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Acordo de leniência: caracterização e repercussões

Acordo de leniência: caracterização e repercussões

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O advento da Lei 12.529/2011 representou grande avanço ao estabelecer a estrutura da defesa da concorrência, com o escopo de prevenir e reprimir as infrações contra a ordem econômica. Uma das ferramentas usadas neste processo é o acordo de leniência no âmbito do CADE.

INTRODUÇÃO

O Acordo de Leniência foi introduzido no Brasil pela Lei 10.149/2000, que alterou a antiga Lei de Defesa da Concorrência. O objetivo era fortalecer a atividade de repressão de infrações à ordem econômica.

Desde 2003, o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE) tem cooperado com o Ministério Público e a Polícia Federal para garantir que dirigentes, administradores e empregados de empresas envolvidas que não assinarem os Acordos de Leniência sejam processados por crime de cartel.

Com a entrada em vigor da nova Lei de Defesa da Concorrência, a Lei 12.529/2011, foi instituído o atual Programa de Leniência do CADE, com um capítulo exclusivo na lei, cujos direitos e garantias estão previstos em seus artigos 86 e 87.

É por meio deste programa que, atualmente, o CADE consegue descobrir a existência de diversos cartéis, podendo penalizar as empresas e pessoas físicas que estejam ou tenham participado, possibilitando a reparação dos danos já causados por eles.


O QUE É O PROGRAMA DE LENIÊNCIA DO CADE – ASPECTOS GERAIS

O CADE possui um programa chamado de “Programa de Leniência” que é um conjunto de iniciativas com o objetivo de detectar, investigar e punir infrações contra a ordem econômica. Além disso, também informar e orientar as empresas e as pessoas sobre seus direitos e garantias com relação ao Acordo de Leniência. A ideia do programa é orientar as empresas e as pessoas de forma a incentivar que estas proponham a celebração do Acordo de Leniência.

O programa de leniência permite que as empresas e pessoas físicas envolvidas, ou que já estiveram envolvidas em um cartel ou em outra prática anticoncorrencial, obtenham benefícios na esfera tanto administrativa, como criminal, por meio da celebração do Acordo de Leniência.


O ACORDO DE LENIÊNCIA

O Acordo de Leniência é um acordo celebrado entre o CADE e as empresas e/ou pessoas físicas envolvidas ou que já estiveram envolvidas em infrações contra a ordem econômica. A Superintendência-Geral é o órgão responsável por realizar as negociações referentes à celebração do Acordo de Leniência, bem como após a celebração (assinatura) do acordo, instaurar o procedimento administrativo a fim de investigar as condutas reportadas no Acordo de Leniência.

O Tribunal do CADE não participa da negociação, competindo a ele apenas decretar, ao final, o cumprimento do acordo quando do julgamento do Processo Administrativo.

Não há disposição na Lei que determine a participação do Ministério Público na celebração do acordo, entretanto, a experiência consolidada do CADE é no sentido de viabilizar a sua participação.

Toda a negociação feita entre CADE e os proponentes do acordo são sigilosas. O conteúdo do Acordo de Leniência apenas se tornará disponível aos representados do processo administrativo que for instaurado em face da celebração do Acordo de Leniência para investigar as condutas delatadas. O processo administrativo instaurado para investigar as condutas é público, restando sigilosa a informação de quem assinou o acordo.


Requisitos para assinatura do Acordo de Leniência

No momento da propositura do Acordo de Leniência, é necessário que: (i) a empresa seja a primeira a se qualificar com respeito à infração noticiada ou sob investigação; (ii) que a Superintendência-Geral não disponha de provas suficientes para assegurar a condenação da empresa/ou da pessoa física. Além disso, ao celebrar o acordo, as empresas e as pessoas físicas devem, no ato da assinatura, se comprometer a (iii) cessar a conduta ilegal – ou seja, caso estejam praticando uma conduta anticoncorrencial elas devem cessar imediatamente ou caso já tenham cessado, não podem retornar a sua prática – (iv) denunciar e confessar a sua participação no ilícito; (v) cooperar com as investigações apresentando informações e documentos relevantes para a investigação, bem como comparecendo, sempre que solicitado, a todos os atos processuais, até a decisão final sobre a infração noticiada proferida pelo CADE; e que (vi) da cooperação resulte a identificação dos demais envolvidos na infração e a obtenção de informações e documentos que comprovem a infração noticiada ou sob investigação.


