o responsável, nos termos do inciso anterior, estiver ausente do País ou não tiver idoneidade para responder pelo crime: a) o gerente ou proprietário das oficinas impressoras no caso de jornais ou periódicos; ou b) o diretor ou o proprietário da estação emissora de serviços de radiodifusão; IV – os distribuidores ou vendedores da publicação ilícita ou clandestina, ou da qual não constar a indicação do autor, editor, ou oficina onde tiver sido feita a impressão.[9]

Ainda, o comando que veda a cumulação da ação de desagravo com o “exercício de ação penal ou civil contra o jornal, periódico, emissora ou agência de notícias, com fundamento na publicação ou transmissão incriminada” (art. 29, § 3) afronta o princípio da Inafastabilidade da Prestação Jurisdicional previsto no art. 5°, XXXV, da Constituição da República: “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”. Diferentemente do que apregoa a doutrina, tampouco a instância administrativa de curso forçado é exceção a tal princípio, ficando o direito de ação apenas prejudicado pela falta de uma das condições da ação, a saber, o interesse de agir, daí o outro nome: jurisdição condicionada.

Também agride a norma constitucional do livre acesso à Justiça a regra contida no art. 57, §, 6.º, condicionando o conhecimento da apelação ao depósito judicial do valor integral da indenização.

Da sentença do juiz caberá apelação, a qual somente será admitida mediante comprovação do depósito, pelo apelante, de quantia igual à importância total da condenação. Com a petição de interposição do recurso, o apelante pedirá expedição de guia para o depósito, sendo a apelação julgada deserta se, no prazo de sua interposição, não for comprovado o depósito. (NR)[10]

A exigência de depósito prévio no valor da condenação para interposição de recurso vai de encontro ao inciso LV do art. 5.º da Constituição vigente (“aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes), ao inciso XXXIV, alínea “a” (“são a todos assegurados, independentemente do pagamento de taxas: o direito de petição aos Poderes Públicos em defesa de direitos ou contra ilegalidade ou abuso de poder”), dentre outros que versam sobre “o pleno acesso do jurisdicionado à justiça em todas as fases do processo” (art. 107, II, §3.º, 115, II, §2.º e 125, §6.º).

O amplo acesso à Justiça já era garantido pela Constituição de 1967, cujo art. 150, § 4.º, asseverava que “a lei não poderá excluir da apreciação do Poder Judiciário qualquer lesão de direito individual”.


Da ordem constitucional-democrática

Nas ações movidas pelo então presidente Fernando Collor de Mello e seu secretário particular, Cláudio Francisco Vieira, contra o jornal Folha de S. Paulo e quatro jornalistas – o diretor de Redação, Otavio Frias Filho, o diretor executivo da Sucursal de Brasília, Josias de Souza, e os repórteres Gustavo Krieger e Nelson Blecher[11] – a defesa arguiu a “inconstitucionalidade” do dispositivo (a rigor, trata-se de arguição da não recepção do dispositivo, haja vista ser este anterior à Constituição)[12] que não admite a exceção da verdade[13] contra, dentre outras autoridades, o presidente da República.

É verdade que o veto existe há muito na legislação brasileira e que o Código Penal agasalha regra semelhante[14]. Coincidência ou não, tanto a Lei n.º 5.250/67, quanto o Código Penal (Decreto Lei n.° 2.848/40) foram editados por governos ditatoriais e a lei de imprensa anterior (Lei n.° 2.083/53), originária de um intervalo histórico de democracia liberal, não adotava a proibição (autos 900102736-9 e 900100141-6).

A carta aberta de Frias Filho, estampada na primeira página segue nessa linha: “Eu defendo para cada um a possibilidade de expressar o que pensa sem ir para a cadeia por isso, enquanto o sr. se agarra à lei de imprensa do regime militar; eu procuro alcançar o exemplo dos grandes jornalistas do passado, o sr. desce à mesquinharia dos tiranetes”[15].

Em seu voto, reiterando o entendimento prolatado por ocasião da medida acautelatória, o ministro Menezes Direito expressa opinião semelhante, asseverando “que não é possível legislar com conteúdo punitivo, impeditivo do exercício da liberdade de imprensa, isto é, que criem condições de intimidação”.

É inegável que em 1967 viviam-se tempos de exceção, que a liberdade de expressão foi o primeiro alvo do regime antidemocrático ora instalado e que alguns artigos da Lei de Imprensa conflitariam com os preceitos da “Constituição Cidadã” de 1988. Mas também há de se reconhecer que sua grande parte se harmoniza com o atual sistema, servindo de garantia para o exercício da liberdade de imprensa, motivo pelo qual os ministros Eros Grau, Menezes Direito e Celso de Mello ficaram vencidos quando votaram pela ab-rogação cautelar do diploma.

A Lei de Imprensa vedava inclusive a censura prévia, assegurando a “manifestação do pensamento e a procura, o recebimento e a difusão de informações ou idéias, por qualquer meio, e sem dependência de censura, respondendo cada um, nos termos da lei, pelos abusos que cometer” (art. 1º, caput)[16] e, malgrado menos condescendente em relação aos abusos[17], trazia diversas garantias à liberdade de informação, como o sigilo da fonte (art. 71), e prerrogativas, como a prisão especial (art. 66, caput e parágrafo único), nos moldes da reservada às autoridades públicas civis e militares (magistrados e governadores, inclusive).