INFRAÇÕES CONTRA A ORDEM ECONÔMICA PUNÍVEIS

As infrações puníveis estão tipificadas no caput do art. 36 da Lei 12.529/2011. De acordo com o referido artigo, constituem infração à ordem econômica, independentemente de culpa, os atos que tenham por objeto ou possam produzir os seguintes efeitos, mesmo que não sejam alcançados:

limitar, falsear ou de qualquer forma prejudicar a livre concorrência ou a livre iniciativa;

dominar mercado relevante de bens ou serviços - resalva para a conquista de posição dominante resultante de processo natural fundado na maior eficiência do agente econômico em relação aos demais competidores, esta hipótese não caracteriza o ilícito.

aumentar arbitrariamente os lucros;

exercer de forma abusiva posição dominante – posição dominante: quando uma empresa ou grupo econômico for capaz de alterar unilateralmente ou coordenadamente as condições de mercado ou quando controlar 20% ou mais do mercado relevante. Este percentual pode ser alterado pelo CADE.

O referido artigo prevê, em seu terceiro parágrafo, diversas condutas que, quando praticadas, configurada alguma das quatro hipóteses mencionadas no caput do art. 36, caracterizam infração à ordem econômica. Algumas delas são:

I - acordar, combinar, manipular ou ajustar com concorrente, sob qualquer forma:

a) os preços de bens ou serviços ofertados individualmente;

b) a produção ou a comercialização de uma quantidade restrita ou limitada de bens ou a prestação de um número, volume ou frequência restrita ou limitada de serviços;

c) a divisão de partes ou segmentos de um mercado atual ou potencial de bens ou serviços, mediante, dentre outros, a distribuição de clientes, fornecedores, regiões ou períodos;

d) preços, condições, vantagens ou abstenção em licitação pública.

II - limitar ou impedir o acesso de novas empresas ao mercado; 

III - criar dificuldades à constituição, ao funcionamento ou ao desenvolvimento de empresa concorrente ou de fornecedor, adquirente ou financiador de bens ou serviços; 

IV - impedir o acesso de concorrente às fontes de insumo, matérias-primas, equipamentos ou tecnologia, bem como aos canais de distribuição; 

V - exigir ou conceder exclusividade para divulgação de publicidade nos meios de comunicação de massa; 

VI - utilizar meios enganosos para provocar a oscilação de preços de terceiros; 

VII - regular mercados de bens ou serviços, estabelecendo acordos para limitar ou controlar a pesquisa e o desenvolvimento tecnológico, a produção de bens ou prestação de serviços, ou para dificultar investimentos destinados à produção de bens ou serviços ou à sua distribuição; 

VIII - recusar a venda de bens ou a prestação de serviços, dentro das condições de pagamento normais aos usos e costumes comerciais; 

X - vender mercadoria ou prestar serviços injustificadamente abaixo do preço de custo; 

XI - subordinar a venda de um bem à aquisição de outro ou à utilização de um serviço, ou subordinar a prestação de um serviço à utilização de outro ou à aquisição de um bem;

XIX - exercer ou explorar abusivamente direitos de propriedade industrial, intelectual, tecnologia ou marca. 

Os 3 primeiros itens do caput do art. 36 da Lei estão relacionados com a prática de cartel, ou seja, quando as empresas concorrentes se coordenam e realizam acordos com o objetivo ou com a potencialidade de produzir os efeitos, ainda que não alcançados.

Nesse sentido, o CADE (o que pode ser demonstrado pela sua própria jurisprudência) entende que a mera reunião entre os concorrentes para combinar preços, alocar projetos de licitações, por exemplo, caracteriza a infração, não necessitando que o que foi combinado entre as empresas tenha realmente sido feito na prática.

Isto porque a prática do cartel é considerada um “ilícito pelo objeto”, isto é, não é necessário que o cartel gere os efeitos no mercado, sendo suficiente a potencialidade de seus efeitos.


SANÇÕES APLICÁVEIS

Na esfera administrativa, o art. 37 da Lei 12.529/2011 prevê as seguintes sanções pecuniárias (multas) que devem ser aplicadas às infrações contra a ordem econômica:

 I - no caso de empresa, multa de 0,1% (um décimo por cento) a 20% (vinte por cento) do valor do faturamento bruto da empresa, grupo ou conglomerado obtido, no último exercício anterior à instauração do processo administrativo, no ramo de atividade empresarial em que ocorreu a infração, a qual nunca será inferior à vantagem auferida, quando for possível sua estimação; 

II - no caso das demais pessoas físicas ou jurídicas de direito público ou privado, bem como quaisquer associações de entidades ou pessoas constituídas de fato ou de direito, ainda que temporariamente, com ou sem personalidade jurídica, que não exerçam atividade empresarial, não sendo possível utilizar-se o critério do valor do faturamento bruto, a multa será entre R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais) e R$ 2.000.000.000,00 (dois bilhões de reais); 

 III - no caso de administrador, direta ou indiretamente responsável pela infração cometida, quando comprovada a sua culpa ou dolo, multa de 1% (um por cento) a 20% (vinte por cento) daquela aplicada à empresa, no caso previsto no inciso I do caput deste artigo, ou às pessoas jurídicas ou entidades, nos casos previstos no inciso II do caput deste artigo.  

Além disso, a Lei prevê que, em caso de reincidência, as multas cominadas serão aplicadas em dobro e, no cálculo do valor da multa de que trata o inciso I do caput do artigo, o CADE poderá considerar o faturamento total da empresa ou grupo de empresas, quando não dispuser do valor do faturamento no ramo de atividade empresarial em que ocorreu a infração, definido pelo CADE, ou quando este for apresentado de forma incompleta e/ou não demonstrado de forma inequívoca e idônea.

Já na esfera criminal, a Lei de Crimes Contra a Ordem econômica, em seu art. 4º, prevê que a prática do crime de cartel sujeita os indivíduos envolvidos às penas de reclusão de dois a cinco anos e multa, podendo ser aumentada de um terço até a metade se o crime causar grave dano à coletividade, for cometido por servidor público no exercício de suas funções ou se relacionar a bens ou serviços essenciais para a vida ou para a saúde.


BENEFÍCIOS CONCEDIDOS PELA ASSINATURA DO ACORDO

As práticas de infrações anticoncorrenciais estão sujeitas às sanções administrativas e penais mencionadas anteriormente. Com a celebração do acordo são concedidos benefícios aos seus signatários em ambas as esferas, de forma que é mais vantajoso tanto para a empresa quanto para os indivíduos envolvidos assinarem o acordo.

Na esfera administrativa, o signatário do Acordo de Leniência, sendo ele pessoa física ou empresa, desde que ele tenha colaborado com a investigação e que o resultado desta colaboração ocasione a identificação dos demais envolvidos na infração, bem como a obtenção de informações e documentos que comprovem as infrações noticiadas ou sob investigação, estes serão beneficiados com a extinção da ação punitiva da administração pública (conhecida como leniência total)– no caso de a autoridade não tiver conhecimento prévio da infração noticiada – ou a redução de um a dois terços das penas administrativas aplicáveis (conhecida como leniência parcial) – no caso de a autoridade já tiver conhecimento prévio da infração, por exemplo, por meio de notícias na internet.

Na esfera criminal, a celebração do acordo determina a suspensão do curso do prazo prescricional e impede o oferecimento da denúncia em relação aos signatários do acordo com relação aos crimes contra a ordem econômica tipificados na lei 8.137/1990, e nos demais crimes relacionados à prática de cartéis, tais como os que estão tipificados na Lei Geral de Licitações (Lei 8666/1993) e no art. 288 do CP (associação criminosa). Cumprido o Acordo de Leniência, automaticamente a punibilidade será extinta para os referidos crimes.

Com relação à esfera civil, a lei não impõe ao signatário a obrigação de ressarcir eventuais consumidores lesados pela conduta praticada, entretanto, a lei também não exime o beneficiário de responder por danos concorrenciais em eventual ação civil pública ou ação privada de ressarcimento de danos propostas pelos consumidores ou até mesmo outras empresas que possam ter sido afetadas pelo cartel.

Os referidos benefícios do Acordo de Leniência serão efetivamente concedidos com a declaração de cumprimento do Acordo de Leniência pelo Tribunal do CADE por ocasião do julgamento do Processo Administrativo.

Ainda, a empresa que não se qualificar para celebrar o Acordo de Leniência pode propor outra espécie de acordo, chamada de Termo de Cessação de Conduta (TCC). A diferença entre ambos é que o Acordo de Leniência é disponível apenas para o primeiro agente infrator que reportar a conduta anticoncorrencial e, desta forma, possui os melhores benefícios administrativos e também benefícios na seara criminal (benefício não disponível para quem celebra um TCC). Já o TCC é acessível a todos os demais investigados na conduta anticompetitiva. 


PROCEDIMENTO – NEGOCIAÇÃO DO ACORDO DE LENIÊNCIA

 Pedido de Senha

 O pedido de senha, mais conhecido como “marker”, é o ato em que o proponente do Acordo de Leniência entra em contato com a Superintendência-Geral do CADE, especificamente com o Chefe de Gabinete da Superintendência-Geral, ou, na sua ausência com o Superintendente Adjunto da Superintendência-Geral, por telefone) a fim de comunicar o interesse em propor o referido acordo em relação a uma determinada conduta anticoncorrencial coletiva, e assim garantir que ele é o primeiro proponente em relação a essa conduta.