Já os exíguos lapsos decadenciais para o ofendido notificar a empresa jornalística[18] e ajuizar ação de reparação civil[19] (de sessenta dias e de três meses, respectivamente) eram, indiscutivelmente, benéficos para os órgãos de comunicação social. A Lei de Imprensa vigorou por quarenta e dois anos, metade dos quais sob o regime democrático, tendo dela se servido o próprio fundador do partido arguente.[20]

É na famigerada legislação que os veículos de comunicação se socorrem, notadamente o art. 27 e incisos, in verbis:

Não constituem abusos no exercício da liberdade de manifestação do pensamento e de informação: I – a opinião desfavorável da crítica, literária, artística, científica ou desportiva, salvo quando inequívoca a intenção de injuriar ou difamar; II – a reprodução, integral ou resumida, desde que não constitua matéria reservada ou sigilosa, de relatórios, pareceres, decisões ou atos proferidos pelos órgãos competentes das Casas legislativas; III – noticiar ou comentar, resumida ou amplamente, projetos e atos do Poder Legislativo, bem como debates e críticas a seu respeito; IV – a reprodução integral, parcial ou abreviada, a notícia, crônica ou resenha dos debates escritos ou orais, perante juízes e tribunais, bem como a divulgação de despachos e sentenças e de tudo quanto fôr ordenado ou comunicado por autoridades judiciais; V – a divulgação de articulados, quotas ou alegações produzidas em juízo pelas partes ou seus procuradores; VI – a divulgação, a discussão e a crítica de atos e decisões do Poder Executivo e seus agentes, desde que não se trate de matéria de natureza reservada ou sigilosa; VII – a crítica às leis e a demonstração de sua inconveniência ou inoportunidade; VIII – a crítica inspirada pelo interêsse público; IX – a exposição de doutrina ou idéia. Parágrafo único. Nos casos dos incisos II a VI dêste artigo, a reprodução ou noticiário que contenha injúria, calúnia ou difamação deixará de constituir abuso no exercício da liberdade de informação, se forem fiéis e feitas de modo que não demonstrem má-fé.

Importantes textos outorgados em períodos ditatoriais permanecem em vigor, convivendo com o atual panorama constitucional: o Código Tributário Nacional (1966), o Código Penal Militar e o Código de Processo Penal Militar (1969), o Estatuto do Estrangeiro (1980), o Código de Processo Civil (1973), a Lei das Contravenções Penais e o Código de Processo Penal (1941), o Código Penal (1940), o qual teria inspirações fascistas, a Lei de Execução Fiscal (1980), a Lei da Anistia (1979) e a Consolidação das Leis do Trabalho (1943), para citar alguns, carecendo, data venia, de razoabilidade a cassação da Lei de Imprensa pelo fundamento de que esta conflitava com as normas democráticas.

Também a Lei de Ação Popular[21], ainda vigente, nasceu no período crítico, sendo sancionada pelo marechal-presidente Castelo Branco[22] em 29 de junho de 1965. Por sua vez, o projeto do Novo Código Civil, em vigor desde 2003, é da lavra do governo Geisel[23], tendo sido encaminhado ao Congresso Nacional em 10 de junho de 1975.

Mesmo o atual Código Eleitoral, que disciplina o direito de voto, ápice do exercício da cidadania, é de 1965. Por isso não prevê, por exemplo, Recurso Contra Expedição de Diploma em face do presidente da República. Mas não houve necessidade de banimento do código. Apenas não são aplicados integralmente todos os seus dispositivos.

Foram, ainda, recepcionados como leis federais decretos-leis editados, tanto quanto a Lei de Imprensa, no período de recesso compulsório do Congresso Nacional (27 de janeiro de 1966 a 28 de fevereiro de 1967), como o decreto lei n. 201, norma penal incriminadora reminiscente de Ato Institucional – portanto sem limitações quanto à matéria a ser tratada – dispondo sobre responsabilidade criminal de prefeitos e vereadores.

Significa dizer que a Lei de Imprensa, quod erat demonstrandum, fora revogada pelo novo ordenamento constitucional tão somente naquilo em que com este era incompatível. Caberia ao Supremo declarar a derrogação (revogação parcial) e não a ab-rogação (revogação total) do diploma, cujo fundamento de validade e eficácia está no art. 220, caput e §§ 1.º e 2.º (Constituição da República, Capítulo V, Da comunicação social).

Art. 220. A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição. § 1.º - Nenhuma lei conterá dispositivo que possa constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de comunicação social, observado o disposto no art. 5.º, IV, V, X, XIII e XIV. § 2.º - É vedada toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística [sem os destaques no original].

Em outros termos, os direitos e as garantias fundamentais não são absolutos, de modo que não constitui “embaraço à plena liberdade de informação jornalística [...] o disposto no art. 5.º, IV, V, X, XIII e XIV”, podendo ser objeto de regulamentação a livre “manifestação do pensamento” (5.º, IV), “o direito a indenização pelo dano material ou moral” decorrente da violação da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem das pessoas (5.º, X), “o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão” (5.º, XIII) – atividade jornalística inclusa – e “o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem” (5º, V), sem que isso caracterize, assim como a vedação ao anonimato, censura de natureza política, ideológica ou artística.


Da resposta e da retificação

 O art. 14 da Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica, de 22 de novembro de 1969), ratificado pelo Brasil em 6 de novembro de 1992 pelo Decreto n. 678, tratou do “Direito de Resposta ou Ratificação” nestes termos:

 1. Toda pessoa atingida por informações inexatas ou ofensivas emitidas em seu prejuízo por meios de difusão legalmente regulamentados e que se dirijam ao público em geral, tem direito a fazer, pelo mesmo órgão de difusão, sua retificação ou resposta, nas condições que estabeleça a lei. 2. Em nenhum caso a retificação ou a resposta eximirão das outras responsabilidades legais em que se houver incorrido. 3. Para a efetiva proteção da honra e da reputação, toda publicação ou empresa jornalística, cinematográfica, de rádio ou televisão, deve ter uma pessoa responsável que não seja protegida por imunidades nem goze de foro especial.