(ii) Análise do Pedido

 Após o recebimento do pedido de senha, a SG verifica internamente no prazo de 05 dias: (i) se há um pedido anterior; ou (ii) se há um Acordo de Leniência em andamento; (iii) ou se a SG possui conhecimento prévio sobre a conduta.

(iii) – Termo de Marker

 Após constatado que a empresa foi a primeira a comparecer perante a SG para denunciar uma infração, obterá uma declaração atestando que ela apresentou informações sobre práticas anticompetitivas. Lembrando que esta declaração não garante a celebração do Acordo de Leniência, tendo em vista que para sua assinatura deverão estar preenchidos todos os requisitos legais.

(iv) Período de Negociação

 A SG irá apresentar na declaração de marker o prazo para os proponentes apresentarem a sua proposta de Acordo de Leniência, que irá depender de caso a caso.

Durante o período de negociação, a proponente deverá apresentar informações e documentos que comprovem a infração noticiada ou sob investigação. O proponente deve necessariamente indicar: (i) qualificação completa; (ii) detalhamento da infração notificada ou sob investigação; (iii) identificação dos outros autores da infração noticiada ou sob investigação; (iv) produtos ou serviços afetados; (v) área geográfica afetada; (vi) duração estimada da infração notificada ou sob investigação; (vii) descrição das informações e dos documentos que serão apresentados por ocasião da assinatura do Acordo de Leniência; (viii) informação sobre outras propostas de Acordos de Leniência sobre a mesma prática apresentadas em outras jurisdições.

Normalmente, os documentos apresentados são trocas de e-mail entre concorrentes, troca de e-mails entre pessoas da mesma empresa relatando os ajustes entre concorrentes, troca de correspondências entre concorrentes, troca de correspondências entre pessoas da mesma empresa relatando os ajustes entre concorrentes, troca de mensagens de texto ou de voz; agendas, anotações manuscritas, cadernos, tabelas e planilhas de Excel, entre outros.

A não apresentação de documentos minimamente aptos a comprovar a infração poderá ensejar na rejeição da proposta de Acordo de Leniência.

A apresentação dos documentos é feita vias pendrive, via física ou por outro meio acordado entre o proponente e a SG.

(v) Rejeição da Proposta de Acordo de Leniência

 Uma proposta de Acordo de Leniência poderá ser rejeitada pelo CADE por diversas razões, tais como: (i) não apresentação de proposta no prazo de 30 dias; (ii) ausência de cooperação ao longo da negociação; (iii) insuficiência das informações e/ou documentos para evidenciar a prática noticiada ou sob investigação; (iv) não demonstração dos efeitos da infração praticada em território nacional ou estrangeiro.

Na hipótese de rejeição da proposta, ou até mesmo desistência por parte do proponente, todos os documentos serão devolvidos e as informações e documentos apresentados durante a investigação não poderão ser utilizadas para quaisquer fins pela autoridade.

O proponente poderá obter um documento denominado “Termo de Rejeição”, no qual a SG declarará que as informações e documentos apresentados não foram capazes de comprovar a infração noticiada ou sob investigação, ou que não foram cumpridos quaisquer requisitos.

(vi) Encerramento da Negociação

Uma vez apresentadas todas as informações e os documentos requeridos, o Chefe de Gabinete da SG irá encaminhar a proposta do Acordo para apreciação do Superintendente Adjunto.

Formalização Do Acordo De Leniência

 O proponente do acordo deverá providenciar a autenticação de documentos para comprovar a veracidade das informações, bem como providenciar a tradução juramentada e consularização de documentos estrangeiros. Todos os proponentes (pessoas físicas e empresa representados por seus representantes legais com poderes específicos para o ato) deverão comparecer na sede do CADE em Brasília para a assinatura do Acordo de Leniência.

 Após A Celebração Do Acordo De Leniência

Após a celebração do Acordo de Leniência, a SG poderá instaurar Inquérito ou Processo Administrativo para apurar a infração noticiada no acordo, bem como realizar outras medidas de investigação, tais como a realização de busca e apreensão e/ou inspeção, requisição de informações e procedimentos de inteligência para detectar cartéis em licitação.

Via de regra o conteúdo de todos os documentos relacionados ao acordo são de acesso restrito e não serão divulgados ao público, mesmo após a instauração de inquérito ou processo administrativo, ressalvada a ordem judicial ou autorização dos proponentes. Além disso, a identidade dos signatários será tratada, via de regra, também como de acesso restrito perante o público até o final do julgamento pelo Tribunal.