“A produção e a divulgação da informação devem se pautar pela veracidade dos fatos e ter por finalidade o interesse público”, assevera o Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros (art. 2.º, II), sendo deveres do jornalista, dentre outros, “respeitar o direito à intimidade, à privacidade, à honra e à imagem do cidadão” (art. 6.º, VIII), “defender o direito de resposta às pessoas ou organizações envolvidas ou mencionadas em matérias de sua autoria ou por cuja publicação foi o responsável” e “promover a retificação das informações que se revelem falsas ou inexatas” (art. 12, VI)[24].

Editada por Castelo Branco, no apagar das luzes de seu mandato (encerrado em 15 de março de 1967)[25], a Lei de Imprensa assegurava tanto o direito de retificação (em caso de informação falsa) quanto o direito de réplica (consistente em rebater informação de caráter ofensivo, ainda que verídica):

Toda pessoa natural ou jurídica, órgão ou entidade pública, que for acusado ou ofendido em publicação feita em jornal ou periódico, ou em transmissão de radiodifusão, ou a cujo respeito os meios de informação e divulgação veicularem fato inverídico ou errôneo, tem direito a resposta ou retificação.[26]

Enéas Costa Garcia entende que no desagravo da Lei de Imprensa o legislador “parece reconhecer apenas o direito de retificação, apesar de mencionar simultaneamente ‘retificação’ e ‘resposta’” e cita jurisprudência segundo a qual “ausente inexatidão na notícia não há lugar para direito de resposta, especialmente se o fato noticiado é verdadeiro (JUTACRIM 80/542, 56/371, RT 686/350)” (GARCIA, 2002, p. 510).

Conquanto a expressão “resposta ou retificação” pudesse, ainda, significar que o legislador tomasse os termos por sinônimos, a segunda parte (“toda pessoa natural ou jurídica, órgão ou entidade pública [...] a cujo respeito os meios de informação e divulgação veicularem fato inverídico ou errôneo”) se refere ao direito de retificação, enquanto a primeira (“toda pessoa natural ou jurídica, órgão ou entidade pública, que for acusado ou ofendido [...] em jornal ou periódico, ou em transmissão de radiodifusão”) se refere ao direito de resposta.

O direito de resposta, lato sensu, apresenta assim duas vertentes: no primeiro sentido, ele quer dizer direito de o respondente apresentar a sua versão correcta dos factos ocorridos ou imputados (direito de rectificação); no segundo sentido, ele significa o direito de ripostar acusações, opiniões ou juízos de valor (direito de réplica ou de resposta stricto sensu) (MOREIRA, apud GARCIA, 1994, p. 13).

Em seu Dicionário jurídico, a eminente Maria Helena Diniz conceitua o direito de resposta como “o concedido àquele contra quem foi publicado algo inverídico (...) de dar, no mesmo veículo e gratuitamente, a resposta devida, retificando a informação, rebatendo as críticas ou falsas notícias” (DINIZ, 1998, p. 158).

Essa definição, todavia, aplicar-se-ia melhor ao direito de retificação, o qual se fundamenta no princípio da veracidade. Para o direito de resposta lato sensu, que compreende o direito de réplica e o de retificação (direito de resposta stricto sensu), mais adequada é a definição de Houaiss, que afirma ser o “direito que tem o ofendido de dar resposta à ofensa recebida, usando o mesmo veículo (jornal, rádio, televisão etc.) e as mesmas condições (espaço ou tempo) de que se serviu o ofensor”[27].

Para maior clareza, evitar-se-á a homonímia optando-se por denominar a resposta em sentido amplo de “desagravo”, o qual se subdivide em resposta (ou réplica) e retificação.


Do direito fundamental à liberdade de opinião

Conforme o mencionado art. 29, caput, o desagravo restringe-se a publicações de caráter ofensivo, o que é reforçado pelo inciso V do art. 34, segundo o qual será negada a resposta ou a retificação “quando tiver por objeto crítica literária, teatral, artística, científica ou desportiva, salvo se esta contiver calúnia, difamação ou injúria”.

Ainda que a crítica jornalística atente contra a honra do ofendido, a réplica poderá ser negada se o texto-resposta incorrer no mesmo vício, contendo expressões ofensivas ao veículo de comunicação[28], a seus proprietários e diretores, ao autor ou a terceiros, “em condições que criem para estes igual direito de resposta” (art. 34, II e IV).

Não constitui ofensa ao responsável pela publicação, entretanto, o desagravo “no mesmo tom vigoroso do ataque” e que “guarda relação com os fatos referidos na publicação”, de modo “que os termos [assacados] por ambas as partes, reciprocamente, tidos como ofensivos, se dosimetrados, resultam equipolentes” (TJPA, Cams. Crims. Reunidas, QC n. 33.477, j. em 23.3.1998, rel. Des. Benedito de Miranda Alvarenga, v.u., RT 761/671-674) (Apud DAVID, 2001, pp. 351-352).

Essa mitigação ao art. 34 viabilizou aquele que é o marco do desagravo no Brasil: o duro contra-ataque veiculado no Jornal Nacional de 15 de março de 1994, assinado pelo então governador Leonel de Moura Brizola, que as organizações Globo Comunicação e Participações S.A. teriam declinado como senil no diário O Globo e no Jornal Nacional, carros-chefes do departamento de jornalismo da casa.