Somente os representados, ou seja, as pessoas físicas e jurídicas investigadas pela infração denunciada terão acesso à identificação dos signatários e aos documentos do Acordo de Leniência.

O CADE não compartilha as informações do Acordo de Leniência com as autoridades antitruste de outros países, salvo na hipótese de as proponentes permitirem expressamente o compartilhamento por meio de um termo de renúncia, nomeado “Waiver”.

Remessa do Processo Administrativo ao Tribunal

A SG, quando for remeter o processo administrativo ao tribunal do CADE, deverá opinar no sentido do cumprimento ou descumprimento das obrigações dos signatários do Acordo de Leniência. A decisão final será proferida pelo Tribunal, sendo que o Conselheiro-Relator possui a competência para verificar eventual descumprimento, devendo sua decisão ser aprovada pelo Plenário do Tribunal.

No caso de descumprimento do acordo por, por exemplo, um dos signatários, o acordo como um todo não será considerado descumprido, pois a eventual não cooperação de um dos proponentes do acordo não contamina o acordo com relação aos demais beneficiários do acordo.

Até o momento, nenhum dos Acordos de Leniência celebrados pelo CADE foi declarado descumprido pelo Tribunal do CADE.

Após ser atestado o cumprimento do Acordo de Leniência por meio do julgamento do Processo Administrativo no Tribunal, cessa o dever de cooperação do signatário com o CADE. A não ser que haja algum desmembramento do processo, caso em que os signatários do Acordo de Leniência deverão permanecer cooperando com as investigações.


REPARAÇÃO DE DANOS

 Os signatários do Acordo de Leniência poderão responder por ação de reparação de danos, tendo em vista que os prejudicados pela conduta anticompetitiva poderão ingressar com a referida ação.


LENIÊNCIA PLUS

A Leniência Plus é a redução de um terço da penalidade que será aplicada à empresa/ou à pessoa física que não se qualifica para um Acordo de Leniência com relação a um determinado cartel do qual tenha participado, mas que fornece informações acerca de outro cartel sobre o qual a SG não tinha conhecimento prévio, por exemplo.

Esta redução de um terço da pena será aplicada quando do julgamento do processo administrativo em relação ao novo mercado (novo Acordo de Leniência), o CADE irá analisar se todos os requisitos do Acordo de Leniência foram devidamente cumpridos.

Esse instituto é incorporado com o escopo maior da função de repressão do Cade, especialmente na persecução relacionada a cartéis, dado que, com a colaboração da empresa e/ou das pessoas físicas, acaba por permitir a obtenção de informações e documentos de conduta anticompetitiva que a autoridade não tinha conhecimento.

Assim, em relação à nova infração denunciada (Novo Acordo de Leniência), uma vez satisfeitos os requisitos legais mencionados acima, o proponente receberá todos os benefícios do Acordo de Leniência (art. 86, §1º e art. 86, §4º, I e II da Lei nº 12.529.2011). Em relação à infração já sob investigação da SG/Cade (processo referente ao Acordo de Leniência Original), o proponente poderá beneficiar-se com a redução de um terço da penalidade aplicável (“plus”), na medida de sua cooperação com as investigações.


CONCLUSÃO

 Ao estudar e analisar os requisitos e benefícios do Acordo de Leniência, podemos concluir que ele é uma forma de ‘’reparação’’ dos danos causados à sociedade por aqueles que cometeram atos ilícitos contra a Ordem Econômica, bem como é uma oportunidade para as empresas envolvidas nos atos se comprometerem a cessar a prática do ato, cooperando com a autoridade competente na descoberta dos demais participantes da conduta, ao mesmo tempo em que se beneficia com a redução ou exclusão das penas arbitradas em processos administrativos, bem como garantindo a exclusão da persecução penal e administrativa, caso colaborem com as investigações até o seu fim.

Desta forma, a criação da Lei 12.529/2011 foi um grande passo ao estabelecer a estrutura da Defesa da Concorrência com o escopo de prevenir e reprimir as infrações contra a ordem econômica, especialmente os cartéis nacionais e internacionais.


BIBLIOGRAFIA

http://www.cade.gov.br/assuntos/programa-de-leniencia - Guia sobre o Programa de Leniência Antitruste do CADE

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2011/Lei/L12529.htm - Lei 12.529/2011



Informações sobre o texto

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MONDECK, Luisa. Acordo de leniência: caracterização e repercussões. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 22, n. 5291, 26 dez. 2017. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/60653. Acesso em: 24 abr. 2024.