Tudo na Globo é tendencioso e manipulado. (...) Quando ela diz que denuncia os maus administradores deveria dizer, sim, que ataca e tenta desmoralizar os homens públicos que não se vergam diante do seu poder. (...) Quando me insulta por nossas relações de cooperação administrativa com o governo federal, (...) só vê nisso bajulação e servilismo. É compreensível: quem sempre viveu de concessões e favores do Poder Público não é capaz de ver nos outros senão os vícios que carrega em si mesma.[29]

A proporcionalidade à ofensa é, ademais, garantida pela Constituição de 1988[30], uma inovação em relação à Constituição anterior, que previa tão-somente o “Direito de resposta”[31].


Da natureza jurídica

Também eram hipóteses de indeferimento do desagravo previsto na Lei de Imprensa a propositura de ação criminal ou de indenização (“Extingue-se ainda o direito de resposta com o exercício de ação penal ou civil contra o jornal, periódico, emissora ou agência de notícias, com fundamento na publicação ou transmissão incriminada”) e se decorrido o lapso de sessenta dias (“A resposta, ou retificação, deve ser formulada por escrito, dentro do prazo de 60 (sessenta) dias da data da publicação ou transmissão, sob pena de decadência do direito”) [32].

Assim, mesmo o direito de retificação não se justifica se, embora falsa, a informação não tiver ânimo ofensivo (dolo), haja vista que o desagravo da lei especial tem natureza de sanção criminal:

Se o pedido de resposta ou retificação não for atendido nos prazos referidos no art. 31, o ofendido poderá reclamar judicialmente a sua publicação ou transmissão. § 1.º Para esse fim, apresentará um exemplar do escrito incriminado, se for o caso, ou descreverá a transmissão incriminada, bem como o texto da resposta ou retificação, em duas vias datilografadas, requerendo AO JUIZ CRIMINAL que ordene ao responsável pelo meio de informação e divulgação a publicação ou transmissão nos prazos do art. 31. (art. 32, § 1.º, sem grifo na fonte)

Logo após a edição da Lei de Imprensa, foram revogados pelo Decreto-Lei n.º 236, de 28 de fevereiro de 1967, os artigos da Lei n.º 4.117, de 27 de agosto de 1962 (Código Brasileiro de Comunicações), que regulamentavam o direito de resposta, de natureza eminentemente cível:

Art. 89. É assegurado o direito de resposta a quem fôr ofendido pela radiodifusão. Art. 90. O direito de resposta consiste na transmissão da resposta escrita do ofendido, dentro de 24 (vinte e quatro) horas do seu recebimento, no mesmo horário, programa e pela mesma emissora em que se deu a ofensa. [...] Art. 95. Será negada a transmissão da resposta: a) quando não tiver relação com os fatos referidos na transmissão incriminada; b) quando contiver expressões caluniosas, injuriosas ou difamatórias contra a concessionária ou permissionária; c) quando se tratar de atos ou publicações oficiais; d) quando se referir a terceiros, podendo dar-lhes também o direito de resposta; e) quando houver decorrido o prazo de mais de 30 (trinta) dias entre a transmissão, incriminada e o respectivo pedido de resposta. Art. 96. A transmissão da resposta, salvo quando espontânea, não impedirá o ofendido de promover a punição pelas ofensas de que foi vítima.[33]

Com o provimento da ADPF 130/08, e a declaração de inaplicabilidade da lei especial, a natureza jurídica da ação de desagravo passa a ser de competência exclusivamente do juízo cível, cabível contra os ilícitos que o constituinte de 1988 chama, genericamente, “agravos”.

Dada a impossibilidade de modulação de efeitos de decisões de não-recepção, consoante precedentes do STF, a Lei de Imprensa deve ser considerada inválida desde a promulgação da CF/88. - O direito constitucional de resposta, antes previsto na Lei de Imprensa, continua passível de proteção jurídica, contudo não mais nos termos em que era previsto na lei não-recepcionada. Para amparar tal direito, os Tribunais deverão se valer da regra da analogia, invocando o art. 14 do Pacto de San José da Costa Rica e o art. 58 da Lei 9.504/97. RECURSO ESPECIAL N.º 885.248 - MG (2006/0184797-8) RELATORA: MINISTRA NANCY ANDRIGHI.[34]

Nos termos do Código Civil brasileiro, “aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência [culpa], violar direito ou causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito” (art. 186). “Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo” (art. 927).

“Há tendência na jurisprudência de se alargar o conceito de culpa para possibilitar maior âmbito na reparação dos danos. Criou-se a noção de culpa presumida, alegando-se que existe dever genérico de não prejudicar.”

Passou-se a entender ser a ideia de culpa insuficiente, por deixar muitas situações de dano sem reparação. [...] É no campo da teoria objetiva que se coloca a teoria do risco, pela qual cada um deve suportar os riscos da atividade a que se dedica, devendo indenizar quando causar dano. O presente Código [Código Civil de 2002] inova arriscadamente nessa área. De fato, o parágrafo único do art. 927, que estabelece a obrigação geral de reparar o dano por conduta decorrente de ato ilícito, dispõe: “Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem” (VENOSA, 2004. pp. 614-615).

O risco de dano moral e à imagem é inerente à atividade jornalística, podendo a violação advir até de ato lícito, como o exercício regular de um direito – quando o interesse público se sobrepõe ao particular –, podendo, mesmo assim, haver obrigação de reparação se, no caso concreto, o titular do direito atingido não tiver concorrido para a veiculação da matéria que deu causa à violação (expondo-se intencionalmente, por exemplo)[35].

O exercício regular de um direito (art. 188, I, do Código Civil) é ato lícito tanto quanto o estado de necessidade (idem, inciso II), sendo que este “consiste na situação de agressão a um direito alheio, de valor jurídico igual ou inferior àquele que se pretende proteger” (GAGLIANO, 2006, p. 499).

É o caso do sujeito que desvia o carro de um bebê, para não atropelá-lo, e atinge o muro da casa, causando danos materiais. [...] Se o terceiro atingido não for o causador da situação de perigo, poderá exigir indenização do agente que houvera atuado em estado de necessidade. [...] Excepcionalmente, portanto, a responsabilidade civil poderá decorrer de um comportamento humano admitido pelo direito (id. pp. 450-451).

Mutatis mutandis, se, em nome do interesse público, o órgão de comunicação social revela o nome da fonte que solicitou sigilo, ou publica foto de pessoa presa em flagrante de crime de ação penal pública incondicionada, estas, caso se sintam prejudicadas com a divulgação, poderão requerer indenização, mesmo tendo a empresa jornalística exercido regularmente o dever-direito de informar.

No sistema francês a regra é mais ampla, assistindo o droit de réponse a todos que sejam mencionados na imprensa, “independentemente de se tratar de afirmações de facto ou de juízos de valor e abstraindo da circunstância de a referência ser ou não lesiva de qualquer direito ou interesse legítimo da pessoa visada” (MOREIRA, op. cit., p. 26).

Logo, a simples menção à pessoa, pejorativamente ou não, daria causa ao exercício desse direito.

O direito de resposta encontra sua base – ao menos para a imprensa escrita – não na necessidade de uma resposta a um ataque, mas simplesmente na possibilidade, para uma pessoa citada ou designada, de fazer conhecer suas explicações ou seus protestos a respeito das circunstâncias e mesmo das condições que provocaram a sua menção. O fato gerador do direito reside nesta simples colocação em causa do autor da resposta, por citação ou designação, independentemente de outra circunstância, o que hoje é interpretado como expressão de um direito absoluto e discricionário. (MAYAUD, Yves. L’abus de droit en matière de droit de réponse, p. 5, apud GARCIA, Ob. cit., p. 513).

Atualmente, de acordo com Enéas Costa Garcia (citando Jean-Paul Levy), a jurisprudência mitiga a incidência do art. 13 da Lei francesa (de 29 de julho de 1881) que versa sobre a liberdade de imprensa, aplicando-a somente “àquelas hipóteses onde se busca proteger a personalidade da pessoa citada”. “Por força do art. 10-2 da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, qualquer ingerência na liberdade de imprensa deve ser justificada com o objetivo de proteger a reputação de outrem” (GARCIA, op. cit., p. 514).


Da aplicabilidade e da eficácia

A decisão do Supremo gerou no ordenamento efeitos ex tunc. Isso significa que a Lei de Imprensa regulou validamente a “liberdade de manifestação do pensamento e de informação” de 14 de março de 1967 (data em que entrou em vigor) até 4 de outubro de 1988, o dia anterior à promulgação da atual Constituição, ressalvadas as coisas (causas) soberanamente julgadas.

            Conquanto a responsabilidade por danos patrimoniais e imateriais às pessoas físicas e jurídicas seja disciplinada nos códigos Civil e Penal brasileiros, com o julgamento da ADPF 130 generalizou-se o entendimento de que o direito de resposta ficara sem regulamentação.

Fábio Konder Comparato chegou a ingressar no Supremo com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão. Representando entidades sindicais, o jurista pede à Corte que determine ao Congresso Nacional, entre outras providências, a criação de uma legislação específica sobre o direito de resposta nos meios de comunicação.

Coautor do livro O STF e o Direito de Imprensa: análise e consequências do julgamento da ADPF 130/2008, Luis Gustavo Grandinetti Castanho de Carvalho, desembargador do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, ratifica que não haveria necessidade de uma legislação especial para regular a responsabilidade civil nas condutas de jornalistas, já disciplinadas pelos códigos Civil e Penal. Quanto ao direito de resposta haveria de fato um “vácuo legislativo”.[36]

 Carvalho recorre, por analogia, à contrapublicidade e à contrapropaganda previstas no Código de Proteção e Defesa do Consumidor (CDC).[37]

Art. 60. A imposição de contrapropaganda será cominada quando o fornecedor incorrer na prática de publicidade enganosa ou abusiva, nos termos do art. 36[38] e seus parágrafos, sempre às expensas do infrator. § 1º A contrapropaganda será divulgada pelo responsável da mesma forma, freqüência e dimensão e, preferencialmente no mesmo veículo, local, espaço e horário, de forma capaz de desfazer o malefício da publicidade enganosa ou abusiva.[39]

“Pode-se invocar o Código de Processo Civil (CPC) em uma ação de obrigação de fazer consistente em publicar a resposta, além de usar a tutela antecipada para obrigar a resposta antes de sair a sentença”, afirma o desembargador. “Mas faltaria um [direito de resposta] específico para a imprensa”[40]. “A ação cabível teria a natureza cível do Código referido, e não mais criminal, como o era sob a vigência da Lei de Imprensa”[41].

Não há porque conferir ao direito de resposta a natureza jurídica de instituto exclusivamente de Direito Penal. Se é certo que o instituto traz profundas influências no campo criminal, também estas existem no campo civil. Hoje, o direito de resposta tem natureza constitucional (art. 5.º, V). Logo, questionável considerá-lo como instituto exclusivamente penal, sua natureza seria mista. Pela mesma razão cabe questionar a atribuição do direito de resposta ao juízo criminal (GARCIA, Ob. Cit., p. 523).

Com a devida reverência à doutrina especializada, o desagravo não conquistou o status de direito fundamental com a promulgação da Constituição vigente, mas já na Constituição de 1967, outorgada poucos dias antes da Lei de Imprensa, aos 24 de janeiro[42] (sem destaque na fonte):

É livre a manifestação de pensamento, de convicção política ou filosófica e a prestação de informação sem sujeição à censura, salvo quanto a espetáculos de diversões públicas, respondendo cada um, nos termos da lei, pelos abusos que cometer. É ASSEGURADO O DIREITO DE RESPOSTA. A publicação de livros, jornais e periódicos independe de licença da autoridade. Não será, porém, tolerada a propaganda de guerra, de subversão da ordem ou de preconceitos de raça ou de classe (CAPÍTULO IV - Dos Direitos e Garantias Individuais. Art. 150, §8.º).43

O legislador constituinte originário, duas décadas depois, apenas reafirma, no capítulo que trata dos direitos e garantias individuais e coletivos, “o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem” (5º, V).

A referida norma constitucional, vale reforçar, não se limita ao direito de réplica, mas também abriga o direito de retificação, assim como o fazia a Lei de Imprensa, desde que a informação inverídica enseje dano à personalidade.

Para Alexandre de Morais, a abrangência do desagravo “é ampla, aplicando-se em relação a todas as ofensas, configurem ou não infrações penais”. Ainda de acordo com esse autor, o direito de réplica “deverá ser tutelado pelo Poder Judiciário, garantindo-se o mesmo destaque [dado] à notícia que o originou [...], a mesma duração (no caso de rádio e televisão), o mesmo tamanho (no caso de imprensa escrita)” (MORAIS, 2005, p. 45).

A liberdade de manifestação de pensamento tem seus ônus, tal como o de o manifestante identificar-se, assumir claramente a autoria do produto do pensamento manifestado, para, sendo o caso, responder por eventuais danos a terceiros. Daí por que a Constituição veda o anonimato. A manifestação do pensamento não raro atinge situações jurídicas de outras pessoas, a quem corre o direito, também fundamental, de resposta (SILVA, 2007, p. 90).

Havendo recusa de publicação por parte do órgão, ou este tiver deixado de existir, tratando-se de obrigação de fazer pode o autor requerer a condenação do réu nas custas da publicação do desagravo em outro veículo de comunicação, ou a conversão em perdas e danos, nos termos da lei civil.

Supre o prazo prescricional da Lei de Imprensa o art. 205, combinado com o 2.028 (ambos do Código):

TÍTULO IV, CAPÍTULO I, Seção IV. Dos Prazos da Prescrição. Art. 205. A prescrição ocorre em dez anos, quando a lei não lhe haja fixado prazo menor. [...] LIVRO COMPLEMENTAR. Das Disposições Finais e Transitórias. Art. 2.028. Serão os da lei anterior os prazos, quando reduzidos por este Código, e se, na data de sua entrada em vigor, já houver transcorrido mais da metade do tempo estabelecido na lei revogada.[44]

Isto é, após a Constituição de 1988, e antes de 12 de janeiro de 2003 (início da vigência do atual Código Civil), o prazo para se pleitear o desagravo passou para vinte anos, contados da divulgação jornalística. De 12 de janeiro de 2003 em diante vigora o prazo de dez anos, também contados do fato, devendo tal redução retroagir às matérias veiculadas no decênio anterior. Nessa última hipótese a contagem tem início em 12 de janeiro de 2003, não a partir da divulgação da matéria dita ofensiva.

A esse respeito, todavia, de acordo com Mônica Cristina Mendes Galvão “prevalece o entendimento majoritário dos Tribunais quanto ao prazo prescricional de 03 anos” (CARVALHO, Ob. cit., p. 131), aplicando-se à matéria a regra do art. 206, § 3.º, V, pertinente à reparação civil: “Prescreve: [...] Em três anos: [...] a pretensão de reparação civil”[45].

Ora, na falta de previsão específica, não se deve estender ao direito de resposta, por analogia, o prazo prescricional da reparação civil, mas aplicar o prazo genérico, pois a prescrição, sendo norma restritiva de direito, não admite interpretação ampliativa – principalmente em se tratando de direito fundamental.  

Além de não ser essa a melhor interpretação, não aplicar o art. 205 importa grave violação da segurança jurídica, pois a prescrição da pretensão dar-se-ia antes do julgamento da ADPF 130, alcançando irremediavelmente ações anteriores ao advento da Constituição de 1988 e fatos geradores do dano ocorridos nos dez anos anteriores à entrada em vigor do Código de 2002 (12 de janeiro de 2003).


Conclusão

 Outrora de natureza punitiva, o direito de resposta ou de desagravo adquire inegável caráter reparatório extrapatrimonial com o julgamento da ADPF 130. Conquanto afastada a sanção penal tipificada no art. 27 da Lei de Imprensa, imputado ao autor da matéria jornalística o abuso de direito, não há qualquer óbice para aquele que se considere prejudicado pela veiculação da matéria jornalística pleitear o desagravo, assim como a reparação pelos danos morais e materiais decorrentes, perante a Justiça Cível.

Em que pese a opinião, de estudiosos e aplicadores do Direito, de que a revogação da lei criara um “vácuo normativo”, na expressão utilizada pelo meritíssimo ministro Marco Aurélio, único a votar pela total improcedência do pedido do autor na ADPF 130 e contra a prescindibilidade do diploma para o exercício do jornalismo, o fato é que os códigos Civil, Penal e processuais vigentes e a própria Constituição da República possuem mecanismos que suprem suficientemente os da lei federal revogada.

Mesmo o direito de desagravo tem previsão no art. 5.º da Constituição, o qual desfruta de eficácia plena (independe de regulamentação): “As normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata” (5.º, LXXVIII, §1.º).

Advindo regulamentação, esta não poderá criar empecilhos ao exercício desse direito, de resto cláusula pétrea, de modo que o impacto da revogação da Lei de Imprensa foi deveras superestimado, tanto pelos defensores quanto pelos opositores da norma especial – cujos dispositivos evidentemente não recepcionados já não eram aplicados pelo Judiciário havia duas décadas.


Referências

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VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: parte geral. 4 ed. São Paulo: Atlas, 2004., pp. 614-615.


Notas

[1] LOBATO, Elvira. Igreja Universal chega aos 30 anos com império empresarial. Folha de S. Paulo. São Paulo, 15 dez. 2007, p. A1.

[2] ________. Igreja controla maior parte de TVs do país. Id., p. A4.

[3] Pet. 3.486-4/DF. Rel. Ministro CELSO DE MELLO. DJ de 29 ago. 2005, Seção I, pp. 8-9.

[4] PARTIDO DEMOCRÁTICO TRABALHISTA (PDT) vs. PRESIDENTE DA REPÚBLICA. Petição inicial da ADPF 130. Brasília/DF, 19 fev. 2008, p. 45.

[5] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Ação de arguição de descumprimento de preceito fundamental n. 130 (op. cit.).

[6] Apesar de dicionaristas registrarem o termo “imprensa” como sinônimo de “jornalismo” ou no sentido de “qualquer meio utilizado na difusão de informações jornalísticas (p.ex., a radiodifusão); conjunto dos processos de veiculação de informações jornalísticas” (HOUAISS), imprensa se refere apenas aos veículos de comunicação impressos (jornais, revistas e similares). Cf. Manual da redação: Folha de S. Paulo. São Paulo: Publifolha, 2001, p. 74 (“Não escreva imprensa escrita (pleonasmo) nem imprensa eletrônica, falada ou televisionada”) e MARTINS, 1997, p. 143 (“Imprensa para o Estado é apenas a escrita (sem a necessidade de qualificativos)”.

[7] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Ação de arguição de descumprimento de preceito fundamental n. 130. Arguente: Partido Democrático Trabalhista. Arguido: Presidente da República. Relator: Ministro Carlos Ayres Britto. Brasília, 19 fev. 2008, p. 58.

[8] Salvo disposição expressa em contrário, o ofendido decai do direito de queixa ou de representação se não o exerce dentro do prazo de 6 (seis) meses, contado do dia em que veio a saber quem é o autor do crime, ou, no caso do § 3.º do art. 100 deste Código, do dia em que se esgota o prazo para oferecimento da denúncia.

[9] A responsabilidade solidária é possível, todavia, no âmbito civil: “São civilmente responsáveis pelo ressarcimento de dano, decorrente de publicação pela imprensa, tanto o autor do escrito quanto o proprietário do veículo de divulgação (súmula n.º 221 do STJ, de 12/05/1999 - DJ 26.05.1999).

[10] Parágrafo com nova redação dada pela Lei n.º 6.071, de 3 de julho de 1974 (DOU de 4/7/74, p. 7389). Na redação reformada, o recurso previsto era o agravo de petição, sendo que o agravante deveria, do mesmo modo, solicitar “a expedição da guia para o depósito, sendo o recurso julgado deserto” se no prazo do agravo não fosse comprovado o depósito.

[11] A título de curiosidade, embora a acusação sustentasse a “conjugação de vontades” dos jornalistas em cometer a suposta calúnia, não foram os réus indiciados por formação de quadrilha (art. 288, Código Penal): “Associarem-se mais de três pessoas, em quadrilha ou bando, para o fim de cometer crimes: Pena - reclusão, de um a três anos”.

[12] O instrumento correto para arguição de normas inconstitucionais é a ADI (Ação Direta de Inconstitucionalidade). A própria Lei de Imprensa já havia sido objeto de ADI, não tendo sido conhecida por impossibilidade jurídica do pedido (ADI 521/MT. Rel. Ministro PAULO BROSSARD).

[13] Não se admite a prova da verdade contra o Presidente da República, o Presidente do Senado Federal, o Presidente da Câmara dos Deputados, os Ministros do Supremo Tribunal Federal, Chefes de Estado ou de Governo estrangeiro, ou seus representantes diplomáticos (art. 20, §3º).

[14] Art. 138. § 3º - Admite-se a prova da verdade, salvo: II - se o fato é imputado a qualquer das pessoas indicadas no n.º I do art. 141; art. 141, I. I - contra o Presidente da República, ou contra chefe de governo estrangeiro.

[15] FRIAS FILHO, Otávio. Folha de S. Paulo. Carta aberta ao sr. Presidente da República, 25 de abril de 1991.

[16] BRASIL. Lei n. 5.250, de 9 de fevereiro de 1967. Lei de Imprensa. Atualizada até 2000. Brasília: Câmara dos Deputados, Coordenação de Publicações, 2000.38 p.

[17] Com a previsão de apreensão dos jornais e extinção do registro, em caso de reincidência (art. 62, §4.º, a)

[18] Lei de Imprensa, Art. 29, § 2.º, e Art. 58.

[19] Id., Art. 56.

[20] Vide, mais adiante, o tópico “Do direito fundamental à liberdade de opinião”

[21] lei n. 4.717/65.

[22] Humberto de Alencar Castelo Branco (1897-1967).

[23] Ernesto Beckmann Geisel (1907-1996).

[24] FENAJ. Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros. Vitória, ES: Federação Nacional dos Jornalistas, 4 ago 2007.

[25] Humberto de Alencar Castelo Branco, um dos principais articuladores do Golpe de 64, foi morto em um suposto acidente aéreo logo após o término de seu mandato, aos 69 anos.

[26] Idem, art. 29, caput.

[27] HOUAISS. Dicionário eletrônico da Língua Portuguesa. Versão monousuário 3.0, junho de 2009.

[28] Ipsis verbis, “expressões caluniosas, difamatórias ou injuriosas sobre o jornal, periódico, emissora ou agência de notícias em que houve a publicação ou transmissão que lhe deu motivos”, mas, como se sabe, pessoas jurídicas não são sujeitos passivos de injúria.

[29] PORTAL PDT. Brizola responde à TV Globo – Direito de resposta. Vídeo (3min59s). Youtube: Verborreia, 29 abr 2009. FLV, 6,23MB, son. Color. Acesso: 13 mar. 2012. Disponível em: http://www.pdt.org.br/

[30] BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal, 1988. Art. 5.º, V - é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem (TÍTULO II - Dos Direitos e Garantias Fundamentais – CAPÍTULO I – DOS DIREITOS E DEVERES INDIVIDUAIS E COLETIVOS), bem como a liberdade de manifestação do pensamento (5.º, IV) e de expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença (5º, IX) e a inviolabilidade da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem das pessoas e o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação (5.º, X).

[31] _______. Constituição da República Federativa do Brasil de 1967. Brasília, DF: Congresso Nacional, 1967.

[32] BRASIL, op. cit. Art. 29, § 3.º e § 2.º, respectivamente.

[33] BRASIL. Lei n.º 4.117, de 27 de agosto de 1962. Institui o Código Brasileiro de Telecomunicações.

[34] Brasília (DF), 15 de dezembro de 2009 (data do julgamento)

[35] Também haverá dever de indenizar se o responsável pela publicação, agindo no interesse público, cometer excessos, mas aí o exercício do direito não será regular e o ato será ilícito.

[36] Em sentido diverso, o Superior Tribunal de Justiça: VI – A despeito da absoluta inaplicabilidade de qualquer preceito constante da Lei de Imprensa, em face de sua não recepção pela Constituição Federal/88, nos termos declarados pela Suprema Corte, de modo algum, com tal declaração, estabeleceu-se um vácuo normativo. VII – O ordenamento jurídico vigente, encampado e norteado pela Constituição Federal, em que há expressa proteção ao direito de resposta (esta proporcional ao agravo), prevê, na sua legislação civil, o dever de reparar decorrente de ato ilícito, este entendido como aquele que causa prejuízo a outrem. É de se reconhecer, portanto, por meio de uma interpretação extensiva, que o direito de resposta está respaldado no Código Civil de 2002. RECURSO ESPECIAL Nº 1.021.688 – RJ (2008/0003244-0) – RELATOR: MINISTRO MASSAMI UYEDA – R.P/ACÓRDÃO: MINISTRO SIDNEI BENETI).

[37] CARVALHO, Luis Gustavo Grandinetti Castanho de. Desembargador especialista em liberdade de imprensa sugere regulamentar direito de resposta. Entrevistadora: Marina Ito. São Paulo, SP. Entrevista concedida à Revista Consultor Jurídico, SP, jun. 2011

[38] Art. 36. A publicidade deve ser veiculada de tal forma que o consumidor, fácil e imediatamente, a identifique como tal. Parágrafo único. O fornecedor, na publicidade de seus produtos ou serviços, manterá, em seu poder, para informação dos legítimos interessados, os dados fáticos, técnicos e científicos que dão sustentação à mensagem (BRASIL. Lei n. 8.078, de 11 de setembro de 1990. Código de Proteção e Defesa do Consumidor. Dispõe sobre a proteção do consumidor e dá outras providências.).

[39] § 1.°. É enganosa qualquer modalidade de informação ou comunicação de caráter publicitário, inteira ou parcialmente falsa, ou, por qualquer outro modo, mesmo por omissão, capaz de induzir em erro o consumidor a respeito da natureza, características, qualidade, quantidade, propriedades, origem, preço e quaisquer outros dados sobre produtos e serviços. § 2° É abusiva, dentre outras, a publicidade discriminatória de qualquer natureza, a que incite à violência, explore o medo ou a superstição, se aproveite da deficiência de julgamento e experiência da criança, desrespeite valores ambientais, ou que seja capaz de induzir o consumidor a se comportar de forma prejudicial ou perigosa à sua saúde ou segurança (art. 37, id.).

[40] CARVALHO, Luis Gustavo Grandinetti Castanho de. Desembargador especialista em liberdade de imprensa sugere regulamentar direito de resposta. Entrevistadora: Marina Ito. São Paulo, SP. Entrevista concedida à Revista Consultor Jurídico, SP, jun. 2011.

[41] “E, desse modo, seria cabível a antecipação de tutela, nos termos do artigo 273 do Código de Processo Civil, observando-se os seguintes requisitos: verossimilhança das alegações, o dano ser de difícil reparação – e quase sempre a ofensa à honra o é; e, finalmente, a reversibilidade, que, no caso de imprensa, consistirá no reconhecimento do direito de o jornal cobrar pela publicação da resposta em caso de improcedência do pedido. (...) Embora tenha percebido que a informação tem um sentido público e que interessa a todos os leitores e espectadores, o acórdão do STF parecer [sic] se satisfazer com o tratamento privatístico que vem sendo dado à matéria.” (CARVALHO & GALVÃO, 2011, p. 172).

[42] A lei de Imprensa, no entanto, entrou em vigor um dia antes da Constituição de 67, aos 14 de março.

[43] BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1967 (op. cit.).

[44] BRASIL. Lei n. 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil.

[45] BRASIL. Lei n. 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (op. cit.).


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Informações sobre o texto

Publicado originalmente em: JURISVOX: Revista da Faculdade de Direito de Patos de Minas / Centro Universitário de Patos de Minas. -- Ano 12, n. 12 (dez. 2012). -- Patos de Minas: UNIPAM, 2012. pp. 169-188.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ALMEIDA, Manoel de Jesus Pereira. O direito de resposta ou desagravo pós ab-rogação da norma penal especial . Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 20, n. 4278, 19 mar. 2015. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/31448. Acesso em: 23 abr. 2024.